As pessoas passavam apressadas em diversas direções, esbarrando umas nas outras com inaudíveis pedidos desculpas sendo proferidos a torto e a direito. Era como um mar de corpos que sabia para onde ir, quando andar e quando parar. Era um caos ordenado que somente as grandes metrópoles conseguiam ter. Quem não fizesse parte destoaria do ritmo, chegando a sentir-se claustrofóbico.

Passos largos e rápidos. Olhar atento a carros e outros veículos que surgiam do nada usando aquela via como rota alternativa. A tentativa de sair daquela cidade só não era superada pela curiosidade de como alguém conseguia viver naquele ritmo. Eram apenas sete da manhã e parecia que a cidade inteira já estava de pé trabalhando a horas.

Mas, diante a todos os incidentes que ocorreram em Saffron, com uma semana já era hora das coisas voltarem ao normal. Uma manhã ensolarada de segunda feira parecia ser a opção perfeita para a rotina recomeçar e as pessoas tocarem suas vidas, neste caso os que não eram da cidade também tinham que voltar a suas rotinas de jornadas.

— Pensei que não ia mais aparecer! -

A voz surpreendeu Mirian que acaba de alcançar a saída da cidade. Olhou para o lado já esperando ver as roupas escuras de couro e olhos quase brancos mostrando um Q doentio e enlouquecido em alguma posição relaxada. Encostado no portal da cidade, com mochila de viagens aos pés o interlocutor sorriu de forma debochada ao perceber que Mirian já havia feito contato visual com ele.

— O que está fazendo aqui, Aries? - Questionou Mirian parando ao lado dele.

— Sério? - O rapaz deu uma risada debochada e colocou a mochila nas costas e fez sinal para seguirem. - Você exibe Farfetch’d, um pokémon de milhões, no meio de uma das maiores metrópoles de Kanto e acha que ninguém do Grupo Olimpo viria para conter suas idiotices? -

Aries olhou para o lado, buscando a cara engraçada de emburrada ou confusa que Mirian faria naquele momento, mas não a identificou do lado direito. Virou-se para o lado esquerdo sem conseguir encontrá-la e parou de imediato sua caminhada olhando para trás, identificando-a indo por uma pequena estrada e não pela principal.

— Eu queria saber o que estava fazendo parado no portal. - Disse Mirian se afastando. - Estava me esperando? - Ela de repente parou de andar percebendo que era aquilo que Aries estaria a fazer.

— Sim! Não pode viajar sozinha! - Aries disse como se aquilo fosse alguma novidade. - Espero que seu próximo destino seja menos perigoso. Ande logo! - Aries fez um gesto para que ela começasse a andar, seguindo-o. Mas, ela permaneceu parada. - O que foi? -

As vezes Aries deixa tudo tão complicado. Ele não podia simplesmente dizer isso desde o início sem parecer querer me insultar? Não pode ser tão divertido me diminuir. Mirian suspirou enquanto tentava entender Aries.

— Estou indo para Celadon. A rodoviária já voltou a funcionar e fica pra lá. - Mirian apontou na direção que a estradinha que ela havia tomado anteriormente. - Preciso estar lá pela manhã. -

— E eu com isso? - Questionou Aries com os olhos faiscando.

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Meu nome é Mirian Miller e me tornei uma Coordenadora Pokémon para conquistar uma taça em homenagem a minha mãe. No entanto, fui tão mal no início que acabei presa acusada de ser caçadora ilegal e falsificadora. Depois de sair da prisão, retomei minha jornada para descobrir as pessoas que armaram para que eu fosse presa.

As coisas não estão fáceis. Estive no meio de um pseudo atentado terrorista em Saffron e enquanto me recuperava deixaram minha personalidade e capacidades em cheque.

Por que uma coordenadora vive esse tipo de coisa?

Mente de Coordenadora Pokémon
Episódio 16: Orgulho

— Absurdo! - Berrava Aries. - Você está mais lenta do que quando começou sua jornada! E olha que naquela época você estava machucada! -

A caminhada até Celadon demoraria 3 dias, as vezes poderia levar 2 se não se importassem de cortar pelo meio de florestas e dedicassem horas a mais de caminhada nos dois dias. A caminhada não era difícil, especialmente por ser uma rota bem utilizada e por isso vivia sofrendo manutenção para facilitar a vida dos viajantes. Com copas de árvores ladeando ao menos um dos lados da estrada, oferecendo sombra por muitos momentos, era comum até achar algumas clareiras se adentra-se a floresta. Mas, aquele não era o caminho que Aries e Mirian estavam fazendo.

