Katt tinha que dar um jeito de fazer com que os Clareanos saíssem da Clareira. Estava usando uma regata preta e uma calça larga com estampa do exército. Suas botinas não faziam barulho algum conforme a garota corria pela grama, em direção ao refeitório. Quando chegou, subiu em uma das mesas desocupadas e deu um forte e alto assobio, chamando a atenção dos garotos e Teresa.
–- Prestem bem atenção! Eu sei que não sou líder de nada aqui, mas vocês tem que me ouvir!-- Ela disse em tom decidido, cruzando os braços ao redor do corpo magro, a beira da desnutrição.
–- Manda aí, Katt!-- Disse Jeff.
–- Eu sei como sair do Labirinto.-- Ela disse e logo depois todo o Refeitório virou espanto e burburinhos.-- Calem a boca! Preciso que me escutem! A idéia não vai parecer tão agradável, mas irá dar certo. Eu sei que vai.
E então a garota explicou a situação aos garotos. Alguns a olhavam incertos, alguns encabulados, outros assustados, e então havia os determinados a fazer o necessário para sair dali.
E havia Newt, que não tinha expressão alguma e olhava no fundo dos olhos de Katt. A ruiva sentia como se aquele olhar estivesse lhe cortando a alma. Rapidamente desviou sua atenção do loiro e voltou a falar com os garotos.
Quando tudo estava explicado, os garotos começaram a tentar bolar algum plano para que conseguissem sair do lugar, mas estavam todos muito ligados a duzentos volts, então Katt pegou apenas alguns Encarregados e os arrastou até a casa dos mapas, trancando a porta atrás de si. Haviam apenas alguns garotos ali, como Minho, Alby, Stewart, Clint, Jeff e Newt. Como Newt era um dos Encarregados e vice líder do lugar, não tinha como excluí-lo da situação.
Mas isso não ameniza a o clima tenso entre Katt e ele. E além do mais, Minho também estava chateado nessa história, também estava evitando Newt. Mas não como Katt. Katt estava realmente chateada, pois realmente achava que Newt confiasse na garota.
–- Bom, é certo que temos que sair daqui, mas como faremos isso?-- Alby disse.
Alby agora, diferente de antes, dava atenção para Katt e não se importava com os outros garotos ali.
–- Bom, não sou muito estrategista, mas sugiro que peguemos todas as armas que temos.-- Stewart disse, pensativo.
–- Boa idéia.-- Katt murmurou.
Todos os garotos tentavam ajudar falando algo, e Katt apenas anotava as ideias boas em um caderno com capa de couro velha.
E então estava tudo feito: Sairiam um pouco depois das onze, com todas as armas que tinham, todos os uniformes de corrida e cada um levaria uma garrafinha de água.
Quando tudo estava resolvido, Katt correu para a Sede e balançou o sino que se pendurava por cima da entrada principal. Foi um pouco complicado, considerando sua altura, mas a garota se esforçou para fazê-lo. Os Clareanos vinham de monte, até estarem todos sentados pela Sede, esperando a notícia.
Newt ficou encarregado de dar a notícia. Katt não se sentia confortável vendo o garoto e não podendo tocá-lo, passar as mãos em seus cabelos, beija-lo... Mas nada disso era possível no momento, pois havia algo que palpitava no coração de Katt, uma angústia.
Porque, se ele escondia a saída do labirinto de todos, o que mais havia dentro de Newt, nas profundezas de seu ser? Será que ele era realmente o que parecia?
Quando enfim saíram da Sede, todos estavam encarregados de algo, todos tinham alguma tarefa em serviço à Saída. Alguns Clareanos ainda batiam o pé e diziam que ficariam na Clareira, que tudo o que conheciam estava ali e que continuariam ali. Katt ouviu alguns argumentos preocupados dos amigos desses tais, mas não disse nada. Afinal, não havia o que falar. Alguns garotos acreditavam que tudo o que havia era a Clareira, e que deveriam ficar ali, envelhecer ali, morrer ali. Outros, com maior perspectiva, sabiam que aquilo não era tudo, muito menos nada. A Clareira era tão insignificante comparada a tudo o que havia no mundo, mas alguns simplesmente não adotavam essa perspectiva.
Alguns simplesmente não queriam abandonar tudo o que conheciam por algo incerto. Katt não podia os culpar, pois os garotos não tinham sonhos sobre o mundo, ou sobre qualquer outra esperança além da Clareira. Katt não sabia nem como ela mesma sabia daquelas coisas. E, se fosse se colocar no lugar daqueles poucos que eram a favor de ficar, conseguiria sentir o medo do novo, o novo incerto.
–- Certo.-- Newt disse.-- Aqueles que quiserem ficar, não posso fazer nada. Mas apenas digo que a decisão ja foi tomada em relação à nossa saída. Se algum de vocês quiser ficar que fique, mas não tenho como ajudar vocês.
