Lives

Capítulo 12


Capítulo 12

Quando chegou do exaustivo ensaio, teve a rotineira vontade de querer mergulhar em sua cama e se afogar em um sono. Necessidade. Mas impotente por não conseguir realizá-lo. O que parece ser algo de extrema facilidade para alguns, para ele era torturante, difícil. Sentiu-se tentado em ingerir algo para o sono, mas havia se livrado de todos os “venenos” de canto de sua casa.

Virou-se na cama, olhou para o teto... Nada. De novo! Espalmou as mãos no rosto. Exaustão. Ainda não conseguira resolver sobre o número de apresentações, e aquilo era preocupante, latejava e expulsava ainda mais o desejável “ninar”. Estava frustrado, não suportava mais aquilo.
Relembrou toda a vida. Suspirou, triste. Momentos de seu passado ainda lhe torturavam em seu presente. Virou-se novamente e se deu de frente ao relógio com seu horrível “Tic-Tac”. Abaixou-o. Chamaram-no na porta.

- Entre, Dowall.

Ela entrou receosa em atrapalhar o astro em seu momento “crucial”.

- Dra. Peterson o aguarda no Hall.

Michael levou a mão branca à testa como ato de esquecimento. Hoje é terça! Como pude ter esquecido?

- Leve-a para sala de estar que já desço.

Dowall rumava para cumprir o pedido. Ele a chamou.

- Obrigado, Dowall. – Sorriu.

Peterson deslumbrava a imensurável riqueza de detalhes e beleza dos objetos na requintada sala. Sentiu-se provocada por tocá-los. Era tudo tão novo. Mas o receio de que seus dedos o pudessem quebrá-los era dominante. Como pagaria por aquilo depois? Talvez se trabalhasse a vida inteira sem se dispor de um mísero dólar... Ficou apenas com o olhar curioso passeando sobre o extenso cômodo.

Michael entrou silencioso se deparando com a médica admirando suas pinturas que abrangiam considerável parte da parede. Riu baixinho, escondido. Não havia reparado o quanto era bonita.
- Bom que tenha vindo, Dra. Peterson.

Ofereceu a mão. Ela aceitou ao se levantar. E novamente foi surpreendida pelo beijinho úmido.

Por ser uma celebridade, ele parece ser bem diferente, concluiu.
Ele exalava um aroma incomum, gostoso, que se misturava ao seu perfume natural tornando-se único, um só. Seus cabelos fizeram cócegas na maçã rosada de Sarah. Os lábios desenhados revelaram-se num sorriso cativante.

- Sente-se. – Ele pediu.

- Bem, como combinamos... As três vezes por semana... Quando eu puder... – Ela tentou explicar sua vinda.

Jackson deu um risinho agradável ao se acomodar no sofá frente à Sarah.

- Sim. Eu me lembro. – Mentiu.

- Então?

- Consultei o Dr. Arnold como pediu.

- Posso ver o que ele prescreveu?

- Claro. Só um momento.

Ele sumiu ao atravessar a porta. Minutos após retornou com papéis nas mãos. Examinou-os e Michael permaneceu calado em sua frente.

- Acredito que ele tenha lhe deixado a par de tudo.

Ele assentiu.

- Bem, como não sou especialista no seu caso, apenas o ajudarei a cumprir o estabelecido, verificando o seu andamento, já que faz tanta questão de minha presença.

- Confio em você. – Interrompeu-a.

Sarah silenciou por breves segundos, e retomou:

- Apenas lhe peço que continue a consultar o Dr. Arnold.- Respirou. Passou os olhos nos papéis. - Frisemos aqui algumas partes. O senhor não deve desobedecê-las de forma alguma.
1) Procure não cochilar, mesmo que queira. Deixe para a noite, pois assim conseguirá uma noite de sono saudável.
2) Caso não consiga dormir em vinte à trinta minutos, levante-se e vá se entreter com algo, só volte quando sentir sono.
3) Separe o quarto, especialmente a cama, apenas para dormir e prática sexual.

Por instinto, desviou repentinamente o olhar para Sarah.

- Algum problema, Sr. Jackson?

- Não, não. Continue, por favor.

- 4) Recomendo não ler antes de dormir.
5) Procure fazer exercícios físicos.

Michael ergueu as sobrancelhas, incrédulo. Ela compreendeu.

- Já deve fazer muito, não é?

Ela soltou um sorriso de canto.

- Tenha certeza. – Confirmou. Retribuiu ao sorriso.

- Acho que só... - Murmurou.- Ah! Não deixe de tomar a doses diárias de Melatonina. Acredite, não é viciante e não lhe causará danos, já que é uma substância produzida pelo corpo. Apenas o estimulará ao sono. – Concluiu.

Michael meneou a cabeça, veemente.

- Cumprirei ao pé da letra... com a sua ajuda.

Estendeu a não para levantá-la, que aceitou, tímida.

- Devo ir. Estarei de volta na quinta, como combinado.

- Pode me deixar seu número de telefone?

Aquilo lhe pegou de surpresa. Um ar de duvida pousou em Peterson.

- Acredito que eu já tenha deixado. - Ponderou.

- Apenas o profissional, do hospital. Eu gostaria também do particular.

Ela receou por tal pedido inusitado.

Para quê meu número... Particular?

O silêncio pairou sobre eles, e já era constrangedor, ao menos para Michael.

