Enquanto reina a paz na casa da família Vieira, em outro lado da cidade o clima é tenso... Catarina tem mais um de seus rompantes graças ao ocorrido durante a manhã daquele dia..

Catarina: E agora mais essa... a notícia até surtiu efeito... mas o Edgar e ela estão juntos... juntos.. se eu não fizer alguma coisa o Edgar logo vai saber que tem um filho com aquela mosca morta... a Laura vai começar a influencia-lo.. e eu e a Melissa vamos ficar na miséria...

Fernando: Meu rouxinol... pare de se lamentar... você logo não vai depender mais do dinheiro do Edgar... já te contei do plano que tenho para conseguir ficar como acionista majoritário da tecelagem...

Catarina: Ai Fernando... mas quanto tempo isso vai demorar? E também... eu duvido que você tenha coragem de fazer o que planejou...

Fernando: Duvida? Pois eu vou te mostrar... sinto por Dona Margarida, que me criou como um filho... mas pelo meu pai... que sempre me tratou como se eu fosse um monte de lixo e agora faz questão de me lembrar a todo momento que sou um filho bastardo... quero mais é que volte a ser um caixeirinho... que vá vender batatas na mercearia... e o meu irmão... esse quero poder espezinhar... mostrar que não é melhor do que eu em nada... eu vou fazer exatamente o que combinamos... a carga de tecidos deve sair aqui há alguns dias...já avisei o atravessador... nada pode dar errado..

Catarina: Assim espero meu amor... assim espero...

Mais um dia amanhece no Rio de Janeiro. Naquela manhã quente de final de primavera, Edgar acorda e vai até o quarto em que Daniel dorme.. O menino continua ressonando tranquilamente... dá um sorriso ao vê lo e volta para o quarto... Laura acabara de despertar e pensa em levantar-se..

Edgar: Onde pensa que está indo?

Laura: Bom dia... vou dar uma olhada no Daniel...

Edgar: Acabei de vir de lá... está dormindo como um anjo... e dessa forma... acho que a mãe dele pode voltar a dar um pouquinho de atenção a um pobre homem abandonado... (abraçando Laura pela cintura)

Laura (rindo): Abandonado? Você? Duvido... (dando um beijinho em Edgar)

Eles voltam para cama e namoram mais um pouco... Mas, não tarda e o relógio mostra que está na hora de começarem suas tarefas diárias... Laura e Edgar vestem-se e descem para tomar café...

Laura: Vou ter de acordar aquele rapazinho... temos que leva-lo para casa antes de eu ir trabalhar...

Edgar: Não... deixa ele dormir... a Matilde está aqui e pode cuidar dele... fora que eu te levo para trabalhar... faço o que preciso na rua e depois volto e fico com ele também... não se preocupe...

Laura: Será que ele não vai estranhar... ele vai acordar num lugar que não conhece e eu não vou estar por perto...

Edgar: Mas ele conhece a Matilde... mas se você está tão preocupada... então vai lá... acorde ele..

Laura sobe e vai ver Daniel...ele dorme tão tranquilo que fica com pena de acordar o menino e volta para sala

Laura: Ele está dormindo tão bem... você me convenceu... ele vai ficar bem por aqui...vamos?

Edgar concorda com a cabeça e eles saem. Laura é deixada no Arquivo Nacional e Edgar segue para resolver seus assuntos. Ao pisar no prédio da instituição, Laura recebe da secretária um aviso... deve comparecer a sala do Sr. Homero assim que chegar... Laura imagina o que seja...dá um leve suspiro... e com passos firmes segue rumo a sala do diretor...bate a porta...

Laura: Bom dia... com licença... recebi seu recado...

Homero (apontando a cadeira): bom dia Sra. Vieira... sente-se

Laura (sentando): Pois não, senhor Homero...

Homero: D. Laura... soube do que ocorreu durante minha ausência... acredito que saiba por que motivo a chamei aqui...

Laura: Pois o senhor me diga...

Homero: A senhora traiu minha confiança me fazendo pensar algo que não condiz com a verdade... eu havia entendido que a senhora era viúva... e não uma mulher divorciada...

Laura: Senhor... nunca lhe disse que era viúva... e não vejo em que meu estado civil interfere em meu desempenho profissional...

