No Rugido Do Leão

Capítulo 18 - A Terra Média - Primeiras Impressões


Eles cavalgaram o mais rápido que puderam, mas Samantha já estava longe da vista deles. Era realmente algo muito importante, ou ela não deixaria os amigos para trás.

– Abelle! - Caspian gritou para a prima, que estava na frente - Já consegue ver a Sam????

– Não!!! - Belle respondeu - Mas estou vendo Pollete!

Essas últimas palavras fizeram Phillip correr mais rápido, e logo ele também estava vendo a égua parda de Sam. Mas ela não estava correndo, como os cavalos dos outros. Estava parada, com as rédeas presas em um galho baixo de uma árvore próxima, pastando calmamente. Abelle desceu de Phillip, e acariciou a crina da égua.

– Onde está sua dona, heim? - ela perguntou, mais para si mesma do que para a égua, já que não era um animal falante.

Logo ouviu-se o som de cascos próximos, e Caspian e Passo Largo se aproximaram.

– Achou ela? - Caspian perguntou, descendo de Destro.

– Não... - ela afirmou, voltando para perto de Phillip.

– Mas ela deixou sua dama aqui, então não deve estar muito longe. - Phillip comentou - Vou ver se Pollete sabe onde ela está.

Eles assistiram em silêncio o cavalo castanho aproximar-se da tranquila égua parda. Ele acenou com a cabeça, e a égua ergueu a sua, calma e lentamente, como se estivesse muito concentrada com uma tarefa importante. Phillip relinchou fraco, e Pollete então, mascou a grama verde com calma, como se prestasse atenção. Um certo momento, ela balançou a cabeça para cima e para baixo freneticamente, e Phillip relinchou, agradecido.

– E então, para onde ela foi??? - Belle agarrou-se na crina de seu cavalo, quando ele retornou.

– Ela seguiu por entre as árvores, atrás de uma luz estranha, e desapareceu, naquela direção. - ele apontou com a cabeça, para sua frente - Mas parece que vocês terão que continuar sozinhos daqui. Pollete diz que a luz queima os olhos, então não podemos ir.

– Deve ser apenas o medo de um cavalo não-falante! - Abelle retrucou. - Mas se você quer ficar, tudo bem.

Caspian desceu de Destro, e Passo Largo, de Safira. Se deveriam ir sem os cavalos, acharam melhor mandá-los devolta para o palácio. Qualquer coisa, retornariam a pé mesmo. Eles retiraram suas bolsas e mantimentos das celas, e em silêncio, seguiram pela floresta.

– Guie os outros, tá! - Belle sussurrou para Phillip - Eles vão precisar de um guia para voltar.

– Pode confiar em mim! - o cavalo relinchou - Que Aslam ilumine seu caminho!

– E o seu também. - ela suspirou.

– Abelle! - Caspian gritou - Vem logo!

A menina correu, olhando mais para trás do que para frente. Isso é um grande problema, se você não vê o caminho que segue, e pode esbarrar em alguém....

– Ai!!!!!!!!

Abelle sentiu seu corpo meio dolorido, e outra pessoa começou a empurrá-la.

– Sai de cima de mim! - Samantha gritou - Isso dói!!!

– Foi mal! - Belle se desculpou, engatinhando para trás - Eu não queria...

– Sai, sai! - Samantha empurrou a irmã, e sentou-se no chão.

Caspian ouviu os gritos, e logo as duas os viram se aproximar.

– Mestre Passo Largo! - ele gritou - Achamos ela!

Caspian aproximou-se das duas, e ajudou Belle a sair de cima da irmã.

– Por que você fugiu????? - Belle perguntou, se levantando.

– Eu não fugi! Chamei vocês! - Ela retrucou - Estava conversando com vocês quando vi...............

– Sam! - Passo Largo a levantou - Você está bem???

– Estou ótima! - ela respondeu - Estava explicando para eles que eu vi uma coisa estranha e vim verificar, mas Pollete não queria vir, então ela ficou lá atrás.

