Capítulo VII – O Grito Desesperado! O Rugido do Leão!

— - Zodick - -

A noite já se fora á tempos e agora a madrugada reinava suprema, eram por volta de quatro da manhã, a floresta estava em completo silêncio, o rio seguia seu curso sem nenhum ruído, Luke ainda estava lá dentro, provavelmente ajudando Bruna á cuidar de Lenny, ele tivera uma luta difícil afinal, Sofie estava alguns metros atrás, escorada á uma das vigas de sustentação do orfanato, Eagle, á minha frente, mantinha-se em silêncio, a derrota de seus discípulos não parece ter deixado-o feliz, o orvalho começava a se mostrar sobre as folhas das árvores próximas, os únicos ruídos que consigo ouvir são o vento e as batidas de meu coração, elas são rápidas, tensas, como se o próprio pudesse entender tudo aquilo que estará em jogo daqui para frente. Os discípulos foram derrotados, mas Lenny não pode mais lutar, Luke não está aqui e Sofie, que conseguiu tão eficientemente cuidar de seu adversário, não seria páreo para um oponente que não demonstra brechas, afinal, ele é um mestre da Marui, ele vive para não cometer erros, e se ele está vivo bem aqui, na minha frente, bem... Então ele ainda não cometeu nenhum.

— Você não parece tão falastrão quanto antes, Eagle. – provoco-o, apesar de eu mesmo saber que estou, nesse momento, brincando com alguém que não deveria. - Triste por seus discípulos? – vejo-o arquear a sobrancelha.

— Triste? Não me faça rir. – o tom dele era seco, sem emoção. – Esses moleques nunca seriam mestres Marui. – Eagle arranca o manto negro que usava, revelando calças escuras com joelheiras embutidas, botas negras e uma couraça de couro sobre o corpo, a águia em seu pescoço destaca-se ainda mais, como se estivesse ameaçadoramente crescendo. – Eu fui o único que os aceitou como discípulos, e isso apenas para esmagar os sonhos desses bostinhas. – ele aponta em direção ao rio, onde o primeiro havia caído. – Aquele não tinha nenhum potencial, não conseguia nem ao menos entrar em um luta sem perder totalmente a cabeça e pôr o estilo da Marui de lado, como se estivesse em uma briga de rua. – á seguir seu dedo repousa sobre aquele que estava no centro de uma cratera, o que Lenny tanto teve trabalho para derrotar. – Este até era bom no estilo em si, mas era totalmente descuidado, se preocupava mais em provocar e irritar seus oponentes do que acabar com eles. – sua mão finalmente aponta para o último. – Aquele era o que mais tinha potencial, mas ele era um artista marcial, não um assassino. – sua voz ressoa ainda mais séria do que antes. – Aqueles que não estão prontos para matar ou morrer, não servem para a Marui.

— Eu não estou disposto a nenhum dos dois, então por qual razão me querem nela? - interrogo-o, ele sorri e dá de ombros.

— E como eu vou saber? Essas são as ordens do Pai, eu apenas as sigo. Nada mais que isso. – ele, então, assume a verdadeira posição de luta da Águia, ele fica de lado, seu joelho direito, que estava atrás, dobra-se, deixando a coxa repousando tensamente sobre a canela abaixo de si, sua perna esquerda esticava-se á frente de seu corpo, de frente para seu oponente, seus braços encontravam-se abertos nas laterais de seu torso, como a posição de uma águia ao planar sobre os céus. A Águia assassina da Marui. – Muito bem, vamos começar.

— - Lyon - -

Já fazia alguns dias desde que tudo aconteceu, e o fizera tão rapidamente que mal pareciam reais. O sequestro. Luke aparecer e derrotar os dois sequestradores. A curta estadia dele em minha casa. O ataque de Sofie. A luta deles para sobreviver. Sua partida. E o vazio que ficou após isso.

