Lances da vida

Noite agitada


SOLUÇO

– Um beijo. Digo me aproximando. - Se não sente nada por mim não será problema algum.

Sua postura é altiva, caramba, ela não tem ideia de que agindo assim durona me faz querê-la ainda mais.

– Não beijo para provar coisas. Fala firme. – E não preciso provar nada para você.

– Que mal há, é só um beijo. Se seguiu mesmo em frente não vai sentir nada.

– Tá bom, já que insiste. Eu te provo.

A Astrid de antes ficaria tímida, coraria. A astrid de antes correria do perigo. Essa nova Astrid me tira do meu jogo, me desestabiliza. Ela se aproxima e leva sua mão ao meu peito e olha nos meus olhos. – Não me desafie. Ela me deixa completamente inebriado. Sinto seu cheiro e meus instintos se aguçam. Espero que ela não perceba o poder que ela tem sobre meu corpo e sentido. Quero tocá-la tocar seu rosto, mas não posso, isso seria intimo e quebraria o controle. Roço de leve meus lábios no dela. Quero tanto esse momento. – Só não conta para ninguém.

Como assim? Essas palavras descem como um balde de água fria.

Ela não quer que saibam de nós. Talvez ela realmente não esteve brincando e superou de verdade. O que aconteceu antes foi acidental e inesperado, e foi bom e verdadeiro. Isso agora não passa de um jogo perigoso. O que eu preciso na verdade é de um envolvimento com uma garota. Pode ser qualquer uma doida varrida como a Elsa, por exemplo. Aquela ali vale uma noite e assim eu volto ao normal.

Me afasto de Astrid e a olho firme – Você tem toda a razão, não precisa me provar nada. Não fico ali para analizar com ela a situação. Viro as costas e vou embora dali. Eu a ouço me chamar, mas ignoro. Se eu olhar para trás perco minha determinação e avanço em seus lábios com toda a voracidade que guardo só para ela.

Vou até a fogueira onde ela compartilhou sua história, verdadeira para ela, mas uma mentira com que convivo.

Uma hora depois volto para a cabine onde todos dormem e Elsa ronca feito um trator. Vou ao banheiro e tomo um banho quando volto subo na cama com o máximo de cuidado para não acordar Felipe embaixo, apesar da cama de metal ranger bastante. Ouço Felipe se mexer e sussurro – Desculpe, cara.

– Não, tudo bem. Não estava dormindo mesmo.

– Como se pode dormir com Elsa motor de caminhão roncando? Jack reclama

Jack dorme em cima da cama de Elsa. Ele se inclina para baixo e grita – Elsa cala a boca.

– O que estão fazendo? Astrid acorda

– Tentando fazer a Elsa parar de roncar. Jack responde.

Nessa hora ele começa a sacudir a cama.

– Cuidado.

O grito da Astrid me fez pular da cama a tempo de segurar a estrutura de ferro antes de cair em cima da Astrid. Seguro o corpo de Elsa com as minhas pernas e Jack despenca de cima da cama direto no chão.

Elsa acorda assustada sem entender o que acabou de acontecer. Como sei que Jack não vai explicar eu assumo essa responsabilidade com uma resposta simples. – Sua cama tombou, volte a dormir.

– Como tombou?

– Cara, isso foi incrível. Esse Jack tem sérios problemas.

– Fica quieto, seu idiota. Falo

Elsa olha torto para Jack. – Você derrubou minha cama de propósito?

– Você não parava de roncar, só fiz um favor para todos.

Elsa pula em cima dele e eu a seguro a tempo. – seu idiota, babaca. Ela grita – Diz uma novidade. Jack responde. Ela não tem unhas, tem garras. E está cravando elas no meu braço. Jack não tem ideia do que está provocando, tenho certeza que ela não hesitaria em usa-las como arma contra ele.

– Elsa não dá confiança. Astrid fala entrando entre Elsa e Jack. Não posso correr o risco de soltar a Elsa e ela dar o bote de novo, nervosa do jeito que ela está poderia machucar a Astrid. – Soluço solta ela.

Eu solto, mas fico pronto para segurar de novo ao menor sinal de novo ataque.

– Ninguém tem senso de humor aqui. Jack fala se retirando da cabine.

– Eu não vou dormir debaixo desse idiota.