— Naquela época eu não andava amarrada. -

Um resmungo mais parecido com algo que era dito para não ser ouvido. Mas, isso não impediu de um novo puxão da corda em suas mãos para que ela andasse mais rápido.

Após cinco minutos de discussão com Aries sobre irem de ônibus para Celadon ou não, ela simplesmente virou as costas para ele indo em direção a rodoviária, antes que perdesse a saída do veículo. Dois passos e viu o mundo escurecer. Quando recobrou os sentidos estava amarrada pelas mãos embaixo de uma árvore e não via sinal da cidade. Aries estava encostado em outra árvore mexendo com um pokémon planta que Mirian nunca havia visto, mas tinha certeza, fora ele que a colocou para dormir.

Duas horas depois, ainda não sabia o quanto faltava para Celadon ou mesmo se realmente estavam indo em direção a cidade. Mas, ela preferiu silenciar-se por todo o caminho, até aquele momento onde ele começara a puxar a corda a ponto de sentir dor em seus pulsos.

— Suas mãos estão amarradas e não suas pernas. - Ele balançou a cabeça contrariado.

— A quanto estamos do ponto de ônibus mais próximo? -

Só havia árvores e mais árvores em volta. Não havia exatamente um caminho, mas parecia uma trilha que era pouco usada. Felizmente não era uma mata, ou Mirian já teria se arranhado toda, já que para viajar havia colocado uma sapatilha, calça jeans de um azul-claro e uma blusa cinza de botões com alguns franzidos.

Aries revirou os olhos ao sentir que Mirian havia parado novamente. Pensou em dar um novo puxão na corda, mas virou-se para fazê-lo para praguejar com ela e acabou por desistir, ao perceber que a expressão dela estava diferente da que conhecia.

— Vamos andando para Celadon. Ônibus não é uma opção. - Disse Aries após suspirar. - Será que ainda não compreendeu isso? Treinadores não ficam pegando condução de um lado para o outro. -

— Eu pareço uma treinadora para você? - Questionou Mirian. - Por sinal, porque temos que ir andando? Você só gritou um bando de coisa sem sentido até agora. Está tão irritado como as vésperas da minha entrevista em Pewter. -

Mirian parou de falar por alguns instantes com a lembrança. Em Pewter ficaram na casa de Beta por vários dias, lembrar da nutricionista era complicado. Por sinal, lembrava-se que de alguma forma Beta e Aries acabaram tornando-se amigos após muitas brigas.

— Isso é pela morte de Beta? Não está conseguindo lidar com as coisas ainda? - Questionou Mirian olhando para o rapaz que voltava a ser seu companheiro de viagens, mas como antes eles não conseguiam se entender tão bem.

— Morte de Beta? - Aries franziu o cenho. - Acha mesmo que depois de perder meu pai e minha mãe para doenças que os consumiam em dor e sofrimento eu ficaria mal e puto por causa da morte de mais alguém? -

Isso que eu mereço por ser gentil e achar que ele pode ter sentimentos. Mirian resmungou mentalmente, mas percebeu que ele voltou a andar.

Aries tentou voltar a andar e tentou puxar a corda, mas Mirian foi mais rápida e puxou a corda fazendo ele perder a ponta que estava segurando. Surpreso Aries virou-se e passou a encará-la.

— Parece que seu período na prisão te fez bem. - Disse Aries caminhando até ela e parando com os olhos faiscando.

Mirian engoliu um seco naquele momento e sentiu o corpo arrepiar de medo. Aqueles olhos quase brancos e doentios sempre passavam a ideia de que ele estava pensando em alguma coisa maluca e louca para fazer, mas quando os olhos pareciam faiscar era certo de que ele estava pronto para entrar numa briga e nada do que Mirian fizesse ou falasse dissuadia ele disso.

Parado diante dela ele levou as mãos na corda e desamarrou-a recolhendo a corda e virando-se para recolocá-la na mochila, deixando Mirian perplexa.

— Vai me soltar? - Mirian ficou parada olhando aquilo sem entender. - Por que? -

— Eu te amarrei para facilitar te carregar até aquele ponto onde acordou. Você não pediu para que eu te desamarrasse, então permanecemos assim. - Comentou Aries pronto para voltar a andar – Vamos andando! –

— Não até me dizer por que faz tanta questão de irmos a pé. - Mirian cruzou os braços. - Desde o início era você me apoiar a me tornar uma coordenadora melhor, mas não me obrigando a fazer nada. Era o contrato, que pelo que sei já foi honrado por outra pessoa. Então a não ser que me explique o porquê, não vou seguir com você. -

— Faça como quiser! -

Aries disse sem se virar para ela e permaneceu andando até desaparecer depois das árvores. Mirian ficou parada ali ainda mais alguns instantes e olhou em volta irritada.

