O Diário Secreto de Anna Mei

Talvez eu nunca mais deva consumir cafeína novamente!


Terça-Feira/4 de Fevereiro

Sinceramente acho que vou explodir, já estou na escola – acho que só vou relatar neste diário o que eu faço na escola, porque em casa é um tédio só – na frente da classe tem uma professora que parece que engoliu o Mickey com essa voz ridícula querendo saber nossos nomes.

Acho que a tortura vai durar por um bom tempo.

O sinal toca! Ebâ! Ora do almoço... Posso comer em paz, o que será que a dona mãe fez pra mim hoje? Pães de queijo – que provavelmente ela comprou na padaria do Seu Chico Pão – com... Nada, ela não colocou nada pra beber. Como pode fazer isso com sua própria filha?

Ótimo, só preciso ver alguém bebendo algo para que eu possa assaltar.

Não vejo ninguém, ah eu posso sair e compra algo na cantina... só que eu não trouxe dinheiro, isso é a cara da pobreza.

Durante meu definhamento, aparece alguém na sala, Dennis – provavelmente me procurando para conseguir informações sobre seu amor: Amandha Martins. Vejo que ele está bebendo um refrigerante de alguma coisa – espero que não seja xixi com gás.

– Dennis, seu lindo – ele estranha o que eu falo – Me dá – ele para de achar estranho e se afasta de mim, tirando minha mãozinha de seu refrigerante precioso.

– Por que eu tenho que te dar?

– Não vou contar mais nada sobre a Man... – então ele estende a garrafinha me fazendo ver que o refrigerante é de... – Coca?

– Não, se você beber rápido a garrafa enche com refri de laranja, por magia.

– Isso não vai dar certo, lembra naquele dia do shopping que eu tava grole, eu tinha bebido coca, minha mãe não me deixa fazer isso – falo.

– E por que?

– Ela diz que eu não posso tomar muita cafeína, então nada de coca, nem café, a não ser que seja descafeínado – falo, voltando pra mesa e para os meus pãezinhos de queijo.

– E o que acontece? – ele senta na minha frente, exatamente como ontem, daqui a pouco o assunto morre e ele volta a me perguntar sobre a Amandha, melhor eu aproveitar.

– Ela diz que meu olho incha e minha cara fica verde...

– Legal...

– Né! – falo empolgada – imagina só se de repente minha cara começar a inchar e, do nada, ficar verde! Vou parecer um limão ou o Hulk!

– Agora fala da...

– Nem pensar! Hoje é minha vez, você fala o que sabe do Gabriel.

Mesmo achando uma ideia péssima ele começa.

– Descobri que ele mora com a mãe e a irmã – ele fala.

– E o pai?

– Me deixa falar – ele se aborrece – a mãe dele se chama Jane, é, na versão americana mesmo, a irmã se chama Kate, se fala como escreve – isto é, ele disse “Kati” – Ele gosta de marrom – droga, não sou fã de marrom – e que o pai dele era dentista antes de se mudar pro exterior.

– Legal, é só isso?

– Sim, não há muito pra saber, ele é um livro aberto – ele pega um dos meus pãezinhos e como não reclamo, continua pegando – Hoje a tarde eu vou à sua casa.

– Fazer o que? – quase grito e me engasgo.

– Precisa me dizer coisas detalhadas da Amandha, você é uma garota, use o talento natural para fofocas, todas as garotas têm, nem que esteja bem escondido! – o que ele quer dizer? Que toda garota é uma fofoqueira nata? E esse negócio de coisas detalhadas sobre a Mandy? Ele quer que eu diga a cor da urina dela? Como ela defeca? Isso soou muito mais nojento do que eu pensei, além do mais, eu tô comendo.

– Que horas? – estou me sentindo mal, acho que vou vomitar.

– Quê?

– A que horas vai para a minha casa? – Continuo mal... Falar com ele me dá náuseas.

– Que tal depois da aula?

– Ás três, então – falo... é muito melhor dizer o horário do que só “depois da aula”.

Mas aí, eu vejo aquela pessoa.

E com ele entram um loiro (provavelmente falso), um com o cabelo meio rastafári e outro com o cabelo meio marrom, eles estão o convidando para fazer sei-lá-o-quê e ele recusa por tem que cuidar da irmãzinha já que não tem mas ninguém pra ficar com ela, e não sei o que houve comigo, foi no automático.

