Make a Memory

Capítulo XXXVII - Novas memórias


...

Dias depois...

— Essas são as últimas malas, não é, carneirinho? Diz que é, pelas contas do rosário! Senão você vai acabar levando toda a casa pelo que estou vendo.

— Hum... Essa é a última, tá? Acontece que eu comprei muita coisa pra o Jayminho e o Fabrício e a maioria das malas são só deles. Eu mesmo tenho pouca coisa...

— Sei... Só aqueles seus capacos de capuz ocupam um espaço enorme. Aliás, espero que não esteja levando aquelas coisas horrorosas, carneirinho! Angra dos Reis é muito quente, não tem porque você usar isso.

— Coisas horrorosas? Lembra que quando te recebi aqui em casa para aquele jantar, a nossa primeira noite juntos, eu estava com um casaco desses?

— Lembro, óbvio, né, carneirinho? E você nem sabe que eu quase desisti de te pedir pra dormir aqui só por causa daquela sua roupa de astronauta.

— Roupa de astronauta?! Félix, seu exagerado!

— Que é? Eu falo mesmo. Roupa de astronauta, sim. Onde já se viu? Convidar o amor da sua vida pra jantar e vestir um casaco prata enorme!

— Ora! E você não desistiu por quê, hein? Posso saber?

— Ah... Porque eu olhei bem pra você e percebi que você até que estava vestindo a fantasia certa.

— Que fantasia, Félix?

— De astronauta, ora! Foi só eu olhar nesses olhinhos lindos e prestar bem atenção no corpo que você escondia embaixo daquelas roupas que eu percebi que se eu ficasse com você... Você me levaria ao céu.

— Oh, Félix! - Niko, como sempre, se derreteu com a declaração de Félix e aproveitou mais um pouquinho com ele o último dia em sua casa em São Paulo. Em breve eles estariam rumo à nova cidade, à nova casa, à nova vida.

Enquanto isso, na casa de Pilar...

— Ah, mas esse Fabrício é muito fofo, não é? Tão lindo!

— Também, é a cara do Niko carneirinho.

— Isso é verdade, Márcia. Ele vai ficar igualzinho, não acha? Ah, mas eu vou ser uma avó coruja demais para ele.

— E pra mim? - Jayminho se pronunciou.

— Pra você também, Jayminho. Com certeza. E já sabe, né? Já pode me chamar de vovó.

— Tá, vovó Pilar. Mas, a Márcia também disse que eu posso chamar ela de vovó.

— Pode, pode sim. Afinal a Márcia também é como se fosse uma mãe para o seu papai Félix.

— É papi Félix.

— Ah, é mesmo! O seu papi Félix.

Márcia e Pilar cuidavam dos meninos enquanto esperavam Félix e Niko chegar. A casa dos Khoury estava diferente aquela tarde. Todos se preparavam para uma grande festa. Todos, menos uma pessoa, sozinha, num quarto...

— Quem é?

— Sou eu, doutor César. O Rafael.

— Entre.

— Com licença... O senhor me chamou com urgência. Do que se trata?

— Bom... Desde que o Eron foi preso você passou a ser o advogado responsável pelos assuntos do hospital e pelos meus assuntos pessoais também.

— Sim, doutor César. Precisa da minha ajuda para algo?

— Preciso. Você já deve saber que hoje o Félix vai... Vai assinar um tipo de união estável, ou sei lá o quê, com o tal do Niko.

— Eu sei. Inclusive acabei de ver a decoração da casa para isso, está muito bonita. O senhor não vai participar?

— Isso não importa. E não é do que quero falar. Pelo menos, não diretamente.

— Como assim?

— Diga-me, doutor Rafael... Você me ajudaria com algo referente à minha casa em Angra dos Reis?

— Referente à casa? Eu... Eu soube o que ocorreu e... Sinto muito, doutor César, mas se for me pedir para tentar vender essa casa como pediu ao Eron, eu não poderei aceitar...

