Novo Mundo

Laços de Sangue


– Vocês sabiam? – Samantha perguntou. Ela olhou para cada um de nós e parou em Percy, como se soubesse que foi ele o primeiro que soube do segredo. Lágrimas caiam do rosto dela.

Percy assentiu.

– Ele não pode estar vivo, eu o vi morrer – Samantha falou – Ele não pode ser Pain.

Percy passou as mãos pelo cabelo – Eu soube disso um pouco depois de conhecer ele, eu tive um sonho sobre o dia em que ele morreu, depois uma conversa, ele me confirmou e falou que a Pedra Filosofal o ressuscitou.

– Espera, o quê? – Samantha disse – A Pedra Filosofal? Por quê? Não faz sentido.

– Eu não sei, também não faz sentido para mim, mas ele me falou sobre você, eu te reconheci do sonho – Percy falou, sua voz começava a falhar.

– E você não me contou – Samantha olhou com as lágrimas caindo ainda mais – E vocês sabiam?

Ela olhou diretamente para mim, eu não consegui falar nada, ninguém também o fez. Me sentia como uma traidora, Samantha é uma das minhas melhores amigas, ela me ajudou a me adaptar. Quando eu e os outros decidimos manter em segredo sobre ela ser irmã de Pain, eu hesitei, era um segredo muito grande. Agora eu sabia que eu não deveria ter guardado esse segredo.

– Sam... – Finnick tentou se aproximar de Samantha, mas ela deu dois passos para trás.

– Eu preciso ficar sozinha – Ela falou e se dirigiu até a porta, ela olhou para nós rapidamente e depois saiu do quarto.

Finnick se sentou na cama e colocou a cabeça entre as pernas, Hermione encostou-se à parede. Percy se deitou numa cama perto da janela e Jace foi em direção à porta.

– Você vai aonde? – Perguntei para ele.

Jace suspirou – Vou beber e tentar manter um olho nela.

Então ele saiu, eu soltei um suspiro e me lembrei de uma conversa que eu tive com Samantha um pouco depois de sairmos de Brasília. Estávamos atrás de um carro grande o bastante para abrigar seis pessoas, já que o nosso grupo havia crescido. Ele estava em um estacionamento de carros abandonados.
– Acho que esse daqui está ótimo – Samantha colocando a mão numa Kombi.

Franzi a testa – Parece que vai cair aos pedaços.

– Mas deixaram a chave – Ela interpôs – Ou é isso ou é tentar fazer ligação direita.

Fiz uma careta. Ela abriu a porta do motorista e sentou no banco e fingiu dirigir o carro e sorriu. Samantha havia optado por usar uma calça jeans e uma camisa simples branca, de alguma forma eu sempre ficava intimidada por ela quando eu a conheci, a mão dela foi a seu pescoço, ele havia colocado um cordão com uma pedra preta.

– Cordão bonito – Eu apontei.

Ela sorriu – Minha mãe me deu, eu tinha nove anos, é uma réplica da Pedra da Ressurreição eu era fã de Harry Potter e havia pedido para ela.

– Eu também ganhei um cordão da minha mãe – Mostrei para ela – É um símbolo egípcio.

Samantha sorriu – Eu sei, eu li sobre você, lembra?

Bati a mão na cabeça – Ah claro! Como eu poderia esquecer que eu sou um livro nesse mundo e que milhares de pessoas sabem sobre as minhas aventuras suicidas.

Samantha riu, eu olhei para ela com curiosidade.

– Você sente falta da sua família? – Perguntei.

O rosto dela escureceu – Eu sinto falta da minha mãe e com certeza sinto falta do meu irmão, mas eu não sinto falta do meu pai, ele era um monstro, ele matou meu irmão, ele era um bêbado desgraçado.

Eu entendia um pouco do que Samantha estava passando, eu já havia tido problemas na minha família, minha mãe havia morrido eu e meu irmão ficamos separados desde então, até que descobrimos que nós éramos magos egípcios e depois meu pai meio que virou o deus Osíris, aquilo havia bagunçado minha cabeça. Então sim, eu entendia bem como era ter uma família bagunçada, mas mesmo assim, nunca ninguém da minha família havia tentado matar ninguém da própria família, isso deveria ser um trauma.

– Eu deveria ter contado a ela – A voz de Percy me tirou das lembranças – Mas o que eu falaria para ela? Ei Samantha, seu irmão não está morto, na verdade, ele agora é o cara que nos colocou nesse inferno.

Ninguém respondeu, não havia jeito de uma notícia dessa ser dada, talvez ela simplesmente tivesse que ser dada, alguém havia me dito uma vez que não se pode suavizar a verdade, ela tem que ser dita, doa a quem doer. Meu estômago embrulhou, a pessoa que havia me dito essa frase era Walt, me lembrei do corpo caído dele no asfalto há algumas semanas atrás, ele tinha uma doença, uma maldição que matava os membros da família dele, ele era descendente de Tutancâmon e para que essa maldição fosse parada, Anúbis se hospedou no corpo de Walt (os deuses egípcios faziam isso). Era estranho no começo, dois caras que eu gostava em um só corpo, mas depois me acostumei.

