Lucca gargalhou durante algum tempo, olhando exclusivamente para Steve, com aqueles olhos orgulhosos de quem vencera um desafio particular.

- É, Capitão... Hoje é você quem precisa de mim. O mundo dá voltas, não é? – Meu irmão disse, dando um gole num copo de uísque. Em seguida, o pôs na mesa ruidosamente.

Steve levantou os olhos e deu de ombros, mas ainda havia um leve vestígio de riso em seu rosto. Ele falou:

- Faço isso porque o Universo depende de mim e da minha Equipe.

Mas meu irmão se levantou da mesa, acendeu um cigarro, e falou, recolocando os óculos:

- E eu faço isso porque preciso da grana. Você sabe como é... – Lucca replicou, olhando para nós com diversão. - E... Pague a conta. Capitão.

Steve revirou os olhos. Ele já estava acostumado com as piadas e as inconveniências do meu irmão, depois de conviver com ele durante meses na prisão. E Steve sempre ignorava.

Por fim, eu me despedi do Capitão, e ele disse para eu e Lucca estarmos na SHIELD em três dias, às nove da manhã. Eu insisti para pagar as bebidas que Lucca consumiu, mas ele não deixou. Steve era mesmo cavalheiro.

Eu o cumprimentei e falei, rindo discretamente:

- Bom... Vejo você em breve, então. Sem grades nos separando.

- Que droga. – Disse Lucca, bocejando. – Nove da manhã? Esses caras não dormem?

Nova York. Nove horas da manhã, e um vento gelado cortando até minha alma. Bom... É isso mesmo. O dia chegara. Eu e Lucca retornávamos à SHIELD. E devo dizer que é bem estranho entrar pela porta da frente, como uma “Vingadora”... Sem algemas me impedindo de me movimentar.

- Eles dormem. No horário certo, Lucca. – Eu respondi ao meu irmão, dando um falso soco no braço dele. – Agora tire esses óculos.

Lucca me fitou com diversão, bagunçando meu cabelo. Ele usava o mesmo tipo de roupa de três dias atrás, com seus famosos óculos de aviador. Num dia nublado.

- Nem pensar, maninha. – Ele disse, enquanto andávamos.

Nós tínhamos arrumado as malas um dia antes. Foi uma tarefa simples, pois não tínhamos muitas coisas. Eu coloquei o que precisava em uma mochila, e Lucca em outra. Quanto à missão que teríamos de enfrentar, eu estava perfeitamente calma. Ora, éramos mercenários. Eu e Lucca encarávamos tudo simplesmente como um serviço a ser feito, e posteriormente recompensado.

Eu era uma criminosa treinada, e feiticeira. Já enfrentei situações de perigo antes, envolvendo de tudo, inclusive magia. Medo não era algo que eu tinha com freqüência. Lucca também era tudo isso, acrescentando que era exibido e um pouco mais impulsivo do que eu.

Paramos em frente à edificação. A SHIELD era uma grande construção futurista, cercada de câmeras de segurança e com muitos soldados em pontos estratégicos. Enquanto eu os fitava, curiosa, Steve apareceu. Ele usava roupas comuns, semelhantes às que ele geralmente usava. Somente o cabelo me pareceu mais bagunçado.

- Olá, Stella. – Ele me cumprimentou, estendendo as mãos firmes. – E Lucca...

Lucca ergueu os olhos e franziu a testa, em forma de cumprimento. Steve fez o mesmo.

- Prontos? – Perguntou o Capitão, enquanto nos guiava SHIELD adentro.

- Somos mafiosos. Estamos sempre prontos. – Falou Lucca, jogando um cigarro fora. O guarda mais próximo o fulminou com os olhos.

Steve sorriu levemente, e foi andando em direção à entrada. Lucca o seguia, olhando tudo com ávido interesse, inclusive mexendo em cada coisa que lhe interessava. Eu o cutuquei com o braço quando ele tentou apertar os botões de algo que parecia “armas para emergência”. Ele reclamou, fingindo inocência.

Mas o lugar era realmente incrível. As paredes pareciam feitas de aço puro; os corredores eram bem iluminados com lâmpadas frias, apesar da falta de janelas; e o ambiente respirava tecnologia.

O mais simples fio de cobre daquele lugar devia valer muito dinheiro, e não pude evitar esse pensamento mercenário. Depois de alguns minutos andando, Steve nos conduziu até uma sala no segundo andar. Paramos em frente a uma porta, e eu li a identificação acima dela: “Iniciativa Vingadores”. Fiquei apreensiva. Uma ansiedade anormal tomou conta de mim.

Steve abriu a porta para que eu passasse. Em seguida, ele entrou e Lucca foi o último. A primeira coisa que observei foi a sala. Era grande, espaçosa, e continha múltiplos aparelhos tecnológicos, que me pareceram radares e coisas do tipo. No centro da sala, havia uma grande mesa oval metálica, com muitas cadeiras ao redor. Cada uma estava ocupada por um membro dos Vingadores. A presença deles, todos juntos, impunha muito respeito. Não que eu estivesse me sentindo intimidada, era apenas receio.