— Não vou lhe pedir isso.

— Então? O que quer me pedir?

...

Pouco tempo depois, Niko e Félix chegaram à casa de Pilar já devidamente arrumados para a celebração.

— Prontos, meninos? - Pilar perguntou ao vê-los chegar.

— Pronto, mami poderosa! Ai de mim se não estivesse pronto. Eu... Eu teria certeza que teria colado chiclete na cruz se não quisesse ficar com o Niko para o resto da minha vida.

— Está emocionado, não está, Félix?

— Você não sabe como, mami.

— E você, Niko? Como se sente?

— Sinto que este será... Hum... Não, não será o dia mais feliz da minha vida, não... Mas, será o primeiro dos dias mais felizes que terei de agora em diante.

— Que lindo, Niko. Você foi o maior acerto do Félix na vida dele.

— Mami poderosa... O carneirinho foi o único acerto na minha vida. E foi só por causa dele que eu continuei acertando.

Antes que pudessem falar algo mais, Márcia foi cháma-los.

— Vamos, gente! O juiz já está esperando, só faltam os noivos. Vocês nem podem dar a desculpa que noiva se atrasa, então não me vão atrasar os dois, ok?

Eles riram e partiram rumo ao casamento.

Descendo as escadas da mansão Khoury, de mãos dadas, Niko e Félix caminhavam rumo à realização dos seus maiores sonhos. Família, amigos... Todos ali torciam por eles. Já nao havia inimigo, já não havia nada nem ninguém que pudesse separa-los.

Naquela caminhada, degrau por degrau, os dois colocavam o ponto final em seus planos já traçados. Mas, sabiam que era apenas o início. O início de uma jornada: suas novas vidas, suas novas responsabilidades, seus novos desafios. Degrau por degrau, passo a passo, os dois, juntos, traçariam seus destino. E agora se tornariam um só.

— Félix Khoury... Aceita Nicolas Corona como legítimo esposo perante a lei?

... ... ...

... - Ah, Félix! Que bom que esse pesadelo acabou! Eu não via a hora de a gente voltar pra casa, ficar tudo em paz... E o que é melhor: você. Você de volta pra mim, meu amor. Vem. Vem cá, senta aqui pertinho de mim.

— Pertinho? Você quer que eu me sente no seu colo, criatura?

— Quer saber? Quero. Quero sim. Senta aqui, vai. Quero te proteger, só mais um pouquinho.

— Proteger? Sei... Carneirinho, você não me engana. Só porque os meninos já dormiram você quer me dar o bote, né? Pensa que não sei.

— Félix... Eu estou cansado, não vou te dar bote nenhum. Vem cá, vem. Eu quero você mais pertinho de mim.

— Ai... Tá bom, carneirinho. Eu devo ter feito permanente na peruca de Sansão pra me deixar convencer tão facilmente.

Félix sentou no colo de Niko que prontamente o abraçou pela cintura encostando a cabeça em suas costas.

— Hum... A que se deve tudo isso, carneirinho? Tem certeza que não quer me dar o bote? Por que eu acho que estou sentindo algo aí que...

— Félix. Eu adoro esse seu jeito, sabia? Eu adoro as coisas que você diz... As divertidas, as engraçadas, e até as bobas...

— Não estou entendendo, carneirinho.

— Eu senti tanta saudade de você. Tanta. Sabe... Era bom ter você de outra maneira... Sendo o Cristiano. Era bom pensar que mesmo sem suas memórias, mesmo sem esse seu jeito de ser, você ainda assim se apaixonou por mim.

— Pois é... Quem diria que... Que o Cristiano se apaixonaria por você assim como eu me apaixonei. Ah, se isso fosse verdade!...

— Se o quê fosse verdade?

— Se o Cristiano existisse e realmente se apaixonasse por você. Sabe o que aconteceria?

— O quê?

