Lances da vida

Fúria incontida


SOLUÇO

Você contou para ela que fui eu? Pergunta Luane ao ver Astrid correr do parque. Balanço a cabeça.

– Você e Astrid? Eu reparei como a olhou.

– O quê? Vou em direção de casa seguido de Luane.

– Se envolver com Astrid vai arruinar nossa família, Soluço.

– Me deixe em paz. Já tive o suficiente por hoje.

Quando chego meus pais me esperam.

– Onde passou a noite? Meu pai fala com uma voz dura e severa como se eu tivesse cometido um assassinato.

– Na casa de uma amiga.

– Vi Astrid vindo do parque.

– E? Que eu saiba é um país livre. Ela pode ir onde ela quiser.

– Só não queremos que se meta em problemas. As pessoas comentam...

– Sobre o que?

– Não quero falar disso agora. Diz minha mãe transtornada indo se entorpecer mais.

– Vamos conversar sim, agora.

– Soluço, por favor, não grite. Minha mãe se certifica de que os vizinhos não estejam vendo a cena que faço.

– O que dizem de mim?

– Nada Soluço. Pare com isso.

Vou até o jardim e falo o mais alto que consigo. – Estão dizendo que puxo brigas na escola? Estão dizendo que assedio Astrid? Estão dizendo que faço meus amigos beberem álcool? Vocês acreditam em tudo isso, não é mesmo? Anda, mandem as merdas das fofocas?

– agora chega, você passou dos limites. Fala meu pai parando em minha frente. – Entre e se acalme. Pode se desculpar com sua mãe na hora do jantar.

Me arrebento feito um elástico levado ao seu limite. Eu me quebro completamente.

Beijar Astrid, a suspensão da escola, as manipulações da Kendra, a minha irmã, meus pais e sua incapacidade de encarar a realidade, o vicio da mamãe, os boatos falsos, tudo isso me enlouquece.

– Não saio daqui até que todas as cartas estejam na mesa.

Meu pai endurece ainda mais e seus olhos estão enfurecidos. – Essa é minha casa. E enquanto viver aqui seguirá as minhas regras. Agora entre, acalme-se e deixe sua mãe em paz.

Não dá mais, chega. Isso é doentio e eu não tenho mais estomago para aguentar essas coisas. O único jeito de curar minha família é se eu não estiver junto. Eu sou a raiz dos seus problemas. Arranque a raiz e o problema some.

– Vou embora.

Penso em Asty. Ela é a pessoa mais forte que conheço. Ela confrontou Kendra, vai à escola todos os dias mesmo sendo julgada e apontada, e trabalhou duro na casa da senhora Reymond para alcançar seu objetivo de ir para o Canadá. O acidente fez dela mais forte. E ela me fez uma pessoa forte.

– Onde pensa que vai?

– Vou só pegar minha coisas e vou embora. Não aguento mais viver cercado de negação e vergonha. Vocês também não deveriam.

– Isso é o que somos, filho. Tudo isso nos mudou todos nós. Estávamos bem até você chegar e estragar tudo.

– Vocês não querem que volte ao normal? Eu estou disposto a qualquer coisa para melhorar as coisas.

– Deveria ter pensado nisso antes de atropelar a Astrid. Eu nunca gostaria de falar isso para um filho, mas Soluço Strondus...você é um bastardo egoísta.

Vou ao meu quarto, pego minha mochila e coloco algumas coisas que sejam necessárias. Em cinco minutos já estou pronto para sair. Dou uma última olhada no meu quarto.

Meu sabre de luz ainda está na estante esperando que eu volte, eu não vou voltar. Tenho esperança que ao sair minha mãe vai parar de se drogar, Luane vai voltar a ser uma adolescente normal com ou sem a verdade e meu pai vai cair na real, quando estiver pronto.

Já eu terei que encontrar o meu lugar no mundo e parar de querer que as coisas voltem ao normal. Normal não existe. A família Strondus não existe mais. Estou por minha conta.

Suspiro e entro de novo no quarto e pego meu sabre de luz colocando-o na mochila e saio. Luane aparece e bloqueia minha passagem.

– Não vá

– Sai da minha frente.

– Nós precisamos de você, Soluço.

– Eles ficarão bem, e você precisa superar o acidente e seguir em frente. Não estarei mais aqui para te proteger. Cuide-se sozinha agora.

Passo por ela e sigo para fora de casa. Sem ideia de para onde ir, mas com uma sensação de liberdade. Olho para a casa de Astrid. Não a vejo, mas sei que está em casa. Dou um aceno de despedida e sigo em frente.

É no gazebo que passo a noite fria e solitária.