Capítulo Único

Minha

Ele caminhava por um jardim. Ao sue lado sua amada lhe sorria e segurava sua mão. Havia muitas flores e a noite era fresca e estrelada.

Não conversavam, porém estavam felizes assim. Respeitavam o silêncio um do outro. Pássaros noturnos piavam e o local fervilhava, cheio de vida.

Até que um doce aroma de chocolate se fez sentir. Os pássaros pararam de cantar, uma nuvem obscureceu a lua e a mão que estava na sua se engrossou, perdendo a delicadeza e passando a ser fria e viscosa. Olhou para aquela mão que saia de um manto preto em farrapos. O feiticeiro.

Tentou soltar sua mão da dele, mas ele a agarrava, enquanto lhe dava um sorriso maligno. Olhou então a sua volta, mas já não havia flores. Tudo havia sido sufocado pela hera. Sem flores, sem música, sem amor. Apenas a escuridão e o aroma, tão doce e tão amargo.

Então ele viu cada um de seus irmãos aparecerem. Apenas para se deterem e empalidecerem, até se transformarem em estátuas. A hera subia e se enrolava neles, até que não houvesse mais corpo ou feições. Apenas a hera e o aroma tão querido, tão tentador, tão maligno, tão amaldiçoado.

Sentiu que já não conseguia caminhar; olhou para baixo e viu que a hera já se emaranhava neles, subindo para sufocá-lo, o aprisionar, e o único cheiro que ele sentia era o que ele mais queria. O que ele menos queria.

Até que ele ouviu aquela voz. Uma voz toda lavanda e dourado.

Abriu os olhos de repente. Não estava em um jardim. Estava deitado. E sua amada estava ao seu lado, lhe despertando, acariciando seus longos e multicoloridos cabelos. Respirou fundo. Apenas o cheiro dela.

Olhou profundamente em seus lhos e ela, como sempre, pareceu saber exatamente o que ele estava pensando. Saber o que Le necessitava. Pois ela era sua necessidade, seu remédio, sua cura. A jardineira mais encantadora, aquela que tirou a hera e trouxe calor e vida para seu coração petrificado.

Beijou-a apaixonadamente e, como que por reflexo, a tomou nos braços a girando, aprisionando-a com seu corpo. Pois ele precisava dela mais do que tudo. Beijou-a, tocou-a, amou-a. E em sua mente a única voz que retumbava era a de seu coração. De sua alma. Da essência de seu ser. Dizendo uma única palavra: MINHA.