–- Como Newt diz, os dois líderes estão saindo.-- Minho disse aos garotos.-- Não vai Haver líder, não vai haver ordem.
Alguns garotos ficaram um pouco sem jeito em relação à situação, mas era verdade. Não teriam um controle, não haveria algum jeito de se resolverem sem alguém no comendo. Sem alguém competente no comando. Desde que os garotos começaram a chegar, a ordem era a coisa mais importante para que o caos não se espalhasse, e agora tudo estava entrando em colapso.
Como os Clareanos já estavam encarregados de algumas tarefas para que saíssem em segurança (nas medidas possíveis) da Clareira, essas agora eram mais específicas, como encher as garrafas de água, pegar todos os equipamentos de Corredores possíveis e várias outras coisas.
Katt já havia feito sua parte, àquela altura. Tinha que mapear o caminho até o Penhasco, e já havia o feito. Caminhava por perto dos muros, pela última vez, se tudo desse certo. Passou um pequeno tempo ali, mas sabia que , se sobrevivesse, seria o que mais a marcaria. As árvores, os besouros pisca-pisca, a brisa refrescante e tudo o que era bom. Mas também não esqueceria de todo o sufoco que passou ali, não se esqueceria de todas as mortes que presenciou, os sumiços, o desespero de ter alguém em um momento, e em outro não ter nada. E de repente, Katt estava em lágrimas, que escorriam até seu queixo e pingavam em sua blusa.
Seguiu seu caminho até a parte mais profunda da floresta, onde havia o pequeno riacho. Tirou seus calçados e se sentou na beira do riacho, cujas águas cristalinas agora corriam rapidamente para algum lugar impossível de se alcançar por conta das pedras com formato de ponte que passavam por cima do riacho. Katt resolveu ir um pouco mais além e andar por cima das pedras, coisa que um momento atrás parecia perigoso.
Sentou-se no que poderia ser o "meio" da ponte e fechou os olhos por um longo tempo, esperando que quando abrisse tudo aquilo acabasse. Mas quando abriu os olhos, viu que um certo loiro estava sentado ao seu lado, olhando em seus olhos, como se pudesse ler sua alma.
–- O que quer?-- Ela disse seca.
–- Conversar com você.-- Ele disse com um olhar de súplica.
–- Seja rápido.-- Respondeu a garota.
Por fora estava uma pedra de gelo. Mas por dentro, seu corpo queimava na procura do dele. A garota continuou firme, sem baixar o olhar. Newt deu um suspiro pesado e triste.
–- Não sei como você não percebe. Ela esta tentando nos separar, com tudo isso acontecendo.-- Ele murmurou.-- Ava me disse para não falar sobre isso, ou mataria você. Me mostrou como pode simplesmente te tirar de mim em um piscar de olhos, como a vida aqui é tão frágil...
–- Não importa, Newt!-- Exclamou Katt, antes que o garoto terminasse seu discurso.-- Você deveria ter me contado. Mesmo sabendo que isso poderia ter me matado, eu adoraria saber de uma coisa dessas vinda da boca do meu namorado do que da mãe dele.
–- Olha, Katharina, diferente de você, eu prezo pela sua vida!-- Ele aumentou o tom de voz, passando a mão pelos cabelos loiros.-- Eu amo você e não quero que seja torturada por minha causa. Olhe para todas essas cicatrizes que conseguiu aqui! Acha que eu quero mais ainda o seu mal? Você pode não sentir o mesmo, mas sempre que fica em perigo meu coração martela dolorosamente, sabendo que eu não posso fazer muita coisa. Du te amo e chega a doer!
Katt não tinha respostas para aquilo. Seu queixo estava caído. A garota não sabia que Newt diria aquilo, não sabia que seus sentimentos eram tão fortes. Engoliu em seco.
–- Olha, Newt, eu te amo demais. Mas você tem que me contar as coisas. Mesmo que isso possa fazer mal a mim, eu prefiro tentar te ajudar com isso e correr riscos do que ficar com cara de otária quando eu sei que você ta escondendo alguma coisa.-- Ela disse com uma voz calma, passando a mão pelo rosto de Newt.-- Eu preciso de algum tempo para pensar sobre isso.
Newt suspirou pesadamente, dando-lhe um sorriso triste.
–- O problema, Kattie, é que nós não temos mais tempo. Provavelmente muitos dos Clareanos vão morrer no labirinto. Ava pode até dizer que vai ser apenas uma morte por noite, mas não vai ser assim. Sempre tem mais um joguinho escondido.-- Ele disse tristemente.
A garota ficou um pouco triste pelo loiro, mas não havia como dizer-lhe algo precipitado. Havia ficado magoada, por causa do que Newt havia escondido, mas toda vez que olhava para aqueles olhos nublados sentia seu coração derreter.
