Não basta abrir a porta

Brigas, verdades e fome


Por Rodrigo:

Chegamos em casa já tarde e a Manu que tinha conseguido falar o mínimo possível comigo durante todo o trajeto estava tão cansada que já estava muda mais por sono do que por raiva.

Depois de colocar as malas pra dentro, praticamente a carreguei, tirei sua roupa e a deixei em nossa cama.

Já havia falado com a Ana e decidimos que a Julia só voltaria pra casa amanhã depois da escola.

Acabei tomando um banho rápido para admirar minha esposa e sem pensar em mais nada, me encaixei no corpo dela e adormeci.

Por Manuela:

Acordei mais uma vez nos braços do Rodrigo e confesso que só de estar em casa, despertando com ele em nossa cama, já me senti mais calma, sem tanta raiva do ciúme infantil do meu marido.

Quando já estava pronta, terminando de passar o café, ele me olha tímido na porta da cozinha.

R: Bom dia amor!

M: Bom dia!

Rodrigo se aproxima de Manuela por trás, afasta seu cabelo e beija sua nuca.

R: Eu sei que você ainda esta chateada comigo... mas estamos em casa, a gente podia ficar bem é?

Manuela se afasta do balcão, soltando-se do marido e pegando duas xícaras para encher do café já pronto.

M: O fato de estarmos em casa não muda o motivo que me deixou chateada com você.

R: Amor, eu estava sendo sincero no avião, eu sinto muito, mas não consegui me controlar... eu sei que não deveria ter falado daquele jeito com... seu amigo..., mas agora não sei mais o que fazer, não quero que a gente continue assim, que a Julia chegue em casa e o clima esteja tão ruim. Tenta me perdoar vai...

Rodrigo se aproxima de Manuela e fica na expectativa de ver sua esposa virar e aceitar seu pedido de desculpas.

Manu que estava se agarrando numa raiva que talvez nem sentisse mais, percebe que Rodrigo está usando todas as armas para recuperar o clima bom de antes e resolve dar uma folga a ele. Se vira e coloca uma das mãos em seu rosto.

M: O que me deixa preocupada é que eu acho que você nem ao menos sabe o que realmente mexeu comigo nessa história toda. Mas ok, também não quero ficar mal com você. Mas me dá um tempo tá bom?

Manu beija levemente Rodrigo, pega sua xícara de café e sai da cozinha rumo ao quarto deixando o marido levemente confuso para trás.

O casal recupera a rotina na semana anterior ao casamento de Ana e Lucio e mesmo estando com sua família, Rodrigo ainda sente Manu um pouco distante.

Por Rodrigo

No início pensei que as coisas iam voltar ao normal e que era só stress por causa do casamento, mas não conseguia ignorar que ela estava estranha, sempre cansada... nem sexo eu estava conseguindo, no máximo uns beijos mais fortes sempre iniciados por mim e encerrados por ela. Até a Julia perguntou se estava tudo bem.

No terceiro dia não aguentei, aproveitei que a Julia ia dormir na casa da Ana e resolvi procurar Manuela no buffet, quem sabe encontra-la no fim do expediente, sozinha no trabalho, ela teria menos chance de fugir de mim.

No buffet – fim da tarde.

Rodrigo se despediu do último funcionário prometendo ajudar Manuela ao fechar tudo.

Quando caminhava em direção ao escritório, ouviu a voz da mulher vinda da cozinha. Ela estava no telefone e ele discretamente ficou entre o corredor e o cômodo.

M: Não se preocupa Ana, te juro que é normal. Eu já até morava com Rodrigo e fiquei tensa a semana inteira antes do meu casamento

(...)

M: Acho que era isso que me deixava mais nervosa... Mas relaxa, sério, você está assim porque sabe o quanto é sério casar com alguém e você não estaria fazendo isso se não tivesse certeza que o Lucio é o cara certo.

(...)

M: Eu sei que ama, é visível! E eu sei que casamento não é fácil e você tem razão em ficar com medo, mas honestamente.... é incrível Ana! É incrível fazer essa promessa... e no fim das contas, pode acontecer qualquer coisa, quando o amor é de verdade, nada quebra isso! Eu te garanto!

