Lágrimas de Diamante

Reconhecendo o território


05:50 a.m
O fim de semana chegou ao fim, eu já não me lembrava mais dos tiros ou da grosseria do homem na lanchonete, minha mente estava focada em uma coisa: O 1º dia da jornada mais intensa da minha vida estava para começar.
Meu amanhecer poderia ser cantarolante como o de uma princesa mas não era. Levei uns bons 15 minutos até sair da cama e quando finalmente o fiz, arrastei-me até a cozinha mentalizando panquecas com queijo derretido.
Não tinha leite. Droga.
— Você ficou em casa o fim de semana todo e não arrumou nenhuma das caixas da mudança, Felicity. Sinceramente, você é seu próprio veneno. - Resmunguei para mim mesma quando percebi que se tivesse terminado de arrumar minha mudança, eu teria visto a geladeira e também teria notado o quão desnecessariamente vazia ela estava. Passei o fim de semana terminando matérias que fiquei devendo para o The Globe and Mail e zapeando o netflix sem chegar a escolher um filme ou série de fato.
Não me restou alternativa a não ser ir para o banho e tomar café a caminho do trabalho.
Enrolada na toalha, fiquei encarando meu corpo na frente do espelho. Eu só havia ido até nova-iorque três vezes há muitos anos atrás e apesar de estar completamente consciente do ritmo de uma cidade grande, me peguei pensando sobre que roupa jornalistas nova-iorquinas usavam para trabalhar. Claro que nesse mundo globalizado, eu não estava completamente no escuro mas toda novidade nos faz ficar nervosos até com o que já é habitual, a meu exemplo: qual roupa usar para trabalhar. Eu já não me lembrava mais da sensação de ser "nova" em um lugar.
Bem, discrição é sempre a regra. E eu não faria diferente.
Escolhi uma saia lápis midi cinza e uma camiseta salmão de alças finas que ornou perfeitamente com a corrente dourada fina o e alguns poucos anéis que escolhi para me indumentar.
Meus cabelos são loiros e apesar de uma estatura média, são cheios, não exatamente escorridos mas com leves ondas que sempre me deixam com ar de despojada quando os deixava soltos, por isso eu sempre trabalhava prendendo-os em um rabo de cavalo, pois transmitia mais seriedade. Hoje eu optei por unir o melhor de dois mundos, deixando o cabelo solto porém prendendo algumas mechas um pouco acima da nuca com uma presilha. Escolhi um scarpin nude-rosado para combinar com a harmonia da roupa e saí de casa.
Após tomar café em uma padaria que descobri não ser tão perto de casa quanto eu achei, peguei um táxi rumo ao trabalho e cheguei ao prédio do The Wall Street Journal.
Uma porta de vidro preto larga e alta se abriu automaticamente quando me aproximei e fui abraçada pelo frio congelante do potente ar condicionado do hall de entrada. Toda a extensão do saguão era revestida por piso de porcelanato marrom e a mesa da recepção era feita de mármore em tons pastéis. Acima da recepção, na parede, estavam esculpidas no mármore o nome do jornal em formato piramidal. O saguão não tinha muitas portas para muitas salas, pelo que notei, bastava-se ali a recepção e os elevadores, com o acréscimo de uma tv de LED transmitindo informações da bolsa de valores e algumas poltronas de couro preto ao redor dela.
Após me identificar à recepcionista, ela fez meu cadastro e direcionou-me ao 8º andar, onde meu mais novo editor-chefe me aguardava.
No andar de destino fui recepcionada por uma mulher que provavelmente era adulta (afinal, era secretária pessoal do editor-chefe) mas seu rosto absurdamente juvenil e seu corpo magro e pouco desenvolvido me deixou estupefata, ela não deveria estar na escola?
— Bom dia. - Disse à mim e olhou para o crachá preso a minha blusa. - Srtª Felicity Smoak. Seja bem vinda. - E apertamos as mãos. - Me chamo Olivia. Sou a secretária do Sr. Dibny.
— É um prazer. - Retribui a gentileza com um sorriso caloroso.
