Magic Mystery Theatre

Capítulo 5 - Poeira de Fada.


Depois que Valéria Crowley foi intimada e desmascarada pela investigadora Louise Burker, a pequena maga retorna aos seus estudos de Alquimia e poções. Não é pelo fato de sua tentativa de ludibriar uma agente da lei que a incomoda, mas sim o erro em si.

Valéria não é uma garota que gosta de perder.

Com os seus aparentes onze anos de idade, cabelos castanhos encaracolados que são presos por um prendedor, os seus óculos de lentes enormes e suas leves marcas de sardas em sua face. Se andasse na rua, ninguém suspeitaria que ela é uma maga. Ainda mais uma garota competitiva e ambiciosa. Ficar em terceiro lugar na pontuação geral no grêmio a incomoda mais do que os seus erros.

Valéria quer ser a número 1.

A morte do professor pode ser a oportunidade perfeita de passar a frente dos seus colegas e rivais. O genial elfo, Tensey, e a Lefou ruiva chamada Jennifer. Os três juntos possuem 75% da pontuação geral do grêmio do falcão. Além de ocuparem o segundo, quinto e sétimo lugares gerais respectivamente.

O mundo de Valéria não se resume a provas e pontos, tem as suas fadas, Sprites, que lhe dão certa vantagem. A multi-tarefas. Com os seus aliados alados, a garota pode assistir várias aulas ao mesmo tempo. Com isso, Valéria lucra bastante para evitar faltas e venda de matérias para alunos displicentes.

Alguns professores não gostam dessa atitude, mas toleram. Têm outros que proíbem. Para estes, Valéria assiste às suas aulas pessoalmente.
Com o atentado e a morte do professor e o seu juramento e fidelidade para o seu grêmio, a garota está assistindo muitas aulas ultimamente. Para a surpresa de alguns mestres.

– É a primeira vez que está aqui, senhorita Crowley. – dizem alguns desses professores.

– Tenho os meus motivos... – retruca a aluna de onze anos.

Os motivos de Valéria são muitos. Competição, inveja, superação, ambição. Todavia, o principal motivo de tanto empenho é um só: Medo.

Podemos dizer que Valéria era uma menina normal, com família, pai, mãe e irmã. As suas lembranças a levam para uma quinta, um tipo de sítio um pouco maior para produção de azeite e trigo. Os seus avôs criaram e se enriqueceram com a produção de trigo e óleos de oliva.

Todavia, a quinta tinha os seus segredos. Os avôs de Valéria firmaram um pacto com um dos inúmeros povos da floresta a qual ajudavam na produção e armazenamento do trigo e azeite. Em troca, a vila mágica daquela tribo de Fadas seria preservada e protegida.

Um dia, houve uma daquelas guerras ou disputas entre algum titã ou algo do tipo. Não importa. O avô de Valéria perdeu tudo. O medo da fome e da miséria batendo na porta o levou a procurar os seus vizinhos mágicos para salva-lo de alguma forma da desgraça que se aproximava sobre a sua família.

Então o pacto. A próxima filha e a partir das próximas gerações, a primogênitas, serão entregues ao povo das Fadas, depois todas as produções da quinta cresceriam magicamente. O único, porém, que as lembranças dessa primogênita seriam esquecidos da mente de todos.

E assim foi por duas gerações daquela família. O problema que no dia que Valéria nasceu, ela estava acompanhada de uma irmã gêmea. Valquíria. Idêntica em aparência, mas um pouco mais gentil e carismática. Ironicamente, ela era a caçula. Por tanto, Valéria seria levada pelo povo das Fadas.

Valéria nutria uma inveja profunda por sua irmã gêmea. Mesmo tendo a mesma aparência, a mesma criação, carinho, atenção e afeto. Valéria via a sua irmã tinha mais talentos e carisma do que ela. Como pudemos ver anteriormente, a garota é competitiva, ambiciosa e, até certo ponto, sem muitos escrúpulos.