(...)

M: Vai se distrair vai, conta com a Julia que ela é ótima em fazer isso!!!

(...)

M: Não escuta ela não, eu e o Rodrigo temos nossos problemas mas está tudo certo! Ele me enlouquece, mas a verdade é que eu nunca tive tanta certeza dos nossos sentimentos! Tranquiliza nossa filha, eu e o pai dela só estamos precisando de uma conversa.

(...)

M: hahahaha! Disso também! Vou te esperar em casa com a mochila que a Julia esqueceu. Beijos!

Rodrigo que ouvia tudo quietinho acaba esbarrando em um peso que segurava a porta, quando Manuela se vira ele vê que não tem mais jeito e se aproxima, deixando a porta fechar.

M: Faz quanto tempo que você está aí?

R: Tempo suficiente pra ter certeza que você me ama.

M: E precisa ouvir a conversa alheia pra isso?

R: Ultimamente acho que sim. Manu. É sério, o que mais eu posso fazer pra você ficar bem comigo?

M: Deixa eu te perguntar uma coisa... porque você acha que eu estou chateada com você?

R: Ora, porque eu tratei teu amiguinho mal lá em Salvador.

M: Ai Rodrigo sério, você é impossível. Manu encara duramente um Rodrigo confuso.

Eu não sou tão infantil assim... O que me deixa muito chateada com você é esse teu jeito novo comigo, esse ciúme ridículo que faz você se comportar como um adolescente.

R: Peraí Manuela, também não é assim... Já pedid desculpas pelo jeito que eu falei com aquele cara.

M: Mas é justamente isso que eu estou falando... Você fala isso da boca pra fora, mas na verdade você não se arrepende do chilique que deu com o Eduardo ou se toca de todas as suas atitudes nos últimos tempos com relação ao teu ciúme. Que o que aconteceu em Salvador foi só o surto mais recente.

R: Eu não sei qual é a grande novidade, você sabe que eu sou ciumento... Mas não sou nenhum descontrolado.

M: É aí que você está errado Rodrigo, desde que voltamos que tenho te achado ciumento, você não era assim e se era, definitivamente não nessa intensidade. Eu não gosto de cena e pelo visto, temos opiniões muito diferentes de descontrole.

R: Temos mesmo, porque se eu fizesse o que eu queria, tinha partido a cara daquele almofadinha que estava querendo algum tipo de flashback com você. Ia me satisfazer, mas aí sim você ia poder me chamar de descontrolado.

M: Você está se escutando? Aquela nossa conversa no hotel não serviu pra nada? Afff.... melhor a gente conversar depois.

Manuela anda em direção à porta, contudo não consegue abrir. Nesse momento recorda quando Fernanda, sua funcionária, lhe falou que a fechadura da porta estava com problema e não poderia ser fechada até o dia seguinte, quando um chaveiro iria no buffet.

Ela pega o celular para ligar e quando ainda está chamando, percebe que a ligação caiu, a cozinheira olha para o celular sem bateria e abaixa a cabeça derrotada.

R: O que houve?

M: Liga para alguém vir aqui. A tranca está quebrada, só está dando para abrir a porta por fora e acabou a minha bateria..

Rodrigo coloca a mão no bolso para fazer uma cara surpresa.

R: Acabei deixando no carro. Você chegou a ligar para alguém?

M: Liguei pra Ana, mas não deu tempo de ela atender. E agora Rodrigo? Como que vamos sair daqui?

R: Calma, você não falou alguma coisa de ela ir na nossa casa?

M: Mas ela só ia bem mais tarde. Não sei se vai pensar em vir aqui.

R: Bom, pelo menos de fome a gente não morre até amanhã e agora você vai ser obrigada a se entender comigo. – Rodrigo fala um pouco debochado enquanto morde um pãozinho e se senta de frente para Manuela. – Ou você vai querer reviver aquele clima gostoso de silêncio do avião.

Manu acaba caindo na provocação e se vira, decidida a ficar sem falar com o marido até alguém encontrá-los.

2 horas depois...

M: A minha vontade era parar de falar com você mesmo, mas eu realmente preciso saber, você acha que eu vou te trair?

