O computador enfim ligou, e Matheus abriu o site de busca da internet. Lá ele digitou a palavra “família Taurino+bruxos”. Logo dezenas de sites aparecerem e ele procurou pelo site que havia encontrado no dia anterior.

– Sabe o que está procurando? – eu perguntei a ele.

– Não, mais creio que se eu entrar no mesmo site que eu entrei ontem possamos achar alguma coisa.

Ele achou o site e clicou no link. A página era escura e tinha desenhos de pentagramas, adagas, crânios, espadas cruzadas. Havia um titulo no começo:

Artefatos mágicos - Lendas

– Não vamos perder tempo com isso... – disse ele rolando a página a baixo. Bem no final havia algumas fotos e do lado coisas escritas – Aqui fala sobre as famílias que seguiam a bruxaria. Algumas delas são do século V e vão até a mais atual, que termina bem na família Taurino. Veja!

Aproximei-me mais do monitor e vi o conteúdo ali escrito, era o mesmo material que ele tinha me dado logo pela manhã. A foto da família Taurino na internet era a mesma que estava na parede na sala da casa deles, só que havia algo diferente. A foto da internet tinha um detalhe que no verdadeiro retrato não havia. Na parede, bem pequeno, acima da cabeça da velha havia algo preso, próximo a um lampião na parede. Pedi para Matheus então abrir aquela foto em algum programa que pudesse dar um zoom. Feito isso ambos pudemos ver, um colar com um coração dentro da boca de uma serpente. Meu coração bateu mais forte e fiquei todo arrepiado. Matheus não conseguia dizer nada.

– Mas é a mesma foto, impossível a gente não ter visto isso lá. O retrato era enorme... – eu dizia.

– Deve ter alguma explicação bem plausível...

– Procure algo sobre algum colar com um coração dentro da boca de uma serpente. – eu disse.

Ele digitou e mandou buscar. Abriu algumas páginas que ele clicou, mas nenhuma delas tinha algo interessante. Eis então que um abriu e apenas dizia:

O Colar do Parvo

Meu corpo tremeu. Eu sabia que seria aquilo, só poderia ser aquilo. Era uma sensação estranha, mas segurando aquele colar eu tive a certeza que se tratava do mesmo.

Na página havia um grande desenho como plano de fundo do colar, apenas estava sem o cordão. As letras que anunciavam o título eram grandes e estavam em dourado, embaixo lia-se.

“O Colar do Parvo, um artefato tão raro quanto à existência de licores para se manter jovem por toda uma vida.

Conta-se a historia, que um antigo homem, sofria deverás com insinuações de que era um tolo, por amar uma bela donzela que nada sentia por ele. Enlouquecendo então quando seu melhor amigo se casará com ela, com a singela desculpa que ele sim a amava e ele tinha posses e podia dar a ela uma vida farta e graciosa.

O homem então fugiu da cidade e sua loucura o consumiu. Ouvia pelas florestas as vozes de todos que diziam o quão tolo ele era por aceitar tal infâmia. Ele sentia que perante o seu ex-grande amigo, ele não tinha forças para lutar, pois por várias vezes ele sentia que ela também o amava. Sabia que isso sim seria o melhor a donzela, mais se fez louco e moribundo.

Caminhava e caminhava. Não comia. Por vezes se sentia molestado por vozes em meio à escuridão. O amor platônico que sentia era forte demais e eis que um dia uma voz reinou.

Ela dizia ao jovem e enlouquecido rapaz que lhe daria um presente mais que seu coração lhe seria arrancado de seu corpo em troca de uma oferta. O rapaz na ânsia de deixar o sofrimento aceitou o pedido e uma serpente negra surgiu e feriu o homem com suas grandes presas.

Este deitou na terra e sucumbiu a morte.

Da oferta, o coração daquele homem fora engolido pela serpente, criando-se então um artefato chamado O Colar do Parvo.

– Nossa, você tem O Colar do Parvo em suas mãos! – disse Matheus surpreso.

–Não pode ser eu não acredito nessas histórias...

Por mais que eu não quisesse acreditar, aquela história fazia sentido, e independente de qualquer coisa aquele colar que agora se entrelaçava na minha mão podia não ser o mesmo. Obviamente que não seria. Alguém teria lido aquela história e teria mandado fazer um colar parecido.