Félix virou ainda sentado em seu colo para ficar de frente para ele, passando os braços em volta de seu pescoço, e disse:

— Hoje teria dois irmãos Khoury brigando por você.

— Sério? E quem ganharia?

— Ah! Que pergunta, carneirinho! Eu, lógico. Félix Khoury é único, como eu não há. E tem mais... Eu não desistiria nunca de você.

— Não?

— Nunca.

Niko deu um meio sorriso, mas Félix notou seus olhos tristes.

— Ei... O que foi? Eu sei que você quer me dizer algo. Fala.

— Eu... Só queria entender uma coisa...

— O quê?

— É que... Ainda me dói... - Niko suspirou profundamente antes de revelar. - Dói pensar que você me esqueceu, mesmo que por um curto tempo.

Félix sentiu o peso do que Niko sentia. Os corações dos dois pareciam bater na mesma sintonia.

— Me perdoa, carneirinho. Me perdoa por ter te esquecido... Por ter te feito sofrer. - Ainda em seu colo, Félix o trouxe para um abraço mais junto de si. Com os corpos colados, Niko pôde sentir quando Félix começou a chorar em silêncio.

— Não chora, Félix. Não chora que me desmorona. Eu... Eu não queria te fazer chorar, eu... Eu não quero mais te ver sofrer. Porque você também sofreu durante todo esse tempo, eu sei. Você sofria por não lembrar quem era, você sofria por estar confuso, não saber o que fazer ou como agir... Você tentava ser o homem perfeito pra mim e eu acho até que... Que fui meio egoísta com o Cristiano algumas vezes, afinal, ele estava tentando ser o melhor Félix que ele podia ser.

Félix levantou a cabeça do ombro de Niko e, pensativo, indagou:

— Eu te prometi alguma coisa enquanto era o Cristiano?

—... Bom... Aconteceu uma coisa, sim. E tem a ver com algo que está com você esse tempo todo e eu acho que você nem percebeu.

— O que... - Antes que pudesse completar a questão, Félix olhou para o anel em seu dedo. O anel que, agora sim, ele lembrava muito bem de a mãe de Niko tê-lo dado. - O anel... O anel da sua família. Eu já estou usando ele... Por que, carneirinho? Sua mãe me disse para dar para você no dia que eu te pedisse em casamento e... Não me diga que... Eu... Eu te pedi em casamento já? É isso? Eu te pedi em casamento e não me lembro?

— Não, Félix, não foi você quem me pediu em casamento. Fui eu.

— ...Você?

— Eu. E você aceitou. Por isso eu te dei o anel. Você havia perdido quando sofreu o acidente e eu encontrei. E te devolvi no dia do nosso noivado.

— Nossa!...

— Surpreso?

— Sim, mas... Pensando bem... Você não me pediu em casamento. Você pediu ao Cristiano.

— É mesmo... Você tem razão.

Alguns segundos de silêncio se estabeleram após essa conversa, até que Félix decidiu quebrar o clima sombrio e trazer à luz o sorriso do seu carneirinho.

— Você não podia ter feito isso, carneirinho. Você é guloso! Onde já se viu, querer os dois irmãos Khoury, só porque ambos habitaram o mesmo corpaço aqui! É o apocalipse isso!

Niko começou a rir e Félix continuou.

— Além do mais, eu já ensaiava te fazer o pedido faz tempo, portanto, nem pense que vai fazer antes de mim, tá?

— Oi? Você... Você ensaiava como me pedir em casamento?

— Eu... Ensaiava sim. Pronto, falei. Ensaiei mesmo, ensaiei muito. Inclusive, no ensaio, em imaginava uma cena assim, sabe?... Eu estaria sentado em seu colo, claro que nós dois estaríamos sem roupa, né? E aí pegava na sua mão... - Ele pegou. - E perguntava assim: carneirinho, aceita se casar comigo? - O modo como Félix olhou bem fundo nos olhos dele, fez Niko perceber que ele falava sério. O pedido era real.

