O Caso Da Boemia

Capítulo 2 - Conhecendo Sherlock Holmes


Sophie caminhou, ainda com raiva, na direção de Godfrey Norton, o advogado e ex-marido de sua mãe. Ela não disse nada quando chegou ao lado de Norton, mas percebeu que ele não andou dormindo bem nas últimas noites, pois suas olheiras estavam bem destacadas e arroxeadas.

Será que é por causa de ele ter deixado ela sozinha por duas semanas? Ou será que não conseguiu convencer Sherlock Holmes de aceitá-la?

-Hoje é um belo dia, não acha Sophie? O céu está tão bonito e claro.

Sophie olhou para o céu escuro e nublado.

-Hoje realmente poderia ser um belo dia, se não o céu não estivesse escuro e nublado, mas está assim por causa das freqüentes chuvas. Pra mim, o tempo está razoável. Mas para o senhor é o oposto. O senhor prefere os dias de sol, céu limpo e azul turquesa e com algumas nuvens.

“1, 2, 3, (...) 10. Ela é igualzinha ao pai”, pensou Norton.

-Você está absolutamente certa!

-É claro que eu estou. Além disso, pela minha observação, o senhor não dormiu bem nas últimas noites. Suas olheiras estão tão destacadas que qualquer pessoa irá pensar que você levou dois socos em seu rosto.

-Agradeço a preocupação.

-E quem disse que estou preocupada?

Norton bufou, pois sabia o quanto Sophie conseguia ser fria em relação a ele, algo que Irene nunca foi à época em que estavam casados.

-Está preparada para conhecer seu pai?

-A única coisa que eu quero saber é: O quê você faz aqui, afinal? – perguntou, ignorando a pergunta de Norton.

-Eu estou garantindo sua segurança. Você não faz idéia com o tipo de pessoa que vai morar.

Deve ser melhor do que você” pensou a jovem.

Há duas semanas, Godfrey Norton foi ao apartamento de Sherlock Holmes contar-lhe que ele tem uma filha com Irene Adler e o detetive pensou que fosse algum tipo de piada, mas de tanto o advogado insistir, Holmes acabou dizendo que quer conhecer a jovem, mas que não queria que ela fosse morar com ele.

-Parece que você não conseguiu convencê-lo.

-Eu não consegui convencê-lo a ficar com você, mas ele quer te conhecer. E seu assistente também.

***

-Ah! Você deve ser a jovem que o Sr. Holmes e o Dr. Watson querem conhecer. Eu sou a Sra. Hudson. – respondeu à senhora que Sophie julgou ser muito bondosa.

-Obrigada!

-Vou chamá-los! Esperem aqui, por favor. – disse a Sra. Hudson, enquanto subia a escada.

Sophie observou a casa na qual se encontrava e ficou imaginando como vai ser sua vida quando for morar ali, com um pai que nunca conheceu e uma governanta de uns 50 e poucos anos. Não demorou muito até a Sra. Hudson descer as escadas:

-A Srta. pode subir. O Sr. Holmes a está esperando, junto com o Dr. Watson. O quarto é o primeiro à direita.

-Obrigada. – Agradeceu Sophie, já subindo as escadas, com Norton logo atrás.

A Sra. Hudson não permitiu que Norton fosse junto com Sophie, o que deixou o advogado irritado.

-Desculpe Sr. Norton, mas o Sr. Holmes deseja ver apenas a jovem.

-Eu não vou permitir que ela vá conhecê-lo sozinha. Espere-me Sophie.

A jovem ignorou o advogado e continuou a subir as escadas, e chegou à porta do quarto, que estava fechada, e escutou murmúrios baixos, mas o suficiente para poder entender a conversa entre, provavelmente, Sherlock Holmes e John Watson.

-Holmes, você não acha melhor ela ficar aqui com você? – perguntou Watson, que tinha uma voz suave.

-Eu disse que queria conhece - lá, e não que queria que ela morasse comigo e do jeito que está minha vida, depois do que aconteceu nas Cataratas de Reichenbach, em Meiringen, perto de Berna, na Suíça, no caso de Moriarty, ter uma filha nesse momento não é a melhor opção. – respondeu Sherlock Holmes.

-Como não é sua melhor opção? Ela é sua filha!

-Não. Ela algo que nunca deveria ter acontecido. Por um descuido de minha parte. E que também eu não me lembro de ter acontecido. Deve ter sido quando Ela enganou-me várias vezes no passado. E a questão é em qual momento isso aconteceu?

O pouco da conversa que escutou, Sophie concluiu que sua mãe havia enganado Sherlock Holmes várias vezes e que uma dessas vezes, engravidou dele. E que ele não queria que ela morasse com ele, apenas queria conhecê-la, o que já era hora, então bateu na porta.

-Deve ser ela. – disse Watson, indo na direção da porta.

-Deve não, é ela. – respondeu Holmes.

“Eu nem a conheci e já estou notando que essa jovem gosta de escutar as conversas de outras pessoas. Como Irene.”, pensou Holmes.

O Dr. Watson abriu a porta para uma jovem de 15 anos, morena e de olhos azuis, iguais ao de Sherlock Holmes, mas que era muito parecida com Irene Adler.

Sophie entrou, observou os dois senhores olhando-a, ou melhor, um olhando e o outro observando e percebeu que quem a estava observando era Sherlock Holmes, seu pai. Sophie começou a observá-lo também.

Watson percebeu a tensão que estava formando-se no ar e decidiu deixá-los sozinhos. Sherlock e Sophie observavam intensamente um ao outro, tentando descobrir algo.