– Eu posso cuidar dela – levanto e falo, minha intromissão fez com que, não só os quatro, mas também o Dennis, parar todas suas atividades e me olhar como se eu tivesse pirado, o olhar deles me cutucavam, o de Dennis principalmente, que dizia: Se senta logo ou te mato, mas eu fiz questão de não dar trela.

– Pode cuidar da Kate pra mim? – ele fala, se aproximando. Céus, estamos a menos de um metro de distância! Vou vomitar – Anna controle-se para não vomitar no seu futuro marido! – Ah, o efeito da cafeína... Não consigo parar.

– Sem problemas! Que horas posso ir? – me faça parar!

– Depois da aula, você pode?

– Claro! Eu não tenho nada pra fazer mesmo – cafeína é uma droga pra mim!

– Você salvou a minha vida! – ele puxa meus ombros e me abraça.

Ele me abraça.

Tipo, abraços onde ocorre contato. Ele me abraça. Me abraça e me só solta cinco segundos depois... Foi um abraço longo. Pelo menos pra mim que nunca fui abraçada por um garoto.

– O que diabos foi aquilo? – Dennis pergunta, quando sento, flutuando nos meus pensamentos.

– Hãn?

– O que você fez? Eu disse que ia pra sua casa saber mais sobre a Amandha e você...

– Está bravo porque ganhei um abraço e você nem sequer fala com a garota – digo, tomando dois goles da coca.

– O quê?

– Às vezes é bom a menina tomar a iniciativa – digo, tomando mais um gole e soluçando – mas – soluço – na maioria das vezes, quem deve atacar – mais um gole – é o cara.

– Não está falando coisa com coisa... – ah, eu estou, ele que não quer aceitar a realidade nua e crua.

– Deixe de reclamações, a culpa é toda sua por ser frouxo – bebo mais.

– Mas, não quero sabe, se não pode ser na sua casa vai ser na casa do Gabriel, não vai se livrar de me dizer coisas sobre a Amandha – ele fala, ou melhor, quase grita.

Dou mais um gole, mais e mais, e quando acaba, percebo que bebi muito rápido, agora estou zonza e com vontade de fazer xixi.

– Você vai acabar doente bebendo isso tão depressa – ele resmunga.

– Pare de resmungar! – digo.

– Resmingar? Eu nem sei o que é isso – pelo visto eu falei errado, mas e daí?

– Não resmingue seu trouxa, traga mais disso daqui para sua nona!

– Nona? Nona quer dizer avó, até parece que está bêbada!

– Não estou bêbada! Cale-se, estúpido!

Então eu não escuto nem vejo mais nada, meu corpo fica pesado e eu fecho os olhos, isso é desmaiar? Fingirei que é só um cochilo depois do almoço.

*

Acordo numa sala branca parece uma sala de hospital... Ah, a enfermaria, isso explica a mulher loira olhando pra mim, junto com Mandy e Dennis, vejo Ellie discutindo com alguns peixes no aquário multicolorido e Gabriel me olhando de longe.

Soluço.

– Droga! – me sento na maca – Por que sempre que eu acordo – soluço – eu fico com soluço?

– Mei, você é bem fraca, né? Se desmaia apenas com uma garrafinha de coca, imagine com álcool! – Mandy diz.

– Ah, Mandy – sussurro depois de um soluço – Mamandy, você está aqui.

– Tudo bem, todos aqui sabemos que só estava dormindo – Ellie interrompe seu papo com os peixes – levanta daí.

*

Como ele me irrita, não para de fazer perguntas sobre a Mandy, isso é o cúmulo.

– Por favor, morra – sussurro.

– Hãn? – ele para de falar, ótimo, é melhor assim, ah não, vai começar de novo.

– Já chega! Minha vez! Me fale um pouco da Kate – quero acabar com isso logo.

– O que quer saber – ele fala após bufar.

– Idade, aparência física e personalidade, é claro que você não sabe muita coisa dela, não tem como já que teve menos de um mês para – falo, mas ele está tão sorridente que me faz parar.

– Garotos não tem tanta frescura quando as garotas, nossas amizades são desenvolvidas bem pais rapidamente – ele diz.

– Não entendi nada.

– A irmã dele tem seis anos, é loira como ele e tem olhos verdes como ele, é inteligente e adora cutucar a cabeça dos outros, principalmente a minha, e às vezes... – ele diz o final da frase bem baixo.

– O quê?

