Lives

Capítulo 20


Capítulo 20

- Olá, Carl.

- Bom dia, Sarah.

Ele parou, olhou-a mais uma vez.

- Algum problema?

- Todos.

- Sorte, então. Vai precisar.

E quanto!

- Sam já chegou?

- Sim. Mas está se preparando para uma cirurgia.

“Dr. Carl, Quarto 126, Stat”

- Tenho que ir.

- Entre! – Exclamou Sam ao bater o telefone no gancho.

Sarah entrou, e com um sorriso pálido sentou-se em frente a ele, sendo separados pela mesa com papéis.

- Tem um minuto?

Sam franziu a testa respondendo:

- Sim. – Consultou o relógio no alto da parede. – Acho que sim. – Relutou, impassível. – Só seja breve enquanto me preparo.

Sam esterilizava mãos e antebraços enquanto aguardava alguma palavra de Sarah, que ainda formulava o que dizer.
Vestiu-se com luvas e avental brancos quando escutou:

- Me abrace.

E assim ele o fez mesmo sem compreender.

Sarah deixou que uma lágrima marcasse a vestimenta dele. Saiu.

- Sarah! Sarah, espere! – Pediu Honey, agitava, movimentando um montante de papéis no ar.

Ela não ouviu, e então Honey alargou os passos até a figura de Peterson.

- Sarah! Sarah! Estou lhe chamando.

Postou-se a frente dela sacudindo-lhe pelos braços. Sarah olhou-a revelando as marcas de uma noite em claro, pesada.

- Ah, não! Eu conheço essa cara! – Reclamou.

- Doutor, pressão baixando!

- Mais sangue!

Me abrace, ele relembrava. Me abrace, me abrace, me abrace...

Como ele queria beijá-la e amá-la.

- Assistolia! Assistolia! – Berrou o anestesista, desesperado. – Doutor, assistolia!

Sam olhou para a tela, tenso.

- Adrenalina! Enfiem Adrenalina, já!

Ele estava descontrolado.

- Onde está o maldito desfibrilador?

O local estava tenso, todas as vozes eram como um zunzum em seu ouvido. As respirações fartas se mesclavam num ritmo incessante - agitação - onde tudo parecia rodar rente a seus olhos.

O anestesista berrava à sua frente algo que lhe soava como “Seu louco, seu louco”.

- Sem ritmo! Sem ritmo” – Insistia o anestesista.

Sam se afastou da mesa cirúrgica, tonto, as ferramentas escorregaram de seus dedos pintando o piso de um vermelho denso e gritante.

Um enfermeiro agarrou-o antes que tombasse num aparelho qualquer.

Apenas lhe correu aos ouvidos:

- Chamem a Dra. Peterson! Depressa!

- Chamem alguém! – Gritou um residente.

Dr. Rodner adentrou a sala esbaforido vestido de pijama cirúrgico e propés, se enfiou em luvas e máscara.

Incompetentes!, referia-se a Sam que se mantinha em pé agora por dois enfermeiros.

- Adrenalina! – Ordenou Rodner. – Já!

- Doutor, já lhe demos o bastante! Poderá morrer se dermos mais! – Ponderou o anestesista.

- Sou eu quem está no comando. Faça o que mandei!

- Irá matá-lo!

- Cale a boca e obedeça!

- Me recuso a ser um assassino!

O anestesista arrancou as luvas e máscara, escancarou as portas da sala e sumiu.

Sam fugiu cambaleando.

Momento após o bip se silenciou.

Fora da ala, Dr. Rodner pôs-se a alimentar seu vício por nicotina, enfurecido. Deu mais uma forte tragada e resmungou:

- Bando de inúteis!

- E o que pretende fazer? – Indagou Honey, séria, mastigando um chiclete já sem sabor, afoita. – Diga alguma coisa! – Ralhou.

Sarah tomou mais um gole de seu café meio frio.

- Eu nem sei o que pensar! – Tossiu engasgada. Meteu a xícara de volta ao balcão marmoreado, nervosa. – Droga de café! – Olhou para a boca apressada de Honey em mastigar a goma branca.- Muitos menos o que fazer!

Sam surgiu à frente dela esmurrando o balcão com a mão pesada, furioso. A xícara tremeu, tilintou e rolou para o chão.
Ela ergueu os olhos para ele, hesitante. Pela primeira vez sentiu medo de Sam.
- Mas o que está fazendo?

Ele agarrou-a pelos punhos abruptamente, erguendo-a. Honey tombou na banqueta de Sarah, aparvalhada, e se pôs em pé.
- Sam, pare com isso! – E correu os olhos por todo o refeitório em silêncio. – Todos estão olhando para cá! – Sussurrou.

- Sam, fique calmo. – Mostrou voz firme mesmo com todo os corpo fedendo a medo. – Vamos para outro lugar.

- Aqui está a grana. – Anunciou Murray, impassível.

- Até que enfim! – Respondeu o homem de cabelo grisalho escasso metido num terno de segunda mão exibindo um sorriso pervertido. – Pensei que teria que dizer um “oi” à polícia.

