Minha

Uma em um milhão


Flashes e mais flashes. Luzes. Gritos. Inúmeras vozes chamando. Inúmeras pessoas desejando sua atenção, seu sorriso, um olhar, um sinal de que ela os enxergava, de que dedicaria ao menos cinco segundos de seu tempo para acenar em sua direção.

Quinn Fabray caminhava lentamente pelo tapete vermelho do GLAAD. Paparazzos, fotógrafos, impressa e óbvio, fãs, gritavam incessantemente por ela. Quinn sorria e acenava. Essa era a rotina em eventos desse tipo. Sorrir, acenar para os fãs, caminhar lentamente, eventualmente parar, trocar algumas palavras com alguém da impressa, voltar a caminhar, posar para fotos. Nada de muito extraordinário. Na verdade, Quinn preferiria que sua presença chamasse mais atenção para a causa em si, e não para o fato dela estar sem um acompanhante.

'Calma Fabray, sorria. Você está aqui para arrecadar fundos. Isso é o que importa.'

"Hey Quinn, o que você tem a dizer do twitter de Brandon sobre os lances iniciais para o leilão de hoje?" O repórter mantinha um sorriso sarcástico, enquanto aproveitava a proximidade da atriz para berrar a plenos pulmões perguntas capciosas.

'Owwww, per-fe–i–to. Que tal? Ele pode enfiar seus comentários e sua conta do twitter bem fundo, no meio do seu... Arrrrrrrrr ...sorriasorriasorriasorriasorr iasorriasorriasorria.' voltou a pensar Quinn.

Alex Brandon, 24 anos e ator de pontas em pequenos seriados de baixo orçamento, que ao invés de percorrer o longo caminho para a fama, tomou o Expresso Hollywood, galgando os degraus para a glória e sucesso, através de um romance com uma estrela em ascensão.

Quinn caiu nos seus encantos, e na sua lábia, em uma tarde de verão durante o intervalo de uma filmagem. Ele fazia parte da figuração de uma das cenas, ou pelo menos foi história dele na época... Foram necessários 13 meses de relacionamento, uma traição confirmada e a humilhação de descobrir isso atráves das fotos publicadas em todas as revistas e sites de fofoca existentes no mundo. Ah, e ainda a confissão do próprio, deixando bem claro que não precisava mais dela, justamente por já ter usufruído o suficiente. Só então Quinn finalmente enxergou o canalha que ele era.

Três meses haviam passado e a história aparentemente ainda vendia.

'Meu coração em uma bandeja de prata...mais uma vez...'

Ela sorriu.

Um sorriso e mais um pedaço dela que se perdia.

Ela não o amava mais. Disso ela tinha certeza. Mas, doía continuar sendo exposta a crueldade dele.

"Bem, estou me sentindo honrada em participar do evento e espero que todos presentes dividam esse mesmo sentimento. Vamos nos concentrar em como esse tipo de visibilidade pode ajudar com a ruptura de comportamentos arcaicos, o que já em si, uma batalha difícil para a comunidade LGBTQ. Essa não é uma noite para comentários negligentes, estamos aqui para reconhecer o maravilhoso trabalho feito pelo GLAAD e para falar de amor e tolerância. E quem sabe? Pode ser que eu dê sorte, hã?" Ela respondeu com um sorriso encantador que deixou o repórter sem palavras. O que pareceu atiçar um grupo de jornalistas vizinhos, que se adiantaram a esticar microfones na direção da atriz.

Ao constatar a horda de fofoqueiros se aproximando da estrela, Luc, o assistente de Quinn, prontamente se posicionou ao seu lado, conduzindo a atriz para longe dos lobos ainda se degladiando junto ao tapete vermelho, atirando outras tantas perguntas.

"Desculpem, rapazes." Disse ela, se afastando e agradecendo mentalmente a astucia de seu assistente. Ela acenou, sorriu e seguiu o rapaz, finalmente entrando no grande salão que dava acesso ao anfiteatro onde aconteceria o evento.

Deixando-se guiar, Quinn cumprimentou alguns produtores, músicos, outros artistas e celebridades. As respostas vinham em modo automático. Sua mente divagando em pensamentos. O salão lotado pareceu distanciar-se, enquanto a loira se isolava em sua bolha, abafando todas as vozes ao seu redor.

'Por que isso ainda me afeta tanto? Eu definitivamente não o amo mais...então, esse vazio vem de onde? Esse rotulo de que ainda sofro por ele porque ainda estou solteira me sufoca. E isso só me lembra como fui estupida em acreditar em todas as mentiras...como eu quis que ele fosse especial... Porque eu realmente desejei que dessa vez, fosse verdade... Isso é o que ainda dói. E continua a doer e a me corroer profundamente... Uma garota do interior, 23 anos, famosa, chamada de bela (a terceira mais bela de hollywood, segundo a Rolling Stones) e financeira e profissionalmente independente... De que vale isso tudo? '

"Senhorita Fabray?" Luc chamou, tocando seu ombro levemente.

"Desculpe Luc, estava um pouco distraída. Já está na hora?"

Ele ofereceu um sorriso singelo, confirmando. Luc compreendia muito bem as preocupações da atriz, apesar de não ser alvo da mesma escrutínio da mídia, só acompanhar a ferocidade com a qual os jornais e revistas vinham tratando o término do relacionamento da artista, era algo capaz de causar angustia a qualquer alma benevolente. Além disso, ele era uma das pessoas que estava assistindo na primeira fila, como Quinn se isolava cada vez mais, depois de cada rajada de comentários e perguntas desse tipo eram atiradas em sua direção.

