Olho em direção à porta e vejo Benny do lado dela, ele está com os olhos arregalados e cheios de medo. Percebi que ele teve um arrepio assim que viu que eu estava olhando pra ele. Ele vira um pouco o rosto olhando para o meu quarto e meus olhos seguem o seu olhar...

Meu quarto está praticamente destruído! Fui eu que fiz tudo isso? Foi, foi sim... Eu me lembro de como virei minha cama tirando-a completamente do lugar onde sempre esteve. Minha comada jogada no chão... E finalmente vejo o copo... Bom, o que sobrou do copo que estva o sangue que eu estava bebendo.

Na verdade, eu acho que foi o sangue que me fez ficar... Ficar... Não sei, acho que a palavra seria: viciado, ou descontrolado, quem sabe... Irado? O que sei é que não sou iracundo, ops, era. Depois de beber “aquilo”, não quero admitir que bebi sangue, acho que isso pode ser contra os métodos de terapias... Não admitir coisas. Quem liga? Bom, depois disso fiquei desgovernado e praticamente não raciocinava. Era como se eu estivesse assistindo as coisas que esse “Ethan”estava fazendo mas, eu me lembro de ter feito isso... Err, quase tudo.

Os cacos de vidro estão espalhados pelo quarto começando da parede, que foi onde eu o lancei. Tem umas gotículas de sangue secas na parede. Minúsculas, não dá nem pra lamber... Não que eu queira! Bom, eu, eu quero... Não, não eu. Mas “isso” quer, e “isso” não sou eu.

Sarah está sentada na cadeira que fica na frente do meu computador, que por mais incrível que pareça, está intacto. Sinto que tenho que agradecer ao Benny depois.

A Sarah me olha discretamente mas, quando percebe que estou olhando pra ela, ela desvia o olhar e esconde seu rosto olhando para o outro lado, com certeza é porque ela não quer que eu veja suas expressões faciais.

Eu me viro para o Benny e vou andando até ele. Com a costa de minha mão, limpo a gota de sangue que escorre pelo canto da minha boca. Enquanto dou passos lentos até o outro lado do quarto, onde Benny está. Ele me olha apreensivo. Ele parece estar decidindo se deve ou não fugir de mim, então ele olha mais uma vez para os cacos no chão, olha para a mancha vermelha na minha camisa, então olha direto nos meus olhos, eu vejo que ele não quer fugir... Mas essa é a única opção dele, e como se estivesse seguindo a ordem em que os meus pensamentos surgem... Ele some.

Eu não sei para onde o Benny foi... ele deve ter usado magia porque ele simplesmente sumiu.

Eu me encosto na parede e me arrasto com as costas grudadas nela até que eu esteja sentado no chão. Com as pernas abertas e esticadas eu seguro a cabeça com as mãos e grito:

- O que eu me tornei?!

Olho para Sarah que é a única comigo no quarto e continuo:

- O que eu me tornei?! Você sabe Sarah?! Você sabe?!

E continuo a falar da forma como estou:

- Você sabia disso?! Sabia Sarah?! Sabia que eles estavam atrás de mim, e não de você?!! Sabia que... Que eles, eles queriam... Me transformar nesse monstro sanguinário?

Ela começa a falar em um tom baixo e que apresenta um pouco de arrependimento e medo:

- Sim, Ethan... Mas... – E antes que ela possa continuar eu fico de pé em um salto, dou passos firmes e pesados em direção à ela, e com os olhos focados e cheios de ira, eu grito:

- E PORQUE VOCÊ NÃO ME AVISOU?! Por que Sarah?! O que foi que eu fiz a você?! Será que foi algo tão terrível assim?! Porque, olha eu realmente acho que devo ter criado um inferno pra você querer fazer uma coisa dessas pra mim!

De repente eu percebo: Eu estou brigando com a Sarah, como assim?! Eu não tenho coragem de dizer pra Sarah que ela está bonita, quanto mais gritar com ela?! Não, não pode ser... Eu nunca faria isso com ela. Essa raiva não pode ser minha... Eu nunca fui assim... O que é isso? Que tipo de monstro terrível eu sou?!

