– Vamos pequeno Kyu, fale comigo, hoje será seu primeiro dia de aula na escola nova e você não falou nada comigo dês de uma semana atrás quando se mudou pra cá, vá! Diga ao menos um oi a sua avó!

Apenas olhei pra cara dela e levantei da mesa, indo andando até o quarto que me fora doado para pegar minha mochila. Só de lembrar que já fazia um mês dês de a morte de meus pais eu não queria nem olhar para o céu lá fora.

Logo desci as escadas e cheguei à porta saindo em direção a escola onde eu passaria quase todas as manhãs e tardes de minha vida a partir de agora. Eu já estou no ultimo ano de escola, então costumo ter aulas aos sábados e retornos quase todas as tardes.

Fui o caminho todo olhando para o chão, às vezes esbarrando em algumas pessoas as quais eu não me dava o trabalho de levantar a cabeça para olhar quem era e muito menos pra pedir desculpas. Afinal, eu estava olhando para o chão. Elas estavam olhando para frente e não desviaram porque não quiseram.

Só percebi que estava na frente do meu colégio quando comecei a escutar os gritinhos dos alunos se reencontrando com os velhos amigos. Bando de amizades falsas que nos fazem perder tempo em nossas vidas, sim, apenas pra isso que elas servem, pra fazer-nos perder tempo e sofrer por briguinhas idiotas que de nada valem em nossa vida.

Passei direto por todas aquelas pessoas que me encaravam vez ou outra, logo voltando sua atenção para seus companheiros por perto. Todo aquele barulho apenas servia-me para causar dor de cabeça.

Entrei no corredor onde me foi indicado para descobrir em que sala eu ficaria. Lá estava a lista com o nome dos alunos, o que acho patético de se fazer. Por que eles não dão a lista aos alunos separadamente na sala do diretor como em qualquer escola normal? Isso é apenas preguiça de procurar o nome do aluno nas pilhas de papeis de horários.

Para minha sorte não tinha muita gente há essa hora no quadro de avisos. Grande parte dos alunos estava com seus amigos. Logo avancei no quadro, procurando as listas do 10° ano, o ultimo ano. Não demorei a descobrir minha sala, turma D no terceiro andar do prédio.

– Hei – senti alguém tocar meu ombro – Você deve ser novato, prazer, sou RyeoWook.

Olhei o garoto de soslaio, baixinho e magro, bem franzino mesmo. Dava até para dizer que estava desnutrido. E que cabelos são esses, ruivos? Acho que esse não é o nome certo para a sua cor de cabelo. Mas não era do meu interesse me socializar, então apenas tirei sua mão de meu ombro e dei-lhe as costas, saindo do corredor em direção as escadas.

E qual não foi a minha surpresa em ver tantos casais se agarrando ali? Hormônios a flor da pele, isso sim. Tem alguns que nem discretos são com as mãos, idiotas. Pobres garotas, mal sabem que os garotos depois que comem só fazem jogar fora. E ela ainda terá sorte se não engravidar. Acreditem, eu já fiz isso. Nunca engravidei nenhuma, sempre usei camisinha. Mas já comi e sai. Isso é comum com qualquer garoto normal.

Logo cheguei ao terceiro andar, olhando as turmas em cima das portas das salas, até encontrar a minha. Não me importei com o fato de a porta estar fechada e de escutar algumas risadinhas vindas dali de dentro, apenas entrei e fui em direção a cadeira ao lado da janela, do outro lado da sala.

Apenas ignorei o olhar do casal que me encarava. Pelo visto havia atrapalhado-os em seu momento intimo. Pouco me importa, apenas salvei essa garota de um futuro pior pra ela. Mas, nunca se sabe, ela poderia ser pior que ele. Sim, pelo que pude perceber, ela é bem oferecida, continuou no colo dele mesmo depois de eu entrar na sala.

Coloquei meus fones de ouvido e passei a olhar pela janela, observando as nuvens se movendo tão lentamente. Só de pensar que meus pais devem estar lá em cima agora, um aperto me vem ao coração. Nem mesmo Deus sabe o quanto sinto falta deles.

**.**

A aula passou rapidamente. Após anotar o que o professor copiava ao quadro e ignorar os cumprimentos dos meus “colegas de classe”, levantei-me para ir embora. Naquela semana ainda não teríamos retornos durante a tarde, o que eu dava graças.

Primeira coisa que fiz foi passar em uma lanchonete que tinha ao lado do colégio e comprar um pacote de batatas e uma garrafa de suco. Não estava com vontade de me matar tão cedo tomando refrigerante.

Logo tomei meu caminho em direção ao cemitério, o mesmo em que meus pais foram enterrados, ignorando tudo e todos, apenas comendo e ouvindo musica. Afinal, que sentido tinha ficar observando as pessoas a minha volta? Julgando-as? Elas são tão ignorantes quanto eu em relação à vida.

