Lua e Sol

Apenas sentir


Domingo a tarde, o sol brilhava intensamente no céu, o mar estava calmo e muito azul, mas tudo o que Luana conseguia pensar era em como beijar poderia ser incrível se fosse com a pessoa certa. Passara das duas da tarde e ela ainda não tinha se levantado da cama, dormiu tão bem naquela noite, que acordar foi uma tarefa quase impossível, seu pai saiu bem cedo para pescar com uns caras que ele havia conhecido numa visita a praia onde Augusta trabalhava, provavelmente ele voltaria quase no fim do dia, foi o que Lua pensou, então desceu apenas para comer um macarrão instantâneo e voltou para o quarto; pegou seu diário, escreveu sobre toda a aventura que vivera nos últimos meses:

(...)” De todas as alegrias que vivi com minha mãe, nenhuma se compara ao que estou vivendo agora. Encontrei uma parte minha que havia se perdido; talvez agora eu entenda o por que de todos acreditarem que amores impossíveis são melhores que amores fáceis, lutei tanto para viver algo assim e finalmente aconteceu. Ah um beijo, o que é um beijo? Eu não tenho palavras para descrever o que senti quando ele aconteceu, mas com certeza, encontrei minha luz que há anos procurava.”

Quando terminou de escrever, ficou olhando sua vizinhança pela janela, ela morava em um sobrado, simples, porém bonito e bem arrumado. Quando criança passara a maior parte do tempo fora de casa com a mãe, então não costumava observar seus vizinhos. Mas seu pensamento estava bem longe dali…

Sol, havia acordado cedo, ajudado a mãe a arrumar a casa e organizado todo seu quarto de novo. Tentou ficar a par dos problemas que a mãe dela ainda teria que resolver, mas o que uma garota de 14 anos pode fazer nesta situação?, ela pensou; então deixou que os assuntos de adulto fossem resolvidos por eles.

–Mãe, já disse o quanto eu sou grata por tudo o que fez por mim desde que eu era apenas um grãozinho? - disse Sol quase chorando.

–Oh minha lindinha, por que essas lágrimas? - Augusta abraçou Sol enquanto falava - Você sabe que eu te amo mais que tudo, sou tão feliz por ter você, nunca mais vou deixar que te tirem de mim!!!

–Eu queria poder te ajudar mãe, com os advogados e com tudo o que envolve os problemas que aquele traste nos causou…

–Sol, não se preocupe com isso, eu já tenho ajuda o bastante. Agora se preocupe apenas com os estudos ou em seu esporte favorito, não pense no que eu tenho que fazer! - Respondeu Augusta andando até a cozinha.

–Eu não me desculpei por ler seu diário, isso foi péssimo, sinto muito…

–Se não tivesse lido, sabe lá o que teria acontecido com você!! Até mesmo porque se eu não quisesse que ele fosse lido, não teria escrito!! Filha não deixe que ninguém apague seu brilho…- fez uma pequena pausa e continuou - Eu queria te perguntar uma coisa…

–Pode perguntar mãe, não tenho segredos com você.

–Sabe, estou preocupada, esse namoro não é muito precoce?!

Mães são sempre muito preocupadas, a grande maioria tem sentimento de proteção contra qualquer motivo de sofrimento ou angustia. No caso, Augusta se preocupou, porque tudo o que havia acontecido foi por amor, mas ela ainda não entendia muito bem o tipo de amor que a filha sentia por Lua, as duas eram muito jovens e talvez não desse certo, então tudo o que a mãe de sol pensava naquele momento, era no bem estar da filha.

–Ah… - Sol ficou pensativa, não havia planejado tudo aquilo, o sentimento apenas surgiu e foi cultivado por tantos meses que era muito improvável que ela não insistisse em fazer dar certo. A idade não era a maior questão para elas, tudo se resumia em uma mistura de energias, companheirismo e amizade, que resultava no amor que elas sentiam uma pela outra. A idade nesse era apenas uma informação, nada que pudesse atrapalhar. Pensou por alguns minutos, enquanto a mãe lavava a louça e disse - Eu a amo mãe, há dois anos, ela é meu primeiro amor e se não der certo, bom… pelo menos eu vivi isso.

Aceitando a resposta de Sol, Augusta pediu que ela fizesse uma sobremesa, Tavi viria para o almoço e Solange não aguentou de tanta felicidade, estava com muita saudade do seu melhor amigo e quase não conseguiu acertar a receita. Minutos depois, o almoço já estava pronto e o mousse na geladeira, só faltava alguém:

–TAVIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIII!!!

–TELETUBE!!!!

Os dois se abraçaram com tanta força que caíram no chão, Augusta se assustou, mas depois começou a rir. A amizade deles era tão sadia, aquele tinha sido o maior intervalo de tempo que passaram separados; como era bom poder se abraçar, eles pensaram, mesmo que no geral não se abraçavam muito. Tavi sentiu tanto medo de perder sua “maninha” que aquele momento entrou para a lista dos melhores de sua vida.

–Teletubes? Como assim? - perguntou Augusta, ainda rindo.

–Ah, sabe aquele sol com cara de bebê do desenho? Então é a Solzinho Teletube!!- Explicou Tavi, então todos começaram a rir sem controle!

–Senti tanta falta de você, seu surfista idiota! Nem foi me visitar!!! - Falou Sol com bico de criança mimada.

