Me Acorde Pra Vida

capítulo 21 Doze espadas quebradas, Akachi se liberta


Quando você sentir meu calor
Olhe dentro dos meus olhos
É onde meus demônios se escondem_ Imagine Dragons

A minha vontade era de fechar os olhos e nunca mais abri-los, me entregar aos braços da bondosa morte, a ceifadora de vestes negras que pela primeira vez passou a ter uma imagem agradável a meu ver, mas não acho que ela iria querer um monstro em seus braços gélidos. Meu coração doía tanto que as dores do meu corpo pareciam ter se anestesiado, me levantei devagar com os olhos sem foco, como um corpo sem alma.

_ E então Valentine? Cadê a monstrinha nervosa que chegou determinada aqui?

_ Perguntou Pethria à alguns metros de mim, rodeada por mais de milhões de guerreiros.

Me virei devagar pra ela, então comecei a sentir um ódio terrível invadir meu corpo, me consumir, destruir tudo o que restava de mim, todo amor, toda bondade, toda piedade, todos esses sentimentos sumiram e foram ocupados por ódio e vingança, arrastei um passo na direção dela, e então urrei de dor ao sentir algo em meu braço, como se ele estivesse sendo mastigado, o selo queimava em vermelho, e então a dor se espalhou por todo corpo, doía cem vezes mais que a dor do dom de cura, cem vezes mais do que todas as dores que senti desde que cheguei naquele local, cai no chão e rolei de um lado a outro abraçando meu corpo, era uma dor inexplicável, insuportável, enlouquecedora, gritei tanto que senti minha garganta arder, minha cabeça começou a queimar, vi meus cabelos negros tornarem vermelho-sangue fio por fio, garras enormes e negras surgiram no lugar de minhas unhas dos pés e das mãos como se estivessem rasgando as pontas de meus dedos, cravei as garras no chão, como se aperta-lo fosse diminuir minha dor. Depois de muito gritar a dor foi aliviando, olhei para o meu braço, doze das espadas do selo haviam sumido, e o mais estranho é que eu não estava nem ligando pra isso, eu só queria minha vingança, fiquei ajoelhada de cabeça baixa enquanto todos me encaravam assustados. Comecei a me levantar de um jeito meio mórbido, assustador, as lágrimas ainda estavam presentes em meus olhos, mas meus lábios traziam um sorriso medonho, não sabia o que eles estavam vendo, mas certamente algo em mim os deixou com medo.

_ Vocês me chamam de monstro, então serei o que vocês me acusam ser..._ Comecei enquanto caminhava devagar na direção de Pethria._ Vocês pediram um monstro, eu lhes darei um demônio... Vocês chamaram por Akachi, pois agora eu e ele somos um só... Vocês tiraram tudo o que eu tinha pra que eu me tornasse uma arma, então agora irei retribuir... Vou matar... Todos... Vocês!!!_ Disse enfim encarando-os.

A maioria ali deu um passo atrás, pude ver medo em todos, menos na Pethria, e nem sinal de Sazu naquele lugar. Meus passos eram tão pesados que estouravam o chão onde eu pisava, minha pele estava quente e haviam rajados negros por todo meu corpo.

_ A verdade é esta, ou você morre herói, ou vive o bastante pra ver a si mesmo tornar-se o vilão... Vocês deviam ter me matado quando tiveram a chance!_ Dei um largo sorriso._ Desejo uma morte dolorosa a todos vocês... E que o circo de horrores comece!_ No mesmo instante todo o exército avançou em mim.

Logo comecei a rodar, cada vez mais rápido e mais rápido.

_ Dança dos nove ventos!!_ Gritei e então nove furacões desceram do céu e passaram arrasando todos os que estavam ali.

Foi como se eles estivessem sido colocados dentro de um liquidificador, foi sem dúvida uma cena horrível, mas algo dentro de mim gostou disso, a pergunta é, será que essa era mesmo eu? Depois de a maioria ter sido triturada, os que restaram estavam apavorados, me curvei no chão apoiando meu corpo nas mãos e nas pontas dos pés, como um animal, e então saltei de lugar em lugar e cada espaço que eu saltava matava logo dois, usando as garras das mãos e dos pés, ou avançava neles e arrancava-lhes a cabeça sem esforço, fiz o medo reinar naquele lugar. Depois dessa chacina a maioria estava morta, os que restaram saíram correndo, apenas Pethria continuou parada no mesmo lugar, tremendo.

