Pov’s Ally

Tudo passou como um borrão diante dos meus olhos.

Em um momento estávamos nos beijando e no outro eu tinha sangue em minhas mãos enquanto ele estava estirado no chão.

Foi tudo rápido demais para que eu sequer conseguisse piscar.

—Austin? -dei um tapa em seu rosto para que ele não adormecesse, mas seus olhos já estavam quase fechados.

—Por favor, fica comigo. -coloquei minha mão ainda trêmula sobre o buraco de bala em seu estômago.

Um sorriso fraco se espalhou por todo o seu rosto. Ele estava fazendo o seu melhor para não gemer de dor.

—Não durma, por favor, apenas não durma. -eu não sabia se eu estava tentando acalmar ele ou a mim mesma.

Meu coração estava acelerado e eu sabia que se continuasse nesse ritmo, não iria demorar muito até eu ter um ataque cardíaco.

—O kit... -ele se esforçou para dizer. —O kit de primeiros socorros.

Me senti estúpida por não ter pensado nisso antes, mas nem pensei duas vezes antes de correr em direção ao kit de primeiros socorros que tínhamos roubado do avião.

Minhas mãos tremiam enquanto eu vasculhava a caixa branca diante de mim. Peguei uma pinça, algumas gazes e de debaixo da cama eu tirei uma garrafa de uísque. Aquilo teria que servir por agora.

Respirei fundo antes de colocar um dos braços de Austin atrás do meu pescoço e conseguir tirá-lo do chão, mas ele era muito pesado o que apenas dificultou o processo.

—Argh. -ele resmungou quando eu o joguei na cama, mas aquilo era o melhor que eu podia fazer em minhas condições de aflição.

Me arrastei até estar pairando sobre seu corpo e enfim me sentei em seu abdome tomando o máximo de cuidado possível para não tocar em sua ferida.

—Eu preciso que você beba isso. -com a boca arranquei a rolha da garrafa de uísque e nem esperei por sua resposta. Levantei um pouco sua cabeça e despejei o líquido dentro de sua boca.

—É quase como um analgésico. -falei enquanto eu mesma dava um pequeno gole no líquido de cor escura e com um gosto horrível.

Austin tossiu um pouco e tentou recuperar o fôlego, mas não reclamou por nenhum momento sequer.

—Isso vai doer, não posso negar. -olhei o buraco de bala alojado pouco abaixo de seu peito. Foi por pouco. —Mas você estará bêbado o suficiente para não reclamar.

Fiz com que ele bebesse mais alguns goles antes de tirar a garrafa de sua boca.

—Eu espero que isso seja algo bom. -ele tentou dar um meio sorriso, mas não obteve sucesso. A dor não lhe permitia fazer nada além de tentar regular sua respiração.

—Eu também espero. -Peguei a pinça com uma mão enquanto despejei o resto do uísque em sua ferida o que apenas fez com que ele soltasse um grunhido alto.

—Porra. -ele mordeu o lábio tentando controlar a dor e pude ver gotas se suor começarem a aparecer em sua testa.

Fechei os olhos por um breve momento antes de enfiar a pinça no buraco de bala.

Eu nunca tive experiência com qualquer tipo de coisa que envolvesse sangue e ferimentos causados por armas de fogo, mas desde que viemos para essa ilha tudo tinha mudado e eu já estava cansada de tentar entender os fatos.

Enfiei um pouco mais a fundo até que senti o metal em contato com a pinça. Respirei fundo mais uma vez antes de tentar puxa-la, no entanto fui um total fracasso.

Minhas mãos tremiam e eu sabia que não iriam parar tão cedo, porém mesmo assim tentei pela segunda vez e de novo falhei.

Calma, Ally. Apenas foque em remover a bala.

Repeti para mim mesma como um mantra e depois de mais algumas tentativas inúteis finalmente eu consegui remover a bala de seu corpo.

—Graças a Deus. -sussurrei para mim mesma antes de jogar a pinça e a bala para o outro lado do quarto.

Sem me importar com o sangue em minhas mãos eu limpei o suor em minha testa.

Levantei a mão para agarrar a gaze ao meu lado quando ele segurou meu pulso.

—Obrigada, você salvou a minha vida. -sua voz estava agora rouca e eu podia ver como estava sendo difícil para ele pronunciar aquelas palavras sem gemer de dor.

—Logo depois de quase ter o matado. -um sorriso amargo apareceu em meus lábios enquanto eu colocava a gaze em seu peito.