Rodrigo fica surpreso com a pergunta, perde o sorriso e se levanta.

R: Claro que não Manu, que absurdo!

M: Então pra que esses dramas? Afinal, você não tem nenhum motivo para desconfiar de mim e eu tenho todo o direito de ficar irritada com qualquer insinuação do contrário.

R: Manuela, amor, eu nunca achei que você fosse fazer alguma coisa, eu te conheço, te amo e sei que você me ama.

M: Então porque esse comportamento?

R: Você vai achar que eu sou idiota.

M: Rodrigo, meu amor, eu já estou te achando um idiota.

R: Eu vou ignorar essa ofensa... Mas a verdade é que eu não estou lidando bem com a ideia de saber que você já foi de outro homem.

Desde que eu te vi aquele dia com o Gabriel na nossa casa, vi o teu estado de quem tava no maior... enfim... desde aquele dia a minha ficha realmente caiu de que eu não era mais o único homem da tua vida.

E desde então, a ideia desses outros homens te olhando, querendo te tocar... aquela foto no jornal com o Gabriel, aquela cena do almofadinha colocando o cabelo atrás da tua orelha, o jeito que ele te olhou... Enfim... só serviu pra eu ver eu quase te perdendo e toda a vida que você teve sem mim.

M: Rodrigo, que absurdo – Manuela se aproxima de Rodrigo e segura sua mão.

Eu nunca te vi inseguro assim, ainda mais comigo.

R: É porque antes nunca me ocorreu que você poderia refazer sua vida sem mim. Mas pelo visto era mais fácil do que parecia – Rodrigo fala com um pouquinho de rancor na voz o que faz com que Manuela solte sua mão.

M: Rodrigo, cuidado, eu posso entender um pouco dos teus medos, mas não quero quebrar nossa promessa, não quero ressuscitar uma parte do nosso passado que ficou pra trás.

R: Mais ou menos né, já que teu passado de vez em quando surge de novo. Teve mais algum namorado seu que eu precise saber antes de encontrar com os braços em você?

M: É exatamente esse teu comportamento que me irrita. Você fala como seu eu tivesse te largado para ir pra cama com todos os homens que me dessem atenção.

R: Não é isso que estou falando – Rodrigo esfrega os olhos em frustração.

M: Mas é isso que eu estou ouvindo. Mas ok, você quer saber, então vou te contar.

Nesse tempo que a gente ficou separado, que eu estava um lixo, tentando me recuperar do baque de tudo que aconteceu eu conheci um cara bacana, que foi meu ombro enquanto meu ex marido me falava que ia viver a vida dele....

Como eu já te disse, fui mesmo pra cama com ele e aí? O meu marido tinha decidido estar com outra mulher, inclusive me disse isso na cara... Então não vem querer insinuar que eu agi mal, que te traí de alguma forma, porque você sabe que não é verdade.

Depois disso, após meses e meses negando qualquer coisa eu fiquei com o Gabriel e os detalhes do meu relacionamento com ele apenas nos pertence. Não é porque nós voltamos que eu vou quebrar essa privacidade.

Então respondendo a tua pergunta velada eu te falo, eu me relacionei com dois homens, e você já conhece os dois. E você? Além da minha irmã com quantas mulheres você foi pra cama? Vai dizer que nenhuma? Vai dizer quem foram todas? E aí Rodrigo, reponde?

R: Você sabe que eu não estava perguntando nada. Que eu estou apenas frustrado pelo meu ciúme.

M: Não interessa mais o que você perguntou, agora sou eu que quero saber. Qual é a história daquela Carol? Você namorou alguém? Como foi sua vida de solteiro Rodrigo?

R: Manu, você está querendo brigar mais, você não quer saber o que está me perguntando. Você sabe que eu não namorei ninguém.

M: É verdade Rodrigo, eu sei que não, e sei também que você teve outras mulheres, mas eu não quero saber delas, de verdade! Só vai me fazer mal. Quando nós conversamos, quando nós deixamos tudo pra trás eu não estava falando só da Ana, eu estava falando de tudo... Mas você não está conseguindo, e eu não vou fingir que não me incomoda.

