Laura e Constância chegam em casa. Ao adentrar o portão de casa, Laura caminha vagarosamente pelo caminho decorado com pedras em meio ao gramado que leva à entrada da casa. Estava perdida em seus pensamentos, fascinada com o que acabara de lhe acontecer na casa dos Vieira. Edgar a beijara... ela havia dado seu primeiro beijo!

Ela com uma das mãos traz o livro que Edgar a dera de presente apertado contra o peito e a outra mão Laura, toca seus próprios lábios delicadamente, ainda sentia a presença dos lábios de Edgar nos dela. Não podia mais negar pra si mesma, estava completamente apaixonada por aquele rapaz. E quem diria, ela que fora tão resistente a idéia de ter um pretendente arranjado por sua mãe, estava completamente encantada com tudo que Edgar lhe proporcionava. Era carinhoso, inteligente, com idéias tão modernas e tão livres de preconceitos, Edgar era uma das poucas pessoas que entendiam o seu jeito tão distinto do das outras moças, sua presença a fazia feliz, estar com ele, conversar com ele lhe faziam um bem imensurável, seu coração pulsava aceleradamente toda vez que o via e agora fora beijada por ele. Este misto de emoções causava tantas dúvidas na jovem moça, estava descobrindo o amor, sequer pensara que isso realmente existisse, nunca fora romântica e agora estava ali completamente envolvida por esse novo sentimento que tomava conta de todo o seu ser.
Constância impaciente com a lenta caminhada de Laura:

– Não gostei nem um pouco deste presente que Edgar lhe deu. Onde já se viu dar um livro de presente para uma moça? Não disse nada para não desagradá-lo. Mas nem pense em ficar fazendo a cabeça de Edgar em relação a esta sua maldita mania de ler, ouviu mocinha?!

Laura com o pensamento longe não ouvira sequer uma palavra dita pela baronesa.

Constância impaciente: - Laura? Laura você está me ouvindo? Laura? (ela toca em Laura).

Laura: - Eu?

Constância: - Onde você está com a cabeça menina? Ah não me interessa, já chegamos preciso ir ao encontro de Carlota.

Constância entra apressada em casa deixando Laura para trás que caminhava vagarosamente pelo jardim. A baronesa logo se tranca em um dos cômodos da casa com Carlota.

Constância: - Carlota o que houve de tão grave para me mandar um recado na casa de Margarida solicitando minha presença com urgência?

Carlota nervosa: - O Dr. Teixeira.

Constância: - O que tem o Teixeira Carlota?

Carlota: - O tabelião...

Constância sem paciência : - Eu sei que o Dr. Teixeira é um tabelião... o tabelião que você subornou para falsificar o testamento de seu marido. Para que assim você e Alice herdassem toda a fortuna de Ernesto, deixando a pobre tia do coitado na miséria.

Carlota: - Uma loucura que Ernesto quisera fazer, ainda bem que descobri antes do testamento ser aberto. Um absurdo aquela velha receber boa quantia do dinheiro que é meu e de Alice por direito.

Constância: - Poupe-me de sua ladainha Carlota, ainda não me disse o que tem o Teixeira!

Carlota: - Ainda pouco me pediu mais dinheiro, está me chantageando, onde vamos parar com isso?...

Constância : - Ah mas isso é simples Carlota, nos empenhemos a descobrir algum podre daquele vendido e você estará salva.

As duas ficam confabulando o que irão fazer enquanto no exterior da mansão...

Laura depois de alguns longos minutos consegue chegar à porta da sala da mansão, ela se encosta no batente da porta, com os olhos brilhando, um sorriso bobo e os pensamentos longe em Edgar, ela diz pra si mesma:

– Ai Laura. (sorriso bobo)

Alice que estava sozinha na sala, estranha o modo que Laura entra.

Alice: - Laura?

Laura não responde, Alice em sua primeira tentativa não conseguira fazer a prima despertar de seus pensamentos e então se aproxima tocando nela:

– Laura está tudo bem?

Laura despertando: - Alice? Você está aí?

Alice: - Há um tempo que lhe chamo. Está tudo bem com você? Você está estranha.

Laura: - Ai está tudo ótimo Alice. ÓTIMO. Melhor impossível. Venha comigo preciso lhe contar algo urgente. (Fala Laura gargalhando alegremente e puxando a prima pela mão, escada a cima se trancando no quarto com ela).