Presenciei tudo isso com meus próprios olhos e, agora, não tenho vontade de mais nada, correr pela cidade, brincar de esconde-esconde com as empregadas, tentar roubar quitutes da cozinha, até mesmo fazer compras, antes meu passatempo tão amado, não me despertam mais a mesma alegria, todos os dias têm passado mais vagarosamente do que o normal, e cada um deles mais sem cores do que o anterior.

Quando via Luke lutar, arriscando a própria vida, e, mesmo assim, sempre saindo vitorioso, eu sentia uma adrenalina incontrolável e viciante viajando por todo o meu corpo, e quando ele se foi, levou essa sensação consigo. E eu a quero novamente.

Levanto-me da cama no meio da noite, não queria dormir, mesmo que o conseguisse, vou até a janela e, com dificuldades, abro-a, dando uma boa olhada. Como esperei. Ninguém vigiando. Após os ataques, papai deixou alguns guardas constantemente rondando a casa, em busca de qualquer movimento suspeito. Mas eles não conseguiam vigiar quando estavam na troca de turnos, e aproveito esse momento para subir por cima do telhado que separava o primeiro andar do segundo.

Esgueirei-me cuidadosamente, muito próximo da calha de metal, até alcançar um tronco de árvore que, convenientemente, ficava próximo à casa, desço por ele com habilidade imensa, afinal, essa não é a primeira e, infelizmente, ainda não é a última vez que faço esse trajeto. Ao chegar à base da árvore, agacho-me, sendo coberto por alguns arbustos que ficavam ali, dou uma última olhada à procura de guardas antes de prosseguir meu caminho, nenhum, muito bem, aqui vou eu.

Percorro todo o caminho até a caverna onde uma vez encontrei Luke e Sofie, mal sabiam eles que esse é meu esconderijo secreto á mais tempo do que posso me lembrar, e tive o máximo de cuidado para que ninguém o descobrisse, digo, até antes de eles virem para cá, e ainda bem que o fizeram, não tenho certeza se eles conseguiriam se esconder em algum lugar que não fosse aqui, nem que eu os acharia em outro lugar.

Sento-me próximo à entrada, encostando-me à parede pedregosa antes de começar a observar o manto de estrelas que se erguia acima da minha cabeça, que bonito. Sempre que venho aqui, começo a imaginar o tamanho do mundo e como eu gostaria de conhecê-lo, mas nesse momento sempre me lembro de minha saúde e do quão frágil consegue ser.

Um incômodo sobe pela minha garganta, me fazendo tossir compulsivamente, sinto que, muito em breve, não poderei mais vir aqui, ou á lugar algum. Escutei meu pai conversando com o médico, só tenho mais quatro meses de vida, meu coração e meu pulmão estão por um fio, é um milagre que eu ainda esteja vivo, aparentemente. O nome dessa doença é tão complicado que nem ao menos o lembro, mas ela ataca e destrói as células de órgãos dentro do portador, e eu, em meu surto absoluto de sorte, a contraí no coração e no pulmão. Espelho, espelho meu, existe alguém mais sortudo do que eu? Claro que sim, todo mundo.

Balanço a cabeça, afastando de mim aqueles pensamentos, apenas focando na beleza do céu noturno. Passa-se uma hora desde o momento em que cheguei quando ouço um ruído vindo de algum lugar próximo, como se um galho caído de árvore tivesse acabado de ser pisado. Ergo-me rapidamente, será que é algum animal selvagem? Olho para dentro da caverna, achando uma pedra que rapidamente tomo em mãos, erguendo-a ameaçadoramente enquanto procuro que animal estaria se aproximando.

Espanto-me ao ver uma forma humanóide á se aproximar e uma voz calma e polida se pronuncia.

— Acalme-se, não sou nenhum inimigo. – ele dá alguns passos para fora da floresta, sendo iluminado pela luz do luar.

Seus pés estavam dentro de botas escuras, usava uma calça marrom que parecia folgada em sua cintura, sobre si usava um sobretudo vermelho sem botões e de mangas curtas que cobria-lhe dos ombros até os joelhos,deixando seu corpo musculoso á mostra, seus antebraços estavam expostos enquanto o resto do braço encontrava-se abaixo das mangas, seus cabelos verdes eram longos o suficiente para obrigá-lo á prendê-los em um rabo de cavalo, seu sorriso é tranquilizador e seus olhos verdes-claros tinham um brilho suave, ele mantinha as mãos acima da cabeça, mostrando que não estava armado.