Mas quando fomos trazidos para esse mundo, o “mundo real”, Walt foi obrigado a se separar de Anúbis o que causou sua morte. Mas e agora? O que havia acontecido à Anúbis? Percy e eu havíamos tentado contatar os deuses gregos e egípcios varias vezes, mas nem sinal deles, só tínhamos certeza de uma coisa: Pain havia trazido os deuses para cá, as condições eram um mistério. De repente, algo surgiu na minha mente, me levantei abruptamente.

– O que foi? – Percy perguntou.

– Ah cara, eu não acredito que eu esqueci – Falei animada.

– Esqueceu o quê – Falou Finnick de repente interessado.

Peguei minha bolsa de utilidades mágicas e retirei um mapa e mostrei à eles – Logo depois que o jogo de Verdade ou Desafio acabou eu guardei esse mapa e só agora me lembrei.

– Sim, mas lembra de que quem na verdade nos deu isso foi Cronos como “A” – Hermione disse.

– Sim, mas isso não quer dizer que não funcione – Olhei para cada um deles – Há qual é gente? Vamos testar.

Finnick suspirou – Vá em frente então.

Peguei o mapa e o estendi sobre a cama, mas o que eu deveria fazer? Escrever o nome de alguém que eu queria achar? Fazer algum tipo de sinal? Então tentei uma abordagem mais simples.

– Anúbis – Sussurrei para o mapa.

Primeiro me senti estúpida, isso obviamente não ia dar certo, mas como se em resposta um ponto brilhou na América do Sul. Na parte em branca do mapa, letras em tinta preta se formaram até dizer: Anúbis, Manaus.

Levantei uma sobrancelha – Anúbis está aqui?

– Quem é Anúbis? – Finnick perguntou.

– É o deus-namorado de Sadie – Hermione disse.

Anúbis estava aqui? Esse tempo todo? Será que ele estava bem? Não, ele não estava. Me lembrei dos sonhos que havia tido durante a semana, de Anúbis preso e acorrentado em um calabouço escuro e uma voz fria falando “Ah! Se ela pudesse ver o que você fez e quem você matou, Anúbis”. De repente, as mensagens de “A” faziam sentido, Anúbis estava morrendo.

– Precisamos ir – Ela falou.

– Onde? – Percy falou – Me diga que não é na direção daquelas nuvens pretas ali.

Olhei para a janela, na direção norte da cidade, havia no céu nuvens pretas em círculos, relâmpagos negros eram vistos. Aquilo com toda certeza não era normal.

– Eu tenho certeza que é para lá – Falei.

Percy e Finnick trocaram um olhar com Hermione, então assentiram – Ok, nós vamos.

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POV Samantha

– Ei! O que houve? – Perguntei para meu irmão mais novo, Willian.

Era tarde de uma segunda-feira, primeiro dia de aula. Estávamos voltando da escola, o céu estava tingindo em um laranja de pôr-do-sol, era possível ouvir o canto dos pássaros. Meu irmão de nove anos estava emburrado como ficava quando ele estava com raiva, ele era um garoto baixo de cabelos pretos e olhos castanhos escuros.

– Nada – Ele falou – É só a escola.

Willian não era um garoto exatamente social, ele era o tipo de garoto que ficava no canto da sala e não conversava com ninguém, e geralmente, os outros garotos da escola aprontavam com ele, eu sempre fazia o que podia para impedir, mas nem sempre eu conseguia.

Eu suspirei – Não foi só a escola, fala logo, o que aconteceu?

– Não foi nada, foi só um garoto da escola?

– Que garoto?

Ele se encolheu – O Bruce.

Chutei uma pedra do caminho, Bruce era um garoto que estudava na minha turma, ele tinha 11 anos e era totalmente detestável, seus pais eram ricos e sempre encobriam quando ele aprontava algo, infelizmente ele tinha uma paixonite por mi e definitivamente odiava meu irmão.

– O que ele fez? – Perguntei à Willian.

– Ele disse que o papai era um bêbado vagabundo e que mamãe era vadia e ainda falou que Harry Potter era historia de criancinhas idiotas – Ele falou com sua voz tremendo.

Eu o parei e o fiz olhar nos meus olhos – Olha, não liga, quando ele vier te xingar você dá as costas para ele, toda vez que ele falar com você, ignore. Não há nada melhor do que o silêncio para um idiota como aquele, ok?

Ele assentiu – Eu tenho vontade de dar um murro nele.

Eu sorrio – Não se rebaixe ao nível dele, mas se você tiver a oportunidade um dia, não a perca.

Ele me abraçou.

Um barulho me tirou dos pensamentos, olhei ao redor e não havia ninguém. Depois que eu saí do hotel, eu havia corrido sem parar, as lágrimas não paravam de cair. Eu me sentia um pouco traída por meus amigos não terem contado, e me sentia estranha. Meu irmão estava vivo. Ele não podia ser Pain, meu irmão era bom, ele nunca faria coisas ruins como Pain fez, mas o rosto de Pain vinha a minha cabeça. As semelhanças, como eu não havia percebido antes?