— Depois eu que sou a idiota! - Resmungou começando a correr. - Me espera! -

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— Está anoitecendo. - Disse Mirian desanimada. - Você é um grandessíssimo idiota! -

Aries ignorou a menina. Caminharam sem parar durante o dia todo. A refeição foi feita em pouco menos de dez minutos o que fez Mirian colocar tudo para fora nos dez minutos seguintes.

— É sério! Preciso descansar! - Mirian disse parando e começando a se sentar. - Se for... Uau! -

Mirian estava sem folego e energia para continuar. Sentou-se na primeira pedra que viu e pretendia ficar ali por pelo menos dez minutos, isso se não identificasse que ali era um bom local para pernoitar.

No entanto, assim que sentou e olhou em volta identificou uma torre de vigilância. A estrutura era enorme em comprimento e altura. Construída com grandes toras de madeira, devido a penumbra não poderia precisar se havia cordas, encaixes ou parafusos a prender a estrutura. Iluminada por algumas lâmpadas que ladeavam uma escada de madeira a altura da torre parecia incerta.

— A primeira vez que vi uma dessas fiquei admirado. - Aries disse olhando para cima. - É uma subida um pouco puxada para fazer com a mochila nas costas, mas aquela corda pendurada ali será sua corda de segurança. Basta passá-la pela sua cintura. -

Mirian assentiu com a cabeça entendendo que passariam a noite ali, mas levantou-se apressada ao ver que Aries caminhava em direção a floresta. Em um salto agarrou-o mochila do rapaz, puxando-o para trás com o máximo de força que conseguia.

Um solavanco e dois passos para trás para recuperar o equilíbrio. Aries apenas girou o pescoço para encarar Mirian demonstrando um certo tédio, que talvez fosse das reclamações das últimas horas.

— Não sabe fazer o nó? -

A pergunta saiu até bem casual fazendo Mirian pensar que a hostilidade talvez tivesse acabado. No entanto, seria apenas por parte dele já que ela estava onde não queria.

— Onde pensa que iria? -

— Penso e vou caçar. - Diz Aries. - Lembra-se, caçador legalizado. -

— Você queria vir andando por fora da rota para caçar? - Mirian encarou-o incrédula. - Por que me trouxe para cá? - Mirian de repente deu vazão a sua raiva. - Se estivesse indo não levaria a mochila pois cortaria sua mobilidade e os passos furtivos. Você fez questão de me trazer junto ao invés de apenas me orientar, deixar eu ir de ônibus e me encontrar em Celadon depois. Logo, queria que eu estivesse aqui essa noite. Ainda há um por menor, você me esperou na porta da cidade com toda a paciência do mundo como se estivesse caçando um pokémon, você normalmente iria me tirar da cama no ginásio. - Mirian parou por alguns instantes. - Por que me trouxe para cá? -

— Você vai passar o restante da noite me aporrinhando com isso, né? -

Aries questionou Mirian que apenas confirmou com a cabeça. Ele bufou retirando a mochila das costas e pegando uma pokebola da qual liberou um Skarmory. Mirian saltou para trás ao ver o pokemon. Era uma ave metálica com cara de furiosa, mas aparentemente ela lembrava-se de já tê-la visto. Mas, em meio a penumbra e a certeza que no dia que a viu estava apavorada, talvez fosse outra ave.

— Leve nossas mochilas para o topo e não cause muito estardalhaço se houver alguma outra ave por lá. - Disse Aries que recebeu um “Mor” de resposta.

Mirian retirou a mochila das costas estendendo para ave metálica que subiu com as duas, seguras pelas garras, tão rápido que nem parecia carregar nada. Parecia ser ainda mais alto olhando para cima daquela maneira e Mirian já se preocupava com a subida.

— Por que queria ir de ônibus? -

Mirian olhou para Aries incrédula com a pergunta. Pensou em retrucar que ela havia perguntado primeiro, mas sabia que não levaria a nada além de iniciar uma briga estilo criança que ela não venceria.