Minhas presas são recolhidas e eu sinto meu corpo esfriar como se a raiva estivesse sumindo em um estalar de dedos. Eu vejo Sarah de cabeça baixa, ela parece ser tão pequena e frágil agora. É quando eu noto que ela parece menor porque... Eu estou maior!

E-eu estou mais alto e, e, meus bíceps... Nossa estão bem trabalhados! E minhas roupas, estão um pouco descosturadas? Como assim eu estou... Sarado! O que é isso!?! Tá legal, quem foi o louco que contrabandeou drogas aqui! Me aplicou esteroides enquanto eu estava desmaiado! Há há, muito engraçado! Como é que eu explico isso agora?!

Eu fico me tocando desesperadamente, tentando descobrir pra onde foi meu corpo magricelo... Eu posso não ter ficado enorme como esses bobandões de academias ou sei lá o quê, ou como os caras esportistas lá da escola mas, isso COM CERTEZA não é o meu normal.

Enquanto estou me olhando eu acabo vendo a Sarah com o canto dos olhos... -Ethan seu vacilão!- Eu deixei ela ai todo esse tempo me olhando como se eu me achasse um fisiculturista! Ótimo, ponto pro idiota aqui!

- Sarah, eu... Eu sinto muito, eu realmente sinto, eu não sei o que deu em mim. Eu, eu nunca deveria falar desse jeito com você e... – Eu estava tão envergonhado que nem conseguia continuar, então eu me virei e quando estava para sair do quarto ela toca meu braço com sua mão fria e me faz virar – Sarah...

- Recebi uma carta um dia antes de esbarrar com você naquele dia na escola, eu ainda estava meio distraída pelo que eu tinha lido no dia anterior. Nessa carta dizia que mudanças estavam acontecendo mais não explicava o que era, e nem quando aconteceu. Mas lá também estava escrito que eles precisavam que eu levasse você até eles... Dizia que o concelho queria você...

Fiquei calado escutando cada palavra que Sarah dizia, e ela continuou:

- ...Mas não explicava porquê. Eu fui procurar mais informações, e no dia seguinte eu fui falar com a Ericka sobre a carta quando você a derrubou e teve aquela visão. Eu perguntei à Ericka se ela tinha recebido alguma noticia recente do concelho e ela me disse que ela e o Rory receberam a mesma carta que eu tinha recebido, com seu nome, fotos suas, informações sobre você, e detalhes sobre a hora que tudo aconteceria.

“O estranho é que na carta que eu recebi não vinha com todas essas informações, nem muito menos falava sobre planos para pegar você ou horas para isso. Talvez, eles soubessem que somos amigos, mas, então por que mandaram para o Rory? Ele é seu amigo também. Acho que por pensarem que a Ericka e o Rory entram antes de mim, eles não questionariam ordem nenhuma vinda do concelho.”

Não perdi nenhuma palavra dela, e olhava diretamente em seus olhos enquanto assimilava tudo que ouvia:

- Quando você me perguntou se eu fui à floresta... Eu, eu quis proteger você da verdade, do medo que poderia lhe abater. Sabe, eu fui à floresta para procurar por pistas sobre o que ia acontecer, porque a Ericka me falou que o plano estava marcado para começar lá pelas 2:30 da madrugada.

- 2:30 da madrugada? Eu falo como que em transe, mas, meio sético também por lembrar me tudo que aconteceu naquela madrugada, como se fosse um filme passando muito rápido por minha mente.

- Sim, por quê?

- Porque foi exatamente às 3:00 que eu estava correndo do Jesse e dos amiguinhos dele. Eu os tinha visto em uma pequena clareira, e depois de descobrir que eles estavam atrás de mim, eu corri, mas é claro que não adiantou muito...

- Ethan, o que exatamente aconteceu?

