SOLUÇO

Não consegui dormir a noite, tudo bem não durmo uma noite inteira desde que cheguei, mas dessa vez o motivo da minha insônia não são os pesadelos com a prisão. Foi o beijo. Beijar a Asty foi a coisa mais estupida que já fiz. Mas vê-la tão frágil e vulnerável me fez querê-la mais do que qualquer coisa que já quis em toda minha vida.

Enquanto me arrumava para a escola pensava no beijo. Quando nossos lábios se tocaram ela fechou os olhos e me agarrou forte. Senti todo meu corpo vibrar com tal intensidade como uma explosão nuclear dentro de mim. Foi tão...intenso.

Ainda não consegui achar uma explicação lógica para o que me levou a beijar justo a garota que eu deveria evitar a todo custo. Só sei que estar perto dela parece tão certo que não pude resistir. Passamos por tantas coisas, nossas vidas se enlaçaram de tal forma que parece impossível soltar. E quer saber de uma coisa? Eu não quero mais sair.

O jeito que ela cantarola musicas ridiculas quando está nervosa, com raiva, triste. Seu olhar de lado quando a senhora Reymond diz que ela está plantando seus estúpidos bulbos errado. Tudo isso me encanta de uma forma que não sei explicar.

Tudo bem, ela fugiu depois do beijo. Ela me deixou naquela árvore me perguntando como fiz para me meter nessa confusão. Tê-la é impossível.

Tentei escrever uma carta para ela me desculpando, mas todas as minhas tentativas foram falhas.

Os beijos de Kendra são ocos para mim e eu não me arrependo de ter me aproximado de Asty. Eu quis beija-la, ainda quero beija-la. Mas sei ao menor sinal de aproximação ela fugirá.

Resolvo ir para escola e tentar esquecer a noite passada.

As aulas foram tediosas e estava ansioso para a aula de informática para vê-la, mas ela nem sequer me viu entrar na sala. Nenhuma troca de olhares, nada.

A única coisa que consegui foi Kendra o dia inteiro me lançando olhares sedutores. Prometendo satisfazer todas as minhas fantasias. Mal sabia ela que minhas fantasias estavam todas em uma garota que nem me dá atenção.

Por sorte consegui me esquivar de Kendra e seus decotes durante todo o dia.

Fui pegar o ônibus e sentei no fundo como sempre, Asty entrou logo depois e percorreu o corredor e sentou-se ao meu lado, mas sem me olhar ou dirigir a palavra. Nossos joelhos se tocam levemente. Jeans com jeans. Senti meu corpo esquentar só com esse simples toque. Eu quero mais do que toque dos joelhos. Isso está me deixando louco.

Olho sua mão e lentamente vou aproximando a minha. Quando finalmente a ponta de meus dedos tocam seu pulso ela estremece, mas não tira a mão me dando mais confiança para ir além. Estou com minha mão sobre a dela e agradeço mentalmente por ela não ter uma crise de consciência e retirar a mão dali.

Como uma sincronia de pensamentos nós dois viramos as mãos palma com palma. As mãos dela são tão pequenas, tão delicadas. Sinto uma necessidade grande de protegê-la e de ser seu o seu herói se um dia ela vier a precisar. Entrelacei nossos dedos. Estamos de mãos dadas.

O ônibus chega em nosso ponto e ela solta sua mão da minha. Seguimos até a casa e a senhora Reymond nos recebe com seus biscoitos. Ela nos olha com um olhar desconfiado.

– Estava calor lá fora? Pergunta ela

– Não. Eu respondo sem entender

– Então por que os dois estão vermelhos?

Merda

Depois do momento constrangimento nos dirigimos cada um para seus afazeres. Depois que a senhora Reymond cochilou ouvi Asty cantarolar. Como era tranquilizante o som de sua voz.

Mas quando a cantoria parou procurei Asty não a vendo em canto algum. Fui até a cozinha e a vi cortar uns limões.

– Está me seguindo?

– Sim

– Por quê?

– Honestamente?

Ela me olhou desconfiada e dei a reposta mais honesta. – Você está onde eu queria estar.

ASTRID

– Astrid. A senhora Reymond chama quebrando o clima e deixando Soluço desolado. – Melhor voltar ao trabalho. Ele diz

Estou aqui tentando absorver o que ele disse. Soluço gostaria de estar onde eu estou.

Ele não é qualquer um, é o cara dos meus sonhos. Aquele que eu sempre desejei.

Ele é o mesmo que me atropelou e me deixou no chão.

Mas hoje vejo um Soluço diferente, alguém que agora se preocupa com as necessidades dos outros. Será que estou o perdoando?

Eu fugi ontem depois do beijo porque foi perfeito. Foi exatamente como eu sonhei que fosse e tive medo. Medo dele não ter gostado, de rir da minha falta de jeito e experiência.

Quando descemos do ônibus perguntei se ele queria entrar na minha casa.

– Sua mãe não está?

– Só chega daqui a uma hora.

– Então, claro.

O levei até meu quarto. – Minha mãe surtaria se soubesse que você está aqui.

– A minha mãe também. – Quer que eu vá?

– Não. As escolhas são nossas.

Ele estuda meu quarto e encontra um par de luvas de boxe pendurado na minha cama.

– São suas?

– Ganhei quando estava no hospital. Para lembrar de sempre lutar.

Ele sorriu melancolicamente. – Estou cansado de lutar, cansado de reviver o acidente.

–Eu também. Sinto a necessidade de perguntar. – Por que você está aqui?

– Não sei. Sei que isso é loucura. Sei que não deveríamos estar aqui, agora, tão próximos. Mas o mais louco disso tudo é que...perto de você eu sinto que existe sentido nas coisas. Não consegui dormir essa noite pensando em te abraçar até que toda dor fosse embora. Sabe, eu pensei que Kendra me faria esquecer, mas é você. E isso me enlouquece. Você entende?

– Entendo. Eu o abracei o mais forte que pude.

Ele correspondeu ao abraço. – Um dia você será capaz de me perdoar?

Não sei bem como, mas algo mudou. Acho que me libertei do passado. – Eu já te perdoei.

Ficamos ali, simplesmente abraçados, não sei por quanto tempo. Era como se nesse simples ato algo estivesse limpando a nós dois. Eu estava tirando toda a dor dele e ele a minha.

Quando nos separamos haviam lágrimas nos olhos dele.- Caiu algo no meu olho.

– Não há problema em chorar, Soluço. Não conto a ninguém. Eu também choro bastante.

– Vou mudar isso.

Ele já mudou

– Minha mãe vai chegar logo.

– Então é melhor eu ir.

– Ok

Ele se aproximou e começou a passar sua mão sobre meu rosto. Alisou meus lábios.

– Seus lábios são macios

– Você sabe que não sou como a Kendra, sabe, experiente em beijar. Falei timidamente.

– Eu não ia te beijar.

Eu sou uma estúpida, claro que ele não ia me beijar quando pode beijar garotas muito melhores.

– Não... a próxima vez que te beijar vai ser sem pressa, e você disse que sua mãe está chegando.

Olhei para o relógio, é verdade, minha mãe está chegando.

Ele mordeu os lábios. – Da próxima vez que te beijar vai ser bem devagar e vai durar muito tempo. E quando terminar você vai saber que se excitar não tem nada a ver com experiência.