Alice: - Laura o quê que aconteceu pelo amor de Deus? Você está me deixando nervosa e curiosa também.

Laura: - Ai Alice, o Edgar, o EDGAAR! (diz ela num misto de felicidade e nervosismo).

Alice: - O que tem o Edgar? Jesus!

Laura: Laura segura nas mãos de Alice e com um largo sorriso olha nos olhos da prima:

– O Edgar me beijou! (Laura dá um rodopio e se joga na cama)

Laura coloca o livro aberto que ela não soltara momento algum, na frente do rosto:

– Ai ele me beijou Alice.

Alice admirada e curiosa: - Como o beijo de noivos nas cerimônias de casamento?

Laura: - É Alice, um beijo. Meu primeiro beijo. Eu mal posso acreditar o Edgar me beijou. (Laura gargalha fascinada com tudo que lhe acontecera.)

Alice: - E ele se declarou pra você? Te pediu em namoro? Ai Laura conta direito, você só sabe dizer que o Edgar te beijou e isso eu já entendi eu quero é saber como foi. (nervosa)

Laura ri: - Ai Alice nem sei direito, foi tudo tão rápido, tão confuso eu não podia esperar por isso.

Alice: - Mas conta. (suplicando)

Laura tenta se acalmar um pouco se senta na cama e puxa Alice para que ela se sente de frente para ela.

– Olha isso! (Estendendo o livro que ganhara de Edgar, para Alice ver.)

Alice espantada: - Dom Casmurro?! Mas esse não é o novo livro do Machado? Que acabara de ser lançado? Mas Laura você não está proibida de comprar livros novos, se esse é novo, como conseguiu?

Laura sorri : - O Edgar! O Edgar me deu de presente. Ele sabia que eu estava de castigo, proibida de comprar livros novos. No dia da festa eu comentei com ele que eu queria muito o novo livro do Machado, ele percebeu que eu estava entristecida por não poder comprar o livro nem tão cedo, então ele resolveu me dar de presente.

Alice: - Que lindo, prima.

Laura: - Ele é muito atencioso, Alice! No chá que dona Margarida nos convidou hoje, Edgar me fez essa surpresa, me deu Dom Casmurro de presente. Depois ele me levou à biblioteca de sua casa para me mostrar os livros dele, disse que eu poderia pegar o que quisesse emprestado. Então fui olhar uns títulos e acabei derrubando alguns livros no chão.

Alice ri: - Ficou parecendo até a tia Celinha, Laura. Mas continue.

Laura: Então me abaixei para pegar os livros que derrubei, Edgar foi me ajudar. Sem querer ele acabou pegando na minha mão. Ai Alice depois disso ele me olhou de um jeito, foi se aproximando disse que o meu olhar o prendia mexia com ele e...

Alice: E? Ai Laura fala logo!

Laura: - E eu não sei como... ele me beijou Alice.

Alice: - E você?

Laura: - E eu o quê?

Alice: - Ai Laura, o que você fez? Como reagiu?

Laura: - Eu não sei Alice. (rindo e se atirando deitada na cama de novo)

Alice: - Como assim não sabe?

Laura: - Eu não sei. Eu não sabia o que fazer, como reagir, o que falar. Foi o meu primeiro beijo, oras Alice. Eu me senti completamente envolvida por ele. Os lábios do Edgar tocando os meus. As minhas pernas tremiam, eu tive vontade de chorar, de rir, de gritar de sei lá o quê. Fiquei muito nervosa que não fiz nada.

Alice: - E depois Laura? Ele te pediu em namoro? Vai vir falar com o tio Alberto?

Laura: - E depois nada! A mamãe entrou feito um furacão na biblioteca me chamando para virmos embora, porque tia Carlota queria falar com ela.

Alice: - Ai que hora mais inoportuna para mamãe resolver falar com tia Constância. Mas como você está se sentindo Laura?

Laura: - Como eu estou me sentindo Alice? Realmente eu preciso dizer?

Alice: - Claro que não. Seus olhos, o seu sorriso falam por você, senhorita Assunção. Está completamente apaixonada pelo Edgar Vieira, confesse. (Alice começa a fazer cócegas em Laura).