Rodrigo suspira, odeia esse momento, o momento que percebe que Manuela está certa e ele está errado.

R: Eu estou entendendo o que você está falando, e eu sei que você tem razão.

Eu não tenho o direito de te cobrar nada e eu saquei que errei em pirar por conta do Eduardo ou ainda de qualquer outro homem.

Rodrigo se aproxima de Manuela, que se mantem imóvel mas não rejeita os braços do marido que a envolvem.

Mas me entende amor, entende que o meu ciúme existe e que eu estou aprendendo a lidar com ele. Entende que eu estou tendo que aprender como que coloca limite no amor que eu sinto com você. Eu nunca senti tanto ao mesmo tempo. Meu coração transborda do tanto que eu sinto.

Eu prometo que vou trabalhar nisso, mas eu te peço que me ajude, que dê um desconto pra esse teu marido bobo e infantil, que não desista de mim. – Rodrigo encosta sua testa na de Manu e percebe que amolece um pouco a esposa que coloca as mãos no braço do arquiteto, se deixando levar pelas palavras dele.

M: Eu não posso deixar você me ofender com seu ciúme.

R: Eu sei, nem quero te ofender, nunca! Eu vou me comportar melhor, eu prometo. Eu não quero mais te machucar com meu ciúme, eu só quero ficar bem com você. Eu te amo Manu.

M: Eu também quero ficar bem. Eu te amo tanto Rodrigo.

Os dois se beijam. Primeiro devagarzinho, aproveitando a proximidade que não desfrutavam desde Salvador.

Aos poucos, a saudade começa a consumir o casal e Rodrigo acaba conduzindo Manuela ao balcão central, colocando ela sobre ele.

A chef, inebriada pelo beijo e toque do marido, se esquece por um instante onde está e acaba se rendendo à ele.

Quando ela já desabotoou metade da blusa do Rodrigo e soltava seu cinto, ele enterrava a boca no pescoço de Manu, enquanto começava a puxar a calcinha da mulher por baixo do seu vestido.

Quando a tarefa de ambos já está em andamento e as bocas voltam a se encontrar, acabam se assustando com o barulho da porta sendo aberta com força e a voz de Julia e Ana.

J: Papai, mamãe!

A: Julia meu amor, vai lá avisar pro Lucio que encontramos eles.

J: Mas ele tá vindo.

A: Vai logo Julia, pra ele ficar despreocupado.

Quando Julia se afasta correndo, Manu tenta da forma menos humilhante possível, se recompor com Rodrigo, disfarçadamente ajeitando a roupa de ambos.

Ana não se contem e antes de deixar os dois, aproveita pra tirar um sarro.

A: Bem que o Lucio disse pra não me preocupar, que vocês estavam comendo alguma coisa ou namorando.... No fim das contas ele acertou o lugar e a atividade – Ana fala rindo.

M: Muito engraçada. Vai lá Ana que a gente já tá indo encontrar vocês...

Eles escutam Ana rindo e falando pra Lucio que era melhor esperar os dois no carro.

Rodrigo que até então estava em choque, solta uma risada contida, beija Manuela e fala:

R: Relaxa amor, podia ser pior.

M: Como poderia ser pior?

R: Eles podiam chegar 05 minutos mais tarde! Vai indo pra lá que eu já to indo.

Depois de respirar um pouco e imaginar tudo que pode para segurar o seu desejo, Rodrigo anda de encontro a sua família e acaba se divertindo com o constrangimento de Manu, a graça dividida entre Ana e Lucio (que obviamente já sabia do ocorrido) e a inocência de Julia.

J: Aposto que meu pai aproveitou que tava preso na cozinha para comer um monte de coisa gostosa.

A: Não sei não meu amor, acho que ele ainda está com cara de fome.

Os adultos não resistem e todos caem na gargalhada, até mesmo Manuela, que apesar de achar graça, sente o rosto vermelho e percebe que ninguém vai deixa-la esquecer o ocorrido!

Por Manu (pensamento):

Pelo menos está tudo bem de novo! E confesso que não vejo a hora de tirar essa fome da cara do meu marido!