— Olha só quem resolveu aparecer, já estava começando a acreditar que tinha esquecido da sua promessa. – Senhor Wayne apaga o cigarro assim que me vê descendo da van com Eddie. – Hoje teve sorte, vou fazer carne assada no forno e um molho para acompanhar, por pouco não foi macarrão instantâneo. – Vem até mim e abraça-me apertado.

— Viu? Era o destino eu vir almoçar hoje aqui. – Sorrio para ele e entramos no trailer. Eddie fica para trás por que decide fumar também. – O sen... – Percebo o seu olhar e me lembro das inúmeras vezes que ele me pede para chamá-lo de “você’’. – Você... Você mesmo, precisa de alguma ajuda? – Dá uma risada rouca e nega com a cabeça.

— Não será necessário, a carne já está quase pronta e o molho só precisa reaquecê-lo. – Afirmo com a cabeça e me sento no sofá que há na pequena sala do trailer. Não demora para Eddie voltar do seu vício e segue direito ao banheiro, como sempre lavar as mãos e boca. Uma mania que percebi com o passar dos anos toda vez que ele fumava. – Então meus jovens, como foi a volta as aulas?

— Um saco.

— Foi legal.

Eddie e eu respondemos respectivamente, sorrimos um para o outro.

— Deus abençoe a pessoa que colocou você na vida do Edward, ou então ele estaria na terceira série até hoje. – Eddie o encara chocado e repudia o tio com um engasgo. – Eu te amo meu filho, mas com estudos você é uma negação. Acha mesmo que eu não sei que Hazel te passa as respostas das provas desde que se conheceram? – Arqueia uma sobrancelha para o cabeludo, ele apenas finge um espanto como se dissesse que na verdade nunca fez aquilo.

Mas obviamente ele já fez, várias e várias vezes.

— Mas esse é meu último ano tio, prometo. – Ele sorri para o tio e rouba o boné que o mais velho usava. – Esse ano eu vou subir naquele palco, pegar aquele maldito diploma e mostrar o dedo para o diretor e sair correndo dessa cidade. – Ajeita o boné em sua cabeça e sorri para o tio.

— Você não toma jeito mesmo garoto. – Senhor Wayne segue para o fogão e começa a reaquecer o molho que já estava pronto em uma panela. – Podem ir até a vizinha pegar um refrigerante? Ela nos deu um fardo para este mês.

— Esse vai ser seu ano então Munson? Finalmente. – Tiro sarro assim que seguimos em direção ao trailer do lado. Ele me empurra com o ombro e como é, bem, mais alto quase caio em cima de um arbusto. – Ôh caralho, quer me matar foi? Não passo mais cola para você.

— Duvido, assim eu continuo no senior year por mais dois anos.

— A essa altura do campeonato você já deve ter decorado as respostas. – Rio da sua cara e ele me encara contrariado e quando menos espero, me coloca sobre seus ombros. Me carregando de bunda pra cima até o trailer da sua vizinha, como se eu fosse um saco de batatas. – Ei, me solta Edward!

— Agora que você vai ficar ai! Isso é pra você aprender a me respeitar pirralha. – Me ajeita em seu ombro e bate na porta da vizinha. Começo a bater em suas costas. – Fica quietinha aí ou... Oi Senhora Quinn! – Escuto o som da porta abrindo.

Ótimo, a vizinha deve estar olhando para minha bunda.

— Oi Edward, está tudo bem? – Consigo escutar um riso abafado, que vem da senhorinha que é sua vizinha.

— Fui sequestrada, a senhora poderia me ajudar? Esse maluco não quer me deixar cantar liberdade! - Faço drama.

— Bobeira dela, sabe como são esses jovens... – Sinto alguns tapinhas leves na minha bunda. Arfo surpresa pela sua atitude. – Não sabem parar quietos e não respeitam a gente. – Senhora Quinn, seja ela quem for, apenas ri. – Meu tio disse que a senhora comprou um fardo de refrigerante para nós.

— Ah sim, eu e Wayne vamos dividir esse mês. Está lá na cozinha, pode ficar a vontade querido. – Eddie entra ainda me carregando em seus ombros. Assim que passamos da entrada observo a senhora segurando a porta para passarmos, olho em sua direção e sorrio a cumprimentando.

— Boa tarde, o clima hoje está ótimo, não é? – Falo sorrindo em sua direção, ela gargalha e nega com a cabeça.

— Esses jovens...

Eddie resolve ter a bondade de colocar-me novamente em terra firme, já que ele precisava me soltar para carregar o fardo de refrigerantes. Ajeito minha roupa, que ficou toda amassada, e assim me despeço da sua vizinha. Agradecendo por ser tão querida.

Que vergonha.