— Quem é você? O que está fazendo aqui? – por precaução, não solto a pedra, mantendo apenas as mãos abaixadas.

— Pode me chamar de Kinoko, e eu que lhe pergunto, o que o filho do prefeito faz aqui? Tentando ser sequestrado de novo? Não acho que vão te salvar duas vezes. – encolho os ombros, olhando pro lado.

— Como você sabe disso? – ele sorri, finalmente abaixando as mãos.

— Digamos apenas que sou bem informado das coisas, tanto é que sei que seu pai tem irritado algumas pessoas bem poderosas, e que é culpa delas o seu sequestro. – me surpreendo com suas palavras, dando um passo para fora da caverna, o frio bate com força sobre minha pele, sinto o ar gélido adentrar meus pulmões subitamente.

— O que quer dizer? – ele sorri, se aproximando calmamente e entrando na caverna.

— É melhor você entrar antes que sua doença te mate. – Doença? Ele sabe até mesmo disso? – Lá dentro eu lhe conto tudo. – ele completa ao adentrar completamente a caverna e sentar-se escorado em uma das paredes, faço o mesmo na parede oposta.

— Como você achou esse lugar? E que história é essa de meu pai estar irritando as pessoas? – mesmo dentro da escuridão da caverna, posso ver um sorriso se abrir em seu rosto.

— Eu estava passando por perto por acaso quando vi você fugindo de casa e entrando na caverna, depois disso vim atrás de você até que te achei aqui, e quanto á seu pai... – ele faz uma pausa, olhando para o céu. – Existe um pirata em algum lugar lá fora que fez uma proposta pra ele. – seus olhos fixam-se em mim novamente. – Esse pirata quer adicionar essa ilha como território dele, tomando controle dos negócios locais e, em troca, a ilha ganharia a sua proteção. – vejo-o tirar uma moeda de seu bolso, girando-a por entre seus dedos. – Seu pai, obviamente, negou, dizendo que não queria acordos com pirata algum, e isso não deixou o pirata nada feliz... – ele joga a moeda para cima, o metal reluz com a luz do luar antes de ser subitamente apanhado novamente. – Ele então mandou sequestradores e assassinos atrás de você, buscando intimidá-los, mas parece que certo alguém o salvou... – seu tom era sério, ele não estava blefando e, ao mesmo tempo, tudo isso explicaria os ataques e por que meu pai ficou tão furioso quando Luke disse que era um pirata, provavelmente ele achou que Luke era mais um dos enviados desse pirata, alguém mandado para provar que não poderíamos sobreviver sem a proteção deles... Agora tudo faz sentido.

— Por que está me contando tudo isso? – ele abre um pequeno sorriso.

— Por que você perguntou. – ele pega a moeda, jogando-a em minha direção, agarro-a com dificuldade. – E também porque quero que você me conte quem é esse alguém.

— E o que é você? – ele dá de ombros.

— No momento, apenas um viajante em busca de algo, e quero saber se esse alguém que lhe salvou tem o que procuro. – engulo a resposta em seco, mas algo dentro de mim me dizia para confiar nele.

— Seu nome é Luke Hardy. – posso ver uma leve alteração no seu olhar ao ouvir o sobrenome de Luke, mas continuo mesmo assim. – Ele é um pirata no começo de sua jornada, ele diz que um dia irá se tornar o Rei dos Piratas. – ele ergue-se vagarosamente.

— Você o viu lutar? – assinto. – Em algum momento da luta você viu alguma parte de seu corpo sendo envolvido por uma energia azul? – paro alguns instantes, analisando calmamente as lembranças que tantas vezes tenho revisto em minha mente.

— Sim. – respondo e ele sorri.