— A maioria dos treinadores viaja a pé, mas a maioria coordenadores viaja usando meios de transporte. - Mirian levantou um dedo. - Devido a tudo que aconteceu não me senti segura de sair da cidade caminhando, afinal naquela bagunça toda eu cravei um alvo nas minhas costas por conta do Farfetch’d. - Mirian levantou um segundo dedo. - Para vir caminhando eu passaria pela floresta e não se deve fazer isso sem pokémon, eu até estou com a Audino, mas ela se recusa a sair da pokebola. Então é o mesmo que está sem pokémon. - Mirian levantou um terceiro dedo. - O tempo de Safron a Celadon é 3 dias, mas eu sei que sou lenta na caminhada e acabaria levando cinco dias ou até seis. - Um quarto dedo foi levantado. - Quando apareceu querendo ir a pé eu já havia decidido ir de ônibus, então não tinha suprimentos ou estava vestida para caminhar por dias. - Um quinto dedo foi levantado e agora a mão estava espalmada, mas Mirian parou percebendo que Aries fazia uma cara de espanto. - O que foi? -

— Estou surpreso que levou em consideração tudo isso para decidir ir de ônibus. - Ele parecia realmente surpreso. - Achei que estava querendo chegar a Celadon hoje por algum motivo idiota específico. –

— É específico e trata-se do meu sonho! - Mirian bufuo. - E não chame meu sonho de idiota! - Ela apontou um dedo para ele com certa agressividade. - Eu agora também sou escritora! Tinha um café da manhã para promover meu livro amanhã pela manhã! - Mirian disse por fim, parecendo querer se acalmar. - Agora eu vou perder a oportunidade de promover meu livro, posso ficar com a imagem negativa com os leitores e pessoas importantes de Celadon, além do meu Editor certamente me passar um sermão e até mesmo me multar. - Mirian suspirou e fez um gesto para Aries indicando que era a vez dele. - Sua vez! Por que queria vir andando? - Precisou reforçar ao ver que ele não dera muita bola.

Aries abriu um sorriso quase diabólico, mas Mirian não se assustou com aquilo.

— Eu poderia enumerar os vários motivos para você, de se preparar para vencer Dark Mau a aprender a capturar de verdade, mas vou ficar apenas com o motivo pessoal. - Disse Aries.

— Motivo pessoal? - Mirian ficara surpresa quanto ao fato de que aquilo seria uma espécie de preparação. - Que motivo pessoal teria para me arrastar para o meio de uma floresta? -

— Fazer você perder a promoção de seu livro para aprender a não me pôr em histórias patéticas sem permissão! -

Mirian ficou parada processando a informação. Aries esperava alguma reação, mas a menina pareceu ter ficado desligada e mesmo ele sacudindo as mãos na frente dela ela parecia não reagir. Revirou os olhos desapontado com a situação e foi até a escada começando a subir. Não subiu três degraus até sentir algo envolver seu pescoço e começar a apertá-lo.

Tentou rapidamente identificar o que era, mas ao perceber que se trava da corda de segurança e que mãos puxavam cada lado da corda tentando enforcá-lo quase parou de lutar, surpreso com o ocorrido.

— Repete! Repete que fez isso de propósito! -

A voz de Mirian estava alta e tão descontrolada quanto ela mesma a tentar enforcar Aries com a corda. Foi num lampejo em que ela acordou para a realidade, viu Aries começando a subir as escadas e então ela saltou para agarrá-lo e viu que a corda talvez fosse mais eficiente do que seus pobres punhos e braços sem músculos.

Aries devido ao momento de ter ficado sem reação com a surpresa de Mirian ter atacado-o daquela forma acabou caindo da escada e agora estava sentado no chão tendo Mirian usando a escada como apoio para aumenta a força do aperto.

Se tivesse sido apenas agarrado, jogado no chão e golpeado diversas vezes, provavelmente teria uma crise de gargalhadas. Mas, a verdade era que Mirian havia o surpreendido pra valer e o susto estava demorando para passar e permiti-lo reagir.

— Repete! Repete! Ficou sem falas seu… -

A escuridão da noite já havia tomado conta e a fraca luz que ladeava a escada não permitia que tivessem a visão do que estava acontecendo. No entanto, nenhum deles parecia prestar atenção em nada. Já que Mirian estava descontrolada de raiva e Aries estava sufocando

— Apesar de querer ver onde isso iria para, preciso que parem antes que algum pokémon incomodado com a barulheira venha tirar satisfação com vocês. -

Mirian parou arrepiada. A voz estava exatamente no seu ouvido, e podia até sentir o hálito da voz masculina. Olhou para o lado assustada e viu um rapaz de olhos castanhos, cabelos pretos quase que escondidos por chapéu de caubói parado junto a ela.

Suas mãos afrouxaram-se saltando a corda que escorregara pelo pescoço de Aries. O jovem Olimpo por sua vez caiu completamente no chão puxando o ar profundamente e passando a mão no pescoço, começando a ficar cada vez mais irritado.

—Eu vou matar você, sua maluca! - Berrou Aries levantando-se com os olhos faiscando.

— Poupe-me dessa conversa fiada que você não duraria cinco minutos na prisão a julgar que não conseguiu dar conta desta franguinha. - A voz zombava de Aries como se tudo fosse casual e divertido.