- Vingadores, esses são Stella e Lucca. Os irmãos Alessa. – Apresentou Steve, logo se juntando aos outros.

Cada par de olhos se voltou para mim e para meu irmão. Eu acenei, permanecendo discreta. Afinal, todos que estavam ali já tentaram me matar ou prender. Lucca olhou com desdém para todos, e percebi que seu olhar emitia uma aversão especial ao perpassar por Stark. Mas ainda assim, todos responderam ao meu aceno e fiquei um pouco menos nervosa.

Na primeira cadeira do lado esquerdo da mesa, Tony Stark, o Homem de Ferro; Bruce Banner, o Hulk; e Thor. Na ponta, Steve Rogers, o Capitão América. Do lado direito, Natasha Romanoff, a Viúva Negra; e Clint Barton, o Gavião Arqueiro. Havia mais três cadeiras disponíveis. Onde eu estava me metendo?

- Você trouxe bandidos para nossa sala de reunião? Francamente... – Disse Tony Stark, colocando os pés em cima da mesa e encostando-se confortavelmente em sua cadeira, girando-a levemente.

Algo no tom de voz irônico dele me fez pensar que ele estava brincando, e preferi acreditar que ele estava mesmo.

- Ei... Ex bandidos, ok? – Intrometeu-se Lucca, apoiando as duas mãos sonoramente na mesa central.

- Por favor... Mafiosos como vocês simplesmente não param de cometer crimes só porque foram presos uma vez. – Disse Tony, arqueando as sobrancelhas. Era nítido que ele queria provocar Lucca.

Steve levantou-se da sua cadeira:

- Tony... Precisamos deles. São feiticeiros. – Advertiu Steve, cruzando os braços e olhando para Tony com repreensão.

- Feiticeiros? Ora... Por quatro bilhões de dólares até eu me vestiria de Merlin... – Comentou Tony, fazendo um gesto de quem segura uma varinha. Eu queria rir.

- Tony... – Repreendeu Natasha, mas eu percebi o esforço que ela fazia para manter-se impassível.

- Me vestiria de Harry Potter também. – Incrementou Stark, levantando-se e aprumando o terno. Um ligeiro riso brincou em minha boca. Acho que ele percebeu, porque piscou para mim imperceptivelmente.

- Tony... Você é um idiota. – Disse meu irmão, olhando incisivamente para ele.

Tony andou um pouco ao redor da mesa, e parou bem perto de Lucca, falando sarcasticamente:

- Ah é! Mas eu me esqueci. Não preciso disso. Já sou bilionário.

Banner e Barton deixaram escapar alguns risinhos. Até eu deixei.

- Já pararam com a discussão, crianças? – Esbravejou Steve, ainda com os braços cruzados. – Ou posso fazer as apresentações?

- À vontade, Steve. – Disse Banner, colocando os óculos.

À medida que Steve ia pronunciando os nomes, ele apontava para o Vingador correspondente.

- Esse é Bruce Banner, o Hulk. – Banner acenou simpaticamente. - Esse é Tony Stark... Homem de Ferro.

- Gênio, bilionário, playboy e filantropo, caso ainda restem dúvidas. – Acrescentou Tony, apontando para todos com o dedo indicador.

- Esse é Thor. O deus do trovão. – Thor aproximou-se e beijou minha mão direita, delicada e respeitosamente. Eu sorri em resposta.

- Esse é Clint Barton. O Gavião Arqueiro. – Clint acenou de longe. – Essa é Natasha Romanoff. A Viúva Negra. – Ela sorriu formalmente.

Desse modo, Steve se encaminhou até nós e continuou:

- Esse é Lucca Alessa. Telepata. – Lucca olhou misteriosamente para todos. Ainda bem que ele tinha guardado os óculos escuros ridículos.

- Jura, Steve? Achei que “Stella” combinava mais com ele... – Comentou Stark, olhando com diversão para meu irmão.

- E eu acho que Homem de Lata também combina mais com você, Stark. – Replicou Lucca, inegavelmente irritado.

- E essa é Stella Alessa. Ela domina a magia das sombras. – Disse Steve, como se nenhuma interrupção houvesse acontecido.

- Parece um poder legal... Seria alguma mutação? – Perguntou Banner, anotando algumas coisas em seu caderno.

- Realmente não sei... – Comentei, mordendo os lábios.

Foi então que uma batida na porta, única e seca, desconcentrou a todos. Com um ruído áspero, a porta se abriu e Nick Fury entrou na sala imponentemente.

- Cheguei tarde para a apresentação de poderes? – Ele disse, procurando por Steve.

- Na verdade, chegou na hora certa. – Respondeu o Capitão, cumprimentando-o formalmente. – Estávamos indo para a Sala de Treinamentos.

