Depois daquele dia, a conexão emocional que eu mantinha com Foxy se fortaleceu. Eu ficava com ele todos os dias, durante o dia inteiro, e à noite focava minha atenção em observar Mike da janela.

Foxy não confiava nele, assim como os outros animatronics. Golden Freddy e Bonnie mantinham uma posição neutra em relação a ele, preferindo acompanhar seu progresso à distância, por meio de relatos de Foxy, Chica, Freddy e Balloon Boy, que constantemente apareciam no escritório para atormentá-lo. Puppet, embora acreditasse em mim, acabava chegando perto demais do segurança, desconfiado, assustando-o. Eu não achava que era o melhor método para acompanha-lo, mas fiquei calada. Puppet era um pouco inseguro em relação a Mike.

Quando o expediente dele na quarta noite estava prestes a começar, resolvi conversar com Foxy sobre um assunto que me incomodava.

—Foxy – chamei. – Por que continuam assustando Mike? Ele não faz mal a uma mosca. Eu já expliquei a situação dele pra você. E os ataques constantes de Springtrap só pioram a situação dele. – Eu estava tentando convencê-lo suavemente, sem ser rude. Ele suspirou, levemente irritado por retomar o assunto. Mesmo mencionar o nome “Mike” já o fazia cerrar os punhos.

—Porque – ele respondeu, com um toque de rancor que não soube se era destinado a mim ou a Mike – ele está fazendo serviços para a empresa que reconstruiu nosso pesadelo. Está trabalhando para ela e sendo pago para isso. Os homens deste lugar ganham dinheiro romantizando a nossa história, o nosso sofrimento, a nossa morte. Eu odeio qualquer um que seja oportunista o suficiente para isso. De certa forma, Mike é um deles.

Percebendo que ele não concordaria com a minha hipótese a não ser que tivesse uma prova concreta, suspirei e me desliguei da conversa, infeliz por não ter sido capaz de convencê-lo.

—x-

Antes que eu tivesse a noção de que o tempo se passara, a quinta noite chegara. Com ela, o último dia de trabalho de Mike Schmidt na Fazbear’s Fright. Eu me sentia aflita, com medo de que ele não sobrevivesse às investidas constantes de Springtrap, que estavam ficando cada vez mais agressivas, como se ele estivesse aproveitando ao máximo a última chance de matar o segurança.

Apreensiva, eu fitava constantemente o relógio, torcendo para que o amanhecer chegasse logo. Uma melancolia profunda tomava conta de mim, misturada a uma estranha sensação de paz. De alguma forma, eu sentia como se estivesse chegando ao fim da linha. A luz do outro lado do túnel me cegava instantaneamente com a promessa da liberdade que por muitos anos eu sonhei em ter.

Mike estava extremamente sério. Era rápido ao tocar áudios de risadas em salas distantes, afastando Springtrap de perto dele, ao mesmo tempo que parecia concentrado resolvendo alguma espécie de puzzle. Eu sentia que aquilo tinha algo a ver com a nossa liberdade. Só não sabia como.

PRIMEIRA HORA

Eu ouvia os passos rápidos de Springtrap se locomovendo pelo prédio, tentando achar alguma brecha na defesa impenetrável de Mike. O segurança se mostrava extremamente seguro e confiante. Era rápido no raciocínio. Não se assustava facilmente. Fiz uma breve comparação entre o homem que eu chamava de pai em vida e o segurança sentado na cadeira desgastada de couro checando os monitores.

Me permiti devanear por um tempo. A dedicação de Mike à nossa causa, mesmo que isso significasse um risco enorme de ser dilacerado, torturado, maltratado e assassinado, mostrava que ele seria um excelente pai. Imaginei uma vida com ele, sendo sua filha. Ele me buscaria todos os dias na escola, me ajudaria no dever de casa, seria muito presente em minha vida e, a diferença mais gritante entre ele e meu pai, não me assassinaria brutalmente com uma faca.

Sacudi a cabeça e voltei para a janela do escritório, torcendo para que ele recebesse meus recados mentais para se manter forte. De alguma forma eu sabia que ele conseguiria.

SEGUNDA HORA

Eu não sabia se Springtrap me via, mas o evitava mesmo assim. Receosa, acabei evitando qualquer tipo de som que viesse em minha direção, ocultando-me nas sombras, o que fez com que não visse mais ninguém durante toda a noite.

Mike era muito cauteloso e sensato ao saber que um passo em falso poderia significar a morte dele e nosso eterno sofrimento naquele inferno. Eu flagrava Chica, Foxy, Balloon Boy e Freddy atacando-o impiedosamente e desejava poder intervir. Entretanto, não havia nada que eu pudesse fazer a não ser esperar e torcer para que tudo desse certo.

TERCEIRA HORA

À beira das lágrimas, eu focava toda a minha atenção em Mike, observando-o às vezes de longe, fora do alcance de sua vista, às vezes bem perto. Quando notava minha presença, anunciada pelo som de interferência de rádio, ele me fitava por um instante e sorria, como que para me tranquilizar.

Funcionava. Apenas em parte.