"Aqui está seu microfone." Então Luc indicou gentilmente o telepronter. "O TP está funcionando, tem uma sugestão de texto, caso você precise focar em algo."

"Obrigada." Quinn estava realmente grata. Ela avistou o apresentador do leilão pelo canto dos olhos, e o ouviu anunciar seu nome. Era sua deixa. Respirando fundo, ela olhou novamente para Luc e disse em tom de brincadeira "Se por alguma eventualidade ninguém der um lance...será que, por um momento, você poderia esquecer sua orientação sexual e me salvar do vexame?"

"Duvido que isso seja necessário, senhorita." Responde o assistente com uma gargalhada.

Quinn mordeu o lábio e atravessou a coxia, caminhando pelo palco com um sorriso tímido. A plateia começou a aplaudir imediatamente, visivelmente entusiasmada.

George, o apresentador do leilão, se encarregou de "quebrar o gelo" , numa tentativa de deixa-la mais à vontade. Afinal de contas, apresentar-se em um evento para 700 pessoas, leiloando um beijo para caridade não era algo que Quinn fazia com frequência e, infelizmente, o comentário de Alex Bradon parecia um disco arranhado se repetindo em sua mente.

"...é uma pena que o leilão GLAAD desse ano não valha a pena. Nem se os lances iniciais forem de 5 dolares..."

Sim, ela havia lido.

Na verdade, ela recebeu vários torpedos de seus colegas e empresário falando sobre o assunto. Obviamente, Quinn sabia que aquelas eram palavras de uma pessoa cruel e oportunista mas, lá no fundo, ela estava insegura. "E se? E se ele tivesse razão?...e se ela não valesse mesmo a pena?"

"Eu não comi alho. Eu juro..." Quinn brincou com a plateia, enquanto George ressaltava seus atributos.

Os lances começaram em mil dólares e para a surpresa da atriz, alcançaram quase imediatamente a bagatela de 10 mil dólares. Ela tentava acompanhar o interessante jogo de gestos e sinais das pessoas que brigavam por um beijo dela, levantando plaquinhas e aumentando os valores dos lances, mas tudo acontecia em um ritmo tão acelerado que foi muito fácil se confundir. Com o passar dos minutos, um rapaz negro e uma jovem ruiva se destacaram dos demais, subiando os valores em uma acirrada e silenciosa guerra, com trocas de olhares e gestos bruscos. Era estranho ser disputada dessa forma, mas de alguma maneira também era excitante e divertido.

Ela analisou os dois oponentes, o rapaz negro era bonito, estiloso, tinha feições fortes e atraentes, enquanto a ruiva fazia mais a linha executiva chic, também extremamente charmosa. Quinn deu uma gargalhada quando George incitou o público a subir ainda mais os lances dizendo que ela seria indicada ao Oscar esse ano. Um pouco mais tranquila, Quinn estava mais relaxada, rindo das peripecias de George para instigar a rivalidade do par que continuava a erguer as plaquinhas para sinalizar seus lances. E nem mesmo a possibilidade de ter seu primeiro beijo em uma mulher diante de 700 pessoas a abalou. Afinal, se isso fosse algum problema para ela, Quinn não teria aceitado o convite de leiloar um beijo em um evento LGBTQ.

Alguns minutos depois, George fazia chamadas urgindo o público a continuar a subir o último lance de quinze mil e quinhentos dólares. Quinn notou o jovem rapaz negro inflar o peito, já se levantando da cadeira. George deu inicio a contagem final do que aparentemente seria o lance que encerraria o leilão. Mas antes que ele concluisse a última chamada, exatamente no último instante, uma voz feminina autoritária, e um tanto prepotente, anunciou em alto e bom som.

"UM MILHÃO DE DÓLARES."

O salão ficou em silêncio.

Alguns segundos se passaram até que George reagiu.

"O lance... foi... de... 1 milhão...?"

"Exato. Eu disse, um milhão de dólares." Repetiu a pequena morena que finalmente se fazia notar por entre os presentes.

E Quinn pode distingui-la por entre o mar de rostos estupefados. A loira assistiu a morena caminhar decidida em direção a frente do palco. Ela era pequena (realmente pequena ao julgar pela altura do salto), no entanto, sua presença mantinha cativo todo o salão. Os olhos castalhos cor de chocolate eram brilhantes e desafiadores, seus passos eram firmes, de postura decidida e conferiam a ela um ar sensual, e... intenso. Ela possuía um tipo de beleza diferente, não era uma fisionomia comum, ou clássica...era incompreensivelmente atraente.

Era o tipo de beleza que marcava, e Quinn não conseguia tirar os olhos dela.

A atriz não a reconhecia de nenhum lugar, mas percebeu que alguns dos presentes cochichavam e apontavam. A morena parou na frente do palco e ergueu uma sobrancelha questionadora para George. O homem engoliu seco e anunciou.

"VENDIDO! PARA ESSA BELA E DETERMINADA DAMA PELA QUANTIA MEMORÁVEL DE UM MILHÃO DE DÓLARES!"

O coração de Quinn pulou uma batida quando notou um pequeno sorriso brotar no canto dos lábios da mulher que inevitavelmente ela beijaria.