Laura: - Ai Alice pare. Eu não sei o que é estar apaixonada. Mas se estar apaixonada significa estar sentindo todas essas coisas boas que o Edgar me faz sentir ao mesmo tempo. Sim eu estou APAIXONADA pelo Edgar. (diz com um largo sorriso no rosto)

Alice: - Nunca imaginei te ver falando assim Laura. (surpresa)

Laura: - Nem eu Alice, nem eu. Como posso estar assim tão boba por isso? Tão encantada por um rapaz que há poucos dias eu nem sabia que existia?

Alice: - Você acha que ele vai te pedir em namoro Laura?

Laura: - Ai Alice não sei, eu não sei nem qual é a impressão que eu causei no Edgar. Mas não quero pensar nisso, quero lembrar deste momento com muito carinho, pensar em tudo o que aconteceu, quero pensar no Edgar.

Enquanto isso Edgar em seu quarto não conseguia se concentrar em nada, só pensava em Laura, no beijo que roubara dela. Será que havia sido ousado demais? Laura mal reagiu, não fugiu de seu beijo é verdade, mas também não esboçou maiores reações, parecia tão assustada. Como ele pudera ter feito aquilo? Com certeza era o primeiro beijo de Laura e eles não tinham até então nenhum compromisso sério. Laura por diversas vezes havia feito elogios a ele, ele sabia que sua presença a agradava como a dela fazia a ele, mas nunca haviam sido muito claros em seus sentimentos. Além da ousadia para piorar Constância havia acabado com qualquer possibilidade de Edgar falar de seus sentimentos para Laura, depois daquele beijo. Edgar estava confuso, confuso, mas muito feliz. Porém tinha medo do que Laura poderia estar sentindo. Será que se sentiu ofendida? Teria ele ido rápido demais? E se seu impulso fizer Laura se afastar, não querer mais vê-lo? Não queria que ela se sentisse invadida, forçada a qualquer coisa. Eram amigos e ambos sabiam da vontade das famílias que de vê-los comprometidos. Laura poderia achar que ele estava forçando a situação, ou se aproveitando dela. Edgar se encontrava em uma enorme confusão emocional, estava extremamente feliz, admirado consigo mesmo, só pensava em Laura, no beijo da linda moça que tanto o encanta, porém estava inseguro ao imaginar que espécie de pensamento estaria passando pela cabeça de Laura. Edgar então resolve sair um pouco de casa, precisava conversar com alguém. Não queria a mãe por agora, ela sempre o ouvia, mas sua cabeça só conseguia pensar em procurar uma opinião masculina e mais experiente, Edgar então sai de casa e vai até o Correio da República.

Guerra na Redação do Jornal:

– Mendes, está tudo certo para amanhã você ir atrás das informações sobre a concessão dada a William Reid para o fornecimento de energia elétrica da cidade?

Mendes: - Sim, Guerra. Já fiz os meus contatos, tenho tudo organizado. Acredito que no até o final da semana terei todas as informações e a reportagem já poderá estampar nosso jornal.

Guerra: - Certo. Confio no meu melhor repórter.

Edgar entra na Redação:

– Boa tarde!

Guerra: - Olhem hoje temos a ilustre presença do filho mais velho de um Senador! Edgar o que te trás aqui rapaz?

Edgar: - Preciso dos conselhos de um amigo experiente. (sorrindo)

Guerra: - Me chamando de velho, Edgar?

Edgar: - Não claro que não, apenas é um senhor com mais experiência de vida.

Guerra: - Ouviu isso Neto? O rapaz precisa de um senhor com mais experiência de vida para conselhos, só pode ser sobre um único assunto: MULHER! Acertei? (diz ele divertido)

Edgar: - Guerra! (sem graça)

Guerra: - Ok. Pela sua reação já vi que acertei. Já estava terminando mesmo o meu trabalho, podemos ir ao Bar Guimarães, tomar um café, porque mal dispomos de café aqui nesta espelunca, então conversamos lá, pode ser assim?

Edgar: - Claro! Aproveito para olhar o tipógrafo.

Guerra, Neto e Mendes assustados gritam juntos: - NÃO!

Edgar assustado: - O que vocês tem contra eu observar o trabalho do tipógrafo?

Guerra: - O que tem Edgar? Não se lembra do estrago que você fez na primeira vez que veio aqui ao jornal?