A inveja transforma as pessoas. É uma dor profunda e lenta que corrói e distorce a sua visão de realidade. Valéria estava com todos os sintomas dessa chaga maligna que destrói a sua alma.

Um dia, o povo das Fadas veio cobrar o seu preço...

A surpresa deles era o fato de serem duas em vês de uma. A mãe delas não seria capaz de escolher, pois o seu Amor e dor seriam grandes demais para suportar escolher uma das duas. Por isso, ambas foram levadas, mas só uma retornaria.

Valéria sabendo que seria escolhida e a sua irmã, não. A garota teve uma idéia diabólica. Aproveitando que eram gêmeas e da ingenuidade de sua irmã disse a ela:

– Irmã. Vamos fazer um jogo? Quem vencer volta para casa à outra vai com as Fadas. – propõe.

A sua irmã aceita e acaba derrotada, pois Valéria além de ser habilidosa com as mãos, trapaceou. Exigiu que concordasse com tudo que dissesse. Humilde, a sua irmã, aceita.

A Rainha das Fadas era uma criatura gentil, mas justa e integra. A sua pergunta diante as duas gêmeas foi:

– Qual das duas veio primeiro ao mundo? – pergunta.

Valéria decreta que foi a sua irmã. E a mesma foi levada para a câmara da Driades para ser aceita no povo antigo. Valéria teve um presente de confiança e coragem por vir com a sua irmã. Sete Sprites com poderes únicos para servi-la até o final dos seus dias em compensação da perda de sua irmã, além de conservar a sua memória de tudo que aconteceu ali. No fundo, a Rainha ficou muito sensibilizada com a atitude de uma irmã acompanhar a sua irmã mais velha para aquele povo.

– A primeira Sprite chama-se, Solis, a fada da Luz, os seus poderes são ligados à Luz e o calor do Sol. A segunda chama-se, Lunes, a fada das Águas, ela controlará tudo que for ligado às águas e seus correspondentes. A terceira chama-se, Martis, a fada da Terra, ela tem controle sobre a terra e seus frutos. A quarta chama-se, Hermis, a fada da Mente, ela controla as facetas dos pensamentos dos seres vivos. A quinta chama-se, Jovis, a fada do Ar, ela controla os elementos dos ventos e do clima. A sexta chama-se, Venis, ela controla o Fogo e os sentimentos da paixão. A última chama-se Saturnia, a fada das Trevas, a escuridão e morte são os seus domínios. – apresenta a Rainha das Fadas. Ter tantas companheiras requer trabalho e responsabilidade. Elas vão te servir bem e são poderosas. Acredito que possa ser uma mestra justa e gentil com todas elas, assim poderemos aumentar os nossos laços entre as nossas famílias. Pois a sua família é honrada e honesta. Nenhum dos seus tentou me enganar sobre nenhum pretexto. Espero que continue assim até a chegada da sua futura primogênita. – e a realeza sorri.

Valéria retribui com um sorriso tão falso que constrangeu todos os presentes.

Depois de uma cerimônia simples e rápida, Valéria sai do Reino das Fadas com uma expressão de felicidade tendo a companhia de suas novas companheiras. Só que nenhuma ousou falar, exceto uma. Saturnia. Com a sua voz cavernosa e tétrica diz a sua nova mestra.

– Você mentiu para a Rainha das Fadas... – diz taxativa. A minha irmã, Hermis, leu a sua mente. Sabe o que fez e contou para mim. Nenhuma de minhas colegas teve coragem de condená-la, pois fizemos um juramento eterno de servi-la até o fim de sua existência terrena. Mesmo tolhidas em nossas Regras, temos meios de burlar-las... – explica.

– Cale-se! – brada. Sou a sua mestra agora! Não estrague o dia mais feliz da minha Vida. Livrei de minha irmã e vou ter a minha mãe só para mim. O que é melhor que a memória da existência de minha irmã está apagada para sempre. Sou filha única, nunca mais vou ter que dividir nada com ninguém! – urra de prazer e satisfação.

O horror das Sprites era tamanho que as lágrimas escorrem em suas faces diminutas.