— Entendo... Muito obrigado pela informação. – ele toma o caminho da entrada da caverna, parando na entrada. – Ah, a propósito. – ele se vira, fitando-me em meus olhos. – Algo me diz que nos encontraremos novamente em breve, então não morra e não passe o resto da sua vida aqui. – ele vira as costas e sai da caverna, me deixando com enormes dúvidas em relação ao que ele havia falado, por alguns instantes sinto como se meu corpo não se movesse, faço um pequeno esforço e corro até a entrada, chamando por ele.

— Ei, o que você está buscando? – ouço sua risada ecoar pela floresta e, embora eu não possa vê-lo, ele responde.

— Por alguém que tenha a coragem de virar o mundo de cabeça para baixo.

— - Zodick - -

Meu punho descreve um arco da direita para a esquerda, Eagle, que já estava ligeiramente mais baixo, apenas curva-se um pouco mais, permitindo que o golpe passasse por sobre sua cabeça, sua “asa” direita rapidamente me ataca, as pontas de seus dedos podiam realmente ser armas poderosas quando usadas em combinação com esse estilo, o golpe me faz recuar um passo, mas tudo o que Eagle queria nesse momento era avançar.

Seu próximo golpe é usando sua “garra” esquerda, o movimento descreve um arco contra meu rosto, abrindo um corte em minha bochecha, algumas gotas de sangue escorrendo do ferimento recém-aberto. Tento revidar com uma joelhada, mas o mestre Marui usa ambas as suas asas como um escudo, tirando totalmente o impacto de meu golpe em sua defesa, mesmo uma força sobre-humana como a minha não era páreo para o estilo da Marui.

Vendo que golpes com força bruta não funcionam, giro o corpo, buscando lhe acertar uma rasteira na parte de trás do pé, mas ele parece já ter previsto isso, saltando, esquivando-se de meu golpe, logo em seguida acertando uma joelhada em meu queixo, o impacto do golpe me faz perder a consciência por uma fração de segundo e tira meus pés do solo, me fazendo cair pouco mais atrás com as costas no chão, giro para o lado quando vejo que ele estava prestes a usar as suas “garras” para me cravar no solo.

Ergo-me rapidamente e dou um pequeno salto para trás, tentando me recompor, mas Eagle me persegue, não parecia disposto a me dar algum tempo para pensar ou respirar, sua “asa” esquerda passa a centímetros de minha cabeça quando subitamente me agacho, mas mesmo que eu tenha esquivado, não é o suficiente, antes que eu tivesse tempo de reagir, o joelho do Marui me acerta com força no nariz, mais sangue espirra enquanto minha cabeça é arremessada para trás, meu corpo estático vira um alvo fácil e Eagle aproveita. Um, dois, quatro, oito, vinte, perco as contas de quantos golpes suas “asas” me aplicam antes que sua “garra” crave-se em meu ombro.

Solto um murmúrio de dor enquanto caio de joelhos sobre o solo de terra batida, não tinha notado que estávamos perto do campo de futebol dos garotos, mas agora estamos bem no centro dele... Ah, quantas memórias boas tenho dos dias que passei minhas tardes aqui jogando com os garotos.

— Você não parece tão certo da luta agora, Zodick. – a voz de Eagle me traz de volta a realidade, ele estava de pé, parado frente a mim, sua mão esquerda estava suja de sangue, o meu sangue. A ferida em meu ombro queimava como o fogo, meus pulmões dobravam seu funcionamento, buscando manter-me respirando, meu corpo estava inteiramente dolorido, minhas pernas pareciam serem feitas de chumbo nesse exato momento, minha mente clamava por descanso e eu duvido que Eagle o dê.

— Cala essa boca. – ergo-me com dificuldade, cambaleando um passo para o lado quando busco me manter em equilíbrio. – Eu já disse antes, e vou repetir. – ergo o olhar, meus orbes fixos nos dele. – Eu vou te derrotar e nunca mais vou usar o estilo da Marui. – Eagle sorri de canto.

