Laura está ainda acolhida nos braços de Edgar... Não queria chorar... precisava se manter forte... mas o aconchego de seu abraço e a proteção que lhe transmite naquele momento lhe fazem ir às lágrimas e nelas estão toda a vergonha, a humilhação e a revolta que sentiu durante as últimas horas. A tarde vai terminando. Após tantas emoções daquele dia, Laura decidiu-se a não voltar para o trabalho naquele turno. Daniel percebe que há algo estranho acontecendo em sua casa e sai do seu quarto... fica apoiado no batente da porta do corredor, escondendo-se, e vê que seu amigo e sua mãe estão abraçados... entra em silêncio e seus pais não dão pela presença do menino na sala

Daniel (amuado e zangado): Mamãe! Está chorando? Edgar... o que fez com minha mãe? Solta ela...

Laura(limpando os olhos e soltando-se de Edgar): Calma filho... o Edgar não me fez nada... ao contrário...estava me consolando por eu estar um pouco triste...

Daniel: Triste?

Edgar: Sim, Daniel... sua mãe teve um dia complicado no trabalho... mas já vai passar..

Daniel: Mas não abraça mais ela... não gosto que abracem minha mamãe... o único que abraça ela sou eu... ou...

Edgar: Ou quem, Daniel?

Daniel (com vergonha): O meu pai... ele pode não estar aqui... mas eu sei que o dia que ele me conhecer vai gostar de eu ter cuidado da mamãe para ele...

Laura: Daniel!

Edgar: Claro... ele vai ficar muito feliz em saber que você sempre cuidou da sua mamãe...

Laura: Vocês dois querem parar com isso?

Edgar (tentando disfarçar um sorriso): Mas eu sou amigo da sua mãe... e amigos abraçam amigos quando eles estão tristes... e o seu pai não iria se importar com isso... (pensando em qual seria sua reação se visse alguém abraçando Laura e chegando a conclusão que ia enlouquecer de ciúme)... eu acho

Daniel (desfazendo o beiço): É... e o teu abraço é tão bom... tá... eu deixo você abraçar... mas só você...

Edgar: Obrigado... então vem aqui e me dê um abraço... que o seu sim... é muito melhor que o meu...

Daniel dá um abraço apertado em Edgar... depois abraça a mãe e sai correndo...

Edgar: Tem certeza que foi só o que me contou que você falou para ele?

Laura: O que?

Edgar: Que eu estava longe e que amava muito ele...

Laura: Bem... ele uma vez me pediu se eu gostava do pai dele... e eu respondi que sim... acho que ele concluiu que se eu gostava o pai dele devia gostar de mim também...

Edgar: Se concluiu isso... concluiu certo... o pai do Daniel lhe ama muito Sra. Vieira... (vendo se Daniel não está por perto e roubando um beijinho de Laura)

Laura: Eu sei...

Laura senta-se no sofá e Edgar senta-se ao seu lado... dão-se as mãos... ficam um tempo sem falar... até que resolve contar a Edgar como está se sentindo... precisa desabafar...

Laura: Ai Edgar... foi horrível...

Edgar: Não precisa falar disso se não quiser.... mas se quer me contar... fale... desabafar faz bem..

Laura:os olhares que me lançavam...os comentários... Edgar... me senti tão mal... os homens me olhavam como se eu fosse uma vadia... as mulheres viravam o rosto quando me viam... parecia que tenho uma doença contagiosa ou que cometi um crime terrível...

Edgar: Você sabia que ia ser assim se descobrissem...você foi forte hoje... mas acho que ainda tem muita coisa por vir...

Laura: Eu sei... sabe... eu achei que estivesse preparada para a reação das pessoas... que bom que pareci ser forte... por que estou me sentindo tão débil...

Edgar: Laura... você não sabe a força que tem.. e eu te admiro cada dia mais por isso... tão forte e tão meiga ao mesmo tempo... como eu queria poder te proteger disso tudo... mas não sei como..

Laura: Não há como... você fez isso por tanto tempo e eu nem ao menos te agradeci... hoje eu vejo que se não tivesse feito minha vida seria quase impossível...

Edgar: Também não é assim... é o impacto da notícia... com o tempo as pessoas esquecem..

Laura: Talvez... mas sei que vão me recriminar muito... já estou pensando no que o seu Homero vai dizer quando souber...

Edgar: Não se antecipe... talvez ele não seja tão conservador... tenha a mente mais aberta.. (suspirando)... Laura... a gente se ama... sempre se amou... não precisava estar passando por isso...