Eu conto à Sarah tudo que aconteceu naquela madrugada, tentando não demosntrar o quão fraco e assustado eu estava... E ainda estou.

- Você disse ter ouvido o nome de um dos vampiros que estava com Jesse?

- Sim, se me lembro bem seu nome era Chaise.

- E você o “matou”? – Ela fala arqueando uma de suas sobrancelhas

- Si-sim, mas eu estava apenas me defendendo e, e...

- Não Ethan, tá tudo bem. – ela responde com um sorriso – É que o Chaise era bem forte, e você conseguiu lidar com ele sozinho... Estou impressionada, normalmente você daria um jeito de fugir, e até me chamar, porque você sempre quer que eu resolva as coisas por você. Se bem que, nesse caso uma ajuda não faria mal nenhum.

- Na verdade, foi literalmente um golpe de sorte. E o outro sumiu.

- Ah, foi o Rory, que levou ele pra brigar em outro lugar, ele foi me ajudar mas como a Ericka já estava lá eu gritei para ele ir ajuda-lo.

- Mas, Sarah eu me lembro de você comigo depois que o Jesse... – Parece que tem algo que tenta prender minha voz

- Sim, eu consegui chegar lá, mas foi tarde de mais... Eu, eu SINTO MUITO ETHAN! Porfavor! Me desculpe! Se eu tivesse chegado antes, teria salvo sua vida! E você não seria condenado a viver como eu! Eu, eu sabia o quão ruim é a vida de vampiros como eu, e por isso eu tentei tanto fazer com que você não sofresse como eu mas... Mas eu falhei! Não fui boa o bastante!

- Sarah! Nunca diga isso! Você nem precisava ter ido atrás de mim! Na verdade eu deveria me sentir um completo idiota, porque mesmo depois de você se arriscar tanto por mim, eu ainda gritei com você!! Você não tinha razão nenhuma de ir atrás de mim Sarah!

- Claro que eu tinha Ethan... Você. Eu não podia simplesmente virar as costas pra você!

E ela se levanta e me abraça, e eu me sinto como se estivesse nas nuvens depois de tanto tempo sentindo como se uma âncora estivesse presa ao me pescoço e me puxasse pra cada vez mais fundo de um abismo sem fim. Me sinto o garoto mais feliz do mundo! Não sei se poderia estar mais feliz em uma hora dessas e ...

- Ethan... Ethan. Ethan!

- ahm?

- Será que você pode me soltar? É que eu tenho que ir agora...

- Ah, desculpe Sarah – Digo ficando envergonhado, com certeza etou vermelho, porque sinto o meio rosto queimar... Droga!

- Ah, e Ethan...

- Sim?

- Nunca pense, que eu não iria atrás de você. Você é meu amigo, e você sabe que eu faria tudo pelos meus amigos... Bom, quase tudo. – Ela dá um sorriso e diz - Tchau Ethan.

- tchau Sarah – Eu respondo bem baixo para que ela não possa perceber toda decepção que carrego em minha voz

Nossa Ethan, como você é inteligente! Com toda certeza a Sarah gosta de você, mas você nunca vai deixar de ser o grande AMIGO da Sarah. Dou um suspiro longo, será que só eu falo sobre mim mesmo na terceira pessoa? Não, espera ai. Isso é Clichê.

Arrumo meu quarto. Tento deixa-lo o mais parecido possível que estava antes da bangunça que fiz. Tomo um banho e me arrumo. Vou à frente do espelho para ver se não estou bagunçado mas, que estanho, o espelho não está me refletindo. Isso é mesmo um espelho? Ai claro, tinha esquecido, agora sou um vampiro, e vampiros não tem reflexo. Acho que esse negócio de ser vampiro tá me deixando lerdo.

Saio do meu quarto e quando estou descendo as escadas, me lembro que fiquei desacordado por um bom tempo, de cama por mais tempo ainda, fiquei todo machucado e ainda por cima saí de casa escondido de madrugada... Meus pais vão me matar. Ah... Esquece.

