Minha Viagem Infernal

Um almoço (nada) romântico


Assim que nós saímos de perto do Apolo (que me assustou ao dar aquele ataque estranho do nada), Ares me levou até uma rua bem longe da do hotel. Sem confiar no péssimo senso de direção dele, eu andava olhando em volta, gravando o máximo de pontos de localização que conseguia.

Quem sabe ele não diz que está perdido de novo? Se depender dele, dormiríamos na rua. Enquanto olhava para um prédio engraçado do outro lado da rua, esbarrei contra as suas costas. Ares tinha parado de andar.

- Não está olhando para frente, não?! – Reclamou ele virando-se para mim.

- Eu... Foi mal. – Respondi ignorando a sua arrogância. Olhei para o relógio e notei que já estava mesmo na hora do almoço. Nós tínhamos passado um tempo andando por aquela praça, para fazer hora até o “almoço romântico”.

Ares riu, e sorriu torto para mim. Podia ver que aquele maldito sorriso malicioso estava se deliciando com um plano maligno que eu ainda desconhecia.

- Então... Chegamos, benzinho. – Disse ele sorrindo para mim e mostrando o enorme restaurante na nossa frente. Não era o que Scott havia nos mostrado naquele dia, mas era igualmente grande e luxuoso.

- Uau. Você me surpreendeu. Imaginei que fosse me levar á algum fast food com criancinhas correndo e gritando, mas... Você realmente estava falando sério. – Comentei distraída.

- Uhm... A idéia do fast food é interessante, mas não serve para um dia romântico com você, garota da guerra. – Disse ele sorrindo torto. Ares de repente estava muito educado e gentil – Primeiro as damas.

Com um gesto ele apontou para o lugar, e eu revirei os olhos. Não tinha escolha mesmo, por isso acabei entrando. A sorte era que a roupa que estava vestindo podia ser considerada razoável em um ambiente daqueles.

Assim que eu pisei á 2 metros das portas, dois seguranças abriram as portas para mim. Fiquei surpresa, e sorri para eles um pouco sem graça.

- Obrigada. – Disse em um tom baixo. Pude notar que um deles sorriu de volta para mim, mas Ares notou isso também. Ele correu para o meu lado, colocou o braço sobre o meu ombro, e fez uma carranca para ele – Ares, ele só estava sendo educado.

- Esqueceu que é o meu almoço romântico? Sou em que tem que ser educado, Kelly. Agora cala a boca e me segue. – Respondeu ele em um resmungo.

- Puxa! Já que você foi tão educado, acho que eu vou te seguir. – Sorri para ele em sarcasmo. Ares revirou os olhos, e nós dois fomos levados para uma mesa vazia no centro do lugar. Um dos garçons com roupas elegantes no acompanhou até lá.

- Lembre-se... Elogios. – Sussurrou Ares em meu ouvido.

- Ah, é. Você quer que eu finja que você é um cara legal, e que fique te elogiando. Tinha esquecido dessa parte. – Sorri para ele sem vontade. Ares riu, e me deu um beliscão na bunda – Ai! Seu...!

- O que? – Perguntou ele pacientemente, com um sorriso inocente. Trinquei os dentes. “Sem xingamentos... Só elogios, Alice”, lembrou uma miniatura do Ares na minha cabeça. Sorri forçadamente – “Seu...!” o que?

- Pedaço de mal caminho. – Falei para incomodar ele, pelo que tinha dito para o Apolo. Estava dentro das regras, por isso Ares ficou um pouco irritado em não poder dizer nada contra o meu elogio disfarçado.

- Gracinha. – Retribuiu ele com um sorriso falso. Nós nos sentamos, e Ares pediu para o garçom um prato de cada no menu.

- Você tem idéia de que essa não é uma escolha muito boa, não é? – Falei olhando para ele do outro lado da mesa – Nós estamos na França. Aqui eles comem escargot.

Ares fez uma careta ao ouvir isso, mas acabou dando de ombros.

- Então... Todos os pratos menos esse. – Disse ele para o garçom, que assentiu (ainda bem que ele entendia a nossa língua) e foi embora.

- É um exagero pedir tudo do cardápio. – Comentei olhando a enorme quantidade de comida que tinha ali. Ares se inclinou para frente na mesa, e puxou o meu queixo para perto dele.

- Você merece, boneca. Só fica quieta e aproveita. Não era isso que queria fazer em Paris? – Disse ele em um sussurro. Nossos rostos estavam muito perto um do outro, o que me fez ficar um pouco tensa.