— Dessa maneira, você não me dá escolha. – seus olhos se fecham e, quando ele volta á abri-los, pareciam com os de uma verdadeira águia, como se não tivesse pontos cegos em um raio de vários quilômetros. – Permita-me mostrar um verdadeiro mestre Marui em ação e provar o tamanho do erro que você está cometendo. – ele dá um salto para trás, tomando distância e preparando-se para reiniciar a luta. É melhor eu pegar todo o ar que eu conseguir e mantê-lo dentro dos pulmões a partir de agora, algo me diz que, até que essa luta termine, não terei outra chance de tomar fôlego.

— - Sofie - -

Unilateral.

Essa é a única palavra que posso usar para definir essa luta, enquanto Eagle acertava e feria Zodick terrivelmente á cada novo golpe, os golpes do moreno pareciam ser como nada para o mestre Marui, sua força desumana era comparada à de uma criança contra o assassino á sua frente, e a situação não parecia nem perto de melhorar.

Eagle distância-se, apenas para voltar a atacar novamente, mas dessa vez algo estava diferente em seus golpes, eles pareciam... Impiedosos.

O primeiro é um golpe de “asa” contra o rosto, a cabeça de Zodick é arremessada para a esquerda enquanto uma joelhada atinge-o na boca do estômago e faz todo o seu corpo se curvar, logo após Eagle o segura pelos cabelos, aplicando mais uma forte joelhada, dessa vez contra sua face, seu rosto é lançado para cima, a “garra” da Águia então alveja a lateral direita do corpo de Zodick, ferindo-o acima das costelas, o sangue começando a escorrer pela ferida recém aberta.

Zodick tenta revidar, alvejando o rosto do Marui com um soco poderoso, mas o que acontece a seguir é simplesmente ridículo, seu golpe é parado com apenas um dedo da “asa” do Marui, que sorri predatoriamente.

— Zodick, meu caro, pensei que á essa altura já tivesse percebido. – a mão de Eagle então envolve á de Zodick e, mesmo de longe, posso perceber que a força da mão do Marui estava esmagando cada mínimo osso do punho do moreno. – Neste momento, você não tem mais chance, então por que não desiste de uma vez e deixa que minhas garras o estraçalhem? – ele ergue sua mão esquerda acima da cabeça, neste momento ela era uma “garra”. – Eagle’s Flyby. — sua mão desce mais rapidamente do que posso ver, quando noto, uma ferida abre-se no centro do corpo de Zodick, sua camisa é aberta ao meio enquanto uma enorme ferida abre-se indo desde a base de seu pescoço até pouco acima da coxa esquerda.

Uma sensação de angústia espalha-se por meu peito quando o sangue começa a escorrer por seu corpo, rapidamente olho para a janela, ficando ligeiramente aliviada por nenhum dos garotos ou até mesmo Bruna estarem assistindo a luta, provavelmente estão muito ocupados cuidando de Lenny.

Voltei a fixar meus olhos na luta, Eagle agora estava á alguns passos de Zodick, sua mão banhada em sangue e seus olhos pareciam os de uma verdadeira besta em meio á uma caçada, por outro lado, Zodick estava péssimo, seu corpo ainda não estava totalmente recuperado da surra que levara mais cedo e agora ele parecia ainda mais inchado e ferido do que antes. Se as coisas continuarem assim... Não vejo futuro para esse orfanato.

— - Zodick - -

He.

Então é assim que acaba minha história.

Derrotado por um mestre Marui.

É o fim.

Meu corpo está no limite.

Ah, acabei de perder a consciência.

Por quanto tempo apaguei?

Segundos? Minutos?

Talvez eu já esteja morto na próxima vez que acontecer.

Eu não sei.

Eu não consigo.

Eu perdi.

Eu desisto.