Homero: Veja bem, D. Laura... seu desempenho como funcionária desta instituição é exemplar... quem dera que todos fossem como a senhora... mas...

Laura: Mas por eu ser divorciada não posso continuar a trabalhar aqui... Sr. Homero.. eu não fiz nada de errado... o divórcio é permitido no Brasil...

Homero: Eu sei... mas infelizmente o divórcio, no caso de uma mulher, não é bem visto pela sociedade... recebi muitas reclamações de frequentadores incomodados com sua presença aqui... fora isso... fiquei sabendo que o Dr. Vieira e o Dr. Castro acabaram por usar de violência física nas imediações do prédio por sua causa... não me resta outra coisa a fazer além de demiti-la...

Laura: O senhor vai me demitir por meu estado civil incomodar as pessoas e por meu ex-marido me defender de um ataque de outro homem? Eu fui a vítima e vou pagar por isso?

Homero: Sinto muito... não é nada pessoal... mas entenda minha situação... aqui tem o valor que lhe devemos por esses dias de trabalho (entregando um envelope com dinheiro)

Laura (pegando o dinheiro): Claro... entendo... quem não compreende a minha situação é o senhor... passar bem...

Laura sai daquela sala e daquele prédio sem olhar para trás... sente-se injustiçada... tem raiva.. e agora? Não sabe ao certo o que fazer... nem para onde ir...caminha a esmo pelas ruas do centro da cidade sem se importar com os olhares das pessoas ao seu redor... dobra a esquina e entra na Rua do Ouvidor... sua cabeça ferve em pensamentos... ao passar pelo Teatro Alheira, ouve alguém lhe chamar..

Isabel: Laura! Laura!

Laura: Isabel!

Isabel: Amiga... que bom te ver... achei que a estas horas estivesse trabalhando... está de folga?

Laura: Não... acabei de ser demitida...

Isabel: Vem... vamos para o camarim do teatro... eu estou me preparando para o ensaio de minha apresentação... me conta tudo o que aconteceu...

Laura: Não há muito o que falar... fui demitida... por ser divorciada...

Isabel: Eu sinto muito, amiga...

Laura: Só gostaria de saber quem terá sido o responsável por divulgar o divórcio... tenho certeza que fez com o único propósito de me agredir...

Isabel: Bem... eu tenho quase certeza que foi a Catarina.. é a única pessoa que sei que não pouparia esforços para te ver longe daqui..

Laura: Também tenho... mas com que provas vou fazer com que acreditem nisso?

Isabel: Ainda vamos descobrir... tenha certeza disso... mas mudando de assunto... e o Edgar?

Laura: Ai... o Edgar... ele tem sido tão companheiro... tão compreensivo... ele é incrível...

Isabel: Que bom que ele está ao seu lado...

Laura: Mas, e você... quando estréia?

Isabel: Amanhã... quer ver o ensaio?

Laura: Claro...agora que sou uma desempregada tenho todo o tempo do mundo...

Isabel: Amiga... logo você vai encontrar um trabalho...

Enquanto isso, Edgar termina de resolver alguns assuntos no banco e vai até o Correio da República... entra no escritório de seu amigo Guerra, que está tão concentrado no que está lendo que nem dá pela presença do rapaz...

Edgar: bom dia Guerra (espera a resposta do amigo que não vem) Guerra...

Guerra (levantando os olhos do papel): Ah... desculpa Edgar... Bom dia...

Edgar: Nossa... o que tem aí que te impressionou tanto?

Guerra: Algo muito interessante... você deveria ler também... pretendo publicar isso ainda amanhã... (passando as folhas para Edgar)

Edgar (lendo): Muito bom... muito bom mesmo... o assunto é muito importante e está muito bem pautado... a argumentação também... está perfeita... quem escreveu?

Guerra: Um tal de Paulo Lima... não o conheço pessoalmente... não sei se é jornalista ou apenas um leitor, mas escreve muito bem...

Edgar: Pois é... Antonio Ferreira que se cuide...

Guerra: Falando nele... como vai a reportagem?

Edgar: Vim te falar disso... já tenho algumas informações dadas por um cliente que é oficial da Marinha e está a favor dos marinheiros... ele vai me ajudar a entrar em um dos navios e na Ilha das Cobras para ver a real situação de tudo... só preciso manter sigilo sobre sua identidade... caso contrário ele pode ser punido severamente...