Murray fez um ricto ao olhá-lo. Entregou-lhe um envelope advertindo:

- Quero o da melhor qualidade!

- Desde quando não fazemos isso? – Desdenhou enquanto somava o maço de notas altas. Olhou-o. - Aliás, é para o nosso querido Rei do Pop! – Deu um risinho de satisfação ao constatar que o dinheiro estava completo. – Passe aqui amanhã à tarde.

O seu celular vibrou no bolso da jeans azul. Pegou sua maleta e se afastou alguns metros.

- Pronto.

- Murray?

- Eu.

Pausa.

- This Is It se inicia daqui a um mês e não vejo notícia alguma do “Pop sem Rei”, se é que me entende.

Ele entendeu muito bem, tanto que já estava enjoado da mesma ladainha sendo socada todo dia no seu ouvido. Murray deixou escapar um suspiro. Manteve o controle.

Droga!

- O prazo de seis meses já está em sete! – Berrou Smith, furioso. Murray escutou uns palavrões sendo abafados. – Já temos material suficiente. Droga! Só quero vê-lo num maldito caixão e as notícias em todo o mundo! É só o que precisamos!

- Sei disso, e estou fazendo o possível! – Ralhou.

- Então fala o impossível!

Sam sentou-se um tanto mais zonzo que antes no assento frio. Deu uma intensa respirada alargando as narinas agora avermelhadas.

- Sarah, por que insiste em fazer isso comigo? Por que me trata assim? – Gritou. – Sabe muito bem o que tenho por você, e continua a me humilhar... Um dia é gélida, noutro é amiga, e em outro penso que tenho esperanças... você está me exterminando! Hoje aparece do nada e me pede um abraço? Quer que eu fique como? Droga! – Ele esperou que ela tivesse alguma reação. Nada. – Santo deus, preciso dizer quantas vezes que a amo? Uma, duas, três? Talvez mil? Quantas? – Engoliu a saliva que lhe rasgou a garganta árida.

- Sam, por favor... – Ela tentava manter a calma.

- Não sabe o quanto necessito de você! – Levantou-se deixando algo cair da mesinha ao lado. – Não sabe Sarah... não sabe... – Ele forçou um beijo prendendo–a contra seu corpo. Peterson se debateu, e com as mãos espalmadas em eu peito largo empurrou-o.

- Pare Sam, chega! Pare com isso!

Sarah caminhou pelo cubículo com as mãos inertes pela cintura sinuosa. Estava assustadoramente séria.

- É de extrema importância o que lhe preciso falar.

Houve uma longa e tensa pausa. Sarah suspirou ao olhar a figura chamada Sam.

- O que é? – Intimidou ele pendendo o corpo para a frente. – Por acaso vai me convidar para o seu casamento com Matthew?! – Provocou dando uma irritante ênfase no nome.

Peterson preferiu não acolher a provocação, e avistou pela vidraça o desenho da cidade grande. Pareceu até que sentiu o cheiro gorduroso dos fast-foods dançar em seu nariz. Virou-se para Sam.

- Estou grávida.

Choque. Sam projetou os olhos para frente, o sangue esvaiu da cara. Empertigou-se na cadeira perturbado.

- O que disse?- Só pode estar me enganando de novo. – O que disse Sarah?

Era impossível, devia ter ouvido errado.

- Grávida. – E apontou o dedo a si mesma. – Eu estou grávida, Sam.

Ele pôs-se de pé num pulo, arrastou-se pela sala até encontrar algo sólido para se apoiar.

- Pirou? – Silêncio. – Por que está me dizendo isso?

Sarah escolheu não responder em palavras, já que ela estava estampada em sua cara.

Sam cambaleou de volta ao assento. Esfregou a mãos ao nariz puxando o ar com toda a força para dentro. Os olhos vermelhos e expressão cansada eram próprios.

- Sam – Chamou Sarah estudando-o por um minuto, atenta. – O que fez antes da cirurgia? – Contou o tempo na mente, dando-se conta. – Mas já terminou? Não se fez nem uma hora... Sam... pelo amor de Deus, não me diga que abandonou a cirur... Sam! – Berrou, furiosa. – Por acaso bebeu antes dela?

Nada. Sam voltou a puxar o ar dilatando as narinas. Os olhos agora lagrimejavam. Peterson ergueu-lhe o rosto, analisando-o minuciosamente.

O sangue subiu inchando o rosto fumegante.

- Está drogado? – Fazia o máximo para manter o tom de voz passível. – Está se drogando, Sam?

Sarah queria matá-lo de tão enfurecida, só lhe faltava sair fogo quando o intimidou:

- Que droga, Sam!– Andou pelo cômodo à esmo. – Por que foi se meter nisso? Você tem noção na porcaria em que se enfiou? Se a diretoria do hospital descobre...

Sentia o rubro de suas bochechas em chamas. E surpreendeu-se com o aperto nos braços encurralando-a contra a parede.

- Você não sabe de nada! Entendeu bem? De nada!

Ela realmente não queria nunca saber de nada.

- Eles não vão saber!

Sam desapareceu, a porta bateu sozinha.