— ZODICK! – um grito exasperado puxa minha consciência mais uma vez para seu lugar, só então me dou conta de meu estado, estou em pé, provavelmente meu corpo já está em um estado tão debilitado que cair fosse um esforço muito além de suas capacidades, minhas pernas tremem, como se estivessem prestes á sucumbir diante do peso do resto do corpo, os músculos de meus braços pareciam ter sido rasgados com uma gilete, as feridas em meu rosto, acima de minhas costelas e em meu ombro pareciam queimar como as chamas, meu punho estava quebrado, meu corpo estava quase partido ao meio depois do último golpe do Marui, mesmo que eu consiga, de algum jeito, ganhar essa luta, a quantidade de sangue que perderei até lá será o bastante para me matar da mesma maneira. Talvez esse realmente seja o fim. Ah... Como o céu está bonito. Os primeiros raios de sol começavam a dar as caras, o azul profundo da noite começava a dar lugar ao azul-celeste característico. – ZODICK! – a voz me chama mais uma vez, a urgência em sua voz era quase palpável. Essa voz... Luke? – O QUE MERDA VOCÊ PENSA QUE ESTÁ FAZENDO? – o que estou fazendo? Que tipo de pergunta é essa? – SE VOCÊ PERDER AQUI, QUEM VOCÊ ACHA QUE VAI PROTEGER ESSE LUGAR? HEIN? – ele gritava como se aquelas fossem as últimas palavras que sua garganta fosse capaz de pronunciar, e ele estava tentando fazê-las valer. – LENNY ESTÁ LÁ DENTRO, TODO MACHUCADO, POR TENTAR PROTEGER ESSE LUGAR! VOCÊ NÃO PODE PERDER AGORA! – Lenny... Ele lutou tão bem... Realmente fez de tudo para vencer... – PARE DE PENSAR TANTO! SE EXISTE UM INIMIGO NA SUA FRENTE, VOCÊ SÓ TEM QUE IR LÁ E ACABAR COM ELE! NÃO IMPORTA O QUE AS OUTRAS PESSOAS DIZEM! MARUI OU NÃO, QUEM APRENDEU A LUTAR FOI VOCÊ! O QUE É SEU NINGUÉM PODE TOMAR! ENTÃO LUTE!

O que é meu... Não pode... Ser tomado...

Meu corpo, antes todo dolorido, agora parece anestesiado, a dor sumiu.

Luke tem razão.

Não importa se o estilo Leão é da Marui. Não importa se os estilos da Marui foram feitos para assassinar. Quem o dominou fui eu. E só eu posso decidir se ele será usado para matar ou não. O que é meu ninguém pode tomar. Nem mesmo a caçada de uma Águia.

— Ei, Eagle... – minha voz sai fraca, mas audível. – A partir de agora... – ergo a perna direita, logo em seguida pisando forte no chão, o solo cede e forma uma pequena cratera no ponto pisoteado, flexiono ambos os joelhos, minhas mãos nesse momento eram como “garras” do rei da selva, curvo meu corpo em direção ao joelho que fica mais á frente, o direito, os braços assumem uma postura mais aberta, como a de uma fera prestes a “abraçar” alguém com suas poderosas presas, está pronto, este é o meu estilo do Leão. – Ouça-me rugir.

— - Sofie - -

Luke... Quem diria que o capitão realmente saberia dizer o que precisa na hora certa. Não sei se me assustei mais em sua súbita saída pela porta ou se foi quando ele começou a berrar com Zodick, mas, seja como for... Funcionou.

Zodick está em uma postura de combate que eu somente ouvira falar em velhas lendas, um dos Três Estilos Suseranos da Marui, o Leão vive bem diante de meus olhos, e tudo graças ao capitão.

Não sei se a emoção de ver Zodick mais uma vez pronto para lutar têm me causado alucinações, mas parece que, por mais absurdo que possa parecer, a sua ferida recém-aberta não está deixando o sangue escapar, na verdade, nenhuma de suas feridas está deixando escapar sangue, quase como se... Como se ele recusasse-se a morrer ou se enfraquecer até o fim da luta... Será que ele parou o sangramento com a própria força de vontade? Que espécie de monstro é esse cara?