– Eu troco de lugar com você. Eu ofereço

Sento na cama e noto que vou ficar do lado de Astrid. Ela aponta para a minha mão que está sangrando. Devo ter machucado quando segurei a cama. – Não foi nada.

Ela pega uma toalha sua e joga para mim. – Não vou sujar sua toalha com meu sangue. E jogo de volta para ela.

Ela puxa minha mão e começa cuidar do ferimento. É estranho, não lembro da última vez que alguém cuidou de mim. Sempre me isolei e me cuidei sozinho. Não é agora que isso vai mudar. Puxo a mão de volta. – Estou melhor

Astrid bufa. Se inclina para mim ficando olhos nos olhos comigo. – Não está.

Preciso virar o jogo ou vou perder o controle. Já não posso mais resistir então o jeito é mostrar para ela que sou o cara que ela pensa que me tornei.

– Nessa posição tenho uma visão maravilhosa dos seus peitos.

ASTRID

Com suas palavras me afasto. – Seu nojento.

– obrigado.

– Quer saber, morre de tanto sangrar.

– Quer sua toalha de volta?

Por que ele é assim, quando estou pensando que ele está voltando a ser o Soluço de antes ele faz algo para parecer um babaca.

– Vocês dois podem parar de flertar? Elsa nos interrompe. – Ou admitem que cada um senti algo pelo outro ou vão dormir. Ou os dois.

– Eu não sinto nada por ele. Afirmo

– Costumava sentir. Soluço murmura

– Eu já disse que superei. Também murmuro

– Vai dormir Astrid, está repetitiva. Soluço fala de forma rude

Superei, acabou. E Soluço também, ele tem se afastado e me feito odiá-lo.

Enquanto tento dormir penso em como vim parar aqui. Meu fisioterapeuta me ligou oferecendo essa oportunidade. Pensei que falando com outras pessoas seria uma forma de botar para fora e assim me ver livre de sentimentos ruins do passado.

Queria que Soluço também botasse tudo para fora e se livrasse dos sentimentos ruins. Mas ele não conseguirá enquanto não disser a verdade.

Na manhã seguinte volto do banheiro e encontro Jack dormindo do lado de fora. Ele roncava tanto que poderia disputar sinfonia de roncos com a Elsa.

Quando entro na cabine Bocão está entrando também.

– Alguém vai me explicar o por quê do Jack estar dormindo do lado de fora?

– Ele quis dormir com seus parentes. Diz Elsa

Bocão não acha nada engraçado. – Ele está cheio de picadas de mosquito. Alguém vai lá acordar ele.

– Eu vou. Soluço se levanta

– Eu vou contigo. Felipe fala

Quando os três chegam é que percebo o estado de Jack. Seu rosto completamente empolado.

– O que aconteceu com sua mão? Bocão nota o corte com sangue já seco na mão de Soluço. – Ele se machucou segurando a cama que quase caiu em cima da Astrid e de mim. Diz a Heather.

Todos ficam chocados porque ela é sempre muito calada.

– foi culpa do Jack, ele virou a cama de propósito. Acusa Elsa

– Sabe o que fazem com delatores na prisão?

– Jack, sem ameaças. Venha comigo para a enfermaria e Soluço também. O restante botem as malas na van e vão tomar o café da manhã. O refeitório é logo em frente.

Fizemos o que Bocão mandou enquanto os três iam para a enfermaria. No refeitório estou pegando meu café da manhã ao lado de Felipe. – Qual a sua história com Soluço?

– Difícil de dizer. Quer ajuda?

– Não precisa, já me adaptei. Sei me virar. Boa forma de se esquivar do assunto.

– Não estou me esquivando.

As meninas sentam do nosso lado. Sinto que não deveria esconder as coisas. Soluço mantém segredos e isso o está consumindo. Não quero ser consumida também.

– Nós namoramos depois que ele saiu do reformatório.

– E o que ele fez para ir ao reformatório?

– É Astrid. Diz para ele logo. Soluço aparece na mesa e antes que eu fale algo ele responde. – Por ter atropelado a Astrid quando dirigia bêbado.

Felipe está boquiaberto – Verdade?

–Verdade, né Astrid? Soluço me olha – Por que não falamos para todos?

– Não faça isso Soluço.

– A faço sim, quer ver?