– É melhor deixarmos isso pra lá, não pode ser o mesmo colar...

– Mas Kayo, é idêntico ao da foto, e também com o retrato da família.

– Mas alguém pode ter feito uma cópia, não sei.

Naquele momento o colar escorregou da minha mão e ao cair no chão pareceu brilhar, eu e Matheus olhamos para o colar atônitos com o que víamos.

– Você disse hoje que coisas estranhas sempre acontecem... – disse Matheus se agachando par avaliar melhor aquele colar.

Realmente aquilo não era normal, um colar brilhar de repente. Matheus levantou e foi até o computador ver se achava mais alguma coisa sobre o Colar do Parvo.

– Eis que conta-se que o colar era mágico, e daria muito poder ao seu guardião. Mas não se iluda, pois a lenda diz que o colar só aparece ao seu escolhido, ou por uma magia oculta e negra. – disse ele.

Pois bem, se aquele era o colar que a história trata eu não podia dizer, mas o fato é que estranhamente eu vi o nome da família Taurino, fomos até a casa deles e eu encontrei o colar. Assim como Matheus disse, que muitos iam naquela casa, e o fato era que foi eu que o encontrou na penteadeira. E esse último trecho dizia “o colar só aparece ao seu escolhido”. Talvez eu realmente estivesse com aquele colar em mão, mas acreditar que ele fosse mágico, mesmo com ele, ainda brilhando no chão, era difícil de acreditar.

– Lendas, só são lendas, porque um dia aconteceram e por algum motivo foram esquecidas. – comentou Matheus.

– Volte ao site que fala da família... -Matheus retornou a página que dizia sobre a família Taurino – Eu lembro de ter lido algo nas impressões que você fez para mim... Veja... – eu indiquei com o dedo no monitor.

“Conceituada família, os Taurinos vieram da Europa e fizeram do Brasil sua morada.

A cidade que habitavam era rural, até sua chegada, e com grande estima conquistaram a confiança de todos que ali moravam. Viviam numa bela casa e todos ao seu redor os veneravam. Recatados, porém ousados. A pequena família Taurino recebia amigos de grandes importância em casa, e outros de não tamanho agrado. Tais como pessoas ligadas a assassinatos ou roubos.

Pessoas relataram em documentos que a família se mostrava uma coisa, porém era outra. Não uma família feliz, mais sim mórbida e sombria. Na casa havia um cemitério, que diziam ser de familiares, porém a família era apenas composta por cinco membros.”

“A família também detinha uma marca registrada por onde passava. Um símbolo que muitos julgavam ser demoníaca. Um coração negro preso a boca de uma serpente.

Dizia-se que quando era visto preso ao pescoço de uns dos familiares, fazia com que eles simplesmente conquistassem a confiança de qualquer pessoa que os olhasse. ”

– Eu sabia que tinha lido algo sobre esse colar. A família Taurino então era guardiã do colar, mas, sendo hipotéticos, porque esse colar apareceria justamente pra mim?

– Essa história já esta me dando medo. – disse Matheus, tornando a olhar para o colar no chão que parecia perder seu brilho – E esse colar brilhando desse jeito?

– Se você esta assustado, imagina como eu estou? – por mais que eu não quisesse, comecei a chorar. O medo invadiu meu corpo.

– Calma, meu amor... a gente vai descobrir o que está acontecendo. Tenha certeza! – disse ele me abraçando.

O telefone tocou. Matheus então atendeu.

– O que você quer? ... Não eu estou ocupado agora... Podemos falar depois?... Está tudo bem, não precisa se preocupar.

Na hora soube que era Aline. Ele desligou o telefone.

– Aline! Como ela pega no meu pé. – disse ele nervoso

– Que culpa ela tem por te amar?

– Preferiria que ela me odiasse... um dia ela vai acabar me prejudicando e nem vai perceber por conta desse amor bobo.

– Não fala isso Matheus.

– OK, desculpa!