Isso fez Niko sentir uma emoção sem igual. E a resposta veio num beijo intenso que o loiro o deu. Não precisava expressar com palavras o tão aguardado sim. ...

...

— Aceito.

— E você, Nicolas Corona? Aceita Félix Khoury como legítimo esposo perante a lei?

...

— Agora acabou, carneirinho. Acabaram de levar a lacraia. É definitivo. Ele foi preso pelo sequestro relâmpago do Fabrício. Duvido que ele se safe da cadeia, e mesmo que não fique preso ele não vai se aproximar de nós de novo. Pedi ao Rafael entrar em contato com outros advogados mais experientes e entrarem o quanto antes com um pedido para o Eron se manter afastado, bem longe da gente. E se ele ousar se aproximar, vai preso na mesma hora.

— Félix, de tudo isso, o que mais me deixa feliz é ter você comigo, como antes. E meus filhos aqui, sãos e salvos. Me diz... Como você desconfiou do Eron antes mesmo de ver as imagens das câmeras com nitidez?

— Carneirinho, primeiro que eu nunca confiei naquela lacraia e segundo, pelo Jayminho.

— Pelo Jayminho?

— É. Lembra quando eu desci com ele para pegar o jantar e você preferiu ficar sozinho? Quando, do nada, o Eron apareceu com o Fabrício?

— Lembro, claro.

— Então... O Jayminho comentou comigo que não gostava daquele ser lá que eu não quero mais dizer o nome.

— Sim. E?

— E daí que eu perguntei por que e ele disse que tinha medo dele. Eu disse que não tinha que ter medo, porque aquele ali não valia a pena, mas sabe o que o Jayminho me contou? Que viu a lacraia, momentos antes do Fabrício sumir, perambulando por aqui, pela recepção do hotel.

— O Jayminho viu? Claro... Ele me disse que dava para ver a recepção de lá do pátio de recreio...

— Pátio de recreio, carneirinho?...

— Hã? Ah, não ri! Eu me confundi. É pátio de recreação. É que o Jayminho fala assim e eu me confundi, tá bom?

— Oh... Como pode, criatura? Você às vezes parece um bebê. Ao mesmo tempo...

— Ao mesmo tempo o quê?

— Ao mesmo tempo é tão... Gostoso...

— Félix! Para!

— Ué! Parar por quê? Você adora quando te elogio.

— Adoro, mas acho que... Sei lá, me desacostumei.

— Ah, não, carneirinho, pelas contas do rosário! Pois eu vou te acostumar de novo, vou passar a te elogiar todos os dias.

— Não precisa, Félix. Basta ser você mesmo. É o que eu mais quero. Você. ...

... ... ...

— Aceito.

— Pelo poder a mim investido, eu os declaro, a partir de agora, oficialmente casados. Parabéns.

O casal se beijou sob os olhares e as palmas de todos que logo estouraram o champanhe e foram os felicitar.

Porém, as palmas pararam aos poucos quando todos notaram a presença de alguém mais na festa. Alguém que ninguém imaginava que aparecia.

— Papi?

— Félix.

— O que faz aqui? Não pensei que ia querer sair do quarto para ver o meu... O meu casamento.

— Você sempre pensa o pior de mim. Mas, eu não o culpo. Ouvi que já terminaram. Preciso conversar com você agora. Aliás, com o seu noivo também.

— M-Meu... Noivo? V-Você disse meu noivo?

— Não é o que ele é? Venham rápido antes que eu me arrependa.

... ... ...

... -... Ele sequestrou o filho do Niko, papi. Porque ele é ex dele e ele achou que ainda tinha chance, enfim... Aquilo é um louco e vai para atrás das grades, que é o lugar dele. Portanto, você deve entender que ele não pode mais ser seu advogado nem de ninguém...

— Eu já entendi, Félix. Entendi toda a história, você já me contou de todas as maneiras possíveis.