- É... Eu acho. – Respondi ainda não entendendo qual era o plano dele. Quando a comida finalmente chegou, o garçom colocou dois pratos com na mesa. Um para mim, outro para Ares.

- Bom appétit. – Disse o garçom indo embora. Olhei para o prato. Era uma sopa de legumes. Ao menos não teria que comer algum bicho nojento.

Peguei o pano delicado que servia de guardanapo e coloquei sobre o colo, como se deve fazer. Peguei a colher que fica mais perto do prato e comecei a tomar algumas colheradas da sopa.

Estava gostoso, e devo dizer que o almoço até que estava agradável. Continuaria assim se eu não ouvisse um barulho alto de algum sugando algo. Olhei para frente, e para a minha enorme felicidade, Ares estava fazendo esse barulho desagradável toda vez que pegava uma colher de sopa.

Tentei ignorar e voltar a comer, mas ele insistiu nisso sem nem mesmo ligar.

- Ares... Não se faz barulho quando se toma sopa. – Disse em um tom baixo para que ninguém ouvisse.

- Quem está fazendo barulho? – Perguntou ele sem entender. Ingenuamente ele fez o barulho de novo, e sorriu para mim – Ah, sou eu. Sinto muito, não consigo evitar.

Ia falar mais alguma coisa, só que ele pegou o guardanapo de pano e colocou na gola da camisa. Algumas pessoas nos lançaram olhares repreendedores.

- O guardanapo é para se colocar no colo, e não na gola da camisa, seu i...! – Engoli o xingamento, assim que Ares sorriu para mim e se inclinou na mesa para poder me ouvir. Sorri forçadamente – Amor. Põem ele no colo.

- Por quê? Fica mais confortável assim. – Disse ele encolhendo os ombros com um sorriso feliz. Eu revirei os olhos e resolvi continuar comendo.

Quando o prato de sopa acabou, limpei minha boca delicadamente com o guardanapo. O garçom veio e retirou o prato com educação. Ares nem mesmo limpou a boca. E ainda lançou um beijo no ar para mim.

Fechei os olhos e fingi que aquilo não estava acontecendo. Não... Eu estava em um encontro romântico com Apolo. Não com o Ares!

- Aqui está, milady. – Disse o garçom com um sotaque forte, enquanto colocava o prato sobre a mesa. Esse era uma coxa de frango com molho especial.

Acompanhado disso, o garçom abriu uma garrafa de vinho para nós. Depois de nos servir, ele foi embora de novo.

- Esse prato parece estar delicioso. – Ares colocou os cotovelos encima da mesa de maneira rude, e sorriu para mim – Você não acha, benzinho?

- Tira os cotovelos da mesa! – Repreendi em um tom baixo.

Ares tirou, usou o garfo e a faca para corta a coza de frango (ao menos isso), mas logo voltou a agir sem nenhuma etiqueta. Ele deu uma garfada, e sorriu enquanto mastigava.

- Não está bom, Alice? – Perguntou ele de boca cheia. Meu queixo caiu por alguns segundos, mas ele não parou. Continuou falando – Então, Alice... Está gostando do nosso almoço? Está gostando de Paris. – Ares apontou o garfo com um pedaço de carne para mim e sorriu torto – Eu acho que está.

Meu rosto ficou um pouco vermelho e eu desviei o olhar para o chão.

- O que... Você está fazendo? Parece um animal comendo! – Exclamei envergonhada. Ares tossiu, e eu me toquei que tinha acabado de xingá-lo – Ahm... Um doce animal. Um doce animal doméstico. Melhorou?

Ares riu, e engoliu o que tinha em sua boca. Olhei para ele sem entender o que ele estava fazendo, enquanto ele dava mais garfadas rudes na comida.

- Sabe... Me dando ordens o tempo todo, você fica muito parecida com Deméter. “Não faça isso, porque é rude! Olha como fala! Blá blá blá!”. Mas também é uma mistura da minha mãe com Atena. Hera falando “Faça isso, faça aquilo!” e Atena “Eu sei mais do que você, me obedeça!”. – Ares falava afinava a voz de um jeito irritante para dizer o quanto aquilo era chato – Mas tudo bem... Estou acostumado, benzinho.

Olhei para ele parando de comer.

- Se me acha tão chata, então porque me trousse para esse almoço? – Perguntei irritada. Ares riu.

- Não é óbvio? Por que um cara convida uma garota para sair com ele? – Perguntou ele rindo – Quero fazer você se sentir especial, princesa. Estamos no melhor lugar, porque você é a melhor das garotas.