Então eles começaram a comer, enquanto Sol e Tavi matavam a saudade, Augusta apenas agradecia ao universo por ter permitido que ela vivesse esse momento lindo. Naquele dia Lua e Sol não se veriam, mas elas teriam muitos dias para passarem juntas ainda.

A tarde passou “voando” para Solange, mas para Lua foi um dia muito longo; seu pai ainda não voltara para casa e ela já estava ficando preocupada, não tinham como se falar e tudo o que ela pensava era que ele havia se perdido no mar, decidiu então que arrumar o guarda roupa ajudaria a passar o tempo.

–Luana Martins, você podia ser mais organizada!!! - pensou ela em voz alta, enquanto jogava as calças jeans no chão para dobrar e guardar de novo. Percebeu que de dentro do bolso de uma das calças caiu um pedaço de papel dobrado, nem lembrava que tinha guardado aquilo, quando abriu era a cartinha que havia encontrado na casa de Sol.

Dizem que as estrelas mesmo brilhantes, podem não estar presentes. Dizem que a Lua e o Sol nunca poderão se amar. Dizem que o Mar é assustador. Dizem tantas coisas as vezes sem valor. Mas ainda não disseram que eu não posso te querer. E se um dia disserem isso, eu vou ignorar, porque não te querer é a ultima que farei.

Quando chego e me sento de longe, penso que nunca terei coragem de dizer o quanto você é linda. Seus olhos me trazem uma paz que eu ainda não decifrei, mas poder olhá - los de perto é o que mais desejo.

Minha 'Olhos de diamante', um dia sei que saberei seu nome, mas por enquanto, te imagino como uma pedra preciosa, a mais desejada, a mais delicada e ao mesmo tempo a mais resistente de todas, há quem diga que és intocável, inalcançável para alguém como eu. Mas nada que eu não resolva.

Espero que um dia me veja, te olhando; e me olhe com tanta ternura como olhas para as ondas do mar, sei que posso não ser digna do seu amor, sou apenas uma garotinha e você tem a beleza de uma mulher.

Não pense que vou desistir, um dia seremos um só coração.

Minha, apenas minha.

Solange S.

Lua, não conseguiu conter as lágrimas, sentou no montinho de roupas e pensou no quanto tempo havia perdido. “ E se eu tivesse ao menos olhado para trás?” Ela pensou muitas vezes nessa frase, nessa caso fez sentido, mas olhar para trás era algo que Lua não fazia. Sua mãe lhe ensinara a viver sempre seguindo em frente, talvez tenha demorado para aprender isso, mas nesse momento era o que ela queria fazer, seguir em frente com seu amor. Mesmo que todas as dificuldades batam a porta. Ela se recompôs e terminou de arrumar as roupas, depois releu a carta, pelo umas quatro vezes, até ouvir seu pai chegar.

–PAI? - gritou ela.

–Cheguei filha, desculpa a demora, trouxe peixe!! Vamos preparar a janta!!

–Até que enfim!!!!

Quando chegou na cozinha, seu pai havia bagunçado tudo em menos de dez minutos, e o cheiro de peixe invadiu a casa inteira, Lua fez cara de nojo e pediu para o pai ir tomar banho antes de comer. Enquanto ele se limpava, ela lavou o peixe e ficou pensando em como deve ser difícil ser tirado de onde você mora, para agradar alguém, lembrou do que Ricardo havia feito com Sol e quase não conseguiu terminar e lavar a pescada, ela sentia que sua vida só iria melhorar quando realmente se libertasse de todos os pensamentos frios que ela tivera desde a morte da mãe; seus pensamentos foram interrompidos pelo telefone da casa que começou a tocar muito mais alto do que ela lembrava, secou as mãos e foi atender na sala.

–Alô?!

–Oi!

Lua reconheceu aquele “Oi”, era Sol, era disso que ela precisava para melhorar seu humor no fim de um domingo tedioso.

–Ai, que bom que ligou, estava mesmo precisando da sua voz.

–E eu da sua!! Meu dia foi tão bom, mas faltou você !

–Ah, quem dera o meu tivesse sido, mas parece que ainda há esperança!

–Pensei em convidar você e seu pai, mas era o dia do Tavi! - risos.

– Ahhh que legal, ele é muito divertido mesmo, fico feliz que seu dia tenha sido bom. - Lua pensou em contar da carta, mas agora percebera que não havia ganhado ela e sim pegado sem permissão, então deixou para outro dia.

–Você está meio desanimada! Isso não é bom!! Na verdade liguei pra saber se quer que eu te busque na escola!? Amanhã não tenho aula de natação, seria legal se pudéssemos sair um pouco. - Perguntou Sol.

–Claro que sim !!- Respondeu Lua sem hesitar.

As duas conversaram até Sr. Lucio sair do banho para finalmente fazer a janta. Graças ao bom humor de Solange, toda aquela negatividade de Luana tinha ido embora e ela e o pai puderam ter um fim de noite bem agradável. Quando voltou para o quarto, olhou mais uma vez pela janela, observou o céu e ficou feliz em saber que mesmo não podendo ver, Sol sempre esteve ali por ela, então agradeceu, pois aquilo era mais do que poderia pedir. A semana tinha tudo para ser ótima, pena que alguns sentimentos são difíceis de controlar.