– Mas o que foi que você viu???? - Caspian perguntou.

– Aquilo! - ela respondeu, apontando para as árvores.

Todos olharam na direção que ela apontara. Definitivamente havia algo estranho ali. Era como quando a luz do Sol entra em contato com a água, e esta a reflete, distorcida, apenas um borrão azul e tortuoso. Mas ele brilhava nas árvores, azul e se movimentando, algo muito encantador.

– O Rio da Arquelândia? - Caspian disse.

– Eu acho que não. Esse brilho é forte demais para um rio. - Samantha disse - A água corrente não reflete tanto. Acho que é um lago.

–Um lago? Por aqui? - Caspian duvidou, tomando a dianteira.

Eles caminharam em silêncio, perseguindo a luz. Com dificuldade eles passaram pelas árvores, e então, se surpreenderam com a vista. Estavam dentro de uma clareira, com um bosque ao redor. As árvores eram tão juntas que não se podia ver o céu. A luz existente era uma luz verde coando através das folhas, intensa e cálida. Não haviam insetos, nem animais, nem som algum. Existia um lago sim, mas não como Sam imaginara, eram muitos e muitos lagos, com três metros de largura, todos próximos uns dos outros. Quase podiam ouvir as árvores bebendo a água dos lagos.

Resolveram caminhar, para ver que tamanho tinha a clareira, mas aquele local era tão calmo, que até mesmo os pensamentos lhes fugiam da mente. Belle olhou atentamente para um dos lagos, encantada com o brilho. Então, ela viu algo que não esperava. Primeiro, parecia um borrão, depois adquiriu cor e forma, e a imagem se movia ao sabor da água. Era uma mulher, deveria ter uns 30 e tantos anos, com um vestido vermelho inconfundível. Tinha seus cabelos negros presos em um coque, e uma vassoura em mãos. Varria sua casa com alegria, erguendo o tapete e os móveis. O rosto daquela mulher era-lhe tão familiar quanto o seu próprio: era sua mãe querida.

Caspian também se perdeu olhando para a água de outro lago. Ele via um local estranho, com um céu com dois sóis. Haviam seres muito curiosos, como um grande bicho peludo e castanho como um urso, que andava nas duas patas. Havia um rapaz com roupas brancas, e uma moça com os cabelos presos em dois coques laterais, que o fez rir, pois lhe lembrava os chifres curvados de um bode. Havia também um homem, com roupas e capa pretas, e um capacete esquisito. Ele tinha uma espécie de espada, feita de luz, uma luz cortante e forte, de cor vermelha.

– Que coisas seriam essas? - ele disse.

– Acho que são portais. - Abelle respondeu.

– Portais para qualquer mundo, em qualquer lugar. - Samantha dizia, fascinada.

– Se são portais, não deveríamos escolher um para entrar? – Caspian questionou.

– Pessoal, olhem esse aqui... - Passo Largo chamou.

O lago tinha águas turvas, quase não se podia ver nada. Eles olhavam atentamente para a água, e identificaram um fino fio de prata correndo entre as árvores, mas não era uma floresta como as de Nárnia. Esta era triste e fria, quase assustadora.

– Olhe, olhe! - Passo Largo gritou, de repente - Eu conheço esse lugar! É o rio da terra dos elfos!

– Ótimo! Agora, só temos que descer! - Belle disse, erguendo a barra do vestido para entrar na água.

– Espere, o que vai fazer???? - Caspian segurou-a.

– Eu vou entrar! Este é o único meio! - Belle respondeu.

– Ela tem razão! - Sam continuou - Afinal, estamos em Nárnia, tudo pode acontecer!