Neto começa a rir: - Foi observar o trabalho do tipógrafo e deu o triplo de trabalho que o pobre já tinha para fazer, derrubando todos os tipos no chão.

Edgar começa a rir: - Mas não foi por mal.

Guerra: - Maldita hora que eu fui permitir que você se aproximasse do tipógrafo.

Edgar: - Ah Guerra eu nem fiz tanto estrago assim. Estava apenas curioso era a primeira vez que eu pisava na redação de um jornal.

Guerra: - E daí em diante não parou mais de vir aqui não é?

Edgar: - Que isso Guerra, falando assim até parece que você não gosta da minha presença.

Guerra: - Brincadeira Edgar. Só nunca imaginei que em tão pouco tempo me tornaria amigo de um rapazote que há pouco mais de um ano estava me procurando aqui desesperado querendo que eu publicasse de qualquer modo, seu texto sobre os dez anos do fim da escravidão no país.

Edgar: - E que você não quis publicar. (Chateado)

Neto: - Texto muito bem escrito por sinal. Você tem futuro como jornalista rapaz!

Edgar sorridente: - Você acha mesmo?

Guerra: - Achamos. Mas pra isso o senhor futuro jornalista precisa amadurecer um pouco mais.

Edgar: - Já sou um homem Guerra.

Guerra: - Ah Edgar por favor, ainda nem completou 18 anos.

Edgar: - Mas daqui a dois meses estarei completando.

A conversa na redação do Correio da República segue um pouco mais e logo depois Edgar e Guerra seguem para um café no Bar Guimarães. Edgar conta tudo sobre o que viveu com Laura por aqueles dias e pede o conselho do amigo sobre o que deve fazer:

– Então Guerra hoje mais cedo eu acabei beijando a Laura. Eu não resisti mais ficar perto dela. Ela tem um olhar que me fascina. O jeito dela tão diferente, tão encantador. Eu não sei direito o que eu sinto por ela, mas ela mexe tanto comigo.

Guerra: - Paixão Edgar, você está apaixonado pela Laura. E não é qualquer paixãozinha não, é daquelas dos mais românticos dos contos.

Edgar assustado: - Eu apaixonado Guerra?

Guerra: - Que outro nome se daria a isso? Você me disse que se torna extremamente feliz com a companhia da moça, que conta as horas para vê-la novamente, encheu-a de elogios em menos de cinco minutos de conversa, me confessou que não resistiu mais em ficar perto dela e acabou a beijando, se isso não é paixão...

Edgar nervoso: - E esse beijo? O quê que eu fui fazer? E se a Laura se ofendeu? Guerra foi o primeiro beijo dela e eu fui tão afobado. Ainda mais que nossas famílias querem que nós firmemos um compromisso ela pode achar que eu estou forçando uma situação, não quero que ela se sinta assim, tenho medo de ir falar com ela. E se ela não quiser mais me ver?

Guerra: - Calma Edgar. Você mesmo disse que ela não é como as outras moças.

Edgar: - Eu queria poder entrar dentro da cabeça da Laura pra descobrir o que ela ta pensando, o quê que ela ta sentindo sabe?

Guerra: - Pra isso não adianta entrar dentro da cabeça da moça não meu amigo, tem que entrar no coração.

Edgar: - Mas é tudo tão complicado, eu não sei o que ela está sentindo e se ela achar que eu fui um abusado?

Guerra: -Vai lá e descomplica, se declara, Edgar. Você quer que eu te ajude numa serenata?

Edgar: - Ah realmente serenata de amor muito a minha cara.

Guerra: - Ai Edgar eu to falando sério, você só vai saber o que ela sente depois de uma velha e boa declaração de amor.

Edgar fica pensativo durante todo o caminho de volta para casa, os conselhos de Guerra não o ajudaram muito, o amigo tinha cada idéia, fazer serenata de amor que coisa mais comum pensara. Mas conversar com Guerra de qualquer forma o fizera bem, o amigo conseguiu entender o que ele próprio não havia entendido: Sim, estava apaixonado por Laura, completamente apaixonado. Não conseguia mais pensar em sua vida longe dela, sem a presença dela, não conseguia pensar em ficar sem ver aquele lindo sorriso, sem ouvir aquela gargalhada contagiante que só Laura tinha, não poderia mais ficar sem Laura. Porém continuava sem saber o que fazer, embora soubesse que precisava fazer alguma coisa.