— Desculpa por repetir, papi. Mas, pensei que fosse o único jeito de fazer o senhor entender que o Eron não presta e que a sua ideia de mandar ele vender a casa foi uma... É... Um grande erro.

— Eu já percebi. Não precisa dizer. Mas, então... O que houve com a casa?

— Ele tentou vender para o doutor André, médico lá do hospital, mas ele me devolveu o contrato, documentos, tudo que estava com ele. E aqui estão. Eu trouxe para o senhor guardar. A casa é sua e se não quer o Niko e eu morando lá, nos não vamos, ok? Desistimos.

Ao entregar tudo para César e levantar para sair do quarto, César o chamou:

— Félix!

— Que é?

— Pegue esses papéis. Eu não quero.

— Não quer? Mas, são seus.

— Venha aqui e pegue na gaveta da cômoda a escritura da casa.

— Para quê, papi?

— Apenas faça o que mandei.

Félix obedeceu.

— E agora? O que eu faço com isso?

— Guarde-os. Talvez eu desista da ideia de vender aquela casa.

— Como?... Vai deixar que eu more lá?

— Você vai desistir mesmo? Ou continuaria tentando mesmo que eu não quisesse?

— Papi, o senhor me conhece um pouco apesar de tudo. É claro que eu continuaria tentando até convencê-lo.

— Então... Eu já sei o que vou fazer.

— Sobre?

— A casa.

— O que vai fazer?

— Antes me diga o que você quer fazer com ela.

— Eu? Você sabe. Eu quero morar lá com o Niko e com os nossos filhos, quero formar uma família com ele, aliás, família que já formamos, só precisamos agora oficializar.

— E quando isso vai acontecer?

— Quando?... É... Em breve. Eu espero.

— Antes de você recuperar a memória de verdade, você disse que ficou noivo desse rapaz. Isso procede?

— Claro que procede! Mas, não valeu porque ele pediu o Cristiano em noivado, né? Não eu. Mas, eu vou pedi-lo de novo.

— O Cristiano...

— Não faz essa cara, papi. Sei que deve ter mexido com você essa minha confusão de achar ser o Cristiano. Mas, acredite, mexeu muito comigo também. Eu quase não acreditei quando o Niko me contou.

— Diga uma coisa, Félix... O que ele achou disso tudo?

— Quem? O carneirinho? Digo, o Niko?

— Óbvio.

— Quer saber o que ele achou de conviver com o Cristiano por um tempo?... Sabe, papi... Você pode até ficar com raiva do que eu vou dizer, mas... Se o Cristiano estivesse vivo, pode ter certeza que nenhum dos seus dois filhos escapariam das garras do carneirinho. Pronto, falei.

— Estou falando sério!

— Ok, ok... Falando sério, papi... Enquanto eu era o Cristiano, digamos assim, eu me apaixonei pelo Niko tanto quanto me apaixonei sendo eu mesmo. E o Niko... Ele me amou. Me amou por mim e pelo Cristiano. E mesmo que eu perdesse a memória de novo e de novo e me tornasse mil pessoas diferentes, eu sei que o Niko ia continuar me amando. Mil vezes diferentes. Mil vezes mais.

— Por que tem tanta certeza do amor desse homem?

— Papi soberano... Como foi que você ficou assim? Não foi por amor, por acaso? Não foi por aquele amor cego que você sentia pela Aline? Eu faria tudo igual, papi. Eu faria tudo pelo carneirinho, eu seria igualzinho a você. Mas, a diferença é que eu sei que o Niko nunca me faria mal. Porque mesmo quando eu o fiz sofrer, esquecendo dele... Ele nunca desistiu de mim.

— Félix... Eu acredito.

— Acredita? Em quê?

— No que você disse. E por isso quero fazer um acordo.

— Um acordo? ...

... ... ...

— Quer conversar sobre aquele assunto, papi? Já se decidiu?