— Que espécie de ranger é você que vai proteger uma criminosa? - Questionou Aries.

— Do tipo que adora ver o irmão menor se dar mal. -

— O que? - Mirian arregalou os olhos e olhou de um para o outro saber se o que acabara de escutar era verdade. - Você também é um Olimpo? -

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As vezes é melhor você se calar quando as coisas começam a ficar confusas até você começar a se acalmar, compreender o que estava acontecendo e talvez a situação começar a se explicar sozinha.

Irritada, mais do que gostaria, a opção de Mirian era se calar e esperar que tudo se revelasse para ela. Até porque, mesmo após o susto de um suposto irmão de Aries surgir, ela ainda queria esganar o seu parceiro de viagem por prejudicar, propositalmente, sua carreira de escritora.

Além disso, precisava rever tudo o que se lembrava da família Olimpo, especialmente os irmãos. Já que aquele Ranger Pokémon dizia ser irmão de Aries e pelo que ela se lembrava, eram sete irmãos sendo um caçador, o próprio Aries, um treinador pokémon que nesse caso era Angel, um Pesquisador Pokémon, um Advogado, um engenheiro, um médico e um último que ela não lembrava o que era, mas achava não ter haver com a carreira policial.

A noite terminou de cair após uma subida relativamente longa. Uma espécie de casa construída de um único com banheiro aguardava-os no topo. Não havia nada indicando o que aquilo seria. Mas, com alguns aparelhos de observação espalhados e cartazes sobre a diversidade local, Mirian decidiu que ali seria uma espécie de posto de observação, na ausência de qualquer identificação de ser uma base ranger.

Foram apenas dez minutos após a subida e Aries resolveu ir a sua caçada, montado em seu Skarmory, não antes de deixar um olhar gelado Mirian, como uma ameaça velada de que aquilo teria volta.

— Já pode relaxar e sair deste cantinho. -

A voz do Ranger propagou-se pelo local ao mesmo tempo em que Aries e sua ave sumiam na escuridão da noite. O ranger virou-se para a jovem Miller, encarando-a encolhida e agarrada a uma vida de sustentação do pequeno complexo erguido no posto de observação.

— Acredite, se eu der mole ele vai me jogar aqui de cima. - Comentou Mirian. - Ele é louco o suficiente para isso. -

— Acredite, ele te jogaria aqui de cima, com você lá no chão. - Ele pareceu rir como se aquilo fosse uma piada, mas Mirian bem sabia que Aries realmente faria isso. - Tem uma sopa no fogão, imagino que ele tenha te feito vomitar o almoço e prepare-se, estamos bem alto, vai ser uma noite fria. -

Mirian pareceu relaxar os músculos por alguns instantes. Percebeu uma Eevee aninhado em um canto do local e um Persian em outra ponta, aparentemente dormindo a muito mais tempo do que deveriam. Levantou-se e caminhou até o fogão e sentiu o vento frio que o ranger falava. Serviu-se em um prato próximo com colher que havia ali e não se incomodou em agradecer ou dizer que estava saborosa. Assustada era mais do que o suficiente para esquecer qualquer coisa, menos retirar de dentro de si a irritação.

— Não se preocupe, aqui é seguro! A estrutura sobrevive a uns três ataques fortes de Dragnite. - O ranger comentou e percebeu que Mirian olhou para ela confusa. - Não sabe o que é um Dragonite? -

— Por que acha que eu tenho medo de altura? - Questionou Mirian.

— Claramente não tem medo de Aires, ou não teria atacado. Ainda assim, está apavorada que ele te jogue aqui de cima, então resta a opção de medo de altura. - O Ranger sorriu virando-se para ir para a área esterna do topo, uma varanda que rodeava todo o local. - Isso ou é do tipo irritada. -

Mirian não disse nada. Não perder tempo explicando algo a ele. Simplesmente, terminou sua sopa e seguiu-o para fora. Arregalou os olhos diante a visão.

Imaginou que passaria a noite toda em meio a escuridão, com a parca luz do complexo dando-lhe uma visão precária do local. No entanto, a floresta pela qual atravessou iluminada pelo sol do dia, agora estava iluminada por milhares de pontos luminosos multicoloridos por todas as partes.

— É quase como se as folhas das árvores estivessem brilhando e sendo levadas de um lado para o outro. - Mirian se aproximou do alambrado para poder observar melhor o show de luzes que a natureza estava realizando. - O que é isso? -

— Migração Burtefree especial. - Comentou o Ranger.