— Eu vou te matar. – Empurro Eddie assim que saímos do trailer da senhora Quinn. – Olha a vergonha que você me faz passar.

— Você passa a vergonha sozinha Williams, eu só dou uma força. – Diz confiante e antes que eu comece argumentar, ou estapear a sua cara, ele corre em direção ao seu trailer.

Idiota.

— Finalmente, o almoço está pronto crianças. – Senhor Wayne declara assim que entramos no trailer novamente. – Está correndo por que Edward? – Encara o sobrinho que parece ter corrido uma maratona.

— Fugindo de apanhar.

— Da Beth? Ela não faz mal nem a uma mosca. – Refere-se a vizinha.

— Óbvio que não, preciso poupar minha vida da Hazel. – Coloca o fardo de refrigerantes em cima do balcão improvisado, que divide a cozinha da sala, e senta-se no sofá ali perto pegando folego.

— Você não correu nem cinco metros, seu sedentário. – Fico em pé a sua frente, rindo da sua cara. – Isso que da fumar, sem ofender Wayne. – Sorrio para seu tio que dá de ombros. – Vamos comer seu gordo. – Ofereço a mão para ele, que agradece e a segura, levantando-se do sofá.

— Já faço atividade física Hazel.

— Comer não conta como atividade física e nem D&D. – Ergo a sobrancelha.

— Não estava falando disso. – Devolve um olhar malicioso e pisca com o olho direito. Engasgo surpresa – pela ousadia, principalmente – fico parada enquanto ele segue até a cozinha e começa a se servir.

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— Estava tudo uma delicia Wayne, como sempre. Muito obrigada. – Agradeço pelo almoço, já estava quase indo embora. Eddie e eu ajudamos a lavar a louça, com muita insistência minha, é claro.

— Por nada minha querida, volte sempre. Na próxima venha com sua mãe. – Me abraça e sigo em direção da van, Eddie já me esperava ali.

— Pensei que ia dormir na minha porta de entrada, que demora pirralha. – Estapeio seu ombro o repreendendo. – Ok, não está mais aqui quem falou.

— Sossega essa tua bunda, que hoje você está chegando no meu limite.

— Esse é o objetivo. – Sorri para mim. – Mas enfim, quer falar sobre o que houve com Liam? Não quis conversar sobre isso no trailer, já que meu tio estava lá.

Suspiro derrotada, não queria relembrar a conversa patética com o jogador.

— Ele é um babaca. – Observo a paisagem passando pela janela. Eddie diminui a música, para podermos conversar melhor.

— Isso não é novidade para mim. Aliás, eu te avisei.

— Eu era... Sou... – Balanço a cabeça negando. – Eu era apaixonada por ele há quatro anos Eddie. Quando a gente gosta de alguém, não percebemos os defeitos dessa pessoa. Mas foi isso, terminamos. Ele não foi nenhum pouco compreensível, disse que queria se vingar de você e...

— Espera aí, volta a fita criatura! – Faz um som como se estivesse rebobinando uma fita cassete. Dou risada. – Como assim se vingar de mim? Que caralhos eu fiz pra merecer isso? Por mim eu arrebentaria esse idiota na porrada, mas geralmente eu preciso de um motivo.

— Ele cismou que foi você que fez a gente terminar. Falei que não tem nada a ver e que ele estava viajando na maionese. – Rolo os olhos. – Só toma cuidado, ok? Honestamente não sei se ele é babaca o suficiente para fazer alguma coisa.

— Hazel olha para mim: eu sou foda. Se ele resolver vir pra cima de mim eu o arrebento na porrada. E ainda coloco Dustin pra chutar o pinto do mauricinho, pra ele aprender como se deve tratar a minha garota. – Sinto um frio na barriga ao escutar as duas últimas palavras. Respiro fundo tentando controlar minhas emoções.

Hoje não, pelo amor de Deus.

— Sei disso, mas ainda sim quero que tome cuidado. Só me falta você apanhar por causa de mim. – Entro em pânico só de pensar na situação.

— Nada vai acontecer pirralha, eu te garanto. - Coloca a mão direita em minha coxa a apertando levemente, tranco a respiração lembrando-me dessa mesma mão percorrendo meu corpo e agarrando minha cintura. – Tudo bem? – Preocupado me olha rapidamente, logo voltando a atenção para a estrada. Sua mão permanece no mesmo lugar.

Afirmo com a cabeça e para tentar manter a calma seguro sua mão em minha coxa, brincando com anéis que há ali e desvio o olhar para a janela. Segui o resto da viagem em silêncio, mas de certa forma, era um silêncio agradável: O vento batendo em meus cabelos, Eddie cantando as suas músicas favoritas baixinho e nós dois de mãos dadas durante todo o trajeto, por menor que ele fosse.