Parei de correr quando me sentia cansada, me sentei em um banco de praça e fique aqui desde então. Meus pensamentos indo sempre à meu irmão e depois Finnick. Por que ele não me contou? Apesar de estar bêbada quando fiquei com Finnick, eu me lembrava da sensação, eu me sentia livre, leve e feliz. Talvez as coisas finalmente fossem dá certo para mim, mas agora eu me sentia confusa. E ainda havia Annie, a antiga namorada de Finnick.

O movimento me fez levantar a cabeça, na minha frente havia um garoto loiro de olhos azuis, havia uma cicatriz que cortava o seu rosto. Ele vestia calças jeans surradas, uma camisa branca encardida e uma jaqueta preta. Eu rapidamente o reconheci era Luke.

– Luke? É você? – Perguntei para ele.

Ele não respondeu, sua boca tremia.

– Olha, meu nome é Samantha, nós ainda não fomos apresentados, eu sou amiga de Percy – Falei.

Ele bufou – Eu sei muito bem quem você é.

Meu coração bateu mais rápido – Sabe?

Ele assentiu.

– Luke, a gente pode te ajudar a se livrar de Cronos, você já conseguiu, lembra? – Tentei falar para ele com segurança, mas minha voz tremeu um pouco.

Os olhos dele ficaram selvagens – Eu tenho que te matar, ele me falou que te matar é a resposta.

– Quem te falou? Cronos? – Falei nervosa.

Luke balançou a cabeça – Não. “A” falou.

Então ele avançou para mim, eu dei dois passos para trás e cai no chão, tentei me levantar, mas Luke já estava em cima de mim, ele levantou a espada e eu fechei os olhos. Então ouvi um som de metal encontrando metal e quando abri os olhos vi que uma espada bloqueou Luke. Ele recuou e Jace apareceu no meu campo de visão. Ele olhou para trás e sorriu.

– Fique atrás de mim – Ele falou – Deixa que eu cuido do nosso amiguinho aqui.

E então Jace avançou contra Luke. Espada contra espada, Jace atacava e Luke defendia, parecia que Jace ficava mais rápido a cada ataque, era como ver uma dança. Luke recuava e então Jace conseguiu desarmá-lo, um olhar de pavor passou pelo rosto dele.

– Samantha – Jace chamou – Não olhe.

Demorou um segundo para eu perceber o que ele iria fazer, eu me levantei mas já era tarde demais, Jace havia cortado a garganta de Luke, sangue escorria pela garganta do garoto, enquanto ele lançou um último olhar de desespero para mim e então seu corpo caiu no chão. Jace me olhou.

– Eu falei para você não olhar – Ele falou, havia uma expressão estranha em seu rosto, demoro alguns segundos para eu perceber o que era. Orgulho.

Eu fui até o lado do corpo de Luke – Por que você fez isso?

– Era o único jeito de acabar com Cronos e “A” – Ele falou.

– Mas e se ele não fosse Cronos – Eu gritei.

Jace abaixou a cabeça, ainda havia algo estranho nele, uma suspeita começou a pairar em minha cabeça.

– Você estava me seguindo – Perguntei à ele.

Ele suspirou – É claro. Você saiu correndo.

Bufei. Por que ele me seguiu? De repente as mensagens de “A” pairaram em minha cabeça. “Um dos seus amigos está mentindo”. Achei que isso poderia querer dizer Percy, ele não havia contado sobre Pain ser meu irmão, mas ele não exatamente mentiu. Olhei para Jace, quando eu o conheci eu esperava uma atitude totalmente egocêntrica e foi isso que eu obtive. Mas mesmo assim havia algo nesse Jace tão diferente do Jace dos livros. O Jace dos livros não beijaria outra garota no jogo Verdade ou Desafio, ele era fiel a Clary.

– Jace – Eu o chamei – Onde está seu pato de estimação?

– O quê? – Ele me lançou um olha confuso.

– O seu pato de estimação, aquele que tem poderes sobrenaturais – Eu falei.

Ele bateu com a cabeça na mão – Sim, eu lembro. Mas não acho que Pain acha patos sobrenaturais importantes o bastante para trazer para esse mundo. Por que a pergunta.

Eu dei um passo para trás – Por que você não tem um pato de estimação. Você odeia patos. Você não é Jace. Você é Cronos.

A expressão de Jace endureceu, um momento de tensão se passou entre nós, eu comecei a tremer e me preparar para fugir, mas Jace me agarrou pelo braço e me lançou um sorriso frio, seus olhos eram de um dourado brilhante e quando ele falou não foi com a voz de Jace, foi com uma voz fria e que parecia o som de ferro sendo arranhado.

– Ah pequena Samantha, você não poderia estar mais certa. Eu sou Cronos.

E então senti algo bater na minha cabeça e desmaiei.