Sim, todos ignorantes somos. Afinal, você nunca sabe o que acontecerá depois, certo? E muito menos o que acontecerá depois que morrer. No máximo crê em algo que uma dessas religiões diz. Mas nada disso é comprovado, muito menos a existência de um Deus.

Olhar aquele portão enorme já me trazia péssimas lembranças. Lembranças que em nada me ajudavam. Afinal, quem gostaria de lembrar-se de como seus pais estavam em chamas enquanto você estava na casa de seu visinho jogando vídeo-game?

Entrei em passos lentos, olhando tudo a minha volta. Cada tumulo, cada pessoa... Algumas com mais de centenas de anos que foram mortas. Umas sem parentes que as visitem, outras tão recentes quanto à de meus pais. Não me demorei a chegar ao tumulo de meus pais, um ao lado do outro.

Sentei-me em frente ao seu tumulo, abrindo minha mochila, pegando dali as flores e colocando elas entre o tumulo dos dois. Acho que o mais correto seria reverenciar os túmulos, mas eu não o faria. Mesmo que olhares repressores passassem e me observassem, eu não ligaria. Não vim até aqui para isso.

Logo, peguei meu caderno dentro de minha mochila, pegando também o lápis que ficava pendurado no caderno, para poder começar a escrever o que eu tinha a dizer-lhes hoje.

“Bem, eu não sou do tipo de começar com aquela típica frase ‘Meu querido diário’, você sabe disso não é, omma? Então apenas começarei falando logo o que quero. Nada de datas, não preciso de datas especificas. Isso só nos faz ficar mais entediados. Datas me lembram história e você sabe que não gosto de história.

Omma, hoje eu voltei às aulas. Sim, eu prestei atenção e anotei tudo o que o professor falou. Mas não, eu não falei com ninguém. E não faça essa cara de desgosto. Não quero amigos. Tem-se algo que eu aprendi nessa vida foi que eles não nos servem de nada, apenas para rir de nossa desgraça e nos abandonar quando mais precisamos.

Não se preocupe, não serei grosseiro com ninguém, eu prometo. Apesar de eu achar que daqui a menos de uma semana todos já estarão me chamando de mudinho ou de estranho. As pessoas são tão imbecis...

Desculpe-me, sei que não gosta quando falo esse tipo de coisas, mas precisava desabafar com a senhora. Espero que você e o Appa estejam bem...

Não sabe como tem sido difícil viver com a vovó. Não, ela não me tem feito mal, mas é como se, quando eu olho pra ela, eu estivesse olhando à senhora. Sinto tanto sua falta omma.

Mas prometo não ser desse tipo de garoto suicida. Não mesmo. Irei me comportar, parei até de beber refrigerante e de comer gorduras de carne e frango. Para ver minha determinação, larguei a calabresa que tanto amava.

Não, ainda não larguei o chocolate, vamos devagar. Ainda não estou pronto para tamanho passo. E também ainda não larguei os meus vícios em jogos, mas irei, calmamente eu irei.

Não irei mais lhe prender aqui, omma. Afinal, vovó deve estar preocupada com a minha demora. Mesmo que eu não lhe responda, eu sinto que ela fica mais segura quando eu estou em sua casa. Acho que ela tem medo que eu fuja, ou me mate enquanto estiver fora, não sei... Só sei que ela tem medo...

Bem, até o próximo dia que eu vier aqui, omma. Irei tentar vir todos os dias, prometo.

Saranghaeyo, de seu filho KyuHyun.”

Olhei para o caderno, vendo uma pequena parte molhada, provavelmente pelas lagrimas que fugiram de meus olhos enquanto eu escrevia. Logo fechei o caderno e guardei-o em minha mochila, enxugando as lágrimas com a costa de minhas mãos.

Fiz uma reverencia em frente aos túmulos, dando um beijo em minha mão e tocando-nos os mesmos, um por vez.

E quase me assustei ao me levantar e ver um garoto sentado alguns túmulos ao lado. Ele tinha lagrimas nos olhos, seus cabelos quase negros cobrindo um pouco seu rosto, suas bochechas grandes meio avermelhadas. Os olhos cerrados com força não negavam o quanto ele se forçava a manter-se forte.

Não entendia o porquê, mas meus olhos não podiam se desviar daquele garoto. Ele parecia sofrer tanto quanto eu, ou até mais que eu. Quase pulei ao perceber seus olhos se focando nos meus em um rosto quase digno de pena de tão triste. Ele parecia ter notado meu olhar fixado em si e rápido secou as lagrimas do rosto e passou a olhar o tumulo a sua frente novamente.

Decidi apenas deixar-lhe ali, afinal, o que eu poderia fazer? Ele havia perdido algum parente também e nada faria isso mudar. Voltei a andar, decidido a voltar para casa de minha avó. Ela deveria estar preocupada.