Abri meus olhos e logo recuei alguns passos,me separando de Brady que permanecia imóvel e assustado. Ele levou dois dedos aos seus lábios e os tocou levemente enquanto me olhava fixamente.
Aquele foi meu primeiro "beijo",eu ainda era inexperiente.
—V-Você...-Brady falou depois de algum tempo, suas bochechas estavam vermelhas,e olha...Posso dizer que não foi pelo tapa que ele levou.
Minha cabeça deu um estalo e eu arregalei os olhos.
—Em lugar ir tenho um agora!-eu embaracei as palavras por causa do nervosismo.-Eu tenho que ir em um lugar!-apontei para a saída.
—Espera!-Brady me segurou pelo pulso.-N-Nós...
—A gente conversa depois!-me soltei e corri para fora do colégio. Tinha que sair o mais rápido dali antes de qualquer um ver.
Me encostei no muro da construção abandonada e registrei tudo o que havia acontecido.
Meu coração estava acerelado e minha respiração ofegante,toda vez que eu lembrava do que fiz era como se tudo dentro do meu estômago dançasse.
O que aprendemos hoje? Que nunca devemos aceitar conselhos do Gray.
☆☆☆
Fui até o cemitério como havia planejado,e como o esperado, Gisele estava lá.
Ela estava em silêncio lendo um livro ao lado do túmulo de minha mãe, vez ou outra parava a leitura para admirar a foto da falecida e suspirava pesadamente.
—Olá?-me aproximei lentamente.
—Estava te esperando.-Gisele disse sem me olhar,apenas virou a página do livro e voltou a ler.-Cadê as flores? Era nosso combinado.
As flores. Eu havia esquecido elas no colégio! Saí com tanta pressa de lá que nem me lembrei de pega-las!
—Eu...
—Tudo bem. Você esqueceu,certo?-Gisele fechou o livro e encarou a capa por um tempo.
—Sinceramente, minha cabeça está uma bagunça!-suspirei.
—Tão jovem e já reclamando disso?-Gisele revirou os olhos e riu. -Gosta de ler?-finalmente me olhou nos olhos.
Assenti.
—Já leu esse livro antes?-me mostrou o livro que estava segurando,era uma coletânea de contos infantis modernos,lembro-me que "mamãe " lia para mim quando eu não queria dormir e ficava enchendo o saco dela.
Assenti novamente.
—Era o favortio da minha irmã. -Gisele suspirou enquanto guardava o livro dentro da bolsa.-Dela e do filho dela.-me olhou de modo sério.-Seu nome é Drew,certo?
—Certo.-concordei com a cabeça.
—O mesmo nome do meu sobrinho. -Gisele me olhou um pouco desconfiada. Talvez por que eu seja seu sobrinho?
—Hum.-eu disse olhando para os lados,tentando não olha-la nos olhos.
—É você, não é? -Gisele perguntou.
—Eu o que?-a encarei.
—O filho de Madeline.-ela se levantou para ficar frente a frente comigo.
—Sou.-engoli em seco.-Quero dizer eu...
Fui surpreendido pelos braços de Gisele que envolveram meu corpo em um abraço daqueles bem apertados,porém confortantes.
—Oh,meu Deus...-Gisele sussurrou com a voz embargada.-Você não sabe a falta que fez!
Bem,se eu tivesse fugido,eu me sentiria culpado. Mas,no caso,eu fui abandonado,né.
—Tantos anos...-Gisele sussurrou.-Mas agora...É inacreditável te ter em meus braços.-senti as lágrimas quentes que escorriam pelas bochechas dela caírem em meu ombro,molhando a manga de minha camiseta.-Tenho certeza que sua mãe adoraria te abraçar assim,só mais uma vez.-me apertou ainda mais.-Eu senti saudades!
Ficamos por mais alguns minutos abraçados, tia Gisele estava chorando,mas disse para eu não me preocupar.
—Como você cresceu!-ela disse me soltando e fungando. Seu nariz e olhos estavam vermelhos de tanto chorar.-Está um rapazinho,afinal tem...
—15.-eu disse.-15 anos.
—Nossa,como o tempo passa...-Gisele sorriu enquanto limpava as lágrimas com um lenço que tirou de dentro do bolso do casaco que usava.-E não é que você veio mesmo me ver?
—Você sempre vem aqui visitar o túmulo...Da minha mãe? -perguntei.
—Quase sempre,normalmente quando eu tenho algo a fazer no centro,já aproveito e reservo um tempo para vir aqui. -Gisele disse.-Afinal,ela era minha única irmã. Éramos tão unidas.
—Sinto muito.-eu disse baixinho olhando para o chão.
—Digo o mesmo.-Gisele sussurrou.
Por alguns minutos ficamos em silêncio. Olhei para a foto,tenho que admitir que aquela mulher tinha uma beleza de se admirar,além de bela,era boa e inteligente,quero dizer,era apenas boa quando não estava de mau humor...Ela quase não dava atenção para mim,apenas perto dos parentes,minha tia dizia que era ciúmes, que mamãe não gostava de ver ninguém muito próximo a mim,dizem que aquele era o jeitinho dela dizer : "Eu te amo".
