— Boa Coelhão! — ouvi alguém comemorar.

Meu irmão sorriu, vitorioso, deixando-me com mais raiva.

Wilbur me chamou a atenção e entregou um guardanapo, para que eu limpasse o rosto; e assim fiz, sentando em seguida.

— Covarde! — ouvi Coelhão urrar, gargalhando.

Cerrei os punhos e sorri desafiador.

— Veremos quem é o covarde — sussurrei, aprontando uma colherada de pudim. Mirei em meu irmão, que estava novamente distraído com os amigos — e de costas para a minha mesa. Em segundos o pudim atravessou a distância que nos separava e lhe acertou a nuca.

Tyler — ou Coelhão, como todos preferem chamá-lo — passou a mão pela o local onde fora atingido e se virou. Seus olhos pareciam arder como chamas.

— Quem fez isso!? — rugiu ele, apesar da resposta estar diante de seus olhos.

— Ah, deixe de birra, Canguru! Não vejo problema algum em um simples pudim te acertar... — disse e ele me encarou. Devolvi-lhe o olhar com um sorriso irônico.

Quando olhei para os meu novos amigos, percebi que todos riam. Cruzei os braços e voltei a atenção para o grupo de Tyler.

Um de seus companheiros lançou um bolo de morango na direção da minha mesa. A sobremesa acertou o Wilbur, ou melhor, o cabelo dele.

— Ei! Aí já é baixaria! — Wilbur protestou, vendo o seu topete desmoronar. Com um sorriso sob os lábios ele pegou seu bolo de chocolate e lançou de volta, acertando o garoto no qual destruiu seu topete.

Segundos depois, ouvi alguém gritar:

— Guerra de comida!

Todos os presentes se levantaram como se o alarme de incêndio tivesse ressoado. Enquanto professores fugiam, alunos praticavam uma guerra.

Alguns — como a Merida ou a garota morena — usavam as bandejas como escudos. Outros, — como Soluço ou Wilbur — deixavam se lambuzar, porém revidavam o ato. Desde saladas, até sobremesas, sobrevoavam o refeitório como granadas e bolas de canhões. As paredes ficaram manchadas, os lustres sujos e o teto engomado.

Ouvi a porta dupla do refeitório ranger. Não dando atenção, continuei o que fazia. Porém logo um grito soou pela bagunça de adolescentes:

— Mas o que é que está acontecendo aqui?! — Era a diretora, Lucy. Todos gelaram com a sua presença e arregalaram os olhos, dando pausa na guerra — Antes de tudo: quem começou isto?! — Lucy colou as mãos sob os quadris e olhou para todos os grupos.

O silêncio era absoluto, até meu irmão apontar para mim e mentir, gentilmente e sem parecer culpado:

— Foi o Jack e seus amigos, diretora Lucy.

A expressão dela foi continuar indiferente, e apenas me olhar, como se falasse "Já começou novamente, Jack?". Pensei em protestar, mas sabia que não iria adiantar, não naquele momento. Lucy parecia arrasada, mas logo estufou o peito e disse, autoritária:

— Sr. Frost, leve seus amigos até a minha sala e permaneçam lá até segunda ordem.

Olhei para os novatos atrás de mim, e senti eles me julgarem apenas com o olhar sob minhas costas.

— Vamos pessoal — chamei-os, já atravessando a porta dupla do refeitório.

A loira e a morena se encolheram. Soluço parecia hesitante, Wilbur confiante. Talvez se sentindo bem por ter tanta atenção logo no primeiro dia de aula. E a ruiva, bom, eu podia sentir seu olhar fulminante enquanto me seguia calada.

Atravessamos os corredores mal iluminados e vazios em passos curtos. Olhei por sob o ombros e todos — menos Wilbur, que estava ao meu lado — estavam encolhidos, parecendo preocupados.

— Até que foi divertido — ouvi Wilbur dizer — Mas a culpa não foi sua. Por que deixou o seu irmão te culpar?

— Sou considerado um aluno desordeiro — suspirei, enterrando minhas mãos no bolso da moletom — Se eu falasse a verdade sem provas seria pior. Eu estaria "acusando" alguém. Nesse caso, o verdadeiro culpado: Meu irmão. Bom, tinham testemunhas, mas vários alunos têm medo dele.

— Talvez fosse melhor do que pegar detenção justo no primeiro dia de aula! — Rapunzel decidiu revelar-se.

Parei de andar e olhei sobre o ombro. Ela estava com os braços cruzados, parecendo frustrada.

— Se acalma loirinha, eles não são tão rígidos assim. — respondi sorrindo. Logo ela pareceu relaxar.

— Para ser tão confiável e dizer isso você já deve ter ido para a detenção inúmeras vezes. Não me surpreenderia se tivesse fugido dela também — a morena falou. Era a primeira vez que a ouvia dizer algo. Sua voz era rouca.

Arqueei uma sobrancelha, abrindo a boca para perguntar seu nome, porém Wilbur fora mais rápido:

— Qual seu nome? — sorriu ele.

— Violeta. Violeta Pêra — ela respondeu, tímida — E os seus?

Todos nos apresentamos, levantando as mãos, seguidas dos nomes. Chegando na sala da diretora, todos se acomodaram.

As paredes eram cor de creme, e estantes de carvalho as ocupavam. Algumas paredes eram decoradas com quadros. Perto da grande janela, onde demonstrava o sol velado por nuvens e o céu azulado, estava a mesa larga de madeira. Atrás dela estava uma cadeira giratória, e na frente duas cadeiras de visitantes.