— Migração Buterfree especial? - Mirian olhou-o sem entender. - É como uma convenção de evolução? -

O ranger olhou para Mirian sem entender bem o que ela havia dito. Ele sabia sobre as convenções de evolução pokémon que aconteciam pelo mundo, inclusive sabia que uma havia acontecido a pouco tempo para as espécies de Ekans, apesar de não saber onde.

— Butterfrees realizam um processo migratório periódico para poder reproduzir. No entanto, algumas delas possuem um dna evoluído que lhes permitem aprender, por conta própria o movimento clarão que não é comum desta espécie. Na época da migração essas butterfrees normalmente não acham parceiras e acabam realizando mais tarde um secundo processo só com as que realizam o clarão, o resultado é esse show de luzes. -

— Entendi. - Mirian balançou a cabeça compreendendo o explicado. Era simplesmente a natureza achando seus caminhos. - Mas, você como ranger vai deixar Aries atrapalhar a migração caçando-as? -

— Ele vai salvá-las. - Disse o ranger começando a rir. - Aries não veio caçar as butterfrees e sim seus predadores naturais e os humanos que quiserem interferir. Como não posso dar conta sozinho pedi ajuda dele para vigiar a passagem delas por aqui. Eu observo de cima e contato pelo rádio e ele de baixo. -

Por um instante Mirian pareceu compreender. Aries tinha que estar ali para apoiar o irmão e queria que ela visse o que aconteceria, pois parecia mais importante para sua carreira de coordenadora que promover o livro. Não podia atrasar pois a migração não os esperaria e não tinha que levar a mochila devido ao equipamento de cominação, caça e outros.

— Você realmente é um Olimpo? -

Mirian voltou a encará-lo para ter certeza que realmente ele era um Olimpo. Não conseguia reconhecê-lo das fotos que havia visto da família do Grupo Olimpo.

— Não. - Comentou o Ranger. - Sou Josh Bindu. Conheci Aries na academia Ranger Pokémon e acabamos tão amigos depois de alguns incidentes que nos consideramos irmãos. -

Aries frequentou a academia ranger pokémon? Então ele queria ser Ranger? Como alguém que queria ser Ranger acaba como caçador? Pensando bem… Quem confiaria num Ranger Pokémon que tem essa atitude dele? Mirian surpresa com a descoberta sobre Aries não percebeu que o Ranger Josh ficou olhando-a durante alguns instantes.

— Parece que errei. Você não estava com medo de altura é do tipo irritada mesmo. - Comentou ele começando a andar em volta do complexo, pela varanda. - Acho que Aries tem esse efeito nas pessoas. -

— Parte é Aries sim. Mas, eu confesso que não é culpa dele. - Mirian distraiu-se. Da cena que via e enquanto Josh rodava ela sentou-se pensando em tudo aquilo.

Ela não era raivosa ou irritada e mesmo com Aries sendo uma pessoa qie irritava a todos, ela ainda conseguia não agir como ele. Mas, ficar uma semana escutando Sabrina falando que ela não era acabou irritando-a a ponto de não conseguir se acalmar.

— Irritada a ponto de descontar em alguém é normal, a ponto de querer matar Aries, também. - Josh sorriu enquanto voltava. - Mas, isso não é da minha conta. Eu apenas estou praticando essa leitura de pessoas e pokémon que os rangers precisam ter. -

Mirian virou a cabeça olhando voltar. Pensou no que ele havia acabado de dizer e percebeu, não tinha ideia realmente do que um ranger pokémon fazia.

— Um ranger pokémon lê as pessoas e pokémon? - Mirian pareceu um pouco perdida. - O que ele faz? O que é um ranger pokémon além de uma espécie de guarda florestal? -

— Guarda florestal? - Josh piscou algumas vezes com a definição dada por Mirian de seu trabalho. - Você sabe que sou amigo de Aries, então temos um pouco de similaridade na personalidade, né? - Mirian concordou com a cabeça. - Acabou de ofender minha profissão, eu te jogaria lá em baixo por isso. -

— Desculpe-me. - Mirian perdiu sem realmente querer. - É essa pressão sobre mim. Querendo que eu seja uma pessoa perfeita e ativa em todos os lugares e dizendo que só não sou por estar quebrada, com parte de mim perdida dentro da minha própria mente. -

Josh olhou-a dizer aquilo e balançou a cabeça de um lado para o outro, sem saber ao certo o que dizer naquela hora. Aquela era a parte do trabalho que ele menos gostava, as pessoas acharem que os pokémon ranger eram pessoas que poderiam servir de psicólogos. Mas, admitia que naquele momento era culpa exclusivamente dele por tagarelar sobre Mirian e sua irritação e modo de agir.