Caminhei ate ela devagar, seus olhos estavam paralisados e isso me fez sorrir, a cada passo meu, minha visão ia ficando avermelhada, e meus olhos estavam quentes, então soube que aqueles eram os olhos de fogo de Akachi. A medida que eu me aproximava dela eu ia perdendo o controle de mim mesma, em um momento eu sabia que aquela era eu e no outro eu não sabia quem eu era, já havia me esquecido de mim mesma nesse espaço de tempo.

"Eu sou Valentine Hitate, sou diferente porque meu toque é inesquecível, aprisiono um monstro, matarei todos eles, sou sobre-humana, agora tenho 18 anos e por todo esse tempo fui escondida de todos, esperando por alguém que viesse me acordar pra a vida, me tornaram mais forte... A verdade será escrita com sangue!"_ Pensei enquanto ainda me restava respostas sobre quem sou, logo depois, perdi minha identidade, perdi minha sanidade.

POV'S Pethria

Era difícil de aceitar, mas pela primeira vez senti medo, eu não estava pronta para aquilo, segui as ordens do meu mestre e agora ele me abandonou. Depois de presenciar todas aquelas mortes horríveis, meu corpo estava salpicado de sangue, e o chão parecia um mar vermelho, Valentine se aproximava de mim, devagar, mas eu não conseguiria correr mesmo querendo, meu corpo não obedecia, eu estava paralisada com aquele sentimento que antes fora desconhecido, e aqueles olhos... Olhos de insanidade, de instabilidade, de loucura, eu podia ver sangue neles, eram tão assustadores, a esclerótica de seus olhos estavam negras como as trevas e a íris de um vermelho vivo, apesar da maldade presente neles, aqueles eram olhos de dor, mas seu sorriso era assassino, agora entendo quando diziam que os olhos são as janelas da alma, as presas rasgavam seu sorriso como as de um animal faminto, seu corpo estava com rajados negros por todo ele, incluindo em volta dos olhos. Ela chegou bem perto de mim e parou, me encarando nos olhos, senti como se ela estivesse lendo minha mente de tão intensos que eram aqueles olhos.

_ Do que você tem medo?_ Perguntou ela.

Aquela voz não era dela, era uma mistura da voz dela com uma voz grossa medonha, fiquei arrepiada, não consegui responder, a voz não saía, ela me agarrou pela gola da blusa e me levantou.

_ Eu perguntei... Do que você tem medo?_ Perguntou ela quase gritando.
Quando ela fez aquela pergunta apenas uma resposta chegou ao meus lábios.

_ V-você.... tenho m-medo... De você...._ Disse gaguejando e tremendo.
Ela me jogou com tudo no chão, bati as costas e senti as minhas costelas estalarem, fiquei um tempo sem ar, mas logo me recuperei, olhei pra ela sem querer olhá-la nos olhos, ela estava sorrindo, e então começou a rir, se abaixou ate chegar perto do meu ouvido.

_ Disso eu já sabia tolinha!_ Disse ela com aquela voz arrepiante e se levantou._ Vou dizer do que mais você tem medo..._ Começou ela enquanto andava à minha volta._ Pra começar você tem medo que descubram sua fraqueza, tem medo que saibam que você tem um coração, afinal o coração é a parte mais exposta de uma pessoa não é? Afinal foi assim que você atingiu a Valentine!

_ A... Valentine?_ Repeti sem entender o motivo de ela ter se colocado na terceira pessoa.

Ela virou pra mim sem expressão no rosto e então sorriu.

_ Você ainda acha que está conversando com ela não é?! _ Ela estreitou os olhos._ Eu sou Akachi!_ Ela... Ou ele abriu um sorriso ainda mais largo.

Meus olhos ficaram paralisados, senti um arrepio correr pela minha espinha. Ele se virou de costas pra mim e deu alguns passos na direção dos amigos de Valentine.

_ Que interessante, estão todos desmaiados, esgotados, e alguns à beira da morte, e você conseguiu fazer com que a Valentine acreditasse que estão todos mortos... Imprecionante, eu não teria feito melhor..._ Disse ele admirado com meu feito._ Ah espere... O ruivinho ali está morto mesmo, fazer o que?! É a vida..._ Comentou ele com um suspiro prazeroso._ Você fez um bom serviço aqui, deixou a Valentine tão irada que ela própria me ajudou a romper o selo, olha... Eu nunca tinha visto alguém com tanto ódio assim!_ Ele deu uma leve risada que me fez sentir minha estrutura tremer.

_ M-monstro... Das doze asas..._ Disse assustada, eu estava mesmo diante do monstro terrível que foi contado como lenda.

Ele se virou pra mim, sério.

