Never knew I needed

Senhor Hiro Hamada


Tip finalmente encontrou a sala. O laboratório E-62. Entrou sem bater mesmo, já que era esperada e estava dentro do horário. Era maior do que ela esperava. Havia uma mesa de inox, cheia de ferramentas, cadernos de anotações e canetas. As paredes eram recobertas com aço inoxidável e havia um cheiro estranho de álcool no ar.

Espalhadas pela sala, máquinas estranhas que ela nem sabia para que serviam, computadores com telas imensas.

E no centro de tudo, estava seu carro. Ela sorriu ao olhar para ele. A pintura vermelha estava arranhada em alguns lugares, mas ela não sem importava com eles. Passou os dedos por cada um, lembrando de como os havia conseguido, naqueles dias ao lado de Oh.

Ela se virou subitamente ao ouvir uma porta se fechando atrás dela.

Um garoto magrelo entrou, usando um jaleco que parecia grande demais para ele. Havia um crachá preso no jaleco, mas estava virado ao contrário. O garoto a olhou, parecendo um pouco constrangido e Tip tentou fazê-lo ficar a vontade. Parecia ser algum tipo de assistente.

– Bom dia. - ela disse. - Estou esperando o senhor Hiro Hamada, nós marcamos de nos encontrar aqui para um projeto.

– Senhor? - ele franziu a testa. - Eu não sou nenhum senhor.

Tip piscou, confusa.

– Você é Hiro Hamada? - ela perguntou, com um ar surpreso.

– Sou, sim. - ele respondeu, na defensiva. - Muito prazer.

Ele cruzou os braços e o crachá se virou, revelando os dizeres "Hiro Hamada".

A boca de Tip se abriu em um "O" perfeito.

– Você é bem mais jovem do que eu imaginei... - ela confessou.

– E que idade exatamente você achou que eu tinha? - ele ergueu uma sobrancelha.

– Eu imaginava um senhor asiático de uns sessenta anos, mais ou menos. - ela riu. - Não pensei que você tivesse a minha idade.

Hiro riu também.

– Então acho que vou tomar isso como um elogio. - ele estendeu a mão para ela. - Já que vamos trabalhar juntos, acho que preciso saber o seu nome.

–Tipolina Tucci. - ela apertou a mão dele com firmeza. - Mas pode me chamar de Tip.

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De todas as coisas que passaram pela cabeça de Tip ao ouvir o nome "Hiro Hamada" pela primeira vez, a última delas é que ele seria um garoto da idade dela, magro como um graveto seco, inteligente como um gênio e... divertido.

Pela experiência que tivera mais cedo, podia pensar que esses geniosinhos tinham o rei na barriga. Mas Hiro era legal. Inteligente sim, mas ele não usava isso contra ela, muito pelo contrário. Era fácil conversar com ele.

– Vamos partir do início. - ele começou. - Como se dá a partida?

Tip se inclinou para dentro do carro, girou a chave e o motor se ligou, automaticamente. O carro soltava bolhas e fumaça em lugares estranhos. Ela se endireitou, olhou para ele e sorriu.

– Imagino que para desligar basta retirar a chave, não é? - ele perguntou, um pouco embaraçado.

Houve uma pausa estranha e os dois riram até perder o fôlego.

Por um momento Hiro até esqueceu porque estava ali. Mas o som do carro o lembrou. Ele deu a volta no veículo, observando atentamente.

– Ele faz esse barulho sempre? - Hiro perguntou.

– Sim. -Tip explicou. - Pelo menos desde que o Oh o consertou.

– Oh?

– Sim. Ele é um Boov. Foi ele quem modificou o carro. - ela disse.

Hiro fez uma pausa, encarando-a pensativo.

– Você não acredita em mim. - ela acusou. - Eu sabia, você é igual a eles. Não devia ter acreditado nos seus amigos.

– Ei ei ei, espera... Calma aí, garota. Igual a quem?

– Os garotos da escola! Você é como eles! Não acredita em mim. - ela avançou na direção dele, furiosa, apontando o indicador em sua direção.

Hiro afastou a mão dela de leve, um pouco tenso com a garota apontando o dedo para ele.

– Ô ô ô. Espera aí. Em primeiro lugar, tira esse dedo da minha cara. - ele reclamou, e Tip franziu o cenho. - Em segundo lugar, quem foi que disse que eu não acredito em você?

– Você acredita? - ela perguntou.

– Claro que sim. O próprio carro é uma prova. Não tem jeito de isso ter sido feito por um humano. Quem no mundo usaria raspadinha como combustível?

Tip deu risada do comentário.

– Desculpe. É que tem muita coisa em cima de mim agora.

– Você pode me contar enquanto eu faço as minhas anotações. - Hiro sugeriu. Por um momento ele não teve bem ideia de por quê tinha se oferecido para ouví-la. Talvez se ela falasse, isso diminuísse a chance de querer bater nele.

Tip contou a ele a história toda sobre a mudança, a escola nova e os alunos. Ele apenas ouviu quieto, enquanto anotava alguns detalhes a serem revistos no novo motor do carro. Em parte ele podia entender o que ela estava passando. Já tinha passado por isso antes. Na escola, as outras crianças o isolavam por que ele era inteligente demais. Estava muito à frente delas e por isso elas achavam que ele não valia seu tempo. Por sorte ele tinha Tadashi para fazer companhia. O tempo passou voando, e Tip terminou por contar como havia conhecido Honey Lemon e os amigos de Hiro, e o quanto tinha gostado deles.

– Viu só? Nós nerds não somos todos assim tão maus.

– Até que não são mesmo. - ela concordou.

– Então você conheceu meus amigos.

– Sim. Estavam falando sobre ir ver um filme. Fúria Assassina.

– Sim. Fúria assassina 3. Eu ia com eles, mas não tenho idade para entrar. - ele lamentou.

Tip o olhou de cima a baixo.

– Você não pode? Mas você é um cientista!

– Sou. - Hiro deu ombros, como se não entendesse o ponto. - E daí? Só tenho catorze anos.

– Mas está na universidade. Não qualquer Universidade, mas a Universidade de San Fransókyo. Eles não te dão um crachá de autorização ou algo assim?

– Não funciona desse jeito. - Hiro explicou, um pouco desconfortável ( não pela primeira vez) por seu intelecto ter crescido antes que seu corpo pudesse acompanhá-lo.

Tip ficou sem saber exatamente o que fazer, enquanto olhava Hiro rabiscar alguma coisa na prancheta.

– Talvez... - ele começou meio sem graça. - Talvez eu possa te ajudar em cálculo avançado. - ele ofereceu, sem muita esperança de que ela aceitasse. Ele nem mesmo olhou para ela, preparando-se para o sonoro "não" que viria.

– Você poderia mesmo? - Tip perguntou, olhando para ele.

Hiro virou o rosto para ela e se afastou, corando um pouco. "Ela tem olhos bonitos", ele pensou.

– Claro. - ele confirmou, tentando projetar mais confiança do que realmente sentia. - Não vai ser nenhum problema. Você pode passar lá no café da minha tia na sexta. Eu te dou o endereço depois.

– Obrigada! Obrigada mesmo! - ela agradeceu, aliviada.

Hiro apenas sorriu.

– Bom, se você não se importar, eu queria muito fazer uma pausa. Tem uma lanchonete do outro lado do prédio. Quer ir?

– Agora que você falou, estou mesmo com fome. - Tip percebeu. Estavam ali a três horas e meia! Ela mal notou que o tempo havia passado tão rápido.