Levou as mãos ao bolso sacando quatro pokebolas e soltando-as de forma displicente quatro pokémon que a pokewatch identificou com Umbreon, Nocktow, Sneasel e Sableye, todos noturnos.

— Galera, quero que cada um pegue um lado desta plataforma e vigiem qualquer movimento que possa ameaçar as Butterfrees. -

Mirian observou que antes de dizer aquilo Josh pareceu posicionar-se de uma forma autoritária e confiável. Sua voz pareceu mais firme e ele pareceu deixar amostra um emblema da corporação Ranger. Não demorou nem dois segundos para os pokémon obedecerem e seguirem para suas posições. Enquanto o Ranger caminhou para dentro do alojamento e retornou com duas cadeiras de espreguiçar colocando-as numa direção de onde podiam ver muitas das luzes. Sentou-se em uma e parecia que ali ficaria descansando por um longo tempo.

— Esses pokémon que libertou são da corporação Ranger, ne? -

Mirian questionou enquanto dirigiu-se a uma cadeira sentando-se confortavelmente. Recebeu apenas um sim com a cabeça enquanto ele parecia escolher as palavras de uma conversa que ele parecia não saber nem o que dizer.

— Basicamente Ranger pokémon são policiais que zelam pelo equilíbrio do mundo pokémon, significa que qualquer coisa que ameace a vida pokémon, incluindo seus habitats, nos aciona. Um ranger pode atuar em diversos segmentos por conta disso, de apenas vigiar e acompanhar fauna e flora a caçar caçadores ilegais. Mas, é básico que saibamos ler humanos e pokémon para que possamos ter uma facilidade maior em lidar com as mais diversas situações que normalmente envolvem brigas humanas ou pokémon, por dinheiro, poder, território ou simplesmente irritação. -

Josh começou a explicar sua profissão a Mirian.

— Se sabemos ler pessoas e pokémon podemos resolver os conflitos e situações com mais facilidade. Especialmente se precisarmos nos ligar aos pokémon. - Comentou Josh. - No geral, os Ranger não possuem pokémon seus, uns dois ou três no máximo, sendo raro isso. A corporação, por outro lado tem pokémon treinados que são cedidos aos patrulheiros de acordo com as missões. Mas, o comum é que os ranger realizem um pedido de ajuda aos pokémon locais, ligando-se a eles. Por isso, lê-los é algo primordial. -

— Ler o pokémon para ligar-se a ele. - Comentou Mirian. - Eu ouvi dizer que vocês tinham essa habilidade especial, mas sempre achei que fosse feito via aparelho algum aparelho ou químico. -

— Quase sempre é pelo aparelho, mas é importante saber fazer isso sem tecnologia, afinal se fosse só por aparelho qualquer um seria ranger ou o usaria, né? -

Mirian pareceu concordar com Josh e resolveu distrair-se com a visão das luzes voando pela noite e criando diversas formas. Butterfrees não tinham o hábito noturno, mas parecia que elas sabiam que a noite o que as fazia ser dispensadas pelas outras durante o dia, era o que chamava a atenção para ti a noite.

— “Querendo que eu seja uma pessoa perfeita e ativa em todos os lugares e dizendo que só não sou por estar quebrada, com parte de mim perdida dentro da minha própria mente.” - Josh repetiu calmamente as palavras pronunciadas por Mirian um pouco antes. - Você sabe que ninguém é perfeito, né? -

— Sério? - Mirian olhou para ele com certo desdém e de repente parou sentindo-se mal por aquilo. - Desculpa. Estou meio que na defensiva desde que Sabrina disse-me isso e ficou dias querendo que eu fizesse um tratamento para liberar meu potencial oculto entrando em contato com ela. -

Josh não disse nada e Mrian calou-se. Ambos ficaram calados por algum tempo.

— Medo ou orgulho? - Questionou Joash quebrando o silêncio. - Eu não conheço Sabrina, além de saber que ela é uma psíquica poderosa procurada por inúmeras pessoas que precisam de ajuda para resolver alguns problemas traumáticos. - Josh sorriu. - Então se a escutou falando com você tantas vezes sobre a mesma coisa, sem pirar, gritar ou algo assim, você não quer aceitar que tem algo dentro de você por medo ou orgulho? -

— Medo? - Mirian pareceu irritada. - Orgulho? -

Miller se levantou e foi até ele zangada. Josh permaneceu sorrindo e então a encarou nos olhos e mesmo na baixa luz Mirian viu-se refletida nos olhos dele. Era estranho, mas conseguia se ver perfeitamente. O rosto um pouco manchado do suor do dia, as roupas sujas, a postura autoritária e os olhos exigindo respeito.