Rapunzel e Merida sentaram nas desconfortáveis cadeiras da sala. Soluço parecia curioso com os livros que ocupava as estantes. Wilbur parecia entediado, andando de um lado para o outro. Violeta ficou encostada na parede e eu na soleira da porta. Minutos depois a mesma se abriu, revelando a diretora, com uma linha fina em seus lábios, não demonstrando emoção. Lucy seguiu para a sua cadeira giratória e sentou-se, nos chamando a atenção.

— Achei que não haveria problemas no primeiro dia, Jack.

— Mas não fui eu! — tentei protestar, frustrado, aproximando-me da mesa — foi o Tyler! Todos nessa sala são testemunhas. Desta vez não fui eu, juro! — Lucy encarou a todos na sala, fazendo com que os mesmos afirmassem com suas cabeças.

— Tyler disse que fora você quem começou — ela suspirou — perguntei para outros alunos, e todos concordaram com a afirmação do seu irmão.

— Todos têm medo dele — resmunguei.

Silêncio.

— Nós receberemos alguma punição? — perguntou Rapunzel, depois de um tempo, insegura.

Lucy sorriu a ela.

— Infelizmente, minha querida. Desta vez não comunicarei o ocorrido aos seus pais, mas da próxima espero que estejam cientes.

Todos afirmaram novamente.

— Diretora — Merida pôs-se a falar —, não acha que é injustiça recebermos punição sendo que todos os alunos colaboraram?

— Todos receberão um castigo, Srta. Dunbroch. Os alunos menos culpados, que apenas participaram, ficaram uma aula a mais está tarde.

— Mas e nós? — quis saber Soluço.

— Vocês ocuparão o horário restante para organizarem o estrago do refeitório — disse Lucy —, e terão aulas vagas por uma semana no período da tarde.

— Mas... mas já temos aula pela manhã! — protestou Wilbur, revoltado.

— Sem mais ou menos, Sr. Robinson. Está decidido, e assim será — Lucy suspirou — Deveriam tem pensado duas vezes antes de arranjarem toda essa confusão.

Wilbur encarou a diretora, frustrado. Ele parecia querer protestar novamente, porém logo cruzou os braços e se afastou, dando-se como rendido. Ouvi ele murmurar algo, mas não escutei exatamente o quê. Os outros suspiraram, derrotados. Me senti culpado por ter deixado Tyler os meter em toda a confusão.

— Quando começaremos, então? — Rapunzel perguntou, cabisbaixa.

— Hoje mesmo, querida. — Lucy disse, doce. Ela sorriu para a garota loira, que devolveu o mesmo ato, porém, forçado.

— Podemos ir agora? — perguntei, estufando o peito.

Lucy olhou para mim e sorriu.

— Podem. Espero que todos tenham trazido uma troca de roupa — a diretora continuou, seus olhos ainda fixos em mim — E, Jack, se tentar fugir, eu saberei.

Expandi meus lábios em um sorriso e disse, antes de sair da sala:

— Não garanto nada.

Ao chegarmos em nossos armários nos separamos, combinando em nos encontrar por volta de vinte minutos, no refeitório.

Esse mesmo tempo não demorou a se passar. Eu estava ajeitando minha camisa azul escura, quando avistei as meninas no lado oposto do corredor. Entrando no refeitório encontramos Soluço, Wilbur e uma grande bagunça.

O lugar estava uma baderna! Havia comida em toda parte! As paredes estavam coloridas por doces e salgados, todos misturados. As janelas pareciam ter ganhado cortinas feitas de chocolate e creme. Haviam bandejas espalhadas para todos os lados, como também algumas cadeiras.

Quando as garotas e eu nos aproximamos de Wilbur e Soluço, eles apontaram para uma mesa, onde estava os produtos que deveríamos usar.

— A diretora é rápida... — sussurrou Soluço.

— Você não viu nada — afirmei, empurrando-o com o cotovelo, lhe abrindo um sorriso.

Querendo acabar logo, começamos a limpar.

— Jack, me deixa matar seu irmão? — Merida disse depois de um longo tempo. A ruiva pegou uma vassoura, apertando o seu cabo como se enforcasse alguém.

— Claro! Mas use luvas, não acho que queira deixar suas digitais quando for matá-lo — respondi sorrindo, fazendo com que todos rissem.

Os garotos, as meninas e eu acabamos chegando na conclusão de tentar deixar o trabalho mais divertido, nos dividindo em grupos; meninos contra meninas, o grupo no qual terminasse primeiro ganhava.

Com o jogo, o que deveria durar horas durou menos tempo. Nossos grupos estavam empatados; faltava apenas uma janela para cada um. Merida esfregava o vidro com fúria. Eu tentava acompanhá-la, mas meus braços gritavam de dor.

"Como ela consegue!?"

De repente gritos ecoaram nos corredores. Olhei por sobre o ombros e encontrei todos com a mesma expressão que a minha: espanto.

Corri para a porta dupla do refeitório. Um garoto parecia aterrorizado. Seus olhos estavam arregalados e ele parecia tremer. Logo reconheci a figura. Era Gustavo, aluno do segundo ano, gêmeo de uma colega, Giulia.

— Jack! - gritou ele, quando me encontrou — Jack! Me ajuda! Mi-Minha irmã sumiu! Algo a levou pelos corredores! E-Eu não sei o que era! Pelo amor! Me ajuda!