Paulo Guerra estava sentado na janela de seu antigo apartamento, observando a paisagem ao lado de fora, sempre fora um homem observador, não podendo deixar de notar que aquele lugar havia mudado bastante. O centro de São Paulo já não era a mesma cidade que um dia ele deixou. Porém, apesar das diferenças, tudo naquele lugar trazia lembranças para o moreno. Paulo ainda sentia aquele sentimento de nostalgia, que lhe invadira desde que pisou os pés na cidade, determinado a ficar.

Observou o luxuoso apartamento com certo desgosto, sabia que mais cedo ou mais tarde teria de visitar sua família no Morumbi e até mesmo voltar a morar com seus pais, já que tinha prometido a sua mãe que faria assim que concluísse seus estudos na Alemanha. Só que o moreno ainda não se sentia pronto para isso. Ele odiava admitir, mas se sentia muito solitário e viver sozinho naquele apartamento caro e afastado do condomínio só lhe traria mais ainda a sensação de solidão.

Sentiu um leve arrepio com o vento frio que lhe tocou, as arvores balançavam incessantemente, e o céu que já estava cinzento por causa do começo da noite, agora estava um pouco mais escuro por causa da tempestade que logo cairia. Paulo continuou lá, da maneira como estava, gostava de sentir o vento frio, sempre gostara de observar a chuva caindo. Era como se o céu estivesse despejando sobre a terra todas as suas emoções, suas angustias e frustrações, se libertando, E Paulo gostava daquela sensação, era como se a chuva levasse com ela todas as suas emoções e angustias, e também o moreno se sentia leve. E aquele clima era seu fiel testemunho.

A chuva já começava a cair, derramando suas primeiras gotas, logo tudo estaria encharcado. Paulo estaria lá, observando, até que a chuva começasse a perder força e ele já cansado, fosse dormir.

Estava observando a chuva molhar as ruas e calçadas, quando um pouco ao longe viu alguém, que vinha em passos apressados, tentando fugir da chuva que lhe molhava todo o corpo, mas era inútil, pois se podia notar que suas roupas estavam encharcadas. E Paulo a reconheceu de imediato: era Alícia Gusman, e ela estava ensopada. As poças d'agua que se formavam na calçada não ajudavam em nada, atrapalhando seus passos, que por causa das poças não podiam ser tão rápidos quanto ela gostaria. O moreno se perguntava o que ela fazia por ali, já que o condomínio do Morumbi ficava do outro lado da cidade e se ela não tinha notado que iria chover, evitando assim tomar chuva. Ela ainda iria demorar um pouco até chegar a sua casa.

‘’- Vai acabar doente se continuar na chuva!’’ - pensou Paulo.

~*O*~*~*O*~*

Alícia se esforçava para andar depressa, mas seu esforço parecia inútil. Além das poças, a calçada de terra agora estava um completo lamaçal, poderia escorregar a qualquer momento, então tinha de ser cuidadosa, andando ainda mais devagar. Seu pai iria mata-la quando a visse chegando naquele estado em casa. Distraída e só focada em chegar logo em casa, não percebeu uma poça a sua frente, pisou de mau jeito e caiu sentada no meio da lama.

‘’- Agora sim estou ferrada!’’ - pensava a morena em desespero não acreditando que aquilo estava acontecendo.

Tentava se levantar sem muito esforço, pelo jeito tinha torcido o tornozelo, não chegaria em casa nunca.

— Só comigo mesmo pra acontecer essas coisas, deveria ter saído antes da casa da Valéria! Não acredito que isso está acontecendo, como vou voltar pra casa agora? Vamos tornozelo, melhore, por favor! – resmungava baixinho, passando a mão no tornozelo.

— Se você ficar aí resmungando e conversando com seu tornozelo a situação só vai piorar Alícia. – disse Paulo simplesmente, como se estivesse ali o tempo todo, assustando a morena que deu um grito baixo e arregalou os olhos.

—Ah. Paulo.. – disse ela gaguejando Eu estou bem, estou indo para casa agora.

— É mesmo? Pois não parece! – disse arrogante.

Paulo não sabia o porquê de ter ido ajuda-la, deveria ter deixado que ela se levantasse sozinha, mas quando viu já estava lá, em sua frente, ouvindo a morena resmungar sozinha. Ele já estava começando a se arrepender de ter saído de casa, sentindo as gotas da chuva invadir a capa de chuva que usava e lhe molhar o pescoço descendo para o resto do corpo.