Valéria retorna toda feliz em sua casa e abraça a sua mãe com uma alegria que não coube em si de tanta felicidade. E todos na família viveram felizes por algum tempo...

Não muito...

Pois a Rainha das Fadas entrou na sua casa sem nenhuma cerimônia.

– Caros humanos e mortais. Com pesar devo comunicá-los que o nosso pacto está terminado. A filha de vocês nos enganou, mentiu e traiu todos nós. Nesta noite, o seu pai está morto e sua mãe será consumida por uma terrível doença que todos sentirão nojo de se aproximar dela. E contei a sua irmã o que você fez... – diz a Rainha da Fadas para Valéria que estava deitada na cama.

Ousada, a garota retruca:

– Dane-se! O que foi feito está feito! Ou vai quebrar as Regras? Foi te dado à primogênita, nascemos no mesmo dia. Não faz diferencia quem veio primeiro. Não é a minha culpa que a minha irmã seja tão burra assim... – desdenha Valéria.

Uma voz com uma dor que a atingiu no fundo d’alma ecoa de uma forma fantasmagórica. Era Valquíria, com lágrimas e uma expressão de raiva e amargura.

– E a nossa mãe? E o nosso pai? Não pensou neles? Eu não ligo que tenha me enganado ou que me odeie, mas não ligar para a Vida daqueles que deram a Vida? Que tipo de monstro é você?! – grita de dor e magoa.

– Daquele que vence... – decreta Valéria. Que quero vencer e vou vencer! Não importa o que tenha que fazer! Piso, mato, traio, engano, roubo, minto, etc. Faço TUDO para VENCER!!! – berra de ódio.

A Rainha fica horrorizada com os sentimentos tão baixos e mesquinhos da garota de tão tenra idade. Por isso, com cabeça baixa diz:

– Não vou tirar os seus Sprites... Nem os seus talentos ou inteligência. Mas precisa ser punida, por isso, não terá família. Ficará só no mundo. Manterá a sua mesma aparência até o dia de sua morte. Este dia contado por Saturnia que dirá quanto tempo tens de Vida em sua existência terrena. Nunca mais reconhecerá os membros de sua família, mas eles saberão que foi que fez o que fez. Vivos e mortos. A sua irmã terá a prerrogativa escolher as outras maldições que serão sete que deverão ser cumpridas antes do fim de sua existência terrena. Espero que fique ciente e aprenda a loucura do que fez... – decreta a Rainha das Fadas.

O incrível que Valéria desprezou completamente o decreto real e interpretou tudo como um sonho. E voltou a dormir.

No dia seguinte, Valéria está no meio da floresta, sem muitas idéias coordenadas e sem memória. Sozinha e com as suas fadas voadoras. Valéria decidiu dedicar a enganar os outros e sobreviver com pequenos furtos. Utilizando as suas Sprites amarguradas com a sua mestra.

Um dia, o professor Carlos Castanheira descobre uma pequena ladra faminta e a conduz para a sua mestra. Com habilidade e diplomacia, o professor leva para as instalações da Academia Arcana e a instrui sobre ética e moral. Além de práticas mágicas.

Valéria foi aplicada e gentil com aquele que a tirou da miséria. Não invejou o professor, pois ele lembrava o seu pai que as suas lembranças não reconheciam mais o seu rosto, mas o seu gesto generoso de perdão e redenção. Todavia, ela se diz órfã e o que aconteceu com ela foi há mais de vinte anos. Na verdade, Valéria tem trinta e um anos. A sua maldição a faz ficar presa num corpo infantil até o final dos seus dias...

A garota sabe que algo de muito de ruim se aproxima, por isso ela estuda tanto. O medo. Um medo inconsciente, mas está lá. Todavia Valéria é um membro do grêmio e sabe de sua condição de amaldiçoada, ela quer ser melhor em todos os sentidos, mas o seu lado negro está lá. A espreita. Esperando o momento para ressurgir. Os seus Sprites estão até admiradas por ela ser uma boa aluna e uma boa aliada.

A questão é...

Até quando?