***

É engraçado. Há poucos segundos eu não tinha certeza do que faria por ela, ou com ela, mas agora...tudo ficou mais claro. Finalmente posso ver quais movimentos devo fazer. Finalmente sei como ganhar esse jogo.

Nyx deve estar se perguntando porque eu a transportei para a floresta, na verdade isso é óbvio, não posso matá-la, mas porque não devo me divertir mais um pouco com o seu sofrimento, afinal, Deus escreve certo por linhas tortas.

***

–MERDA! – Grito assim que percebo onde me encontro.

Começo a andar tentando buscar cheiros familiares na floresta, mas não encontro nada. Ando por alguns minutos até que...lembro-me de tudo.

Corro... eu só penso em correr. Corro com toda minha velocidade até que, eu o vejo. Ao vê-lo ali, caído de forma brusca sinto algo, um sentimento estranho. É uma coisa qual não consigo definir. É uma sensação de vazio, como se algo tivesse sumido de dentro de mim, algo que eu jamais vou conseguir recuperar novamente, não importa quantos anos eu ainda tenha pela frente para viver, e o quanto ainda tenha lutar, nada vai preencher esse espaço.

Tenho vontade voltar de onde vim, mas... o sentimento de curiosidade, era uma força que me levava a verificar aquilo com meus próprios olhos.

–Hey, acorde. – Digo ao me aproximar.

Fixo meus olhos, mas seu corpo continua imóvel.

–Vamos, levante. Abra os olhos. – Desta vez me abaixo e cutuco seu rosto com o indicador da mão direita.

A aceitação ainda era algo que me faltava encontrar.

Encaro novamente seu rosto, e nada. Não se move, ou abre os olhos...

–Vinicius? Oi? Acorde. Vamos... Porque você não acorda? Sou eu quem devia morrer, não você.

Minha paciência, se esgota. A dor, aparece e começa a banhar-me. Perco a noção do que estou fazendo por alguns momentos.

–Nyx. – Uma voz que eu não consigo descobrir de onde vem me chama, fazendo-me voltar a realidade.

–Quem é? Onde está? – Pergunto olhando ao redor.

–Nyx, olhe pra mim.

Paro abruptamente de olhar a minha volta, e lentamente abaixo meus olhos. Sinto um arrepio quando vejo olhos brancos me encarando daquele corpo que antes não tinha vida.

–Vi...Vinicius?

–Não. – O que um dia foi o cadáver de Vinicius diz levantando-se como se fosse um boneco.

–O que diabos é você? –Falo pegando minha espada e apontando para o que quer que tenha tomado o corpo, ou o que restou do corpo de Vinicius.

–Bom, eu quase não tenho nada a ver com o diabo... a não ser claro, o fato de que ele já foi um anjo.

–Oi? – Pergunto o encarando assustada, ainda sem abaixar a espada.

–Não é possível pronunciar meu nome em sua língua, minha forma verdadeira é conhecida como anjo em seu mundo, e se você pronunciar meu nome, ou ao menos ver a sombra de minha forma verdadeira você entra em combustão. –A voz falou pacientemente para mim. Era um tom neutro, calmo.

–E quem te enviou? E porquê? – Pergunto encarando seriamente, tentando manter a espada firmemente em minhas mãos.

–Aquele que criou o mundo, as pessoas, os animais...

–Hm, que legal, bom saber. E porque ele te mandou até mim? Que eu saiba, não tenho sangue celestial nem nada do tipo, faria mais sentido se você fosse um demônio, ou se tivesse vindo me matar. É essa a questão?

–Ele se sente culpado. Na verdade, ele se sente mal porque você está se afundando em problemas que foram causados pelo nosso pessoal, quer dizer, o que um dia foi o nosso pessoal.

–Explique direito. –Grito sentindo a paciência desaparecer.

–Queremos te dar outra chance. Você poderá ter sua vida de volta.

–Sério? E para isso eu preciso fazer o que? Me arrepender de meus pecados e me submeter a Deus? – Digo em tom irônico. Não aguento mais brincadeiras, estou cansada.

–Você precisa apenas acordar Nyx.

Com o soar dessas palavras tudo ficou embaçado. Senti o chão sumir sob meus pés, eu não conseguia mais sentir o peso da espada em minhas mãos. Era como se eu levitasse. Como se eu estivesse passando por barreiras, quais ninguém nunca imaginou que seria possível passar. Era como se eu estivesse no céu. Então, eu comecei a cair. Tudo despencava ao meu redor. A imensidão me engoliu com vontade, a realidade qual eu vivia antes não me queria mais, meu coração pesava, e isso fazia a gravidade me puxar com mais gula.

–Será que foi isso que Alice sentiu quando caiu naquele buraco? – Solto um riso de meu próprio pensamento, para então ser jogada sob uma superfície dura.

Meus pensamentos somem. Apenas sinto. É uma sensação de dejá vu. Mas, ao mesmo tempo é tão estranha. Mexo-me no mesmo lugar, percebo que estou sentada em uma cadeira. Estico-me e bato meus pés em algo a minha frente, que eu entendo que seja uma mesa.

–Hey. Nyx acorde. Você tem que parar de trabalhar tanto. –Uma voz que eu não ouvia a séculos fala comigo e me chacoalha, me fazendo abrir os olhos de forma inesperada pelo susto.

Meus olhos ardem pela claridade mesmo que seja pouca. Observo o rosto de quem me acordou, mas não consigo o reconhecer. Parece que está tão distante.

–Nyx, estou falando com você. Isto é jeito de falar com seu oficial?

–Desculpe, ainda estou atordoada. –Digo de forma automática.

–Certo, vá lavar o rosto você tem uma briga de boate para verificar.

–Sim. – Falo tentando me levantar, mas sinto minhas pernas não cooperarem, parece que fiquei muito tempo nesta posição.

Alongo-me lentamente, este trabalho ainda vai me matar, ou causar bons problemas de coluna. Penso eu enquanto começo a andar rumo a minha viatura. É engraçado, mas sinto como se tivesse esquecido de algo, como se perdesse uma parte importante de mim. Talvez isso se deva a perda recente de minha mãe, mas isso me parece, tão longe. Tão distante. Sinto como se tivesse perdido muito mais, e fosse a menos tempo, mas não consigo descobrir o que é. Acho que é o cansaço, vou pedir uma folga quando voltar a central.

Nyx não voltou a central aquela noite, nem em nenhuma outra.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.