Laura: Você sabe muito bem o porque disso tudo... acho que não é necessário lembrar... e, me diga, o que há de errado com o que fiz? O que? Eu apenas me divorciei... fiz algo permitido legalmente... ou quer dizer que se alguém já não se sente feliz da forma que vive tem de permanecer infeliz para o resto da vida?

Edgar: Te fiz tão infeliz assim?

Laura: Ai... perdão... não queria ter dito isso...

Edgar: Mas disse...

Laura: Não.. amor... deixa eu me explicar.. eu fui muito feliz ao teu lado... muito... mas a situação que você me impôs estava me sufocando...

Edgar: Hoje eu sei....Laura... vamos parar.. da última vez que começamos a falar de tudo isso a gente se machucou muito... e não é hora e nem lugar para gente começar a discutir... depois do que aconteceu hoje acho melhor falarmos de outras coisas...mas, antes, tem outra coisa que está me preocupando...

Laura: O que?

Edgar: Essa situação não envolve somente nós dois... envolve duas crianças...

Laura: Melissa e Daniel...

Edgar: Não quero que sofram.. com a exposição do divórcio podem descobrir que Melissa é minha filha ilegitima... registrada por mim... no caso de Daniel é pior... podem pensar que nós nos divorciamos por você ter me traído e Daniel não ser meu filho...

Laura: Ou seja... podem pensar que você me traiu e eu paguei na mesma moeda... você não pensou nessa possibilidade, pensou?

Edgar: Claro que não! Eu tenho certeza que o Daniel é meu... nunca duvidei da sua fidelidade... e digo mais... você também não deveria duvidar da minha depois que nos casamos...

Laura: Desculpa... mas como não ia duvidar depois de tudo aquilo e depois de ter visto você dormindo no sofá daquela mulher com ela só de robe te acariciando os cabelos

Edgar: Como? Não me lembro disso...

Laura: Na noite que não dormiu em casa... eu fui com a Isabel até a casa da Melissa e vi por uma janela... e naquele momento resolvi sair da nossa casa.

Edgar: Laura... eu juro que não fiz nada! Só me lembro de ter levado a Melissa no hospital e quando voltei para deixa-la com a mãe e voltar para casa, a Catarina ter me oferecido um chá... eu tomei e não me lembro de mais nada...

Laura: Edgar... quer que eu acredite que ela te dopou? (pensando) Se bem que vindo de uma mulher como aquela, não duvido de nada... pensei por um momento que ela plantou essa noticia no jornal...mas acho que não correria esse risco... afinal a nota cita o teu nome também.... Bom... e quanto a vocês dois terem algo ou não... eu estou te dando um voto de confiança...

Edgar: E eu juro que vou ser merecedor dela... mas... voltando ao que eu dizia sobre o Daniel... Laura... como está a certidão dele?

Laura: Bem.. ele está registrado no meu nome...

Edgar: Sem nome do pai...

Laura: É... mas tem o sobrenome por que mesmo divorciada o apelido de casada continua... não é isso?

Edgar: Sim... por isso o Daniel tem o meu sobrenome... não por te-lo registrado... mas eu vou consertar isso... Laura... amanhã depois do expediente vamos até o registro civil... vou registrar o Daniel como meu filho... podem até pensar as coisas que nós comentamos antes por conta do divórcio...mas não vou deixar que legalmente ele seja considerado filho de pai desconhecido...

Laura: Está bem... como o Dr. Advogado quiser...

Edgar: Agora vamos... vamos conversar sobre outras coisas... que tal irmos brincar com o nosso menino?

O casal se dirige ao quarto do filho... ficam brincando com ele por algum tempo... conversam...riem das travessuras do pequeno e esquecem por alguns momentos tudo o que acontecera durante aquele dia... jantam... Laura coloca Daniel para dormir, que exige que Edgar lhe conte mais uma história...

Edgar: Está bem... vou contar então... deixe-me ver...

Laura: Que tal... Os Três Porquinhos?

Daniel: Ah, não... essa eu já sei de cor...

Edgar: Mas não do jeito que eu conto..

Daniel: Está bem... vamos ver qual a diferença da sua história e a da mamãe...

Edgar conta, ou melhor, teatraliza a história deixando Daniel fascinado por sua narrativa... em um dado momento o menino se vê torcendo para que Heitor consiga fugir do lobo... depois de ouvir a história,Daniel adormece rapidamente...

Laura dá a mão para Edgar... estão novamente sozinhos... se dirigem para o quarto de Laura...

Edgar: Laura... não sei se eu devo ficar aqui hoje... podem me ver saindo amanhã e isso vai gerar mais comentários...