Rasguei um pedaço do meu vestido que já estava aos pedaços e com ela fiz o melhor que pude para parar o sangramento.

—Não foi sua culpa. -ele franziu a testa.

—O efeito do álcool veio mais rápido do que eu esperava. -fiz um movimento para sair do seu colo quando ele me puxou para mais perto de si.

—Eu ainda não estou bêbado e nós dois sabemos disso. -um sorriso preguiçoso se formou em seus lábios.

—Como você consegue sorrir sendo que levou um tiro quinze minutos atrás? -perguntei tentando mudar o foco do assunto.

—Eu não posso fazer nada além disso. -ele deu de ombros.
Fechei os olhos e encostei minha testa na sua.

—Você quase morreu, Austin. -Coloquei minha mão em seu peito como se para assegurar a mim mesma de que ele ainda respirava. —Você é tudo o que eu tenho e eles quase te tiraram de mim. -Falei um pouco mais baixo e senti todo o seu corpo enrijecer com minhas palavras.

Eu ainda sentia a adrenalina percorrendo as minhas veias e as batidas do meu coração em meus ouvidos, mas tentei ignorar tudo isso. Ele estava vivo, isso bastava.

—Ally.-ele pronunciou meu nome de forma doce o que me fez arquear a sobrancelha.

Ele deveria estar com raiva de mim. Fui eu que provoquei tudo isso. Mas mesmo assim levantei os olhos para poder encarar os seus e não vi nada além de paz em suas órbitas.

—Poderia ser você deitada nessa cama neste momento, Ally, e eu nunca me perdoaria se isso acontecesse. -ele acariciou o lado do meu rosto. —Fico feliz que esteja bem.

—Eu não estou bem. Tem alguém lá fora que não hesitaria antes de matar nós dois. -o lembrei. Como se as coisas já não estivessem difíceis demais ainda tínhamos que lidar com isso. —Acho que perderei minha sanidade em poucos dias.

Engoli em seco e olhei para a pequena janela em nosso quarto. Em poucas horas o sol nasceria mais uma vez e eu sinceramente já estava cansada dele. Cansada dele, da lua e das ondas do mar. Tudo aquilo que deveria ser um paraíso, na verdade tinha se tornado meu inferno pessoal.

—Eu sei e é por isso que partiremos ao amanhecer.

Lentamente virei minha cabeça para mais uma vez encarar seus olhos.

—O que você está dizendo? -tentei decifrar em seu olhar se ele já estava bêbado ou não, mas o máximo que consegui enxergar foi cansaço.

—Se tivermos sorte o avião ainda está na praia e então podemos tentar alguma transmissão. Também temos o bote que usamos para chegar até aqui. Eu o escondi atrás de alguns coqueiros logo depois que eu soube que não estávamos sozinhos aqui.

Minha boca se abriu, mas eu estava sem palavras. Minha mente estava perturbada demais para eu tentar ligar os pontos, mas mesmo assim apenas perguntei a única coisa que consegui formar em meus lábios:

—Você acha que isso vai funcionar? -perguntei aproximando meu rosto do seu.

Ele estava quase caindo no sono e eu nem o culpava. Tentar controlar a dor, o uísque e o ferimento de bala tinham feito ele gastar toda sua energia.

—Não tenho nada o que perder se eu arriscar, e você? -ele aproximou seus lábios dos meus e não o parei.

Suas mãos vieram para a minha cintura enquanto eu acariciava seu cabelo.
Nada mais precisava ser dito naquele momento e eu agradeci por ele ter cortado a tensão de uma só vez.

Aprofundei ainda mais o beijo e dei um leve gemido quando ele lentamente mordeu meu lábio inferior.

Senti sua mão direita subir até a parte superior do meu biquíni e percebi que ele estava prestes a desamarrá-lo.

—Você acabou de levar um tiro. -não consegui conter um sorriso entre um beijo e outro.

—Eu ainda estou funcionando perfeitamente , isso eu posso garantir. -ele sussurrou contra a curva do meu pescoço.

Quem quer que quisesse nós dois mortos podia esperar até o amanhecer. De um jeito ou de outro eu não conseguiria dormir aquela noite sabendo que poderia ter uma arma apontada para mim assim que eu fechasse os olhos.

Se tudo ocorresse como o esperado e realmente conseguíssemos sair desse lugar, existiam inúmeras chances de acabarmos separados e eu não queria pensar nisso enquanto eu estivesse em seus braços.

Aquela poderia ser nossa despedida.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.