Como de praxe, Arthur estava atrasado para a aula de música. Yuto seria o responsável pelas aulas desta tarde, já que os outros agentes tinham mais o que fazer. Exceto Ginger, que ficou para nos atender em algum pedido.


Fran tomavam chá em uma poltrona perto da janela. Yuka entrou na sala e andou calmamente até Yuto, tentando lhe dar um abraço. Mas o agente a afastou gentilmente, sempre com aquele ar de frieza no rosto. Mira reclamava da falta de responsabilidade de Arthur para mim, mas sinceramente, eu não estava ouvindo nada.



Os outros agentes tinham saído em uma missão secreta. Yusuke disse que ele não podia me falar do que se tratava, então automaticamente eu me preocupei. Não gosto de ficar longe dele, nem de pensar que ele está sozinho. Bem, tecnicamente os outros estão o acompanhando... Mas mesmo assim.



– Cashmire! - Mira pedia atenção. - Francamente, você ouviu o que eu falei?



Ela apertou a ponte do nariz, olhando para o chão.



– Aham - menti.



– Então repita tudo - ela meio que ordenou.



– Pessoal! Atenção, por favor - Yuto pediu.



Valeu, salva pelo Yuto!



– Ah, agora não dá - eu cocei a nuca corri para perto de Ginger e Fran.



Mira revirou os olhos e me seguiu. Na hora em que nos sentamos no chão, Arthur abriu a porta com o pé. Suas mãos estavam ocupadas com pilhas de papéis verge.



– Quer ajuda, Arthur-san? - Ofereceu Ginger.



– Ah, por favor - sua voz saiu por trás das pilhas.



Ginger caminhou até o loiro e pegou as várias pilhas de seus braços. Para o moreno, era como carregar uma pena, nada de mais. Pude ver os olhos de avelã de Fran brilhando enquanto observavam o mordomo carregar os papéis.



Eu o cutuquei de leve com o cotovelo. Ele corou um pouco e se arrepiou.



– Estava sonhando acordado, priminho - eu provoquei.



– Por favor, eu estava apenas... Hã... Reparando na decoração - ele limpou a garganta.



– Ah, de certo. Como se você nunca tivesse estado nesta sala - eu tapei a boca com a mão, comprimindo o riso.



– Será que podemos começar o viemos fazer, ou está difícil? - Mira pediu.



– Ah, fique quietinha, Mira-chan - Arthur exasperou.



Pronto, vai começar. Fran se encolheu, também prevendo as discussões superficiais.



– Como é que é?! - Mira se levantou num pulo. - Kain, faça-o se calar.



Eu puxei a barra de seu vestido de leve.



– Mira-chan, Kain-kun não está aqui.



Ela piscou os olhos algumas vezes, até se dar conta do que estava fazendo.



– Ah, esquece - voltou ao chão.



Caímos na gargalhada. Arthur ria como um louco, um riso doentio e contagiante.



– Ok, ok - Yuka tentava parar de rir. - Vamos prestar atenção no Yuto-kun.



Ah, eu invejo ela e o Yuto. Se apaixonaram livremente e têm apenas um ano de diferença. Enquanto Yusuke tem doze anos há mais do que eu. Por que tudo é sempre mais complicado pra mim? O que eu fiz pra merecer isso?



– Arigatou, Yuka-san - Yuto sorriu com a alma para ela.


Provavelmente aquilo teria uma recompensa, e eu queria saber qual seria. Oh God, como sou hentai.



– Bem, hoje vocês vão trocar de instrumento - ele informou. - Por exemplo, Arthur. Ao invés de você ficar na bateria, hoje vai tocar violino.



Os olhos verdes de Arthur se arregalaram de pavor. Ele realmente não tinha muita afinidade com instrumentos para fins clássicos, por isso se dava tão bem na bateria. Eu ria de sua reação, assim como Yuka.



– C-Como assim, Yuto?! Eu não sou bom nisso.



– Exatamente, por isso vai aprender - Yuto riu maldoso. - Todos vão pegar algum instrumento com o qual não lidam bem.



É, Arthur, acho que eu também vou ter que enfrentar o violino. Mira foi direto para o piano e Yuka para a guitarra. Yuto demorou-se especialmente em ajudar sua dedicada protegida, lógico que foi apenas uma desculpa para tocá-la.



Fran ocupou o banquinho do baterista, vigiado pelos olhos atentos de Ginger. O mordomo ria discretamente a cada erro que meu priminho cometia, e como não achar isso fofo? É, eu curto yaoi. De vez em quando o moreno olhava para mim, certificando-se de que eu não estava fazendo nada perigoso ou idiota.


Ah, a tarde vai ser longa.



Passamos três horas presos aqui. Perdemos no mínimo meia hora, para Arthur aprender a segurar o arco do violino adequadamente. Depois de alguns ensaios e exercícios, Ginger sugeriu que fôssemos para o jardim, respirar ar puro.



Eu fiquei para ajudar Yuto a guardar tudo, mas é claro que com segundas intenções. A luz tardia que entrava pelas janelas brincava em seus cabelos arroxeados. Algo formigava na minha pele, me puxando para perto dele. Eu queria tocá-lo e sentir seu toque.



– Yuka-san, se quiser descer com o pessoal pode ir - disse ele.



– Eu estou bem.



Estávamos de joelhos no carpete bege, com trintas centímetros de distância. Dolorosos trinta centímetros. Me aproximei um pouco mais, sorrateiramente.



Nossas mãos se esbarraram sobre o estofado da caixa do violino. Ele se virou para mim e sorriu de canto. Ah, que frieza mais tentadora. Não resisti, o puxei para um beijo antes que a oportunidade passasse.



Mesmo tendo ficado surpreso ele retribuiu de prontidão, me deitando no chão com suavidade. O carpete era macio, e estava até quentinho por causa da proximidade com a janela.



Suas mãos encontraram meus cabelos brancos espalhados pelo carpete, e seu corpo cobriu o meu. A pele estava fria como sempre, mas mesmo assim era convidativa. Nos separamos por falta de ar e ele perfurou meus olhos com os dele.



– Tem certeza de que isso é certo? - Ele cessou o beijo.



– Se for com você, nunca será errado - eu sorri.



Me sentia nas nuvens, enquanto a língua dele procurava a minha. Sentia saudade do corpo dele sobre o meu, de seus lábios em meu pescoço e de sua língua brincando com a minha. Agarrei as costas de sua jaqueta com uma mão, e com a outra os fios de cabelo de sua nuca.



Os beijos eram secos e frios, estavam me fazendo delirar. Lógico que o momento não durou muito. Afinal, estávamos no estúdio de música da mansão, e qualquer um podia aparecer ali e nos pegar nessa situação.



Ninguém podia questionar-nos quanto a isso, mas mesmo assim não seria algo agradável e muito descente. Por isso ele se levantou e me ofereceu uma mão como apoio. Assim que fiquei de pé fui presa por seus braços contra seu peito.



– Talvez - eu comecei -, possamos continuar isso mais tarde.



– Se for de seu agrado - ele se curvou com rapidez.



Guardamos os instrumentos que faltavam e deixamos o estúdio. Um sorriso de criança que aprontou deve estar brincando em meus lábios. Mas eu não fiz nada de mais, não é mesmo? Apenas me aproveitei de um dos privilégios de ter um guarda-costas nessas condições.



Me agarrei ao braço dele, roçando o topo de minha cabeça ali. Yuto não demonstrava, mas ele talvez estivesse se divertindo mais do que eu. Era um sentimento tão bom, tinha que usurpá-lo ao máximo.



– Eu te amo, Yuto-kun - eu disse.