Memórias

O Sonho Entrecortado


MEMÓRIAS

CAPÍTULO DEZENOVE:

O caixão descia lentamente a sepultura. Rosas brancas e vermelhas eram jogadas. Lágrimas escorriam dos olhos das pessoas ali presentes. Coroas de flores rodeavam o fundo buraco. Cada uma com mensagens diferentes e cada vez, mais encantadoras. Aquela sim era uma pessoa muito amada. Percebia-se.

- Meus sentimentos. – Era tudo o que Julia podia dizer.

- Sra. Hoffman! – A voz ecoava.

Bateu uma agonia. Uma agonia sombria.

- Olá... – Respondia Julia, curiosa e um pouco medrosa, olhando para todos os lados possíveis.

- Sra. Hoffman, quer dizer então que a senhora conseguiu vir? – Era o doutor. O tal que havia encontrado no trem.

- Claro que sim... Não só eu, como toda a cidade, não é? – Disse, com um tom meio que envergonhado.

Riram um pouco para descontrair o clima, e voltaram à conversa.

- E então, de quê ela morreu? – Perguntava.

- Suspeitamos de tuberculose.

Uma longa pausa foi feita.

- É o mais provável. – Disse Julia.

O homem balançou a cabeça em concordância. Logo em seguida, Julia saiu dali.

Quando estava próxima ao portão do cemitério, achou. O mausoléu dos Collins. Como não havia ninguém a observando, decidiu ir até lá. A grade já estava degradada e um pouco escancarada, o que foi estranho. Mas seguiu. Era um tipo de túmulo muito diferente. Em vez de possuir alguns caixões encaixados à parede e cobertos por uma espécie de pedra, tudo o que ele tinha era uma escada. Uma longa escada, com degraus altos e até acabados. A qual Julia desceu por pura curiosidade, e não, coragem.

Seu pensamento estava correto. Não era um túmulo. Era um tipo de cofre. Apenas mais um lugar onde os Collins pudessem esconder suas riquezas sem que alguém percebesse ou ao menos descobrissem onde elas estavam.

Algumas preciosidades puderam até ser encontradas por Julia. Como uma corrente com uma enorme pedra de rubi em seu centro, algumas cédulas antigas (muito antigas), algumas pedras não lapidadas, mas que sabia-se ao certo o que eram, e cartas, poucas cartas. Julia chegou a pegar três. Pôde ver a rocha que cobria a entrada do “túmulo” ser arrastada ao seu meio. Havia ficado presa. Passou todo o resto da tarde a riscar pedras em pedras com o objetivo de fazer fogo. Alguma brecha que sobrou entre a rocha e a areia iluminou o local.

Um pequeno incêndio iniciou no local. Um pequeno incêndio que queimou várias cartas que Julia não pôde observar. Subiu alguns degraus. Gritava. Gritava. Gritava. Salvou as cartas que antes havia pegado e o colar. As chamas espalhavam-se. Agora tentava empurrar a rocha com um único braço, o qual ficou totalmente arranhado e ferido. Conseguiu. Durante o curto espaço de tempo em que não havia ninguém passando, saiu. Escondeu o colar em seu chapéu e correu até a rua. De lá pegou um táxi. Voltou para a casa do Capitão. Estava hospedando-se lá, enquanto não achava um lugar para ficar.

- Está tudo bem Julia? – Perguntava o capitão.

- Tudo bem. – Respondeu. Respirando cansaço.

Acenou para o capitão e seguiu para o banheiro improvisado. Despiu-se e correu para debaixo d’água. Finalmente, suspirava. Vestiu-se e caminhou até a cama, onde se encolheu durante alguns minutos. Puxou uma carta e começou a lê-la.

“Querido Barnabas, você está em perigo. Assim como nós também. Acabe todas as relações que você possui com esta mulher. Ela é perigosa. Ela nos põe em altos riscos. Espero que você entenda. Saia de Collinsport. O mais rápido que puder. Dizem em qualquer lugar que ela não se passa de uma boa feiticeira. Uma bruxa. Livre-se desta paixão que veio tão de repente. É importante filho. Salve a si próprio. Salve o negócio da família. Salve Collinsport. Salve os Collins”.