Guerra: Vai ser uma troca de favores... você mantém em segredo a dele e ele a sua...espero que logo possa me entregar esse material...

Edgar: Assim que possível.. agora tenho de ir... deixei o Daniel sozinho em casa com a Matilde e fiquei de leva-lo na pracinha hoje...

Guerra: E ele? Como está? Edgar não há como não dizer que é seu filho...

Edgar: Está ótimo...e me deixando preocupado... ontem ele percebeu que temos o mesmo sobrenome... e começou a perguntar sobre isso...

Guerra: Bom... acho que Daniel será meu repórter investigativo aqui uns vinte anos... do jeito que está logo você vai ter de abrir o jogo e contar que é pai dele...

Edgar: Sim... estou com medo disso... mas está chegando a hora... até mais ver Guerra...

Guerra: Até mais ver...

Laura acabara de despedir-se de Isabel prometendo que irá ver seu espetáculo... vai andando pela Rua do Ouvidor... Edgar sai do prédio do jornal e acaba por ver Laura caminhando logo a sua frente...

Edgar: Laura?

Laura: Edgar!

Edgar: Amor... o que faz aqui? Não era para estar no Arquivo Nacional?

Laura: O Seu Homero voltou hoje... me chamou na sua sala... e me demitiu... acho que nem preciso te dizer o porque...

Edgar: Bem... você já esperava...

Eles seguem juntos pela rua, indo em direção a casa dele...

Laura: Sabe, meu amor... ainda tinha um fiapo de esperança que o seu Homero fosse entender... Edgar... ele disse que eu era uma funcionária exemplar... me demitiu apenas pelo fato de ser divorciada... que minha presença incomodava os frequentadores... estou me sentindo muito desrespeitada... nós não fizemos nada errado... nada ilegal...

Edgar: Eu sei... mas a maioria não vê as coisas assim...

Laura: Não tenho nem ideia do que vou fazer agora... vou começar a procurar trabalho em outros lugares... nem que para isso precise voltar para o interior...

Edgar: Interior? Não, por favor... eu já fiquei longe de você muito tempo... não quero que você e o nosso filho se afastem novamente de mim... eu não suportaria isso... nós vamos encontrar uma solução... por enquanto vamos para casa... o Daniel está me esperando...

Laura: Eu sei...você vai leva-lo para passear... acho que enquanto vocês passeiam vou escrever uma carta de qualificações para apresentar em algumas escolas...

Edgar: Claro, meu bem... faça isso... em alguma delas você há de ser aceita...

Eles chegam em casa... Daniel está brincando com os jogos que Edgar dera a Melissa... o menino para a brincadeira e corre para os braços da mãe...

Daniel: Mamãe... você voltou cedo! A Matilde me disse que você tinha ido trabalhar e que o Edgar logo ia voltar para ficar comigo...

Laura: Sim, meu anjo... mas a mamãe saiu mais cedo e pôde vir te fazer companhia... se quiser podemos ir para casa...

Daniel: Mas a Matilde disse que hoje nós íamos passar o dia aqui...

Edgar: E você gostou da ideia?

Daniel: Sim... gostei da sua casa, Edgar... e esses brinquedos são supimpa...

Edgar: E eu te prometi uma coisa ontem.. que nós íamos a pracinha hoje... então... vamos?

Daniel: Claro... mamãe... você vem com a gente?

Laura: Não meu amor... eu preciso escrever umas coisas... eu fico aqui e vocês dois vão se divertir... certo?

Daniel: Está bem... até logo então... (dando a mão a Edgar e saindo alegremente pela porta)

Pai e filho vão conversando pelo caminho... a praça fica a aproximadamente um quarteirão da casa de Edgar...

Na pracinha há muitas crianças brincando... pais e mães estão conversando distraidamente enquanto aguardam seus filhos se divertirem... Edgar leva Daniel até um balanço... eles começam a brincar... algumas pessoas que já haviam visto o menino junto a Laura começam a chamar seus filhos e deixar o local... isso não impede que Daniel e o pai continuem com seu brinquedo... um conhecido de Edgar o cumprimenta e eles iniciam uma conversa... o menino neste ínterim resolve usar outro brinquedo da praça... sai do balanço e vai correndo para o escorregador... onde uma pequena fila de crianças se forma para ordenadamente subirem e ter cada um sua vez de brincar...