– Ela... – ele fala resmungando algumas palavras.

– Fala direito!

– Ela me chama de Denny!

– Pfff! Denny? Bom, até que não é tão... – não consigo completar a frase e caio na gargalhada.

– Eu não ligo, ela é fofa... – olho pra ele estranhamente, será que Dennis tem complexo? – Parece uma daquelas bonequinhas que vendem em loja de chaveiros.

– Nem vem – digo – Não tem como uma criança ser tão perfeita.

Ele não fala nada, só aponta para uma casa verde claro, de dois andares com uma varanda de madeira marrom escura na parte de cima, com um alpendre e uma cerca branca com um portão marrom, belíssima casa, melhor que a minha.

Enfim, nesse alpendre estava sentada uma garotinha com o cabelo laranja, Chanel, com olhos incrivelmente azuis, mais que os de Dennis... Espera um minuto... É isso! Isso era o que tinha de diferente! Os olhos dele! Não estão azuis! Até parece um asiático normal! Bom, deixando essa descoberta de lado, não pude admirar a ruivinha por muito tempo já que a porta abriu e uma outra garotinha surgiu com os cabelos loiros até a cintura com seus olhos perfeitamente verdes.

Sim, tem como uma criança ser tão perfeita...

– Hum, mamãe, – ela se encolhe na porta e uma loira alta aparece.

– Olá? Ah, Dennis querido, Gabriel disse que – ela olha meio desconfiada para Dennis – Bom, vieram para tomar conta da Kate?

– Sim, sou Anna – decido só dar meu primeiro nome.

– Que fofa, podem entrar – ela nos puxa para dentro e vai a cozinha, me chamando – Aqui tem tudo que vão precisar, elas não são muito comilonas então vão precisar se esforçar um pouco para fazê-las comerem e... você sabe qual a relação de Dennis com meu Gabriel?

Ela praticamente pula em mim.

– Hum... Creio que... são amigos.

– Amigos? Ah – ela relaxa – E você?

– Eu? – fico vermelha e ela sorri, como se tivesse com pena, mas sorri, e rapidamente muda de assunto.

– Bom, eu preciso ir, boa sorte, tchau meus amores.

– Viemos aqui pra cuidar de uma e acabamos com duas – vou até a varanda e Dennis está sendo agarrado pelo pescoço pelas duas meninas.

– Ah, eu sou a Kate – Ah, ela é fofa até falando – esta é minha amiga, Liza!

– Eu sou a Anna, Anna Mei – falo quase sussurrando.

– Anny!

– Quê?

– Vou te chamar de Anny!

– Anny? – estou acostumada com Annie que soa como a letra “N”.

– Sim! Denny, vamos brincar de cabelereiro de novo?

– Eu... Tá...

Elas nos levaram para a sala, nos sentamos no chão e elas no sofá, Kate era a cabeleireira principal e Liza ficava ajudando com os penduricalhos, eu só assistia – e ria muito.

– Agora é sua vez! – elas terminaram e Dennis foi de um cara comum com cabelos comuns – talvez um pouco longos demais, mas comuns – para um cara com duas marias-chiquinhas com rendas e laços pelos cabelos emaranhados.

– Hãn? – falo, estava tão concentrada em rir que nem percebi que elas estavam vindo em minha direção, só percebi quando já estavam colocando meus cabelos para cima.

– Seus cabelos são enormes, é melhor assim – estou começando a ter medo dessa ruivinha também.

– Como é ser uma adolescente? – Kate pergunta, eu não sei, não ajo como uma adolescente comum, então não sou a melhor pessoa para responder essa pergunta.

– Não cresça! É uma armadilha, você precisará estudar muito e tem coisas que você não entenderia se eu falasse, o caso é, ser adolescente é ser velho demais para fazer birra e jovem demais para fazer o que der na telha, por fim, a escola em si é o pior, onde você vai passar com sofrimento, e, se algumas vezes coisas boas ocorrerem, vai ser por pouco tempo. Por isso todos têm medo da escola.

– Eu não tenho medo da escola – Kate fala orgulhosa.

– Você ainda está no fundamental, quando for para o ginasial vai entender do que eu falo, será como estar numa floresta escura apenas com uma cenoura e um saco de batata doce.

Quando termino a frase, os três olham pra mim como se meu cérebro derretesse e estivesse saindo pelos meus ouvidos em forma de suco... Tá, minha esperteza não é tanta, mas eu tento...