—Drew.-Gisele quebrou o silêncio.-O que acha de irmos para casa para podermos conversar melhor?
—Não sei...-eu disse meio receoso. Tinha medo de me machucar com as lembranças que estavam por vir.
—Eu te prometo, nada de ruim acontecerá. -Gisele me estendeu a mão. -Iremos a minha casa conversar,farei chá com biscoitos. Você adorava, lembra?
Não vai me subornar com comida!
—A vovó está lá.-tia Gisele acrescentou sorrindo.
—Eu vou.-decidi.-Mas tenho dúvidas que você precisa tirar.
—Tudo bem!-Gisele pegou em minha mão e me levou para fora do cemitério.
☆☆☆
Fomos de carro até a casa dela,chegando lá,fiquei alguns minutos observando o lugar. Era a casa da vovó, costumava ir para lá nos finais de semana. Era bem maior que a casa de Margo e tinha um jardim ainda maior.
Incrível como gente idosa ama plantas.
Ao passarmos pelo portão seguimos por um caminho feito de pedras coloridas que levavam a porta da frente.
—Sabe,a antiga casa que você morava com seus pais foi demolida.-Gisele explicou abrindo a porta.-Após a morte de sua mãe, a vovó ficou muito triste,por isso vim morar com ela. Eu nunca tive filhos,nem sequer cheguei a me casar.-entrou.
A decoração continuava a mesma,móveis antigos e de madeira bem lustrada,as paredes tinham as cores desbotadas,e a casa toda tinha cheiro de lavanda. A casa podia ser "velha",mas era limpa que dava gosto.
—Sinta-se a vontade.-Gisele sorriu e apontou para o sofá, indicando que eu sentasse.-Mamãe? -chamou enquanto tirava seu casaco e o pendurava atrás da porta.-Mamãe,cheguei e tenho uma ótima notícia !-disse animada.
—Você arranjou um namorado,minha filha?-a voz de vovó veio da cozinha.
—Eu disse ótima notícia e não milagre!-Gisele revirou os olhos e se sentou ao meu lado.
—O que é então?
—Venha aqui na sala e verá.-Gisele sorriu.
Vovó apareceu na sala alguns segundos depois. Vovó Laura havia engordado,seus cabelos grisalhos eram cortados na altura do queixo e se vestia feito uma jardineira.
—Mas,minha filha,você sequestrou um garoto?!-vovó arregalou os olhos.
—Mãe, não é um garoto comum! Cadê seus óculos? -Gisele se levantou e guiou a vovó para que sentasse ao meu lado.
—Entendo que você esteja desesperada para ser mãe, mas nunca pensei que chegasse a esse ponto,Gisele!-vovó disse colocando seus óculos. -Podia pelo menos ter sequestrado um mais arrumadinho,esse tem cara de drogado.-ela sussurrou.
—Ei!-protestei.
—Mamãe, olha os modos!-Gisele a repreendeu.-O nome desse garoto é Drew! Drew! Isso não te lembra a nada?!
—Drew?-vovó me encarou. Ela tirou de dentro do bolso do avental um camafeu dourado,era igual ao colar de Lily,porém ao invés de formato de coração, era oval.-Não pode ser...-olhou da foto para mim várias vezes.
—O filho da Maddy,mamãe.-os olhos de Gisele voltaram a se encher de lágrimas.
—Meu netinho.-vovó sorriu,os olhos também lacrimejados.
—Oi.-acenei timidamente.
Gisele me encorajou para que eu abraçasse vovó e fui isso que eu fiz.
☆☆☆
Após esse momento de reencontro,vieram as perguntas,porém eu disse que preferia não revelar nada que aconteceram durante esses anos.
—Drew,eu e sua avó compreendemos que não queira dizer nada...Mas,pelo menos...Não pode nos dizer sua localização?-Gisele perguntou calmamente enquanto tomava um gole de seu chá.
—Depende.-eu disse sério. -Vocês vão me procurar?
—Drew...-Gisele tentou.
—Amanda não pode saber de nada.-eu disse. Afinal,Amanda ainda achava que meus pais estavam vivos e achava que eu acreditava que eles iriam me buscar. Eu tinha outro plano em mente para fazer Nanda revelar que mentiu para mim.
—Quem é Amanda?-Vovó perguntou enquanto tentava me forçar a comer biscoitos.
—A mulher que cuidou de mim,ela é como uma segunda mãe. -suspirei.-Ou melhor, a única que eu tive.-falei com armagura.
—Drew,eu já te expliquei a história.-Gisele disse meio incomodada.
—Mas,pense...Você seria capaz de abandonar seu filho por causa das ameaças de seu marido? E ainda ter coragem de continuar com ele?-perguntei cruzando os braços.
—Bem,não...Mas ela fez pelo seu bem!-Gisele disse.
—Meu bem? Largar uma criança na estação de trem não é algo que uma mãe faria!-eu disse cerrando os dentes.
