Meu estranho amor

Ventos mudam, sentimentos também


Regina se levanta tarde e liga seu computador. Mesmo depois de uma semana do evento beneficente, muitas pessoas ainda visitavam seu perfil na rede social e deixavam comentários e algumas pessoas perguntavam por qual motivo ela não se casava com o policial de calça justa. Quanta curiosidade! E que atenção na calça do homem!

Seu celular toca e ela vê o nome de Zelena no visor. Por longos minutos, Regina ouve as narrativas e reclamações da irmã, falando sobre o comportamento lunático de Mary grávida e sobre as mais novas aventuras de Charlote em sua viagem para a Grécia, ao lado de um guia grego e jovem, indicado por Killian.

Quando finalmente o telefonema termina, Regina vai lavar o rosto e começar o ritual de hidratação da pele. Não poderia descuidar da beleza, caso quisesse retornar ao mercado de trabalho em breve. Aquele telefonema havia exaurido suas forças e precisaria de uma caneca com café forte e quente.

— Ah! Quem tem uma família normal, poderia levantar o dedo? – ela pergunta olhando-se no espelho. Subitamente, algo grita dentro de sua cabeça e uma luz é acesa diante de seus olhos.

Sim! Era aquilo! Exceto pelos iglus, as casas sempre possuíam outra saída! Aquilo seria a saída para sua atual situação! Corre de volta para seu computador e inicia um novo documento, cujo título era a mesma pergunta feita para si mesma, diante do espelho.

E o tempo continua, assim como a dedicação de Regina para a produção daquele curioso trabalho. Uma tentativa de reorganizar suas atividades, e de deixar o passado em algum lugar que não a incomodasse em todos os dias de sua vida.

Vou ficar em casa, escrever, reescrever e decidir o que fazer com o resultado de tudo. Nossa! Já se passaram três semanas e eu escondida aqui em meu apartamento!

Filha, aqui é a mamãe! Estou na capital e gostaria de jantar com você. Sua irmã vai ter um menino e vimos no ultrassom. Poderia me ligar?”

“Olá, Regina! É o Killian e vou passar aí para pegar suas roupas para levar para a lavanderia. Estou levando seu almoço!”

“Regina, aqui é Zelena. Quer me acompanhar a um leilão? Soube que vários empresários solteiros estarão lá (risos). Sabia que Charlotte se casou com o guia grego e que está na Austrália, agora, para surfar? Ligue para mim!”

“Srta Mills. Sou a Dra. Swan e quero agradecer mais uma vez pelo seu apoio. Liguei para informar que mais animais foram adotados e que recebemos uma doação vultosa de uma pessoa que disse ter estudado com você. Obrigada mais uma vez!”

“Regina, sou eu, Amintas. Gostaria de jantar comigo esta noite?”

Esse último telefonema valeria a pena responder. Ela retorna e aceita o convite, decidindo espairecer um pouco e divertir-se para conseguir mais inspiração para sua experiência literária.

Quando ela chega à portaria de seu prédio, encontra-se com Amintas encostado em seu próprio carro. Ele sorri e caminha até Regina. Trocam um beijo amistoso, no rosto.

— Você está linda!

— Faz tempo que não uso este vestido estampado. Queria saber se ele ainda caberia em mim. – ela abre os braços e rodopia.

— Exagerada. – ele entrega um envelope, logo pego por Regina. – Por favor, leia.

— “Caríssimos Sr. Amintas blá,blá, blá, a Corregedoria da Polícia serve-se deste para ressaltar nossa profunda admiração pelos resultados de sua dedicação ao serviço público e pretende escusar-se pelo julgamento injusto cometido diante da sugestão de seu nome para o cargo comissionado...blá, blá,blá e gostaria de reapresentar o convite para que o senhor faça parte do quadro de funcionários em nossa equipe.” – Regina termina de ler a carta e sem pedir licença, salta num abraço no policial.

Hummm! Peito com peito, braços em torno do pescoço forte dele, mãos dele em torno da cintura fina dela, pele macia dela na pele barbada dele...isso era perigoso demais!

— Desculpe-me...- ela sorri e devolve a carta. – Você irá aceitar, certo?

— Sim! Trabalhando mais algum tempo na Corregedoria, poderei ter uma aposentadoria maior.