Com um sorriso malicioso para mim, ele tomou um gole de vinho. Continuei olhando para ele, e por fim me toquei do seu plano. Neguei com a cabeça.

- Não. Você não me trousse aqui para isso. – Disse olhando para ele – Você me trousse aqui para poder agir desse jeito grosseiro de propósito, só para me envergonhar. Quer me humilhar na frente de todo mundo por estar almoçando com você.

Ares riu divertido por um tempo, e depois olhou para mim.

- Não me leve a mal. É que eu não resisto ao seu rostinho vermelho. – Disse ele com um sorriso maldoso. Cretino...

Ares continuou comendo como se fosse um animal, e eu fiquei por alguns minutos só olhando a cena. Sabia que tinham várias pessoas nos olhando com nojo ou repulsa, mas o que eu podia fazer? Ele era mesmo um grande idiota.

Sem nem mesmo pensar direto, eu resolvi revidar. Aquilo talvez não fosse uma escolha boa, mas não me importei em parar para refletir. Bati os talheres com força na mesa, e Ares parou de comer para me olhar. Sorri para ele, como se realmente gostasse dele, e peguei a coxa de frango com a mão.

Ares arregalou os olhos quando mordi a carne com os dentes, e comecei a mastigar.

- Sabe... Você tem razão. Isso está divino. – Disse para ele também de boca cheia. Ares ergueu uma sobrancelha para mim, como se quisesse dizer “Acha que pode me passar para trás?” e sorriu.

- Fico feliz que tenha gostado. – Disse ele com um sorriso. Também largou os talheres e começou a comer com a mão. Ele parecia um selvagem, mas eu resolvi não ligar e continuar comendo do meu jeito irritante – Um gole de vinho, boneca?

- Por que não? – Perguntei com um sorriso. Lambi os dedos sujos de molho antes de segurar o cálice, e Ares continuou olhando para mim fixamente. Nós dois brindamos, só que ele bateu com tanta força que o vinho caiu na mesa. Mas como ainda tinha um pouco em seu cálice, ele matou tudo com um gole só.

- Como sou desastrado... Espero que isso não tenha te incomodado. – Disse ele inocentemente. Eu neguei com a cabeça.

- O que? Isso? Imagina. – Respondi sorrindo para ele. Larguei meu cálice encima da mesa, e ele olhou para mim sorrindo torto.

- Não agüenta o vinho? – Perguntou ele – Não vai beber mesmo? Nem um golinho?

- Claro que vou. – Confirmei. Peguei a garrafa de vinho e virei-a com um longo gole. Ares olhou incrédulo para mim, mas em seu olhar eu podia notar um tipo de brilho. Como se ele estivesse louco para superar o meu golpe contra ele. Bati a garrafa na mesa, e limpei a boca com o guardanapo – Delícia.

- Também achei. – Concordou ele. Ares puxou limpou parte de sua boca na toalha da mesa, e eu me segurei para não reclamar. Depois ele parou e sorriu para mim – Oh, onde estão meus modos? Ia usar a toalha da mesa! Há Há!

Ares riu um pouco, e resolveu largar a toalha da mesa. Ele limpou a boca com o próprio punho, como os bárbaros faziam. Depois limpou o punho na toalha de mesa.

O garçom voltou um pouco tenso com o nosso comportamento, trazendo um tipo de creme. Era parecido com uma sopa, mas tinha um aspecto mais grosso. Olhei para o prato e depois para Ares. Ele sorriu para mim.

- Bom apetite, benzinho. – Disse ele malicioso. Ares levantou o prato e tomou a sopa pela borda, fazendo barulho e tudo mais. Meu rosto ficou vermelho. Quando Ares abaixou o prato, pude notar que ele tinha um bigode de sopa cremosa – Delicioso.

O garçom tinha deixado uma porção de arroz em um prato separado para nós. Olhei para o prato de Ares e estiquei o meu braço.

- Posso pegar um pouquinho? – Perguntei com um sorriso. Peguei um bolo da arroz com a mão e coloquei na boca. Ares fez o mesmo com o meu prato.

- Eu também quero um pouco do seu. – Disse ele comendo com a mão. Milhares de grãos de arroz caíram sobre a mesa e no chão, mas nós estávamos concentrados na nossa disputa. Se ele achava que eu iria ficar envergonhada sozinha, estava enganado.

- Ah, gracinha. Seu rosto está sujo. Deixa que eu limpo para você. – Disse ele com um sorriso torto. Ares pegou o guardanapo que ele nem mesmo tinha usado, molhou rapidamente na sopa, e passou na minha bochecha antes que eu pudesse reagir, sujando-me – Pronto. Melhorou.

