CAPÍTULO DOZE - DIA D

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"O amor romântico é como um traje, que, como não é eterno, dura tanto quanto dura; e, em breve, sob a veste do ideal que formamos, que se esfacela, surge o corpo real da pessoa humana, em que o vestimos. O amor romântico, portanto, é um caminho de desilusão. Só o não é quando a desilusão, aceite desde o princípio, decide variar de ideal constantemente, tecer constantemente, nas oficinas da alma, novos trajes, com que constantemente se renove o aspecto da criatura, por eles vestida."

(Fernando Pessoa)

Fizemos tudo certo, tiramos 8,0. A professora se recusa a dar nota máxima para principiantes da língua portuguesa, algo que para ela só pode ser dado no doutorado. Passei pelo corredor, era intervalo de segunda-feira. Estou meio ansiosa, porque nesta semana é a apresentação do teatro.

Eu e o Hélio estamos cada vez mais próximos, eu gosto da companhia dele. Ele se interessa pela minha vida e pergunta sempre quando tiver chance. É paciente e presta bastante atenção, seria um jornalista nato. Pouco sei sobre sua vida, mas sei que já é o suficiente. Ao contrário do Matthew, que se afastará mais de mim nestes dias. E o Fábio parou de me mandar avisos sobre o meu novo amigo.

A sorte é que não terão provas e trabalhos nessa semana, porque a escola está parada. Na semana do teatro, o colégio inteiro - ou parte dele - se reuni para preparar a decoração do evento. Algo extraordinário e as pessoas de outros local também vem prestigiarem o festival. Acho que é a única coisa do qual todos os alunos se interessam em participar, além de ganhar um ponto na média, é algo que contará no futuro.

Passei pelas portas, que neste momento estavam abertas, e escutei uma voz que parecia irritada. Aproximei-me do local, para ver o que estava acontecendo, e percebi que era o Hélio falando no telefone. Alguma coisa o incomodava, pois isto estava aparente em sua expressão.

_Eu não vou fazer isto com ela, John. _respondeu, em um tom considerado alto.

Quem seria ela? E quem é John? Algum parente? Não sei, mas deve ser importante.

_Droga! Dá mais um tempo, por favor. Agora que estou me aproximando dela, não quero estragar tudo ao fazer isto.

A coisa estava feia, pelo jeito! Sua voz tinha mudado de irritada para preocupada.

_Mas, eu prometo que descobrirei algo que tu não sabes. Por favor, dê-me mais alguns dias.

A expressão dele, com o passar do tempo, foi se suavizando. Isto indicava que ele havia conseguido o que queria.

_Obrigado, até mais. _finalizou, desligando o celular.

Virou o rosto e se assustou ao me ver, assustou-se muito. Cai em terror, era como se eu tivesse descoberto o segredo do século. Passou por mim e pegou nos meus ombros, buscando um sustento. Chocou seu olhar com o meu, que mostrava espanto.

_Você ouviu algo, Manu? _questionou, olhando fixamente para mim.

_Sim, mas não se preocupe que eu não irei espalhar isto pelo colégio. _disse, sinceramente.

_Acho bom. _retrucou, rindo com falsidade. _Aliás, finja que nunca ouviu está conversa.

_Qual? Eu não me lembro..._questionei, piscando.

Saímos rindo como sempre foi, indo em direção ao lugar que gosto de chamar de meu. Sentamo-nos e ele, logo, foi abrindo o seu pacote de chips. A mãe dele tinha um estoque, e isso era uma das poucas coisas que ele contará para mim.

_Oh céus, como você não enjoa? _questionei, irritando-o.

_Estranho seria, se eu parasse de uma hora para outra. É a melhor coisa que já inventaram, Manu. _respondeu, comendo a sua cota de salgado.

Abraçou-me, como sempre fazia após lanchar. Mesmo eu implorando para que ele parasse com o contato, o mesmo não me obedecia. Logo, Matthew entrou no pátio. Parou após me olhar, a expressão dura. Encarou-me de um jeito repreensivo, mas eu tentei não ligar. Queria que ele sofresse, muito mais do eu. Eu sei que é algo maldoso de se pensar, mas queria que o mesmo entendesse o porquê de meu afastamento.

Passei pelo corredor, quando bateu o sinal. Abri o armário com dificuldade, tentando achar o livro na enorme bagunça. Encontrei algo a mais, que me incomodou. Tinha um bilhete com uma escrita conhecida, avisando do que eu já havia escutado.

"Por favor, afasta-se dele.

Peço-te, meu amor.

É PARA SEU BEM.

M."

Ou o Matthew era muito burro, ou estava duvidando da minha inteligência. Botando este pseudônimo se todos da escola sabem que só existe duas pessoas, eu e ele, que começam o nome com a letra M. neste local. Passei pelo corredor e o Fábio estava me olhando. Seu sorriso era preocupante, pois dizia algo que eu já sabia.

Estava no momento de desconfiar, pois era estranho algo como isso. Antes eu não acreditava, porque eu sabia que eles brincavam; mas isto estava indo longe demais. Seus avisos eram constantes, e o pior era que a expressão deles era verdadeira.

~*~

Hoje é o dia D, aquele que tanto lutei para não chegar. Teria que me vestir para a minha morte, principalmente porque iria beijá-lo. Passei pelo festival calmamente, já haviam várias pessoas no local. Cheguei no camarim e todos já estavam presentes, só eu havia chegado tardiamente. A orientadora se zangou ao ver que eu não estava pronta.

_Não acredito! Vai trocar de roupa, AGORA. Eu não admito que isso aconteça, Deus me livre se algo der errado. _comentou, o vermelho em seu rosto.

Empurrou-me até o banheiro, onde o figurino estava exposto. Parei ao ver a minha imagem refletido no espelho, estava um caos. Pronta para me arrumar, percebi um vulto atrás de mim. Encostei-me na pia ao ver quem era o sujeito, Hélio. Sua expressão não demonstrava ironia, mas sim dor.

_Manu... Eu preciso falar contigo. _sussurrou, encurralando-me entre a pia e ele.

Aliás, o que o mesmo queria me contar?