— Já. E você?

— Certamente.

Niko não estava entendendo o teor daquela conversa. As coisas pareciam bem menos tensas entre Félix e César.

— Desculpa, mas... Sobre o que vocês estão falando?

— Carneirinho, o papi e eu entramos num acordo. E é sobre a casa de Angra.

— Que acordo?

César se pronunciou: - A casa é de vocês.

Niko ficou totalmente surpreso. Félix mantinha um largo sorriso como se já soubesse a surpresa que César o havia reservado.

— Você já sabia, Félix?

— Mais ou menos, carneirinho. O papi e eu conversamos e... Bom, ele ficou de pensar no assunto.

— E já pensei. - César completou. - A casa é de vocês... Com uma condição.

— Condição? - Niko indagou, mas César continuou falando com Félix.

— Você queria ir embora de São Paulo, não queria, Félix?

— Queria não, quero. E agora vou, né, papi?

— Pode ir. Mas, tem a condição para que a casa seja sua. Eu também não quero continuar aqui, em São Paulo, muito menos na casa da Pilar.

— E quer ir pra onde, papi? Posso procurar um ótimo asilo...

— Não seja cínico! Já conversamos sobre isso e a ideia foi sua!

— Eu sei, papi, calma! - Félix virou para Niko. - Carneirinho, teremos companhia na nossa nova casa, e não estou falando dos nossos filhos nem da Adriana.

Niko logo entendeu que César finalmente tinha aceitado a sugestão de Félix. Ele ia morar com eles, para que o filho continuasse lhe fazendo companhia. Isso queria dizer muita coisa. Principalmente, que César finalmente estava conseguindo aceitá-los.

...

...

O dia da grande mudança havia chegado. A nova família Corona-Khoury chegou à nova casa para suas novas vidas.

Já instalados, vendo o álbum do casamento, Félix e Niko curtiam um ao outro e a brisa marítima.

— Ficaram lindas as fotos, não foi?

— Não tinha como não ficarem lindas, carneirinho, nós estamos nelas.

— Ai, Félix... Tô tão feliz! Nós dois aqui... Nossos filhos... Seu pai de bem com a gente...

— É, na medida do possível...

— Não pode ser mais perfeito que isso, Félix.

— Verdade. Está muito bom. Ah! E eu ainda tenho uma surpresinha pra você, uma coisinha que você me pediu e eu... Esqueci. Mas, prometo, é a última vez que me esqueço.

— Que surpresa?

Félix saiu e voltou com um pequeno cartaz dizendo: "Me desculpa". Niko quase não conseguia parar de rir, lembrando o dia que pediu isso ao seu amado.

... ... ...

— Carneirinho, agora que está tudo bem, que voltamos à sua casa... Pode me responder uma coisinha que você deixou pendente?

— O quê?

— Você não me contou tudo que rolou entre mim e você enquanto eu achava ser o Cristiano.

— Ah, isso!...

— Tá rindo de quê, criatura? Não me diga que eu não dava conta, seria o apocalipse!

— Dar... Você dava. Até demais.

— Quê que você quer dizer?

— Ai, Félix, é que você... Como que eu digo isso?... Você... Só queria ser o passivo. Pronto, falei.

— Oi? É o que, criatura? Eu só queria o quê?

— Só queria ser o passivo. Não que eu não goste de ficar por cima, mas a gente muda de vez em quando, né? Inova, tenta outra coisa... Mas, acontece que você não queria...

— Espera, espera! Time out, Niko! Quer dizer que eu, como o Cristiano, te viciei a ser ativo enquanto estava desmemoriado? Não é possível!

— Não... Não é bem isso, mas... Tá, é meio isso, sim. Você era um fofo, todo tímido comigo, mas quando a gente ia namorar, você... Se deixava levar que era beleza.

— Ah! Pelas contas do rosário! Não acredito!...

— É a verdade, Félix. Não era o que você queria saber? Pronto, contei.