Menino (ao ver Daniel chegando na fila): Aqui não é lugar para você... vá para longe de mim seu bastardo... (empurrando Daniel, que cai no chão)

Daniel não entende o que está acontecendo... todas as outras crianças a seu redor riem dele e o chamam de bastardinho... o menino está cada vez mais acuado e de seus lindos olhos verdes começam a brotar lágrimas...

Edgar ao ver o que está acontecendo vai correndo ao encontro de seu pequeno... pega-o no colo e o abraça ternamente secando suas lágrimas.... olha furiosamente para as crianças reprovando sua atitude fazendo-as subitamente calarem-se e procurarem por seus pais... o menino que começara tudo aquilo está parado diante de Edgar sem reação... a mãe do pequeno agressor aproxima-se para leva-lo embora...

Edgar: É seu filho?

Mulher: Sim...

Edgar: Pois então tenha mais cuidado com o que ensina a ele... essa agressão só demonstra o quanto a senhora é preconceituosa... deveria envergonhar-se de ensinar tais coisas para uma criança... a senhora dessa forma está criando um homem covarde, incentivando esse comportamento discriminatório e hostil para com os outros.... com licença...

Edgar deixa aquele lugar levando Daniel em seu colo... o menino mesmo tendo parado de chorar ainda está assustado... Eles chegam em casa... Edgar coloca Daniel no sofá e senta-se a seu lado...

Edgar: Você está bem? Aquele menino te machucou?

Daniel (triste): Estou bem, sim... o tombo doeu um pouquinho... mas já passou...

Edgar: Ainda bem... nunca mais isso vai acontecer... eu prometo (dando um beijo nos cabelos do menino)

Daniel: Edgar...

Edgar: O que foi?

Daniel: O que é bastardo? Por que aquele menino me chamou assim e os outros riram?

Edgar: Meu anjo... bastardo é uma pessoa que não nasceu dentro de uma família onde os pais são casados.... mas você não é isso... seus pais eram casados quando Deus te mandou como um presente para eles cuidarem e amarem...você nasceu em uma família...

Laura percebe que algo acontecera e sai do escritório... sem dizer nada apoia-se no sofá onde Daniel e Edgar estão sentados..

Daniel: Edgar... eu tenho uma mamãe que eu amo muito e sei que ela me ama também....... mas onde está o meu papai? Será que um dia eu vou conhecer ele? Eu queria muito que ele tivesse aqui... comigo... agora...

Edgar (olha enternecido para o menino... seu coração está apertado... sente vontade de chorar): Eu estou aqui, Daniel...

Daniel: Eu sei... você é meu amigo Edgar...

Edgar: Daniel... o seu papai... sou eu....

Daniel (espantado): Você?

Edgar (olha para Laura procurando por aprovação.. ela acena a cabeça.. então olha nos olhos de Daniel): É... olha... aquele retrato que você viu ontem... foi tirado no dia em que sua mãe e eu nos casamos... e seu sobrenome é Vieira como o meu por que eu sou seu pai...

Daniel: Por que vocês não me disseram isso antes? Por que você nunca veio me ver?

Edgar: Daniel... nós estávamos muito longe um do outro e por uma série de coisas que aconteceram eu não pude te ver ... o dia que eu te conheci foi um dos mais felizes da minha vida... mas eu tive medo que você não me aceitasse.... não gostasse de mim... por isso eu não contei quem eu era..sua mamãe e eu achamos que eu devia ser primeiro seu amigo... e vou continuar sendo... quero ser o seu melhor amigo... aquele que sempre vai estar do teu lado... mas eu sou seu papai...

Daniel: Teve medo que não gostasse de você? Como? Se eu te adoro......

Edgar: E eu te amo, meu filho...

Daniel: Edgar... como eu te chamo agora?

Edgar (com a voz embargada): Como você quiser... se quiser me chamar só de Edgar, tudo bem... se um dia você quiser me chamar de pai... você vai me fazer extremamente feliz...

Daniel levanta-se e olha firmemente para Edgar... abre um sorriso... e abraçando Edgar diz: Papai... eu sabia que você só podia ser meu papai...