- Prevenção. Caso eu não consiga encontrá-la. – Se explicou.

- Hã... ok.

Jackson apalpou os bolsos da calça na procura do celular. Nada. Então, Sarah vasculhou a bolsa encontrando apenas uma caneta, que ainda estava falha. Sorriu, desconcertada.

- Tenho apenas a caneta. – Exibiu-a.

- Estou sem papel aqui...

Foi até uma estante amadeirada abrindo uma pequena gaveta.

- Blanket sempre os pega para desenhar. – Murmurou.

Voltou-se à Sarah. – Está com pressa?

- Um pouco.

Ele se aproximou e estendeu a mão.

- Anote aqui.

- Tem certeza?

- Sei que não vai me machucar. – Brincou.

Peterson riu.

- Não teria tanta certeza. – Respondeu a ele.

Aquela aproximação era um tanto incomoda para Peterson. Tentou rabiscar os números, mas que estava se tornando impossível com aquela caneta. Forçou algumas vezes no mesmo local, tentando completar um zero. Michael soltou um gemido baixo. Ela corou.

- Desculpe.

A mão outrora branca era agora avermelhada.

- Não tem problema. – Passou os dedos onde doía. – Pelo menos o zero está aqui. – Riu.

Semanas se foram desde esse dia, e Jackson apresentava melhoras, poucas, mas eram melhoras. Já não sentia tanta falta dos antigos medicamentos, e estava perdendo a aparência triste e mirrada, ganhando um volume bonito, saudável, e ressuscitando ainda mais a beleza de seu corpo esguio.

O tempo também fora o bastante para o surgimento de uma boa relação médico-paciente, ou até mais. Peterson conhecera um pouco daquele homem misterioso, mostrando-se a ela não ser o que pensava. Michael se desabafava, muitas vezes sem perceber. Sarah apenas o ouvia sem pronunciar uma palavra. Ele queria ser ouvido, apenas isso.

Percebeu que aquele Michael rodeado de pessoas, era ainda assim um solitário. Um popular solitário.

Sentiu que algo o incomodava, e sabia que poderia ou estaria atrapalhando o seu progresso no tratamento. Não teria a ousadia de perguntar, a menos que precisasse.

Era mais uma noite que seus olhos lutavam contra o sono e o relógio apontava que era tarde. Pegou a coberta e se encolheu na poltrona deixando a luz do corredor causar um ambiente aconchegante na sala.

Se cobriu até o pescoço e ali ficou ao escutar o girar da chave na porta.

- Onde esteve, Susie?

Ela controlou o tom de voz, queria muito deixar de ser pacifica e se descontrolar nem que por um momento.
Susie respirou fundo contendo as palavras:

- Me diga.

- Trabalhando.

Sarah suspirou. Ergueu-se e pediu a Susie que se sentasse. Foi a seu encontro tomando-lhe a mão gélida entre as suas. Mirou-a.

- Vamos, me diga, me diga a verdade.

Silêncio. Sarah encheu os pulmões com o ar quente que saíra de Susie.

- Seja lá o que estiver fazendo, eu quero que pare, pois isso já é uma escravidão. Prefiro que estude e deixe o trabalho pesado comigo.

- Preciso ajudá-la. – Murmurou.

- Mas veja a hora que anda chegando, se não são às uma da manhã, são às três! Sou responsável por você. É minha irmã, e me preocupo.

- Sarah, está tudo bem.

- Não, não está! Você sai de manhã e só volta nesse horário. Imagine então a hora que deve chegar quando não estou em casa! – Enfatizou.

- Não há com o que se preocupar. Eu vou para a faculdade, depois para o trabalho e então para casa.

- Quero que saia desse seu trabalho e apenas estude. Eu sempre paguei sua faculdade e não vai ser agora que deixarei de pagá-la. Aliás, você nunca me disse que trabalho é esse. – Concluiu.

Susie rumou para o corredor iluminado em direção ao quarto.

- Trabalho, Peter, trabalho. Não importa qual seja, contanto que se ganhe dinheiro.

Sarah se levantou, atordoada.

- Ah, é? E o que me diz dessas manchas em seus braços?

- Não são nada. – Escondeu-as com a mão. – Devo ter batido em algo.

Peterson tomou-lhe o braço à força para examinar, seu olhar subiu ao pescoço. Afastou os cabelos loiros de Susie e encontrou mais da roxidão.

- Não! Eu sei muito bem qual a origem desses hematomas.

Susie soltou-se e correu, trancafiando-se em seu quarto. Peterson a chamou por uma longa hora, inutilmente. Cansou-se e foi para o seu.

Ainda teremos uma séria conversa, Susie,
decidiu.

Arriou-se na cama imaginando seu dia seguinte.

Às 8:00m, cirurgia com a Sra, Kartws.


Às 12:00m, reunião com a equipe.


O restou não importava, havia até se esquecido.

É sempre o mesmo: Emergência, quarto, berros de dor, choro..., suspirou. Mas sorriu ao lembrar-se que se tudo corresse bem, à tarde seguiria caminho à mansão de Jackson, e conversaria com Dowall, veria George e então ele, Michael.

Até que ele é simpático!

Achava engraçado ele falar dos filhos e ela nunca os ver.


Aquela casa deve ser um labirinto!, riu, sendo o único som no vazio naquele quarto pequeno. E foi seu último pensamento ao se entregar ao sono.