Regina mantém o sorriso bobo em seu rosto. Agarra o braço do homem e o acompanha para seu veículo.

Horas mais tarde, o casal retorna para o prédio. Amintas se despede ali mesmo na portaria, mas não se afasta porque ouve seu nome ser chamado por Regina.

— Suba até meu apartamento, quero lhe mostrar algo interessante.

— Regina!

— É algo sério! – ela gargalha, - Tenho um trabalho e quero que veja!

Lá dentro do apartamento, Amintas é apresentado a alguns trechos do trabalho que Regina estava realizando. Ele se senta e começa a ler, rindo de quando em quando, mostrando-se surpreso em outras vezes e maneando negativamente com a cabeça, momentos outros.

— O que pretende fazer com isso? – ele pergunta e Regina responde qualquer coisa. Estava noutro cômodo e ele não entende a resposta. Levanta-se e segue até lá. – Vai publicar esses textos em um livro ou em capítulos?

Ele chega ao cômodo onde Regina estava e a encontra guardando um par de tênis numa caixa. Ela o olha por cima do ombro e sorri.

— Quando eu terminar, quero pedir a uma amiga para revisar, retirar os excessos, fazer as correções e juntas iremos decidir o que fazer.

— É hilário, sobretudo, ao saber que tudo é real.

Regina se aproxima do policial e delicadamente toca a gola da camiseta que ele usava. Fica na ponta dos pés e aproxima o rosto ao rosto dele.

— Eu mudei o cenário do condomínio gay, para uma comunidade oriental. Obviamente que não citarei os nomes reais e terei de pedir permissão para publicar as participações. – da gola da camiseta, Regina conduz os dedos para a pele do pescoço de Amintas.

O olhar aquilino do policial rapidamente localiza o painel protegido com a echarpe e aquilo causa estranheza como decoração. Ao mergulhar na escuridão dos olhos de Regina, encontra o brilho da desconfiança, quando ela fita rapidamente o painel protegido. Curioso por profissão, o policial ergue a echarpe e começa a rir. Ergue as mãos espalmadas no ar e caminha para fora do cômodo.

— Tanto tempo depois e você continua idolatrando o homem de sua irmã.

— Eu me esqueci de jogar fora...- ela dá de ombro.

— Você não quer jogar fora. Enquanto Mary não se casar, você ainda nutre a esperança de que David volte para seus braços.

Cínica, Regina não nega. Aproxima-se do homem e massageia os ombros dele.

— Enquanto a situação não se decide para você e eu, poderíamos ocupar nossos momentos solitários...

Amintas emite alguns muxoxos e caminha para a direção da porta.

— Preciso saber o que esse David usa no banho. Duas irmãs perdidamente apaixonadas por ele, enquanto querem utilizar meu corpo como estepe. Desculpe-me, mas eu quero muito mais do que substituir o pneu novo furado.

Mais algumas semanas são deixadas para trás. Regina e Killian organizavam a mesa para o desjejum, quando o telefone soa. Colocando em viva-voz, ela se senta e começa a alimentar-se.

— Por falar, Isabelle. Você está em viva-voz e meu amigo Killian está aqui comigo.

— Olá, moça! Quer comprar um carro?

“Bom dia para os dois! E não quero um carro, mas se souber de alguém que queira, peço para falar com você. Preciso falar sobre o texto.”

— O que você avaliou?

Eu adorei, Regina! É um texto muito bem escrito e nada prolixo. Uma comédia romântica que dará certo!”

— Regina é maravilhosa! Tudo o que é tocado pelas mãos dela faz sucesso ou cresce!

“Imagino que sim. Mas você precisa decidir quais dos dois finais deveremos publicar.”

Killian e Regina se entreolham. O homem estreita as sobrancelhas grossas, sem entender.

— Sua história tem dois finais? Quais são os finais? Eu não conheço!

No primeiro, a jovem tem o bebê e decide ficar com o pai da criança. O noivo abandonado procura a cunhada e ficaria subtendido que os dois terminam juntos. A cena do casal caminhando pela praia é lindamente descrita!”

Maneando negativamente a cabeça, Killian repudia a ideia.

— E o segundo final?

“O casal que se ama também não fica junto. O pai do bebê vai morar na casa com eles e ainda começa uma aproximação da escritora apaixonada.”