-É um prazer conhecê-lo senhor Holmes, ou devo chamá-lo de pai?

-O prazer é todo meu senhorita e não deve chamar-me de pai.

Sophie observou o quarto de Sherlock, lembrava muito seu antigo quarto, onde era bagunçado, mas organizado, onde, supôs que tudo estava em seu devido lugar.

-Parece que a senhorita ficou admirada com o meu quarto. O que acha dele?

Sophie olhou nos olhos de Sherlock.

-Bagunçado, mas organizado. Lembra muito o meu antigo quarto. Mas eu não acho que esse seja o tema certo para começarmos a nos conhecer. – disse Sophie olhando os braços de Holmes. – Parece que o senhor gosta de usar e abusar da cocaína, a julgar pela seringa e os pequenos pacotinhos em sua mesa, além do cheiro.

“Hum... Interessante”

-Está absolutamente certa, não é o tema certo para começarmos a nos conhecer, mas parece que a senhorita andou chorando demais nos últimos meses, talvez uns três ou quatro. Está sentindo falta de sua mãe.

Sophie se viu ser pega em seu próprio jogo, o mesmo que usava com a mãe e Norton.

-Quem não sentiria saudades da própria mãe, mas não é isso que me intriga no momento. Está usando cocaína para livrar-se do tédio ou dos pesadelos das últimas semanas, ou serão os dois.

“Touchê”

-Pelo dom de observação e dedução que a senhorita possui, além da cor dos olhos e o jeito de agir em relação a certas pessoas, seria realmente minha filha.

-Então está admitindo que sou sua filha?

-Eu nunca disse o contrário.

-A não ser a Norton.

-Qual seria sua reação se alguém lhe dissesse que tem uma filha?

-Provavelmente, eu acharia uma piada.

-Exatamente. – disse Holmes sentando-se em sua poltrona – Há duas semanas, Norton veio e disse-me que eu tinha uma filha com Irene e que agora eu era o responsável por você. Eu neguei tudo, mas ele continuou a insistir. Até que comecei a pensar na possibilidade, depois de tantas vezes que ela enganou-me. Então para, como posso dizer, calar a boca de Norton, concordei em conhecê-la.

-Mas não disse que queria que eu morasse com o senhor.

-Você é inteligente e esperta. Admito que estou admirando isso em você. Mas você não pode vir morar comigo.

-E qual seria a razão? Tem medo de falhar ou será que não faz ideia de como cuidar de uma adolescente?

Sherlock Holmes não respondeu, mas pelo seu silêncio, Sophie entendeu, e também não disse nada.

-A propósito, onde está a carta de Irene? – perguntou Sherlock.

Sophie entregou-lhe a carta de Irene, que recebeu há três meses e que estava endereçada a ele. Holmes pegou a carta, abriu e começou a lê-la:

“Meu caro Sherlock Holmes:

Provavelmente eu não estarei viva quando você for receber esta carta e a essa altura, você já deve ter conhecido Sophie Isabelly Adler Holmes, nossa filha, e deve ter achado que era uma piada e caso não se lembre, eu engravidei quando o enganei pela segunda vez, em Liverpool.

Mas não é isso que tenho a lhe falar, ou melhor, a lhe pedir. Caso eu morra nas mãos de Moriarty, eu quero muito que você cuide de Sophie até ela atingir a maioridade. Eu não confiaria em outra pessoa, além de você, para cuidar dela, nem mesmo Godfrey Norton. Ela é muito observadora e perceptiva, além de ser inteligente, igual a você, Sherlock.

Lembra-se do Caso Blackwood, quando eu lhe disse que trabalhava para Moriarty e que ele tinha encontrado meu ponto fraco? Ela era meu ponto fraco, além de você. Ele ameaçou matá-la se eu não fizesse o que ele mandasse, eu não fazia aquelas coisas porque queria, era para manter a vida de Sophie salva de suas garras, você sabe do que estou falando.

Por favor, Sherlock Holmes, cuide de nossa filha, pois se eu morrer, ela terá somente a você e a mais ninguém. Ela é tudo na minha vida e espero que também seja da sua.

PS: Eu te amo e sempre te amarei.

Atenciosamente, Irene Adler.”

Apesar de não ter demonstrado, Sherlock Holmes ficou comovido com a carta de Irene. Ele nunca pensou que ela poderia amar tanto a jovem que estava em seu quarto folheando um livro de química. Sophie olhou para Holmes e percebeu que ele já tinha terminado de ler a carta, e decidiu ir embora, voltar para sua antiga casa na Vila Briony. Holmes notou que Sophie estava saindo e disse-lhe:

-Espere Sophie.

Sophie assustou-se, mesmo que não tenha demonstrado, e olhou em sua direção.

-Sim?

-Você pode vir morar comigo. Até atingir a maioridade.

Sophie estava desconfiada.

-E por qual razão mudou sua decisão?

-Eu não posso deixar que qualquer um cuide de você. E como eu lhe disse, ficará aqui até atingir a maioridade. Entendeu?

-Sim senhor.

-Ótimo. Vá pegar suas coisas e vou pedir a Sra. Hudson que lhe de um quarto.

Sophie assentiu e saiu do quarto de Sherlock Holmes e indo em direção a porta.

“O quê será que minha mãe escreveu naquela carta e que o convenceu a ficar comigo?”, indagou a si mesma, enquanto pedia a Sebastian levar suas malas até seu novo quarto, em sua nova residência, a Baker Street 221B.