Alícia simplesmente abaixou a cabeça e ficou em silêncio, esperava que o Paulo fosse embora rápido, não estava em seu melhor estado e mal havia falado com o moreno quando soube que ele retornara a São Paulo. De todas as pessoas que tinham que ver ela naquele estado, tinha que ser justo ele?! Era constrangedor demais para a morena.

Estava com esses pensamentos na cabeça, já tremendo de frio, quando sentiu seu corpo ser levantado do chão e prensado em um peitoral forte. Levou um susto e logo em seguida seu rosto tomou uma coloração vermelha. Antes que pudesse dizer alguma coisa, Paulo começou a caminhar, e ela entrou em desespero, Paulo a estava carregando da mesma maneira como fazia quando eram namorados e ainda ia por uma direção que não era o caminho da sua casa.

— Paulo? O que está fazendo? – perguntou confusa.

—Hunt. – Paulo simplesmente continuou a andar, também não sabia o que estava fazendo, mas agora era tarde para deixa-la na chuva sozinha.

Alícia simplesmente se encolheu e ficou em silêncio, não tinha a menor noção do que fazer. Ao sentir a morena se encolhendo em seus braços, Paulo sentiu um leve arrepio lhe invadir, sentia o perfume dos cabelos dela e estava começando a ficar sem jeito, por Deus, como sentia a falta daquele perfume da morena.

Alícia era diferente das outras, era uma mulher doce, gentil, tímida, quieta, mesmo com seu estilo moleca e curtia andar de skate, ela sabia se portar, tratava a todos bem. Paulo lembrava-se perfeitamente dela, a garota que sempre fora a única que sempre habitava seu coração e pensamentos. Ela sempre lhe chamou a atenção, às vezes, ele gostava de observa-la de longe, achava-a diferente das outras, era e ainda é a única que ele sempre amou com todas suas forças. Paulo se sentia estranho, mas jamais admitiria, mas seu coração havia se fechado desde quando a morena terminou com ele.

Entraram no enorme apartamento. Paulo colocou Alícia no chão e saiu andando, ela ainda sem saber o que fazer, ficou escorada na parede esperando ele voltar. Não demorou muito e ele voltou com uma toalha e uma camiseta de mangas compridas com uma estampa de uma banda de rock nas costas. Estendeu o braço para Alícia que se encontrava paralisada, e não era pelo frio.

Ele não esperava que ela colocasse aquela roupa né?! Era um tecido fino demais, e com certeza ficaria curto. Não! Alícia definitivamente não sabia o que fazer.

—O banheiro fica ali. – Paulo indicou a porta do outro lado, ainda com o braço estendido para Alícia, esperando ela pegar a toalha e a camiseta.

Alícia simplesmente olhava fixamente para a mão do moreno sem reação alguma, ainda estava perdida em seus pensamentos, não acreditava no que estava acontecendo. Seu rosto começou a tomar uma coloração avermelhada enquanto ela afirmava mentalmente que não vestiria aquilo.

— Qual é, Lícia? Você já vestiu minhas roupas antes. – afirmou Paulo com um sorriso irônico.

— Não precisa, Paulo. Eu não deveria estar aqui, tenho que ir para casa. — disse ela vacilante enquanto andava mancando até a porta, ou pelo menos tentava.

Paulo revirou os olhos já perdendo a paciência e se aproximou da jovem segurando-a pelo braço e a puxando para si.

— Que droga, Alícia! Desse jeito você não conseguirá nem chegar até a porta. A única coisa que vai conseguir é ficar doente. – falou de uma maneira autoritária, fazendo Alícia se lembrar de seu pai.

— Paulo, eu só preciso voltar para casa! Meu pai vai ficar furioso se eu não chegar logo em casa. – disse encarando o moreno fixamente, sentindo seus olhos esquentar.

— Fique aqui, depois eu ligo para avisar o seu pai. E amanhã eu te levo para casa.— Paulo simplesmente suspirou, colocou a camiseta e a toalha no chão e foi para seu quarto trocar de roupa, pois a sua também estava um pouco encharcada.

Paulo não sabia o que fazer, pois Alícia parecia não poder enxergar sua real situação, se ela queria ir, e ficar doente, ele não iria impedir. Algo dentro dele estava torcendo para que ela caísse na real e ficasse com ele e fosse logo trocar de roupa, estava torcendo para que a chuva continuasse caindo à noite toda.