Linhas Borradas

Realidade Desconhecida


Algo estava errado, Jade West teve esse pensando pouco tempo depois de entrar no quarto do marido, para seu alivio ele estava acordado conversando com os amigos, mas a maneira que ele a olhava trazia um estranho desconforto que a fazia ter tal pensamento. Ela quis se acalmar dizendo para si mesma que era apenas uma coisa tola da cabeça que estava lhe pregando peças após o pouco descanso.

Eles poderiam ficar bem em breve...

Só que não.

As horas que se seguiram foram um borrão estranho após ouvir as palavras daquela médica e mesmo no momento dentro da sala a uma distancia segura dos pais do marido que mau a olhavam Jade ainda se sentia perdida em busca de um pilar que a estabilizasse.

Quando a porta foi aberta e a médica entrou, os três se levantaram a cumprimentando para logo retornar a posição anterior com a atenção toda direcionada a mulher que trazia um envelope parto em mãos e um tablete. A outra pessoa que vinham com ela já não era a enfermeira que vira anteriormente e a julgar pelo jaleco e a aparecia de pouca idade e manchas escuras abaixo dos olhos presumiu se tratar de alguma interna.

— O que esta acontecendo com o nosso filho, doutora? – a sogra deu inicio a conversa, as mãos estavam entrelaçadas as do marido em busca de apoio para o caso do pior, ela invejou Alice com a percepção de que não teria isso.

— Embora que estivesse usando o sinto de segurança e o sistema de segurança do carro funcionando devidamente bem prevenindo grandes danos ao senhor Oliver, ele ainda sofreu uma concussão que acredito que tenha resultado em sua atual perda de memorias mais recentes – a médica explicou de modo polido.

O aperto de Alice nas mãos do marido se intensificara enquanto encarava a mulher de jaleco que aparentemente já esperava tal comportamento. Jade abaixou a cabeça enfiando os dedos nos cabelos soltos com os olhos fechados. Com uma longa respiração ela tornou a erguer a cabeça entrelaçando os dedos.

— A perda dessas memórias mais recentes, há uma estimativa de quanto tempo delas ele perdeu?

— Por volta de 8 anos suponho pelos testes que fiz, mas a uma chance considerável de ser mais.

Inevitavelmente ela tornou a abaixar a cabeça apoiando sob as mãos juntas que se apertavam fazendo as juntas ficarem brancas. Beck Oliver poderia não ter todas as memorias perdidas de modo que ainda sabia quem era, mas ele definitivamente não fazia ideia de quem ela era no passado e quem é para ele no atual momento.

— Existe alguma chance dele recuperar essas memórias? – o pai de Beck questionou pela primeira vez enquanto embalava a esposa.

— Possivelmente, as chances são bastante grandes. Podemos acompanhar o caso com consultas para estimular o cérebro da melhor maneira que pudermos na chance de encontrar esses momentos, mas também – a mulher hesitou, Jade levantou a cabeça para fita-la, a interna que a acompanhava segurava o tablete olhando alguma coisa ali e ora ou outra a mentora – Existe alguns casos que essas memorias se perdem completamente.

— Vamos torcer pelo melhor e nos preparar para o pior, é o que esta tentando dizer? – soltou com amargura. Doutora Ficher a olhou longamente e Jade poderia afirmar ter visto uma pequena fagulha de empatia da mulher sobre si.

— Pelo menos isso pode faze-lo perceber a burrice que fez em casar com você. Se ele não lembra de você, não precisa estar com você – a sogra soltou a olhando de esguelha.

Bufou.

— Vai se ferrar, Alice.

Em todos os anos que tivera que lidar com almoços dessagráveis e encontros com a família do marido nunca quisera tanto voar no pescoço da sogra como no atual momento. Não melhoraria a situação, longe disso, mas aliviaria as coisas um pouco e talvez até a ajudasse a lidar com a situação posteriormente.

— Esse não é o momento para vocês começarem a brigar – Jonathan Oliver interveio olhando para as duas mulheres com uma clara advertência que fizera a esposa bufar, mas que não afastou a vontade da West de avançar sobre a sogra.

Se antes as coisas já eram complicadas agora seria um inferno.

— O que devemos fazer agora doutora?

— Tenham paciência, há variáveis de caso para caso, mas isso não muda o fato de ser uma situação difícil tanto para a família quanto para o paciente que se sentirá perdido na hora de se situar nessa realidade às vezes desconhecida demais para ele. Esse pode ser o caso de Beck Oliver.

— Desse modo é melhor traze-lo para a antiga realidade dele – a mãe constatou – É melhor levarmos para nossa casa.

— Uau. Porque eu não me surpreendo de ouvir essa ideia magnifica – Jade ironizou apoiando o queixo nas mãos fitando a sogra – Vamos ignorar tudo que ele viveu nos últimos anos mesmo e apenas pensar no que ele pode viver daqui em diante.

— Estamos apenas pensando no que é melhor para o Beck – a outra rebateu.

— O melhor no momento é irmos com calma – o sogro intercedeu. Jade fez questão de ignorar o olhar preocupado da interna sob a mentora que passava uma das mãos no rosto consternada por estar ali. Se toda a situação não se tratasse do marido a própria Jade já teria levantado e ido embora sem olhar para trás.

— A vida do Beck já não é no Canadá há muito tempo. É provável até que esta seja uma das coisas que ele tem consciência.

— Mas ele não te conhece, como se sentirá confortável estando na casa de uma completa desconhecida?