Abelle, sem esperar pelos outros, precipitou-se, afundando e desaparecendo na água. Caspian e Passo Largo foram logo depois, e por último Samantha. É difícil contar como foi, pois tudo aconteceu com uma rapidez extraordinária. Primeiro, eles caíram em um abismo de escuridão. A escuridão era tão densa que eles podiam senti-la tocar suas peles. De repente, a escuridão começou a ficar pontilhada de luzes brancas. Eram pequenos pontinhos brilhantes, dançando ao redor deles. Lindas estrelinhas. Elas se agruparam em uma enorme galáxia na sua frente. Ela parecia uma enorme poça de leite. Leite povoado de pontinhos coloridos e brilhantes. Ela foi se aproximando, até que eles entraram dentro dela. Eles começaram a voar em uma velocidade inacreditável. Viram um planeta pequeno, menor que uma Lua, todo prateado. Era frio. Depois dele, vinha um enorme planeta azul, outro que era meio verde, e tinha um pequeno anel ao seu redor. Então viram um enorme planeta amarelo pastel. Ele tinha anéis de asteroides e de cristais de gelo ao redor.

Neste voo maluco, passaram por um enorme planeta de cores e camadas variadas. Era formado por gazes diversos, que lhe davam uma coloração curiosa. Logo adiante, um grande planeta vermelho. Ele dava uma sensação esquisita de medo e dor. Então, veio o planeta azul. Ele tinha continentes nele, marrons e verdes. Eles aproximaram a uma velocidade inacreditável deste planeta. Um continente se aproximou de suas vistas. Ele era verde, mas escuro, como se ainda não fosse a hora de ver a luz. Voltaram a ver o fino fio de prata, se aproximando, e caíram dentro dele.

Era um enorme e estrondoso rio, com águas agitadas. Meio atordoados, eles foram levados pela forte correnteza, e começaram a afundar. Todos tentaram se manter na superfície, a situação era perigosa. Logo Passo Largo viu um galho forte, e se agarrou nele, subindo para a margem. Estendeu o galho, e retirou Abelle e Caspian da água.

– Estão todos bem??? - Caspian perguntou, ofegante.

– Sãos e salvos... - respondeu Passo Largo, também ofegante.

– Não todos! - Abelle correu para a margem do rio.

Eles olharam atentamente para a água. A única agitação que conseguiam ver era a da correnteza carregando galhos e pedras.

– Samanthaaaaa!!!!!!! - Abelle gritou, desesperada - Samantha!!!

O coração de todos batia forte. Os olhos caçando um sinal de vida.

– Socorro!! - ouviram então, a voz ofegante de Sam.

E ela logo voltou a afundar.

– Por que ela não nada?! - Passo Largo berrou, indignado.

– Ela não sabe nadar! - Belle respondeu. - Nunca conseguiu aprender!

Caspian pulou na água, e desapareceu. O coração de Belle e do peregrino batiam, nervosos. Onde estavam? Estavam bem?

– Samantha!!!!!! - Passo Largo gritou.

Mas não houve resposta. Belle chorava. A ideia de perder sua irmã era cortante e dolorosa. Seus corações batiam loucamente.

– O galho! - Caspian gritou, aparecendo na água.

Passo Largo estendeu o galho para ele, e os arrastou para a margem. Caspian colocou Samantha no chão. Ela estava desacordada. Caspian juntou as mãos e empurrou com força várias vezes o peito da moça.

– Reage! Reage! - ele berrava.

Fez a massagem cardíaca outra vez. Nada. Tentou denovo. Falho.

– Não.... - Belle chorava.

Caspian sentou-se, e abraçou o corpo molhado e inerte da garota. Sua doce prima. Passo Largo deu um soco em uma árvore. Sua raiva tomou conta dele. Ela não estava morta. Não podia estar. Não devia.

– Samantha! - Abelle chorava, ajoelhando-se ao lado do corpo - Não...

Os dois abraçaram a moça, chorando copiosamente. Então, seus colares se tocaram, e um singelo brilho apareceu. Samantha acordou, tossindo e cuspindo muita água dos pulmões.

– Por favor...... - Sam tremia de frio - .....prometam que não vamos mais entrar na água....

– Tá bem.... prometo! - Caspian riu, abraçando-a.

Caspian e Abelle ajudaram Sam a se levantar. A pobre garota tremia de frio, mas estava mais ciente do que nunca.