Olhei no relógio do computador e já marcava quase meio dia. A hora nunca tinha passado tão rápido. Ele me levou até em casa, se despediu de mim com beijo e disse que tudo estaria bem. Peguei as folhas que ele tinha imprimido, que estavam no carro, desci e entrei em casa. Quando entrei tanto meu pai como minha mãe estavam me esperando. Ambos com fúria nos olhos.

– O que foi aquilo? – disse minha mãe.

– Aquilo o que?

– Você e Matheus, se beijando no carro...

– Ah, você viu? Não lhe ensinaram que é falta de educação ficar espionando pela janela?

– Você já esta ultrapassando os limites, moleque!

– EU? O que foi que eu fiz de errado? Se eu estou apenas amando alguém que sente o mesmo por mim.

– Mais você não pode! Você não pode amar ninguém que não esteja no nosso meio, é arriscado. – disse minha mãe nervosa. Mas eu percebi que aquele nervosismo não era por eu ter beijado Matheus, e sim por outra coisa. Minha mãe nunca conseguiu esconder nada de mim, pelo menos não por muito tempo.

– Como assim? – aquilo realmente me interessou. Quais seriam os motivos de eu não poder amar alguém do nosso meio?

– O fato meu filho não é quem você esta beijando ou deixando de beijar. Não vemos problemas nisso. A questão é o porquê justo Matheus. – disse meu pai calmamente.

– Desculpa, eu não sabia que eu tinha que ser mais seleto. O que ele tem de errado?

– Não é ele. É você!

Minha mãe estava realmente nervosa. Começou a chorar e sentou no degrau da escada, com a cabeça nos joelhos.

– Eu não posso suportar...

– Calma querida. – dizia meu pai tentando consolá-la.

– Porque nosso filho? Diga-me? Por quê? – dizia ela constantemente e eufórica ao meu pai.

– O que? DIGA-ME!

Meu pai me olhou firmemente nos olhos e minha mãe ainda ficou ali, sentada chorando.

– Meu filho, você é uma pessoa especial! Existem coisas nesse mundo que giram mais pra uns do que para outros. E digamos que você foi o escolhido.

– Escolhido para fazer o que? Do que você esta falando pai? – eu tinha medo de ouvir algo que não quisesse ouvir, no entanto ver minha mãe daquele jeito estava me deixando nervoso.

– Você o achou, não é? O Colar do Parvo? – disse meu pai.

– Como sabe? – a chuva parecia ter intensificado. O clima pareceu bem mais estranho do que já era antes. Meu pai parecia estar mudando de personalidade, como se não fosse mais ele. Começou a ficar mais sereno, e parecer bem mais velho do que era. Minha mãe ainda sentada parecia estar mais calma, mais notei o mesmo com ela.

As luzes da casa começaram a tremeluzir, e o dia começou a parecer como a noite. Ouviu-se um atordoante silêncio antes que meu pai começasse a falar.

– Eu sempre soube de tudo o que pensas, de tudo o que sentes. Sou como você e você é igual a mim e a sua mãe...

– Do que você está falando?

– A Família Taurino não foi morta, como se conta a história. Ela ainda vive. – disse ele serenamente.

– Como? – eu fui dando leves passos para trás, conforme aquele homem, que ainda era meu pai se aproximava.

– Conte a ele... conte a verdade, eu já não suporto mais mentir para o meu filho! – disse minha mãe, angustiada naquele degrau.

– Nós somos a Família Taurino, Kayo.

– Eu ainda não entendo.

– Ponha o Colar do Parvo e você entenderá. Ponha-o!

Eu tirei o colar do bolso e deixei cair às folhas com a impressão sobre o colar e a família Taurino. Olhei fixamente para meu pai e minha mãe e quase que extintivamente decidi que o colocaria. Lentamente abri o cordão dourado e o vesti. A sensação foi única. Era como se tudo o que eu quisesse fosse possível naquele momento. Quando o imenso pingente tocou meu peito os olhos da serpente brilharam, de um vermelho vivido. E então a coisa mais estranha e mais incrível aconteceu.

A sensação era de que eu estava sendo sugado para outro lugar. Tudo em volta esta disforme e embaçado. Ouvi alguns gritos e um clarão vermelho e então tudo cessou. Eu estava de frente à mansão da família Taurino.