De repente o rosto de Eagle se contrai em uma careta de dor e meu cérebro demora um pouco para entender o que se desenrolou à minha frente. Zodick, em um simples piscar de olhos, diminuiu bruscamente a distância entre ambos, acertando uma poderosa cotovelada no estômago de Eagle, de fato, aquele era o primeiro golpe que o Mestre Marui sofria a luta toda, e este único golpe é capaz de arrancar gotas de sangue de sua boca.

Eagle rapidamente se recupera, atacando com sua “asa” esquerda, visando a ferida ainda aberta de Zodick, o moreno por sua vez defende-se facilmente, logo em seguida afastando o braço do Marui, deixando-o com a guarda completamente aberta, aproveitando-se disso, as “garras” do Leão descrevem um arco contra o tórax de Eagle, retalhando-o como se fossem realmente as garras do rei da selva, gotas de sangue saem da ferida e um grito agonizante da garganta de Eagle ecoa.

Zodick para seus ataques, sua postura se fecha, como se o “abraço” da besta estivesse sendo feito, mas então compreendo, ele está estocando força para o próximo ataque.

Lion’s Paw! — ele lança violentamente seu braço direito contra o peito de Eagle, o mestre Marui consegue rapidamente erguer suas “asas” como um escudo à sua frente, logo após sendo arremessado longe quando o golpe explode contra sua defesa. Dizem que o estilo Marui leva o corpo de seus usuários ao limite máximo, aumentando várias e várias vezes suas capacidades físicas, se antes a força de Zodick era desumana, agora está muito além disso. Aquele golpe fora tão poderoso que Eagle foi arremessado quase um quilômetro pra dentro da floresta, mesmo tendo defendido-o, me pergunto sinceramente o que teria acontecido com ele caso aquele golpe o acertasse em cheio.

— - Zodick - -

Realmente era uma cena que não se vê todos os dias. Durante todo o quilômetro que percorro até encontrar Eagle, é possível ver marcas profundas no chão, provavelmente seus pés foram arrastando-se ali enquanto ele fora arremessado, abrindo então duas longas crateras por toda a extensão da floresta.

Encontro Eagle sentado aos pés de uma árvore próxima à saída da floresta que dava na baía, o mesmo lugar onde encontrei Sofie e Luke, a casca da árvore parecia ter cedido um pouco atrás de si e a árvore parecia mais inclinada que o normal, provavelmente fruto da colisão com Eagle, o mestre Marui tinha sangue escorrendo por sua boca e um de seus sapatos perdera-se no caminho, provavelmente esfarelou-se até chegar á tamanhos não visíveis a olho nu, os braços de Eagle estavam parados estaticamente dos lados de seu corpo, se eu fosse chutar, diria que ambos estão quebrados, provavelmente até reduzidos a pó em alguns pontos. Ainda bem que ele usou os braços para se defender. O resultado poderia ter sido muito pior.

— Que força... Ridícula. – sua voz soa fraca, não o culpo, ele merece os parabéns pelo simples fato de ainda estar consciente. – Agora entendo... O porquê... Do Pai o querer de volta. – engulo em seco, minha visão começa a turvar-se, sinto o sangue escorrendo novamente, lentamente, para fora das feridas, percebo que estou quase no limite quando começo a sentir a frieza nas pontas dos dedos.

— Ouça bem, Eagle. – tento manter a compostura. - Quero que se erga e volte à Marui. Tenho um recado para o Pai. – Engulo em seco quando o vejo levantar, como é possível alguém sobreviver a esse golpe e continuar andando? Só mesmo o treinamento da Marui poderia preparar alguém fisicamente para isso. – Diga á ele... Que pode mandar quantos quiser atrás de mim. Não importa. Eu, Zodick, aniquilarei cada um deles. Um a Um. – estreito os olhos, tentando parecer ameaçador enquanto luto para me manter consciente. – Eu nunca voltarei e nunca perderei para a Marui novamente. – meus punhos se fecham, meu olhar fixo na águia no pescoço de Eagle. – Eu sou Zodick, o mestre do estilo do Leão, e estou aqui para enfrentar qualquer um que queira ter um destino parecido com o seu. Eu vou destruir a Marui.

— - Continua - -