QUARTA HORA

A sensação de paz se expandia em meu peito, espalhando-se pouco a pouco, de início hesitante, e depois com mais força para todo o corpo. Eu nunca estivera mais pronta para ser livre. O sofrimento finalmente chegava ao fim. Eu tinha uma dívida para com ele que jamais poderia pagar. Mesmo que no fim da minha torturante existência, pude comprovar que as pessoas boas existem.

Springtrap parecia frustrado. Isso me deixava ainda mais feliz. Seu objetivo não seria cumprido, afinal.

QUINTA HORA

(P.S.: A partir daqui, ouça a música “Balloons”, de Mandopony. Pode repeti-la também, se o tempo que ela dura não for suficiente para ler tudo. Link: https://www.youtube.com/watch?v=AJvQJ9Nz09k )

De repente, tive uma visão. Nela, eu estava numa sala. Havia muitas crianças sentadas às mesas, comendo bolo e conversando descontraidamente sobre as máscaras de animais que usavam. Eu também usava uma máscara. Tateando-a, percebi que era uma máscara de raposa branca com detalhes em rosa. Era uma máscara de Mangle.

Uma melodia suave preenchia meus ouvidos, me acalmando. Comecei a andar pelo lugar e cheguei a uma sala. Estavam todos lá. Chica, Freddy, Foxy e Bonnie, cada um com sua máscara. Fiquei parada perto deles. Uma criança estava encolhida num canto e logo percebi que era Golden Freddy, sem sua máscara.

Uma última criança apareceu pela porta, com a máscara da marionete que eu conhecia tão bem. Enquanto eu me aproximava de Foxy, ficando ao seu lado, um enorme bolo surgiu na mesa diante de Golden Freddy. Ele abriu os olhos.

Assim que a máscara surgiu em seu rosto, nós desaparecemos. Tive a leve impressão de que os balões sobre nossas cabeças começaram a voar antes de retomar a consciência na Fazbear’s Fright. Imediatamente tive a certeza de que a visão fora graças a Mike.

O êxtase me preencheu de tal forma que decidi: era hora de reunir todo mundo para que pudéssemos finalmente descansar. Sem dar nenhum tipo de explicação e ignorando as perguntas que faziam, peguei Chica, Bonnie, Balloon Boy, Puppet, Freddy, Golden Freddy e, por fim, Foxy pela mão e os levei ao nosso palco. Pedi a eles que esperassem e corri até o escritório de Mike. Quando ele levantou os olhos para mim, sussurrei um breve “obrigada” para ele, com as lágrimas caindo. Ele meneou a cabeça com um sorriso. Guardei aquela imagem no canto mais especial da minha memória e do meu coração.

Faltavam cinco minutos para as seis da manhã.

Corri de volta ao palco. Todos ainda estavam lá. Temendo não poder fazer isso nunca mais, abracei cada um deles, que ainda estavam confusos. Vi com o canto do olho quando Chica e Bonnie, percebendo que algo aconteceria, se abraçaram com timidez e depois com paixão. Golden Freddy e Freddy se entreolharam, sorriram se abraçaram também. Por um segundo eu vi, surpresa, que a pequenina planta do amor brotava nos corações deles. Puppet olhava-nos orgulhoso, enquanto Balloon Boy sorria.

Esmaguei o corpo de Foxy de encontro ao meu. Beijei-o delicadamente e depois com avidez, e ele me correspondeu à altura. Relutantes, nos separamos.

SEIS DA MANHÃ

O relógio tocou.

A paz onírica preencheu todo o meu corpo enquanto eu me senti cada vez mais leve. Comecei a levitar. Fitei o teto, ansiosa por finalmente ser livre. Por abandonar aquele inferno. Olhei de volta para os meus amigos. Eles também levitavam lentamente, sorrindo, chorando de alegria. Ao olhar pra baixo, vi Mike nos observando. Depois de uns segundos, ele pegou um alicate do seu bolso e cortou alguns circuitos elétricos, se apressando em sair dali quando uma estante de madeira começou a pegar fogo pelo curto circuito.

Springtrap apareceu. A saída estava já bloqueada pela parede de fogo. Ele nos fitou, como se estivesse ansiando pela liberdade que nós conquistávamos. Logo atravessamos o teto, abrindo a visão para uma noite estrelada que há décadas não tínhamos a oportunidade de ver.

Eu chorava com um sorriso do tamanho do mundo. Não era diferente com os outros. A liberdade estava ali.

Diante dos nossos olhos. Bem na nossa frente.

Olhei para baixo mais uma vez, para a construção dezenas de metros abaixo. O lugar se incendiava rapidamente. Mike acenava para nós, emocionado. Meu pai encontrava o inferno que merecia, enquanto nós ganhávamos o céu. Olhei para cima mais uma vez.

Havia uma luz branca, partindo do céu, que ofuscou nossa vista. Era a saída daquele mundo, a entrada para o descanso. Me senti cada vez mais etérea. Foxy se virou para mim e estendeu a mão. Dei uma última olhada em todos os meus amigos, finalmente aliviados de nossa dor, e aceitei a mão de Foxy.

Fechando os olhos e sentindo um leve puxão, nós todos entramos na luz para nunca mais sofrermos e nunca mais sermos vistos.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.