Memórias

A Incansável "Guerreira"


MEMÓRIAS

CAPÍTULO OITO:

No momento em que aquilo ouviu, não soube o que fazer de exato. Imagina contar a toda família? Um sufoco inevitável. O homem que estava na porta havia sumido, nenhum detalhe foi dito depois. Ela tinha quarenta e oito horas para fazer o impossível acontecer. Não podia nem pensar em ler o diário de Barnabas e muito menos, gastar o seu tempo tentando ligar para Edgard. Nunca tinha acontecido nada em sua vida desse jeito, ou forma. Também não pôde gastar suas lágrimas armazenadas, quis manter o bom tom, para reagir normalmente diante de todas. Foi então que começou a arrumar as malas, já que não havia nada para empacotar. Sua irmã surgia de longe:

- Quem era o homem? – Falava baixo, porém não tanto.

Julia poderia dizer que era um oficial da justiça que veio tira-las a casa. Porém seria algo constrangedor e para Nina, não faria o menor sentido, afinal, porquê sair da casa em apenas dois dias, do nada? Agora fazia a pergunta para si mesma, porém voltou ao assunto e respondeu como se não tivesse entendido absolutamente nada:

- Não sei, porém ele entregou-me este papel.

- Eu dou a tia Elena.

- Eu mesma entrego, pode deixar.

Ainda duvidava do mau caráter de sua irmã, por isso pôs o papel dentro do bolso e voltou a pensar na pergunta. Não fazia sentido até mesmo para ela. Mas queria entender, também o motivo de os móveis serem tomados. Foi quando Elena percebeu o rosto nervoso de Julia e começou a falar sobre fatos, que tornavam a pergunta cada vez mais obvia:

- Você me parece nervosa, Julia. – Falou a tia, de forma tranquila.

- Eu não apenas pareço, eu estou.

- Por quê?

- Não se faça de santa, um dia as suas ironias irão lhe causar um sério problema. Você sabia que a casa poderia ser tomada, e nada nos disse.

- Realmente.

- E eu não vejo o porquê de tanta ignorância, estupidez e egoísmo.

A mãe de Julia poderia ouvir a conversa de longe. Chegou a chorar quando percebeu o que estava ocorrendo. Porém, sua irmã a fez pensar sobre o marido assim que disse a sobrinha:

- Você já devia ter percebido Julia.

- O seu pai estava doente. Quem você acha que pagava as contas desta casa?

- Mas a casa é sua, era a sua obrigação.

- Se era a minha obrigação e continua sendo, porque está tão preocupada?

- Sabe... Eu tenho uma mãe e uma irmã para cuidar, enquanto você solitária e egoísta não faz o mínimo agrado para nenhuma das duas.

Falou de Nina apenas para dramatizar ainda mais. Queria deixar a sua tia ignorante sem razão, quando ela já estava sem:

- Julia, todas nós temos quarenta e oito horas para deixar a casa, mas irei fazer melhor. Eu vou te dar vinte.

- Vinte, o quê?

- Horas.

- Você está me expulsando.

- Creio que sim.

Preferiu ficar calada, até porque não sabia e pode ser que nem tinha o que dizer. Conteve-se, mas não foi tanto. Acabou ligando para Edgard – Mesmo prometendo que não iria (para não perder tempo) – Sorte sua foi a dele estar em casa no momento... Começou a chorar, porém depois disse tudo o que esteve e estava ocorrendo. Dissera que não via saída, e resolveu com ele. Foi ai que falou com sua mãe:

- Mãe, estou indo para a casa do Edgard. Ele disse que havia um quarto para nós três lá. Irei arrumá-lo e mais tarde voltarei para pegar você e a Nina. Por favor, não fale nada com a tia Elena.

- Mas...

- Mas... Já está feito e não há como desfazer.

Deixou a casa, sem que sua tia percebesse algo. Edgard a veio buscar. Estava meio abatida. O clima lá não era muito bom... Depois ainda pensou quando mentiu para sua mãe logo cedo, ainda na missa. Porém não se abatia, deixou passar. Logo começou a conversar com o namorado, sobre Barnabas e as descobertas que havia feito sobre ele. Os interesses de cada um aumentavam a cada instante que iam trocando informações, e assim seguiram.

Julia chegou a dormir por um instante, mas acordou quando Edgard anunciou que eles haviam chegado. Dizia finalmente para si mesma, afinal não queria provocar. Foi recebida por sua sogra:

- Julia! Há quanto tempo, não? – Falava enquanto caminhava para abraçá-la.

- Pois é...

- Edgard contou-me que vocês vão ficar por aqui um tempo, mas que ótimo.

- Acha ótimo? Pensava que ia odiar ter essa notícia.

- Mas é claro que não.

Sorriu. Andou até o sofá, onde sentou e descansou um pouco mais. Merecia. O seu dia foi demasiado cansativo. Era certo que tentava mudar a sua rotina todo o dia, mas esta mudança de hoje, receio que tenha sido pesada. Recebeu um copo d’água da sogra e percebeu que era ali, ali mesmo que o interrogatório iria começar... Mas não nesse dia:

- E então Julia, eu já provei e aprovei a especialidade de sua mãe, e agora que ela vem para a minha casa, que tal eu cozinhar a minha especialidade para ela?

- Concordo plenamente.

- E que tal você me ajudar? Vamos... Vai ser divertido.

E como não tem como discordar de sogra... Julia acabou concordando. Puseram o avental e começaram a pôr a mão na massa, enquanto Edgard voltava à casa de Elena, para buscar a Sra. Salvatore e Nina. Tudo ficou pronto rapidamente. Chegaram a esperar Edgard por um momento e desistiram... Afinal, não era um “pulo” de lá para a casa dos Hoffman.

Demoraram mais um pouco e chegaram. Assim que entraram foram se servindo, menos Julia. Ela havia recebido uma carta, de sua tia, enviada por Edgard. Não aguentou a tensão e logo abriu. Tal carta dizia:

“Querida sobrinha, fiquei muito grata de ter tomado esta decisão. Afinal, quem terá de comprar os remédios de sua mãe não sou eu. É muito melhor ficar sozinha do que ter a companhia de todas vocês, porém capitei a sua estupidez com esse pequeno “recado” e tenha certeza, você ainda está em minhas mãos. Ainda voltarei a te ver”.

Cada frase irônica e chantagista que lia, dava mais impulso para que escrevesse uma carta de volta, e assim foi feito:

“Querida tia, eu fiquei muito grata de ter me mandado aquela carta. Afinal, quem viverá solitariamente com uma estupidez e um egoísmo eterno, eu reconheço. Esse alguém tem de mandar alguma chantagem para ridicularizar ainda mais a situação. Não se preocupe tia, eu também voltarei a te ver, quando estiver dentro de uma caixa que é chamada caixão. Sua sobrinha está com saudades das suas ironias sem fim”.

Então escreveu e mandou a correspondência. Valeu cada segundo perdido que passou escrevendo. Porque apesar das risadas, percebeu que sua tia entenderia que, não era apenas ela a única concorrente naquela briga. Muito menos, a vencedora.

ARTHUR C.