Desde quando eu exijo respeito? Eu não estou exigindo respeito… Só estou sendo orgulhosa não querendo deixar ele achar que estou com medo ou mesmo orgulhosa.

Era orgulho. Amedrontada ela ficava paralisada, mas orgulhosa ela ficava irritada. Sabrina havia ferido seu orgulho dizendo que ela era incompleta, dizendo que existia uma parte dela que estava perdida em sua mente fragmentada e que ela precisava de tratamento. Era orgulho atacar as pessoas a procura de mostrar ser perfeita sem ajuda de tratamento ou mesmo completa, sem faltar nada. Foi orgulho tratar a mãe e Angel com descaso assim que as encontrou. Era orgulho querer que seus amigos não soubessem que ela foi presa e por isso atacou Blue temendo que ele se aproximasse demais de Dove e assim soubesse da prisão.

— Eu sou… Orgulhosa. - Comentou para si mesma, ignorando que Josh estava ali encarando-a. - Quanto mais orgulhosa eu sou mais agressiva eu sou. -

— Parece com alguém que você conhece? - Questionou Josh.

Mirian ficou olhando-o por alguns instantes até perceber que a única pessoa que ambos conheciam era Aries.

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Aries Olimpo é um rapaz de 19 anos que eu já havia classificado de várias formas. Mas, nunca havia classificado-o como orgulhoso. Ele sempre riu e fez piada de tudo, nunca desperdiçou a oportunidade de brigar com alguém, fosse verbalmente ou fisicamente. Apesar de ser duro com as pessoas e fazer coisas que não deveria, ele sempre parece ter um motivo quase nobre. Literariamente eu diria que ele é o anti-herói e acho que nunca tinha percebido que boa parte da arrogância e agressividade dele é orgulho. Claro, até faz sentido que ele seja orgulhoso, os sentimentos dele são protegidos desta forma, eu acho. Nem sei o que pensar o porque ele é orgulhoso na verdade.

No entanto, a pobre Mirian Miller, que sou eu, fico irritada por causa do meu orgulho que vem de não querer que as pessoas vejam minhas fraquezas. Sou orgulhosa por não querer me ver fracassar. Eu tenho medo da Mirian que Sabrina viu dentro de mim, perdida no caos de meus pensamentos, não ser apenas minha parte de coordenadora pokémon, mas ser alguém nada agradável.

Será que essa Mirian poderia dar um jeito nesse meu orgulho e irritação?

— Passou mesmo a noite toda acordada? -

Mirian olhou para Aries que estava parado próximo a cadeira dela. Ela realmente não havia dormido, passara a noite acordada pensando na descoberta dela ser tão orgulhosa quanto Aries e distraindo-se com o dançar das Butterfrees iluminadas pelo Clarão.

— Por que ainda está com a mochila nas costas? Não quer descansar? -

— Se voarmos agora no Skarmory talvez possamos chegar na metade do seu café. - Disse Aries sorrindo.

Mirian olhou para Aries sem entender. Mas, o que ela tinha a perder? O que ela tinha a ganhar ficando ali? Conhecia o tipo de pessoa que Aries era talvez ele estivesse arrependido do que fez e aquele seria o jeito de pedir desculpas.

— Vou pegar minha mochila. -

Foi uma corrida rápida a pequena cabana, em busca de seus pertences e de Josh para despedir-se. Sentia que talvez tivesse que ter dormido um pouco, mas nada que fosse criar problemas para agir como escritora. Poderia estar com problemas quanto a muita coisa, mas saberia se portar quando como escritora.

— Partindo tão depressa? - Josh pareceu surpreso. - Achei que iria ver o nascer do sol, descansar e tomar café. - Josh olhou para Aries já pronto em sua ave metálica.– Sabe que é uma armadilha para que ele se vingue, né? -

Mirian escutou aquilo admitindo que era a hipótese mais provável de ocorrer vindo de Aries. Mas acabou sorrindo.

— Escute… Tenho que deixar ele ser ele mesmo. Sei que ele é o tipo de pessoa que fará isso, mas quero ser o tipo de pessoa que se controla mesmo nessa situação. - Mirian olhou para Aries sorrindo e sentiu que não chegaria para o café da manhã do seu livro. - Ele é a melhor fonte de testes para eu aprender a me controlar. -

Josh abraçou a menina se despedindo. Mirian achava estar sendo corajosa para se fortalecer, mas estava sendo apenas orgulhosa de não admitir precisar de ajuda. Aries estava sendo orgulhoso de não ter aceitado ser atacado por Mirian com tanta felicidade. Uma dupla de orgulhosos por motivos quase semelhantes, mas muito parecidos em essência. Orgulho por fraquezas, que não querem ter ou admitir ter.