Ela sorriu de volta e gentilmente conduziu-me à sala de Jonathan Dibny, o editor-chefe do jornal.
— O Srº Dibny está no fim de uma reunião e logo irá te receber. Fique à vontade. - Com um gesto das mãos, Olivia apontou para uma das poltronas de frente para a mesa do srº Dibny.
Provavelmente a sala de Jonathan Dibny era maior que meu apartamento. Atrás de sua mesa se estendia uma longa janela coberta por uma persiana nude.
No lado esquerdo da sala havia uma estante planejada marrom, que ocupava todo o cumprimento da parede e estava completa por diversos livros e alguns porta retratos, já o lado direito funcionava como uma espécie de "sala de estar", com uma grande TV de LED rodeada por um sofá de couro de três lugares e uma grande poltrona de couro em cada ponta. Na diagonal da TV havia uma moderna esteira e no canto da parede, próximo a porta por onde entrei um bar e ao lado uma porta onde possivelmente era o banheiro. Era uma sala muito aconchegante que exalava autoridade.
Fui arrancada de meus devaneios pelo barulho da porta da sala abrindo e Jonathan Dibny entrando na sala.
— Felicity Meghan Smoak! Finalmente! - Ele anunciou meu nome calorosamente e com rapidez caminhou até a poltrona onde eu estava sentada, beijando o dorso da minha mão. Jonathan era um homem alto, com cabelos louros e cacheados um pouco abaixo das orelhas, presos por um fino arco preto. Usava uma blusa social vinho e uma calça preta que combinava com seu mocassim de mesma cor. Notavelmente um homem incrivelmente novo para o cargo de editor chefe.
— Jonathan Dibny, é um prazer. - Retribui sua saudação calorosa com um largo sorriso.
Jonathan sinalizou que eu esperasse um instante, onde ele procurou algo dentro de uma das gavetas de sua mesa.
— Vejamos... - Disse após achar o que procurava: um envelope pardo. - Felicity Meghan Smoak, 28 anos, formada em jornalismo. Fluente em frances. Trabalhou durante 6 nos para o The Globe and Mail, hm... um importante jornal canadense. - Dibny deu prosseguimento à leitura em silêncio, intercalando seu olhar entre mim e o papel. Depois de alguns instantes lendo para si, jogou o papel longe. - Que droga eu estou fazendo? Isso não é uma entrevista! Você já é membro de Wall Street! - Sua empolgação repentina me assustou mas eu consegui manter o sorriso. - Leonard me enviou algumas de suas matérias... - Ele se levantou e continuou sua fala enquanto andava pela sala. - Sua inteligência é de um tom único.
Sorri, desconcertada pelo elogio e Jonathan fez sinal para que eu me levantasse e o acompanhasse durante um "tour" pela sua sala, mostrando-me os livros em sua estante, arquivos com matérias antigas que segundo ele eram a gasolina para os novos jornalistas, para a nova geração... Nossa conversa durou mais ou menos 2 horas, onde acertamos burocracias e alguns pontos do cotidiano jornalistíco nova-iorquino que seria primordial que eu começasse a me habituar com agilidade.
— Bom, felizmente você não veio aqui para passar o dia conversando comigo não é? Apesar de ter sido uma ótima conversa. Quero que você comece seu primeiro dia com o pé direito, então, já tenho a semente de uma matéria para você.
Encarei Jonathan com curiosidade.
— Uma mulher se suicidou no Bronx.
Não consegui disfarçar a insatisfação na minha voz quando argumentei: - Mas suicídio sequer é um crime, porque seria útil para uma matéria? Como eu pude ser tão audaciosa no primeiro dia de trabalho?
Felizmente e para a minha surpresa, Jonathan sorriu em aprovação à minha impetuosidade.
— Uma jornalista julgando o livro pela capa? - Jonathan me conduziu à porta de sua sala. - Mergulhe, Felicity... os peixes mais interessantes sempre estão mais no fundo, não é verdade?
— Costumam ser bem feios também... - Conclui, falando mais sozinha do que com Jonathan. Porém, eu amava um bom mistério, não recusava a oportunidade de tirar água da rocha e agora não seria diferente.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.