– Muito bem, Mestre Passo Largo. - ela disse, a voz trêmula. - Direção.

Passo Largo olhou bem para ela. A moça estava enxarcada, e tremia muito. Tinha os lábios roxos e a pele pálida. Mas estava mais convicta que nunca.

– Bom, - ele disse, juntando as bolsas do chão - o sol está nascendo. Vamos pela floresta.

As Terras Selvagens são locais perigosos e hostis, conhecidos como terras de trolls das colinas, e tem até uma floresta denominada assim, a qual, por coincidência ou não, é exatamente aquela em que estão. Passo Largo caminhava na frente, com a espada em punho, olhando para todos os lados. Estava muito temeroso. Um vento suave soprava, agitando os galhos das árvores.

Samantha tremia de frio, mas agora ela não é a única, pois Caspian e Abelle também estão enxarcados. Sem cavalos, se veem obrigados a caminhar e carregar suas bagagens, seguindo um rapaz assustado. Eles caminham durante muito tempo, mas não conseguem explicar ao certo se passaram horas ou minutos na floresta, pois aquele local era tão tenebroso, mesmo à luz do dia, que eles perderam a noção do tempo.

Após muito tempo, eles se veem em um enorme campo aberto, com colinas baixas e muitas rochas.

– Vamos adiante! - Passo Largo falou.

Abelle tropeçou e caiu. Caspian levantou-a do chão, e constatou que, assim como ele, ela estava exausta.

– Peregrino... - Samantha sentou-se em uma pedra, à frente um rochedo alto - É melhor pararmos para descançar.

– Bobagem! Se continuarmos, podemos chegar até as Montanhas Cinzentas antes do amanhecer! - Passo Largo falou.

– Mestre Passo Largo! - Caspian chamou - Estamos em um território desconhecido, não sabemos se essas terras são seguras. É melhor encontrarmos um abrigo e descançarmos. Partimos ao amanhecer.

– Concordo! - Abelle disse, caminhando em direção à rochedos próximos - Vou buscar lenha.

– Vá com ela, Samantha. Assim você se aquece. - Caspian falou, virando-se para o local onde ela estava - Samantha?

Os rochedos estavam vazios. Ela havia desaparecido outra vez. A segunda vez nesta viagem.

– Samantha!!! - Caspian gritou.

– Pessoal! - Samantha respondeu.

Passo Largo correu para os rochedos, onde a garota estivera sentada. Atrás da pedra havia uma rampa de rocha lisa, que dava para uma gruta cavada na pedra bruta. Era escuro, mas a luz de fora iluminava a entrada. Samantha estava sentada no chão, olhando para eles.

– Acho que encontrei um abrigo. - ela riu.

O fogo crepitava na lenha. A luz das chamas era forte, mas não ocultava o brilho das estrelas. Samantha olhava para o céu, pela entrada na gruta. A fogueira lá fora aquecia Abelle e Passo Largo, mas ali, quem a aquecia era sua capa cinzenta. As estrelas deste céu são diferentes das estrelas de qualquer outro céu que ela já tenha visto. Mas ainda sim eram brilhantes e magníficas. Caspian respirava pesadamente. Ela pedira para o primo ficar com ela, e que Passo Largo e Abelle fizessem a primeira vigília. Ela não sabia bem por que, mas sempre se sentiu mais segura com Caspian ao seu lado.

Ele dormia. Estava exausto. O dia havia sido duro para todos. Esatava em sono profundo, e movia os dedos das mãos de vez em quando, como um bebê. Com o que estaria sonhando? Samantha sorriu. Ele era seu primo, seu melhor amigo. Sentia-se segura com ele.

Samantha ouviu um barulho. Parecia passos, passos na escuridão. Lentamente, ela retirou a espada da bainha de seu primo. A lâmina brilhava, refletindo o brilho das estrelas na escuridão. Um vulto pequeno se moveu.

– Que está aí? - ela falou.

O vulto correu para o outro lado. Samantha se levantou, deixou o primo adormecido ali, e se preparou. O vulto se mexeu. Ela pulou.