Laura: Amor.. pior do que já está não vai ficar.... você disse que não ia me deixar sozinha... e eu não vou conseguir dormir sem você aqui... a menos que não queira mais dividir a cama comigo...

Edgar: Meu amor... eu não quero dividir só a cama... eu quero dividir a vida novamente contigo... agora vem... vamos dormir...

Eles se arrumam para deitar e após alguns carinhos e trocarem alguns beijos, Laura dorme tranquilamente nos braços de seu amado...

O dia seguinte chega e se passa da mesma maneira que o outro... no trabalho Laura é olhada com desdém por uns, desconfiança por outros, maliciosamente por mais tantos... na rua nem sequer pôs os pés, afinal Edgar a deixou no trabalho cedo e vai busca-la no final do dia,sendo que o intervalo de almoço resolveu tirar ali mesmo na instituição, mas o assunto não é outro... ainda há muitos comentários e Edgar se irrita ao ouvirem falar tantas coisas a respeito de sua vida pessoal... mas assim como Laura, prefere não dar ouvidos e seguir em frente a ficar alimentando ainda mais a boataria que toma conta da cidade...

São 17:15hs... o horário de expediente está chegando ao seu final, quando um último frequentador do Arquivo Nacional solicita o auxilio de Laura...

Joaquim: Boa Tarde, Sra. Vieira...

Laura: Boa Tarde... em que posso ajuda-lo Dr. Castro?

Joaquim: Na verdade, não vim aqui com fins de pesquisa... soube do acontecido...sinto muito... vim para por-me a seu inteiro dispor...

Laura: Obrigada... mas não vejo porque precise do senhor neste momento.... e já que não precisa de meus serviços... com licença... meu horário de trabalho está terminando e preciso ir para casa... (andando pelo corredor em direção a recepção)

Joaquim (seguindo Laura): Eu a levo...

Laura: Não é necessário...

Joaquim: Eu insisto... deixe-me cuidar da senhora.. por certo está precisando de alguém para desabafar.... quero lhe ofertar minha solidariedade, meu afeto e tudo o que mais necessitar.. (estão na frente do prédio... ele barra a passagem de Laura)

Laura: Já lhe disse que não preciso de nada que venha do senhor... e agora me deixe passar

Joaquim: Não vai a parte alguma sem mim... eu tentei por bem... mas paciência tem limite...

Joaquim agarra Laura pelo braço e tenta beija-la a força. A moça tenta soltar-se desesperada... Laura luta para desvencilhar-se daquele homem...ela bate em seu peito, mas não tem força para soltar-se... quando quase se solta, ele ainda consegue segura-la, rasgando a manga de sua blusa e acaba por pega-la pelo punho, quase deslocando seu pulso... Edgar que estava vindo buscar Laura vê ao longe que ela está sendo atacada e corre para o local...

Edgar (dando uma chave de braço em Joaquim o fazendo ficar sem ar ) solta ela!!!

Joaquim perdendo um pouco o folego solta Laura, que sai para um lado... Edgar solta Joaquim que recobrando um pouco o ar lhe empurra violentamente.: Não se meta...

Edgar (empurrando Joaquim): O que você está pensando? Que é assim que se consegue alguma coisa com uma mulher? E a minha mulher... Eu te avisei para ficar longe dela...

Joaquim : E quem te disse que vou te obedecer?(desferindo um soco em Edgar)

Edgar devolve o soco e dá uma joelhada na barriga de Joaquim que o deixa tonto... ele ainda se recupera e desfere mais um soco acertando o olho de Edgar... o anel que Joaquim tem no dedo, cheio de relevos, corta o supercílio de Edgar, que começa a sangrar.. Laura grita desesperada e tenta apartar a briga... Joaquim o empurra fazendo chocar-se contra a parede do edifício...

Joaquim: Não queria brigar com você Edgar....você perdeu sua mulher por burrice... deixou de cuidar do seu próprio filho para cuidar de uma bastardinha... vai lá cuidar daquela menina que pode ser filha de qualquer um.... até minha...

Edgar ao ouvir aquilo fica tomado de raiva... mesmo ferido retoma a briga, dando mais um soco no queixo de Joaquim que o faz cair.. no chão ainda lhe desfere mais socos e levantando-se termina por dar-lhe vários pontapés...

Edgar (mantendo Joaquim no chão com o pé em seu pescoço): Vamos... desgraçado... agora me diz... o que mais sabe sobre minha filha?

Joaquim: Sua filha? Procure saber em Portugal...