Julia sabia muito bem o que Joshua queria dizer com isso. Sabia muito bem quem era a pessoa a qual ele se referia. O capitão aproximava-se.

- Julia, você quer café? – Foi tudo o que ele perguntou.

- Claro.

Podia olhar o capitão novamente se aproximando com os seus olhos entreabertos. Porém, antes de chegar. Perdeu-se em meio a um mundo preto. Uma mente escura. Havia pegado no sono.

Gemidos ecoavam por todas as paredes, já meio rachadas. Ouvia-se também um barulho de vassoura, uma vassoura sendo arrastada pelo chão. Porém parecia vir do alto, do andar de cima. Devia ser apenas alguma outra servente dos Collins.

- Oh! Oh! Barn... – Os gemidos surgiam cada vez mais altos.

Julia seguia em frente. Agora encontrava-se em frente a única sala da Collinwood que mantinha-se fechada.

- Pare com seus gritos, por favor, minha servente pode escutar. – Uma voz grossa invadiu o espaço dos gemidos.

- Tudo bem... Desculpe. – Uma voz pouco inocente e culpada pôde ser ouvida.

Os gemidos continuaram, baixinhos. Julia não matou sua curiosidade. Não era bastante. Forçou a maçaneta da porta. Pôde perceber que o barulho parou por um instante. Logo voltara. Forçou ainda mais. Conseguiu. A porta rapidamente se abriu, com um grande barulho. Um “Nhec!”. Os dois rostos viraram-se. Ali estavam eles, Barnabas e Angelique.

- Julia! – Exclamou Barnabas com um tom meio envergonhado. – O que faz aqui?

- Apenas sonhei novamente. – Respondeu.

- Você a conhece? – Perguntou Angelique, intrometendo-se.

- Sim... – Dizia Barnabas, entrecortando-a e bem baixinho.

Os dois olharam um para o outro. Angelique empurrou Barnabas para o lado, e correu, a pegar o seu roupão. Barnabas cobria-se agora com um fino lençol de seda, que ainda dava para ver tudo, porém havia preferido ignorar a situação.

- Sinto muito por ter me encontrado em plena tarde de “lazer”. – Dizia Barnabas. – E então, o que te traz até mim?

- Nada de muito importante, gostaria apenas de tirar algumas conclusões. – Suspirou. – E desabafar um pouco.

- Tudo bem... – Respondeu, enquanto vestia rapidamente suas roupas, espalhadas pelo carpete.

Julia caminhou até a beirada da escada, onde ficou um curto tempo esperando. Barnabas a puxou pelo braço e levou-a até a cozinha, onde sempre esclareciam algumas coisas.

- E então, o que você gostaria de esclarecer?

- Eu queria saber apenas se... – Cortou. Agora observara enquanto Angelique saia pelos fundos, compassadamente.

A escuridão logo bateu e Julia agoniou-se. O sonho já era, assim como as conclusões. Estava agora com os seus olhos entreabertos, deitada e extremamente suada, talvez fosse o nervosismo.

- Julia? – Um rosto aproximava-se de seus olhos. Um rosto conhecido.

- Olá... – Dizia bem devagar, como se ainda não pudesse compreender a situação.

- Está tudo bem com o resto dos Salvatore? – Perguntava o conhecido.

- Capitão Jack... – Pôde dizer, reconhecendo-o.

- Sim... O que houve com a sua mãe? – Perguntava, com um ar misterioso. – Você recebeu uma carta.

A carta foi entregue em suas mãos.

“Querida Sra. Hoffman,

Eu, Delegado John Silver, lamento informa-te isto, principalmente em sua especial gravidez. Mais o caso é importantíssimo e tenho certeza de que você me desculpará em breve. Acontece que na noite em que você saiu (ou fugiu) do hospital, sua mãe foi encontrada com uma mulher nua e morta dentro do quarto, claro, sua mãe estava a dormir. Acontece que como a única pessoa no quarto, ela pôde ser considerada suspeita, e como você é a única parente dela que acreditamos que permanece viva, terá de aguentar, a perda da sua mãe por quinze anos. Sim, ela está presa”.

ARTHUR C.