—Ela errou,tá legal?!-Gisele se alterou.-Mas ela tentou consertar o erro dela!
—O que ela fez?-arqueei uma sobrancelha.
—Um mês depois,voltou para te procurar. Eu e ela fazíamos isso sempre que seu pai estava trabalhando.-Gisele disse de cabeça baixa.
—Por que escondido do marido dela?-perguntei.
—Porque você sabe que para começo de conversa ele nem queria que você existisse.-Gisele me olhou,os olhos inchados e vermelhos.-Maddy sofreu muito na mão dele. E ela tinha medo de larga-lo,pois temia o que ele faria.
—Como assim?-fiquei curioso.
—Aquele homem em primeiro lugar,tentou obrigar sua mãe a te abortar,depois estabeleceu que você deveria ser abandonado, e que se ela não fizesse isso,sofreria as consequências. Madeline tinha muito medo,por isso não se opôs. Eu tentei avisa-la que ele não era flor que se cheirasse,mas ela nem me deu ouvidos.-Vovó suspirou.
—Onde ele está?-questionei.
—Ninguém sabe. Após a morte de Maddy,ele nunca mais deu as caras.-Gisele deu de ombros.
—Quem mais sabe dessa história?-eu perguntei.
—Apenas eu e a vovó. -Gisele suspirou.
—Que complicado.-suspirei.-Mas,vocês sabem que não apoio nem um pouco a atitude da minha mãe,não é? Ela devia ter levado esse assuntos as autoridades.
—Sabemos que Maddy errou,Drew.-Gisele sussurrou.-Mas,você sabe o motivo,pode pelo menos perdoa -la?
—Você não sabe o quanto foi difícil crescer sem uma mãe. Não sabe a dor que era imaginar ter uma família unida como nos desenhos animados. Não estou dizendo que era ruim ficar com Amanda,pois não era. -eu disse sério.
—Infelizmente, não dá pra voltar atrás. -Vovó suspirou.-Sentimos muito.
—Só por um momento veja o ponto de vista de sua mãe .-Gisele pediu.
—Não tem como.-eu disse secamente.
—Talvez tenha um jeito.-Vovó disse séria.
—Qual?-Gisele perguntou.
Vovó subiu para o andar de cima,alguns minutos depois voltou com uma caxinha de madeira em mãos.
—Essa caixa guarda...-Vovó soprou a poeira da caixa,a fazendo tossir. Depois posicionou a pequena chave prata na fechadura e a girou para que abrisse.-Os segredos mais profundos de sua mãe.-abriu a tampa da caixa e de lá tirou um pequeno caderninho,com a capa de couro,as folhas amareladas e comidas por traças,resumindo: estragado pelo tempo.-O diário de Madeline.-me entregou.
—O diário dela?!-arregalei os olhos equanto analisava o caderno.
—Mamãe, onde achou isso?-Gisele estava surpresa.
—No sótão. Sua mãe morava aqui quando era solteira,quero dizer,morou aqui praticamente durante toda sua gestação com seu marido . Só se mudou de casa após dar a luz.-vovó explicou. -Eu nunca li esse diário. Apenas o achei durante uma faxina. Ele é todo seu,Drew.-me entregou a chave e a caixa.
—E-Eu...-guardei o diário dentro da caixa.
—Talvez ele te ajude a entender sua mãe.-vovó disse.-Você tem todo o direito de ler.
Encarei o diário. Ali estava escrito toda a vida de minha mãe e talvez até mesmo as respostas para minhas perguntas.
Não seria errado lê -lo,certo?
☆☆☆
No caminho para casa,dispensei a carona que tia Gisele me ofereceu. Ela e vovó disseram para eu ir lá mais vezes, Gisele disse que quando eu quisesse encontra-la bastava eu ir ao cemitério que possivelmente a veria.
Fui até o cantinho,estava precisando pensar,minha cabeça estava uma bagunça. Era como se alguém tivesse me chacolhado com tanta força que meu cérebro tivesse saído do lugar...Foi como ter ido naquele brinquedo do Parque de Diversões.
Primeiro,beijei o Brady. Isso ainda não é nem um registro,porque é difícil de acreditar.
—EU ME ODEIO!-gritei enquanto tocava meus lábios com os dedos. Precisava urgentemente lavar a boca.
Segundo,o diário de minha mãe estava em minhas mãos.
Eu pretendia lê -lo dentro da cabana,mas...
Ao abrir a porta,quase dei um pulo de susto ao ver Jack lá dentro dormindo. Ele mais parecia um bicho do mato coberto com um lençol velho.
—Jack?-arqueei uma sobrancelha.
Ele estava roncando feito um porco e babava tanto que dava para encher o oceno. Parecia acabado.
Revirei os olhos e bufei.
Bem,mas até que foi bom tê-lo encontrado lá dentro,assim eu teria com quem conversar. Era questão de tempo até ele acordar,até lá eu podia matar o tempo lendo o diário debaixo da árvore.
—O diário de Madeline...

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