Passei a mão sobre a sopa no meu rosto, e olhei para ele. Ares ria se divertindo com a cena. O garçom deixou algum macarrão com molho de tomate na mesa e saiu com medo de nós. Foi a minha revanche.

- Ei... Aqui também está sujo. – Disse molhando o guardanapo no vinho e passando no nariz de Ares, enquanto ele estava distraído rindo de mim. Isso o irritou. Ele olhou para mim com um sorriso forçado, mas não se importou em limpar o nariz.

- Ei, benzinho... – Ares começou todo o macarrão rápido, lambeu o prato, e com a boca toda sua de molho de tomate sorriu para mim – Que tal um beijinho agora, hein?

Ares fez biquinho com a boca toda suja de molho vermelho, e eu respirei fundo me controlando. Sorri para ele.

- Só se eu puder tocar no seu rosto lindo. – Comentei passando pegando macarrão com a mão e encostando em suas bochechas. Ares desfez o biquinho, e trincou os dentes sorrindo forçadamente para mim.

- Ah, assim você me deixa louco. – Disse ele rindo. Ares inclinou-se encima da mesa, e puxou meu rosto para perto do dele – Deixa eu tocar você um pouquinho, boneca.

Ares passou a mão no molho em seu prato e começou a esfregar em meu rosto.

- Só se eu puder tocar em você também. – Sorri para ele, fazendo o mesmo em seu rosto. Depois de alguns minutos sujando o rosto um do outro, Ares passou para o meu cabelo, e eu fiz o mesmo com o dele. Nós paramos quando vimos que já não tinha lugar limpo no rosto um do outro – É por isso que eu te amo.

- Digo o mesmo. – Sorriu ele forçadamente. Estava pronta para voltar ao meu lugar, quando Ares teve uma outra idéia. Estávamos os dois debruçados na mesa, por isso ele pegou um pouco de gelo que estava em um pote com a garrafa de vinho, e sorriu para mim – Acho que eu te deixo quente demais, gracinha. Você tem que... Se esfriar um pouco.

Estava quase voltando para o meu lugar, quando ele puxou o decote do meu vestido e jogou o gelo lá dentro. Dei um pulo voltando á cadeira.

- Ah! – Gritei por causa do choque térmico, e o meu rosto inteiro ficou ainda mais vermelho. Coisa que o molho de tomate só facilitava - Miserável!

Ares começou a rir descontroladamente de mim, o que me deixou ainda mais envergonhada e irritada. Não... Aquilo teria volta! Tentei tirar o gelo de meu decote discretamente, o que fez Ares rir ainda mais.

- Acho que eu vou pedir a conta... – Disse ele tentando respirar novamente – O que foi? Alguma coisa está te incomodando, gracinha? Quer ajuda? Há Há!

Sorri para ele. Assim que Ares se levantou, eu fingi que o copo de vinho escorregou das minhas mãos e deixei toda a bebida cair no meio de suas calças. Estava realmente gelada, o que fez Ares dar um pulo.

- Retardada! – Exclamou ele com raiva, enquanto pegava o guardanapo na tentativa de secar pelo menos parte do vinho, mas só piorou a situação, pois o guardanapo estava sujo de sopa – Olha o que você fez!

- Ah, não! Eu acho que isso deve ter estragado uma das suas cuecas estilosas, não é? – Falei rindo ainda mais – Quer que eu limpe para você? Há Há!

- Quero! Com a sua língua, sua lesada! – Exclamou ele com raiva, pensando que iria me atingir, mas eu só continuei a rir ainda mais. Ares me puxou pelo pescoço fazendo-me ficar frente a frente com ele. Ares tentou manter a cara de irritação, mas acabou não conseguindo. Eu estava rindo por ver a cara dele cheia de molho de tomate, e ver que parecia que ele tinha feito xixi nas calças.

Ele acabou cedendo e rindo também. Da minha cara suja, e do que tinha feito com o meu decote. Nós dois começamos a rir cada vez mais alto dentro daquele restaurante, e todos pararam para nos olhar.

- Ahm... Cof. Cof. – O garçom pigarreou chamando nossa atenção.

Nós dois olhamos para ele, que nos encarava em um tom repreensivo e paramos de rir imediatamente.

- É... A conta, por favor. – Pediu Ares com um sorriso desajeitado. Eu ri um pouco disso e ele olhou para mim – Eu odeio você.

- Eu também te odeio. Pra valer. – Confirmei rindo das suas calças.