— Achei uma porcaria! A mãe do bebê deveria ficar com o amigo que vende drogas, o policial se casa com o noivo abandonado e a escritora apaixonada entra para as FARC!

Regina começa a rir.

— Vou criar outro final. Ouvindo você descrevê-los, percebi que não os finais não são bons.

— Não são mesmo! Muito melado escorrendo, açúcar cristalizado, mel de jataí...dá repugnância. – Killian se levanta, beija o alto da cabeça de Regina e vai para a porta. – Tenho cachorrinhos para cuidar e outros para resgatar. Adeus, moças!

A ligação termina, Killian sai da sala e fecha a porta, deixando Regina sozinha com seus pensamentos.

Estava cada vez mais próximo à vida e ao coração de Regina. Era o irmão que sempre havia sonhado em ter: protetor, autêntico, divertido e inteligente. E tudo viera no pacote, quando os dois se conheceram na agência bancária. A vida produz encontros inusitados, que não aconteceria se o cotidiano fosse sempre o mesmo.

O interfone é acionado e atrai a atenção de Regina.

— Quem é?

“Sou eu, Killian de novo! Eu me esqueci de dar uma notícia sobre Amintas.”

— O que houve com ele?

“Há alguns dias, o Senador Gold esteve na casa de meu pai e nos disse que o chefe da equipe de segurança dele, havia sido afastado por envolvimento com tráfico. E agora, ele quer um profissional ilibado e com histórico impecável para ocupar a vaga.”

— Sim, e daí? Você não sabe nada além de criar e vender “subsídios naturais”. Quer ser segurança? – Regina ironiza e ri.

“Não mesmo. Mas indiquei o nome de Amintas e pelo que entendi ontem durante uma conversa, nosso amigo vai aceitar o convite e vai mudar-se para a Capital Federal. Então, sugiro que você vá vê-lo na Corregedoria. Câmbio e desligo!”

E ela vai mesmo! Regina se acomoda numa poltrona naquele imenso saguão e assim que apanha uma revista, ouve seu nome ser pronunciado por uma voz conhecida. Ela se levanta e observa Amintas caminhar apressadamente na sua direção, elegante e sexy dentro de um terno escuro.

— Vim tão logo me disseram que você havia chegado! O que houve? – ele indica a poltrona e os dois sentam-se.

— Killian me disse que você pretende aceitar o cargo de chefe da equipe de segurança do Senador Gold!

— Meu nome foi indicado, sei que fui investigado e o Senador gostou do resultado. Conversamos e é quase certo que serei transferido.

— Mas...mas e seu bebê? Mary dará à luz em pouco tempo!

Amintas sorri e acentua seus traços da idade. Como era bonito e simples! Regina sente vontade de acariciar aquele rosto cuidadosamente barbado.

— A distância entre a Capital e a nossa cidade, não é grande. Viajando de avião, gastarei cerca de quarenta minutos ou uma hora, apenas. Além disso, não quero interferir tanto na vida de Mary e David. Não quero interferir ainda mais no casamento e...

— Mas eles ainda não se casaram! – Regina se altera, porém percebe que falou rápido demais.

O rosto de Amintas se tranca e é coberto por um véu de raiva e indignação. Ele se levanta bruscamente e esconde as mãos nos bolsos da calça. De novo essa reação? Ela ainda continuava nutrindo aquela paixão platônica por David?

— Você ainda não percebeu que estou plenamente apaixonado? Não consegue sentir o que meu corpo emana quando estamos pertos? Está tão encegueirada pelo que pensa sentir por David, que fecha todas as possibilidades à sua volta. Estou apaixonado por você, Regina Mills!

As pessoas que passavam em volta, olham sorridentes para o policial, contentes com a coragem dele. Exceto Regina que se esquece de entusiasmar-se com a declaração.

— Lamento, mas David ainda mexe comigo...

Ele assente com um movimento de cabeça. Mas que azar! Tem gente que nasce para não ter sucesso no amor! Ser eterno estepe para as irmãs Mills?

— Deixe seu crachá na portaria e apanhe seu documento, Regina, quando sair. Saiba que deixarei seu nome da lista de proibidos para visitações, enquanto eu estiver aqui. Ah, caso cite alguma informação oferecida por Killian e que conste em relatórios policiais, mandarei prender sua editora e você. Boa tarde!