E agora, com aquela expressão tão triste não havia nada que a pudesse alegrar. Quando Newt estava quebrado, quem se cortava era Katt. E vice versa. Mas havia ainda algo que a impedia de agarra-lo e beija-lo com todas as forças, e era a voz de Ava em sua cabeça dizendo " Acho que você se esqueceu de que Newt, acima de tudo, é meu filho, sangue do meu sangue.". Não podia apenas esquecer, pois aquilo parecia colado dentro de seu cérebro.
Dando um beijo na testa de Newt, a ruiva se levantou e correu de para fora da mata. Antes mesmo de chegar à Sede ou ao Refeitório, a garota esbarrou em Minho, fazendo com que caísse. Olhou para o garoto, que deu uma pequena risada e a ajudou a se levantar.
–- Ta com a cabeça na lua, hein, vermelhinha.-- Disse risonho.
Katt deu uma pequena risada e olhou para o asiático, que se virou e gritou alguma coisa para Stewart. Algo sobre "se apressar porque o dia era curto", mas sempre no tom sarcástico Minho. A garota sorriu ao pensar assim. Minho sempre fora um amigo, desde que chegou na Clareira.
–- Obrigada, Minho.-- Ela disse, deixando-o confuso.
–- Pelo que? Acho que você bateu a cabeça.-- Ele disse.
O comentário fez Katt rir e abraça-lo, com as lágrimas se alongando pelo rosto. Minho correspondeu, mas levantou seu queixo para ver o que estava havendo. Não sabia se veria o garoto no outro dia, não com tudo que estava para acontecer. Sabia que poderia estar -e provavelmente estava- se preocupando demais. Mas havia algo dentro de si que insistia em lhe dizer que aquele seria seu ultimo dia com aqueles garotos.
–- Ne desculpe se fiz algo de errado.-- Ele disse meio desesperado.-- Não queria te magoar!
–- Calma, seu mole!-- Ela disse, com o garoto a secar suas lágrimas preocupado.
–- Ta tudo bem, Katt?-- O garoto perguntou, estranhando.
–- Sim... Só estou com uma estranha sensação de que não vamos mais nos ver.-- Disse baixinho.
–- Não diga isso! É claro que vamos nos ver de novo! Não importa o que aconteça, eu vou estar do seu lado, sem te deixar para trás. Você é quase uma irmã pra mim, a única coisa que me fez pensar que não temos laços de sangue é que sou mais bonito do que você.-- Ele comentou afagando a cabeça de Katt.
–- Seu convencido!-- Ela murmurou rindo e dando um tapa na testa do asiático.-- Quem iria acha um asiático de cabelo espetado com não sei o que, porque convenhamos, não acho que tenha gel aqui, mais bonito do que uma linda ruiva de olhos avelã? Pergunte a algum desses Trolhos! Até a Teresa cai dizer que sou melhor.
O garoto fingiu ter se magoado e passou a mão pelo rosto, fingindo enxugar uma lágrima. Depois sorriu malignamente e começou a fazer cócegas em Katt, que ria igual a uma hiena.
–- Vamos ver quem é o mais bonito agora!-- Ele disse quando Katt desabou no chão.
A garota se recompôs quando Minho parou e olhou para ele, com um olhar meio confuso e brincalhão.
–- Me diz uma coisa: O que é que cócegas tem a ver com beleza?-- Perguntou colocando a mão no queixo, como se pensando.
–- Apenas pessoas bonitas não sentem!-- Respondeu cruzando os braços.
Katt lhe lançou um olhar de descrença e começou a fazer cócegas em Minho, mas esse não se mexeu, provando que não sentia cócegas. A garota fez um biquinho, rindo logo depois. Minho deu um beijo em sua bochecha e a abraçou.
–- Nos vemos depois, ruivinha.-- Ele disse.
–- Até depois, asiático sem cócegas.-- Ela disse se distanciando. Depois de andar um pouco, a garota se virou e viu Minho ainda olhando para ela.-- Seu lindoo! Vai trabalhar!
E saiu correndo para a Sede, onde Alby falava com alguns construtores. O garoto estava com uma expressão de preocupação no rosto, como se algo realmente estivesse errado. Os garotos foram embora, deixando apenas os dois.
–- Há algo de errado, Katie?-- Perguntou o moreno.
–- Não, tudo bem. Apenas vim ver se precisava de ajuda.-- Disse a garota, mordendo o lábio inferior.
–- Bom, não é extremamente necessário, mas toda ajuda é bem vinda.-- Ela falou sorrindo. Estava com um bloquinho de anotações em mãos, e a caneta pousava em sua orelha.-- Pode ajudar com as garrafas de água.
–- Okay. Obrigada.-- Ela disse se retirando da Sede.
Pelo jeito, aquele fim de dia seria como um turbilhão.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.