— Eu gostava?

— Claro que gostava. Aliás, você gosta, né?

— Gosto, mas é como você disse, a gente varia de vez em quando. Tem certeza que você não se aproveitou da minha falta de memória para me dar o bote?

— Não! Bobo! Você que pedia, é sério.

— Pensando bem, o Cristiano era quem pedia, né, carneirinho? Falando nisso... Quer dizer que se o Cristiano existisse, ele não seria apenas gay, como nós dois brigaríamos por você e ele ainda seria apenas presa de carneirinho. Ah! O papi soberano ia achar que não só salgou a santa ceia, como bebeu todo o vinho e ainda sambou em cima da mesa pra merecer dois filhos assim.

— Eu acho que depois de tudo que aconteceu, ele já acha isso, Félix.

— E quer saber o que eu acho? Que preciso urgentemente reverter esse jogo.

— Que jogo?

— Seu joguinho de carneirinho predador. Tenho que matar sua vontade, quer dizer, sua saudade, não é?

— Hum... Isso me soou muito bem...

— Vem, carneirinho, vou matar sua saudade do primeiro, único e incomparável Félix Khoury. Espero que não tenha esquecido como é.

— Eu jamais esqueceria, meu amor.

— Eu sei que não. Carneirinho... Sei que já te pedi, mas nunca é demais repetir... Desculpa por ter te esquecido.

— Félix, faz o seguinte... Essa noite você me prova que não esqueceu como me fazer feliz. Só isso. E amanhã ou depois você me escreve um cartaz dizendo "me desculpa". Pronto.

— Adorei! ...

... ... ...

— Já chega, carneirinho. Para de rir e me responde. Já me perdoou mesmo por eu ter te esquecido?

— Você ainda está preocupado com isso, meu amor? Pensei que já tinha te dado todas as provas que te perdoei...

— Deu, mas... Sei lá, eu queria mais...

— Ah, queria mais? Tá. Vem comigo. Vou te dar mais uma prova. Eu estava planejando há um tempo, mas chegou a hora.

— Para onde vamos? Vamos sair?

— Você vai ver...

Horas depois...

— Agora você nunca mais vai me esquecer, Félix. Nem eu a você.

— Não mesmo, carneirinho.

Os dois se olhavam num espelho, vendo uma pequena tatuagem. Era o símbolo do infinito pela metade, e as duas metades só se completavam quando os dois se abraçavam.

— Gostou, Félix? Agora, mesmo que você perdesse a memória de novo, você saberia que tem que encontrar a outra metade desse símbolo. A outra metade do seu infinito.

— A outra metade do meu infinito... É isso. A minha outra metade. Você. ... Foi lindo, carneirinho, até gostei, mas não precisava. Eu juro nunca mais te esquecer. Sabe por quê? Porque o papi e todo mundo gosta de mim como eu sou. Não preciso mais querer ser o Cristiano. E mesmo que eu quisesse... Bom, o Cris também é louco por você, né?

— Bom, isso é. Digamos que eu me daria bem de qualquer maneira.

— Pois é...

— Mas, a verdade é que eu prefiro o meu único e verdadeiro amor, o meu Félix.

— Eu sei, carneirinho... Eu sou inesquecível.

— É sim. E eu?

— Você também é inesquecível e você sabe disso.

— Sabe que eu sei...

— Carneirinho, posso falar bem sério agora? Só uma coisinha.

— Fala.

Félix entrelaçou suas mãos as dele e disse:

— Eu te amo. Nunca mais vou te esquecer... Nunca mais vou te soltar.

Niko o olhou querendo perguntar como ele dizia tal coisa. Será que se lembrava de algo que viveu como Cristiano no fim das contas? Ele não quis mais perguntar, pois já não importava, quando Félix concluiu:

— E eu quero, a cada dia, carneirinho... Fazer sempre mais e mais novas memórias com você.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.