Eu ouço vozes e quando tento passar despercebido pela sala:

- Ethan! Filho! Eu estava ficando preocupada! Eu quase forço seu pai a te levar ao hospital, mas a vó do Benny disse que poderia ajudar a curar você da... Da... Do, do mal estar que você estava tendo!

- Eh sim, mas, Ethan? Você está mais alto ou é impressão minha? E você parece mais forte também – Diz meu pai meio desconfiado

- Ah é a adolescência, você sabe como é hormônios e essas coisas – Diz a avó do Benny, que como sempre, tem a resposta certa pra tudo!

- É... Apesar de não ver direito como você estava porque a vó do Benny não deixou – Ele diz isso estreitando os olhos pra vó do Benny, que parece apenas dar de ombros, e continua – Mas, você parece estar bem melhor... Na verdade até um pouco melhor do que antes de ficar doente... Uhm – Meu pai termina de falar pensativo, com a mão no queixo (Que SUPER clichê!).

Depois que eu como alguma coisa, ou melhor, finjo que como, eu vou até a sala falar com o Benny, agora que não resta mais ninguém aqui além de nós dois.

- Err... Benny me desculpe por ter te assustado. Eu realmente não sei o que deu em mim... (Bom, talvez eu saiba...) – Começo me desculpando antes que ele tenha tempo de falar alguma coisa.

- Não, o que é isso Ethan... Vo-você, você não me assustou nenhum pouco – Tentando parecer másculo, o Benny se levanta e tenta dar um sorriso animador (Claro que ele não consegue nada além de uma cara pálida e um sorriso amarelo).

- Eh, Benny?

- Tá, hunf! Talvez você tenha me assustado, um pouco. Mas, sabe Ethan, aquela hora no seu quarto, não podia ser você!!

- Uhm?

- Em primeiro lugar, você NUNCA falaria com a Sarah daquele jeito, e... E não me assustaria... – a última parte ele diz quase sussurrando – E além do mais! Desde quando você tem uma pose de vampiro-bonitão-se-limpando-do-sangue-da-boca-enquanto-parte-pra-cima-de-mais-uma-presa.

- Uhmm... Tudo isso foi só um adjetivo?

- Ethan!

- Ah, foi mal, tô tendo mais problemas de concentração do que o normal... – Digo meio envergonhado cocando a parte de trás da minha cabeça (nuca) - ...E desde quando você virou o cara sentrado?

- Ah, você ai com esse jeito todo maluco faz até parecer que eu... Ah, Ethan! Esqueçe! O que eu tô querendo dizer é que não podia ser você! Você não mal diz “oi” pra Sarah, como falaria aquelas coisas horríveis pra ela?!

- Primeiro, eu não sou tão tímido e envergonhado assim. Segundo, o que eu falei foi tão horrível assim? E como você sabe? Você não estava lá! Se você estivesse lá, teríamos sentido.

- Ah, foi um feitiço novo – Ele falou e seus olhos brilharam.

- Ah, então esquece – Sabe que parece que não estou dando a mínima pra feitiços neste exato momento?!

- Por falar nisso, Ethan, me desculpe por ter saído correndo, como seu amigo eu devia te ajudar e...

- E como seu amigo eu digo que você fez o certo. Eu estava fora de mim. E, e eu quero que vocês todos saiam de perto de mim quando eu estiver assim, ouviu?

- Mas...

- PORFAVOR BENNY!!

- Ah, tudo bem Ethan... Mas, saiba que eu sempre vou tentar ajuda-lo, e nós vamos achar uma cura pra você!

Concordei com a cabeça enquanto olhava para o chão escondendo minha feição. Eu não queria que o Benny insistisse nesse assunto, por isso que concordei com a cabeça, não queria que ele tentasse encher minha cabeça com falsas esperanças... Não quero que ele fique triste, só porque não existe cura... Só porque... Estou condenado... Pra sempre.