Nascido Do Sangue

Agridoce, Do Jeito Que Jamais Iria Esquecer


___ Eu não continuaria se fosse você ___ alertou o sujeito com uma voz amena.

___ Por quê? Isso é tão bom!___ suspirou o rapaz, pela primeira vez desprendendo os lábios rúbidos da pele quente e morena da garota.

___ Não pode continuar ___ contestou Ben com veemência ___, vai matá-la.

O rapaz voltou-se para a garota, estava de olhos fechados, silenciosamente parada, como se estivesse dormindo. Um frio temor se sobrepôs em meio a doce e quente sensação do sangue descendo por sua garganta, seu coração agora batia mais forte com a união da saciedade e do pavor enquanto o dela batia mais fraco.

___ Oh, meu Deus, não! Viorica? Viorica?!

Damian ergueu-se apoiando os cotovelos sobre o colchão, um par de cristalinas lágrimas deslizou de seus olhos de luz ao deparar-se com aquela figura imóvel, a não ser pelo fato de seu peito suavemente se elevar, tão frágil que a qualquer momento poderia parar.

Grigore aproximou-se puxando o jovem para perto de si.

___ Silêncio, băiatul meu, está tudo bem, ela não está morta.

___ Mas por que não me responde?

___ Está inconsciente, perdera muito sangue ___ a voz de Benjamin era estável e fria.

___ Oh, meu Deus, não...

A culpa viera devastando tudo que em apenas alguns segundos construíra, a felicidade que pôde enfim saborear, agora tinha um gosto amargo e quase repulsivo, era ali que a culpa se alojara, entre a consciência e o paladar e como uma parasita, estava se alimentando do que há poucos instantes, Damian usara como alimento.

___ Acalme-se, meu de tineri, ela não vai morrer.

___ Como sabe disso?

___ Pegue o pano na tigela e pressione sobre o ferimento ___ ordenou o lorde tomando o absoluto controle da situação.

Damian sem questionar, fez o que lhe fora mandado, levantou-se mal sentindo o piso de madeira sob seus pés, agarrou firme o tecido entre seus dedos e permaneceu com o pano sobre a ferida por longos minutos enquanto suas lágrimas ao chegar a seus lábios, misturavam-se ao sangue da adolescente.

___ Por quanto tempo tenho de fazer isso?

Benjamin demorou alguns instantes para responder, até que ordenou:

___ Já chega.

O moço verificou e surpreendentemente a ferida já estava cicatrizando, não fizera um corte tão profundo, por mais que quisesse, não atingiu a artéria, então contentou-se com o sangue que saía normalmente por conta de veias menores que foram rompidas.

___ Ah, graças a Deus!___ suspirou Damian aliviado.

___ Deus não tem nada a ver com isso, băiat, se houvesse perfurado a artéria, esta linda menina estaria junto Dele agora.

___ Eu não queria. Ben, acredite em mim, eu... ___ gaguejava o ferreiro não sabendo a quê dar atenção, às palavras ou às lágrimas.

Grigore pousou uma das mãos no ombro do assustado garoto e com um sorriso disse-lhe:

___ Não fale mais nada, acredito em você.

O donaire sujeito olhou no fundo dos olhos do moço, estava apavorado como uma criança num quarto escuro ouvindo os trovões de uma noite de tempestade, tudo que precisava era de conforto e segurança.

___ Minha carruagem está bem em frente aos portões, vá e me espere. Levarei esta criada até seus aposentos e lhe encontrarei.

___ Mas...

___ Não se preocupe, meu querido, Ionel está dormindo, assim como esta linda jovem. Está tudo bem, Damian, confie em mim.

Damian não mais disse uma palavra, apenas novamente fez o que lhe fora ordenado, deixando Benjamin a sós com o corpo inerte de Viorica, que parecia dormir profundamente.

Benjamin, ao ouvir os passos quase inaudíveis do menino nas escadas, voltou seu olhar para a criada, parecia estudá-la, de braços cruzados deu a volta pela cama, a cabeça reclinada em sinal de admiração, mas o que seu gesto apontava, seu rosto desmentia, não parecia sofrer nenhum tipo de emoção ou reação.

Percebeu que um fio de luz repousava sobre a face serena de Viorica, moveu seu tronco e notou uma fresta na cortina na qual deixava o luar embranquecido entrar como se fosse uma nuvem tênue de fumaça. A madeira rangeu sob seus pés ao caminhar até a janela, os dedos que ostentavam brilhantes anéis se agarraram às duas partes da cortina e por um momento, um delicado sorriso delineou o canto esquerdo de seu rosto e um sussurro o acompanhou:

___ Boa noite, dragul meu.

A escuridão engoliu o quarto em um único e certeiro bote fatal.