Eu procurei avidamente o olhar do meu irmão, e ele também parecia um pouco acuado. Nós cumprimentamos Nick Fury e logo todos se levantaram. Eles estavam indo para a tal sala, e Steve pediu para que eu e Lucca mostrássemos o que nós sabíamos. Ok.

A Sala de Treinamentos era como a outra sala, só que mais ampla. Havia equipamentos e armas que pareciam verdadeiramente letais. Os Vingadores se posicionaram ao redor de mim e de Lucca.

- Desculpem o atraso. Recebi mensagens de Asgard. A situação está pior do que eu imaginava... – Comentou Fury gravemente. – Eu esperava que vocês pudessem ir para lá dentro de algumas horas.

Thor foi o que mais se agitou. É claro, Asgard era a terra dele. Eu entendia que ele devia estar aflito. O deus do trovão perguntou mais algumas coisas para Fury, e este respondia tudo com ligeira apreensão. Thor estava ficando cada vez mais preocupado.

- Quanto mais rápido acabarmos com isso, melhor. Devemos partir logo. – Disse Thor, e ficou quieto em seu canto, pensativo, com as mãos no queixo.

Assim, Steve olhou para Lucca, incentivando-o a mostrar o que sabia fazer.

Lucca coçou a cabeça, e arrumou-se. Os olhos dele, negros, costumavam ficar vermelhos quando ele usava seus poderes. Ele abriu as mãos e as estendeu na lateral do corpo, invocando seu poder. Os olhos dele tinham um tom assustadoramente vinho... Depois, tomaram um tom de vermelho sangue.

Contudo, ele parou repentinamente.

- Que droga é essa? Não consigo ler a mente de ninguém. – Comentou Lucca, decepcionado e irritado.

- Bem... A SHIELD implantou escudos em nossas mentes, para o caso de você aprontar. Só vai ler nossa mente quando desejarmos. – Explicou Steve, com um sorriso de vitória estampado no rosto. Lucca cruzou os braços.

Natasha acrescentou, reticente:

- Mas nós já conhecemos seu poder. Não se preocupe. Tentou nos manipular 37 vezes quando foi preso.

Lucca corou levemente, e se afastou, murmurando algo como “Palhaçada”... Em seguida, todos olharam para mim.

Eu estava meio desconcertada, mas invoquei meu poder. Meus olhos foram se avermelhando... Eu podia sentir. Caminhei lentamente até minha sombra, que se formou disforme, na parede atrás de mim. Quando toquei nela, senti meu corpo desvanecendo... Eu estava me transformando na própria sombra.

Desse modo, podia ir para qualquer lugar em que estivesse escuro. Eu me transportava através de sombras e escuridão. Assim, me teleportei até o outro canto da sala, ainda como sombra.

Ao sair de minha própria sombra, eu senti que já estava voltando ao normal. Caminhei tranquilamente, surgindo atrás dos Vingadores. Eles viraram-se e me olharam boquiabertos.

- Eu tinha me esquecido do quanto isso era surpreendente. – Disse Banner, com as duas mãos fixas nas laterais dos óculos.

- Vocês costumam subestimar magia. – Comentei, sorrindo timidamente.

- Eu acredito que magia é só uma forma de ciência que ainda desconhecemos. – Disse Banner, cientificamente.

- Magia é mais do que ciência. E é com esse tipo de coisa que vamos lidar em Asgard. – Eu disse.

- Bem... Isso foi realmente bom. Agora, arrumem suas coisas. Partimos em duas horas. – Interrompeu Nick, o tom de voz urgente. – Desculpem-me, Lucca e Stella, mas vocês terão de ir sem treinamento.

Lucca deu de ombros, e eu fitei Fury com ar de superioridade:

- Nós lidamos com isso a vida toda. Não precisamos de treinamento. – Disse Lucca friamente.

- Ótimo. Estejam na área de decolagem pontualmente. Eu preciso resolver umas coisas. – Disse Fury, pegando algo que pareciam anotações e documentos. Ele cochichou algo com Steve e saiu apressadamente.

Acho que fui a última pessoa a sair da sala, porque todos já tinham ido se arrumar. Até mesmo Lucca. Eu esperei todos saírem, e fiquei lá sozinha, pensando. Às vezes, era difícil acreditar que eu estava ali, prestes a lutar lado a lado com quem já me prendera. Não fazia sentido, de alguma forma.

- Perdida? – Disse Steve, aparecendo de surpresa ao meu lado. Ele retornara para me buscar?

- Bem... Um pouco. – Falei, andando lado a lado com ele.

- Então... Não devemos subestimar magia? – Perguntou ele, olhando significativamente para mim.

- Exatamente isso. - Falei, olhando especialmente para Steve.

Ele corou, e provavelmente se lembrou da mesma coisa que eu. Nossa amizade começara por isso. Por erro de pessoas que não sabiam que magia é muito mais do que isso. E então, ao andar por aqueles corredores sinistros, eu tive uma lembrança.