_ Monstro? Eu? Claro que não, eu sou um animal, dê poder e dom de falar à um leão, ou ate mesmo um gato de estimação e espere pra ver o que ele fará, nós agimos por instinto, apesar de que eu particularmente gosto muito do que faço, mas enfim, sou animal, não humano, monstros são vocês que ferem a própria raça por prazer, nem se quer é por saciar a fome, vocês apenas gostam de ver seu irmão sofrer, isso é ser monstro, eu sou apenas um resultado, o mundo está precisando de alguém pra lhes impor limite, e como você me libertou, acredito que pensa o mesmo que eu..._ Ele chegou bem perto de mim e me olhou nos olhos._ Não, não é isso o que você quer, não fez isso tudo com a intenção de me libertar, nem fazia ideia do que estava fazendo, você procura por vingança!

As palavras dele vieram como uma estaca no meu coração, fiquei pálida, assustada com o que ele poderia dizer a seguir.

_ Pela sua reação é exatamente isso!_ Ele deu uma gargalhada._ Vou te contar uma coisa, você nunca vai conseguir vingar a morte dos seus pais, lembra, de quando eles foram trancados dentro daquela câmara de gás, o que você fez? Você fugiu como uma fracassada, e uma vez fracassada sempre fracassada!_ Disse ele sério.

Senti lágrimas escorrerem em meu rosto, eu nunca havia contado isso pra ninguém, como ele sabia?

_ Eu sei de tudo sua imbecil, sei que toda noite você ainda escuta os gritos deles, chamando pelo seu nome, você viu quem fez isso e não fez nada, agora você acha que depois de anos vai poder consertar seu erro se vingando deles? Não da mais, sua família está morta, e você é uma decepção para a raça humana, fraca, inútil, e busca por vingança na esperança de ser melhor que os assassinos dos seus pais!_ Disse ele em tom zombeteiro._ Seu mestre que lhe prometeu força nem aqui está, você está sozinha, e vai morrer sozinha!

Virei o rosto e o tapei com as mãos enquanto tentava inutilmente segurar o choro. Ele segurou minha mão e a retirou do meu rosto.

_ Ah você está chorando? Eu mal comecei... A sua vida miserável tem muitos pontos ruins, depois do que você fez aqui nem tem direito de chorar, só a sua dor que importa e dane-se a dos outros é? Pois eu vou pisar nos seus sentimentos, assim como você andou pisando nos da sua raça, e depois você vai presenciar a morte desses amiguinhos da Valentine que tanto me atrapalharam, em seguida te arrastarei por onde eu for e você terá que ver todos os humanos morrendo sem poder fazer nada, ate que você enfim fique sozinha nesse mundo, já que é isso o que você tanto quer!_ Disse ele zombeteiro e se levantou.

Meu coração estava apertado, doendo, toda minha vergonha, todo meu medo foi jogado na minha cara, se antes o que me fazia querer continuar vivendo era o desejo de vingança, neste momento já não tinha motivo nenhum, e não conseguia me imaginar vivendo em restos de uma chacina, sozinha e fracassada.

_ Me diga, e seu irmão mais novo, ainda ouve o choro dele? Ainda se lembra do desespero dele quando viu os pais morrendo e tendo a certeza de que seria o próximo? Se lembra dos olhos dele pouco antes de ele os fechar pra sempre? Ou será que você já estava longe de mais pra ver? Acha mesmo que vingando a morte deles sua dor e sentimento de culpa será aliviado? Você apenas se tornará igual aos assassinos!_ Ainda olhando pra mim ele pisou na minha perna esquerda com uma força violenta, senti no mesmo instante uma dor lancinante percorrer pelo osso, um estalo foi ouvido, bruto, seco. Com um grito mudo tive certeza de que havia quebrado.

Depois de uma pausa, ainda gritando de dor implorei soluçando de tanto chorar.
_P-por favor... Me mate...

Ele não tinha nenhuma expressão no rosto.

_ Não tenho motivos pra ser gentil com você!_ Disse ele frio e se afastou.

_ Por que quer fazer isso comigo?

_ Porque eu gosto de ver o sofrimento dos outros, e você não pode me julgar, pois a única diferença entre nós é que pelo menos eu admito!

Ele caminhou com passos duros em direção aos amigos da Valentine, os que ainda estavam acordados reuniam suas forças pra implorar que Valentine voltasse, e Akachi ria deles enquanto estendia a mão pra retirar suas vidas com um ultimo golpe. Lentamente me deitei no chão abraçada à minha dor, estava decidida, não ia continuar, uma estaca de gelo era tudo o que eu precisava, estava pronta pra repousá-la em meu peito.