— Não saia, espera ai! – Fala apressado assim que ameaço abrir a porta quando chegamos. Confusa observo o cabeludo sair afobado da van, dar a volta e então abrir a porta para mim. – Madame. – Estica a mão para que eu a segure como apoio.

Sorrindo abobada pego em sua mão e, juro por tudo que é mais sagrado, que tento ignorar o calor elétrico que me sacode, irradiando de onde nossas mãos se encontraram. O que me deixa ainda mais confusa, pois já senti as mãos de Eddie milhares de vezes.

Saltando para fora do carro, sendo beijada pelo calor do sol, Eddie me observa atentamente, deixando meu coração batendo a quilômetros por minuto.

— O que é? – Minha voz é tão baixa que há possibilidade dele nem ter escutado minha pergunta.

— Nada. Eu só... Nada não. – Seu tom era ainda mais baixo. Ele não para de me observar.

Lentamente sinto seus dedos, calejados de tocar guitarra, roçarem em minha bochecha e sem que eu perceba, meus olhos começam a se fechar. Parece tudo tão certo, como na caótica noite do acordo, ao mesmo tempo que pareça absolutamente errado.

E aqui estamos nós novamente – em uma situação que não queremos, mas não conseguimos escapar e nem ao menos tentamos. Abro lentamente meus olhos e vejo os seus sobre meu rosto, principalmente em minha boca. Minha barriga dá algumas voltas.

Fico o olhando enquanto sinto seu polegar circular a lateral da minha bochecha, onde tenho a marca de uma covinha, enquanto sinto o calor emanar meu corpo e minha respiração falhar. Sua mão solta a minha e começa agarrar minha cintura, sinto um puxão em sua direção. Nossos corpos estavam perto o suficiente para poder sentir o calor um do outro, um calor que claramente não vinha do sol que nos banhava no momento.

Meu coração vai sair pela minha boca.

Tarde demais percebo minhas palmas sobem em seu peito sorrateiramente, deixando um leve roçar pelo tecido da camisa preta. Eddie olha para mim, cílios escuros abaixados daquele olhar infernal que me prende desde que nos conhecemos, a sua boca está levemente aberta.

— Eu não deveria fazer isso. – Sussurra asperamente, tão baixo que mal o escuto. – Ainda não.

Não entendo o que ele quis dizer, mas para ser sincera, nesse momento estou além de entender qualquer coisa. Tudo o que quero é sentir seus lábios nos meus como da última vez, sentir a sensação acolhedora e inesperada. Eddie inclina-se para mais perto, apesar de suas palavras, enquanto pressiono a ponta dos pés no chão e, finalmente, nossas bocas se tocam suavemente, então profundamente. Eu inspiro relembrando a sensação maravilhosa que é estar em seus braços meio a um beijo.

Jogo meus braços ao redor do seu pescoço, passando os dedos pelas mechas longas e sedosas do seu cabelo enquanto seus braços me envolvem até estarmos esmagados juntos. Peito a peito, os corações batendo forte. Inclinando a cabeça Eddie aprofunda ainda mais nosso beijo. Seus dedos afundam na minha camisa de tecido leve e ele puxa nossos quadris ainda amais, como se fosse possível. Nossa respiração é áspera e irregular, entre cada golpe devorador que nossas línguas travam na batalha durante o beijo. Me pressiono contra ele e nossos corpos balançam, com a falta de equilíbrio.

Sinto as mãos de Eddie deslizarem em direção a minhas costas. Me sinto frenética, selvagem e... Amada em seus braços.

Não acredito que estamos entrando nesse barco novamente.

Com essa frase ecoando em minha mente a realidade me atinge como uma bofetada gélida do vento do inverno. Eu me afasto, minhas mãos tremulam enquanto o encaro.

Oh meu Deus. Beijei Eddie de novo. E dessa vez não foi intencional. E dessa fez foi apaixonadamente.

Eddie me olha como se uma névoa tivesse dissipado dos seus olhos também. Como se processasse o que acabamos de fazer e não acreditasse. Cambaleio para trás saindo dos seus braços e batendo na van atrás de mim. Desesperada pego minha mochila em cima do banco e corro em direção a entrada de casa. Mas, por alguma razão quando alcanço a porta, me viro e o encaro.

Ele me observa atentamente, ainda respirando com dificuldade. Assim como eu, minha respiração está tão desregular que mal consigo puxar ar. Parece que não há o suficiente, como se o único ar que eu queria e precisasse fosse cada respiração irregular roubada entre o beijo.

Isso é um desastre, de novo não.

Freneticamente, corro para dentro de casa fechando a porta tão rapidamente, caio contra ela e afundo no chão.

— Que porra foi essa? – Sussurro em meio ao silêncio.

Um medo nauseante toma conta de mim.