— Jade – o sogro chamou, ele concordava com a esposa, mas como o suposto mediador não poderia se dar ao luxo de escolher um lado e reconhecendo o relacionamento não tão bem aceito do filho ainda precisava ter um pouco de consideração pela mulher que supunha estar sofrendo de verdade. Eles tinham uma dinâmica estranha, mas funcionavam muito bem visto que sempre acabavam juntos.

— Podemos pedir para ele ficar com o André ou Fred por enquanto. Na faculdade eles moraram juntos mesmo. Com o tempo ele pode voltar para casa.

— Se ele quiser – Alice enfatizou – Pode ser que ele não queira.

— Eu agradeceria se você enfiasse suas suposições no seu rabo, Alice.

— Acho que temos o começo de um plano – a médica chamou a atenção dos três – Vamos discutir as formas de tratamento que serão aplicadas?

~*~

— Me sinto como uma criança que aprontou na escola e agora os professores estão falando com meus pais sobre como me disciplinar – Beck comentou, mexendo o prato de comida.

— Não ta muito longe disso – André riu comendo uma colherada da gelatina verde que havia vindo no prato como sobremesa, mas que Beck dispensara prontamente – A diferença é que essa criança tem uma esposa lá junto com os pais discutindo.

Ele suspirou com a menção a Jade West. Puxando pelas memorias que ainda tinha ele buscou imagens de todas as garotas por quem tivera alguma queda, rolo ou mesmo relacionamento; elas tinham um padrão um pouco semelhante de independência e autoconfiança charmosa que lhe atraia a atenção, garotas recatadas demais ou muito devotadas ao namorado ele evitava sem pensar duas visto porque tais comportamentos o incomodava um pouco, mas agora pensando na suposta mulher que diziam ser sua esposa ele não conseguia evitar a confusão que pairava sobre sua cabeça.

Ela tinha confiança o suficiente para brigar com a mãe dele na frente dele sem se importar se o incomodaria – incomodou saber isso – e uma aura que exalava poder sobre suas ações e segundo Fred ela era bastante independente. As características básicas batiam de acordo, mas olhando para a mulher por algum tempo ele também percebeu que por mais que tentasse não conseguia pensar no que realmente atraiu ao ponto de se casar quando casamento não era algo que valorizava.

Aquela mulher não parecia ser o tipo que permitia alguém estar ao seu lado a julgar pela forma fechada que agia perto das pessoas e ele não era o tipo de pessoa que ficava insistindo também.

Quando soube que não tinha qualquer memoria sobre ela, ele a viu fita-lo longamente de uma forma indecifrável, em silêncio para logo depois deixar o quarto. Ninguém a seguiu e por um momento ele se sentiu incomodado com isso até ser engolido em um abraço amoroso da mãe que desviara sua atenção para a mulher que lhe dera a luz e derramava lagrimas em seu ombro.

— Eu liguei para Sam vim e ajudar – Fred comentou tomando um pouco do copo de café que havia pegado.

— No que a sua esposa pode ajudar? – questionou olhando o amigo com uma sobrancelha arqueada.

— Sam é a melhor amiga da Jade, a melhor pessoa para lidar com a sua esposa nesse momento se ela explodir já que não da para contar com você por enquanto – ele explicou com simplicidade balançando os ombros.

— É muito difícil lidar com ela?

— Sim – os dois disseram ao mesmo tempo e André continuou – Mas mesmo assim você casou com ela.

— Podem me falar alguma coisa útil que não seja o quanto ela é complicada de lidar?

— Vamos ver, ela é basicamente uma bomba e você o pino, por isso se davam bem da maneira de vocês, eu acho – Fred começou fitando o nada pensativamente – Ela é escritora de livros de suspense e terror, vocês se conheceram em uma viagem e se encontraram no meu casamento quando foram convidados para serem os padrinhos, ela faltou em todos os ensaios e só apareceu no dia mesmo, a Sam estava puta da vida com ela por fazer isso, mas ela prometeu um best-seller que foi o que a prendeu na época... De fato o livro é considerado um dos melhores que ela já escreveu.

— E como você pode ver, ela não se da bem com a sua família, todos com exceção da sua prima Anna a odeiam – André adicionou.

Puxando pelas memórias que tinham só conseguia lembrar-se dos comentários da mãe sobre a prima ser uma vergonha para a família e uma má filha, então de certa forma poderia levar isso como uma talvez justificativa para a possível afeição da garota pela esposa. Ambas compartilhavam o desprezo dos familiares.

— E quanto à família dela, gosta de mim?

— Não tem nada contra, mas também não tem a favor. Os West’s não são do tipo que se reúne nos natais para trocar presentes e tirar fotos usando goros vermelhos – Fred respondeu terminando o copo de café – No máximo você recebia algumas visitas do irmão mais novo da Jade, Simon. Os dois são bem próximos até.

— Ela deve estar bem chateada por eu não me lembrar dela – suspirou por fim empurrando a mesa com a comida e se acomodando melhor na cama. Por mais que tentasse nada relacionado às coisas que ouvira surtira algum tipo de lembrança – Eu nem sei como começar a conversar com ela.

— Talvez vocês só precisem sentar perto e o assunto fluirá naturalmente – a confiança no tom de Fred não era tão confiante quanto este claramente queria que fosse e só fez Beck suspirar ainda mais preocupado.

Conhecer pessoas nunca fora um problema que tivesse, mas nenhuma delas vieram com uma aliança no dedo anelas e um registro de casamento com nome dele anexado ao dela na mesma folha.