Hoje. Hoje. Hoje. Era hoje e o coração de Anne palpitava de ansiedade, finalmente a jovem veria os seus novos vizinhos. Uma semana após a mudança e ainda assim ninguém ainda tinha os vistos, ou pelo menos, as pessoas que ela conhecia. Porém durante a última aula senhorita Stacy contara que se juntarão às aulas dois novos alunos, os O'Flanagan. Com isso a mente de Anne viajou imaginando a origem desse diferente sobrenome, das origens dos novos possíveis amigos e de suas aparências.

Correu ao descer as escadas e pode ouvir o grito de Marilla pedindo para que se acalmasse. Respondeu um bom dia animado e correu para pegar seu quadro, livros e almoço, sem nem ao menos tomar seu café da manhã. Não continha sua ansiedade e ao passar por Jerry correndo observou seu rosto confuso.

— Hoje, Jerry, é hoje. Os veremos hoje! - seu êxtase era palpável e ouviu o riso do amigo em resposta, ele passou todos os dias ouvindo suas fantasias românticas então Anne sabia que estava animado como ela.

Durante o caminho ao passar pela bifurcação encontrou Diana a esperando com um sorriso largo. Acenou e correu para seus braços, a retribuição foi igualmente animada, mais um dia começava e sabia o quão especial era, dividiria o máximo com a Barry.

— Minha mãe me disse que são irlandeses - a fala da amiga a deixou surpresa - Mas ouvi-los dizer que a empresa da família ficou tão grande que se mudaram para poderem acalmar suas vidas.

— Irlanda - sua voz foi um sussurro e continuou repetindo a palavra até ser chamada por sua companheira - São irlandeses... O qual romântico e mágico deve ser viver como um irlandês, suas roupas, suas histórias... - sua mente vagava para longe - duendes, fadas e magia... Eles possuem duendes, fadas e magia, Diana! - a sua última fala saiu alta, mais do que imaginava.

— Sim, Anne, fadas... - sussurrou como em confidência - Eles são ricos em romance e magia.

O grito da ruiva fez a outra sorrir, andaram ainda mais depressa e encontraram Ruby e Tillie conversando animadamente perto do córrego onde ficariam seus leites. Sorriram para as duas e se abraçaram como se não tivessem se visto durante uma década. A Cuthbert ouviu a amiga contar as ouvir o que tinha ouvido de seus pais e os gritos animados das meninas se tornaram altos.

Logo todas entraram ao ouvir a voz de senhorita Stacy, caminharam até seus lugares e perceberam que ainda não tinham chegado. Anne soltou um suspiro, queria vê-los mais que nunca. Porém ouviu um barulho vindo da porta, todos os olhares caíram sobre aquela entrada e percebeu que nem em seus sonhos imaginou aquilo.

O garoto era o mais visível, alto era o que mais julgava, a jovem perto dele era menor, julgava ser menor que a Ruby, mas não dava pra vê-la totalmente. Cabelos longos pretos revoltos com ondulações, julgava que conseguiam ser mais pretos que a própria noite e olhos expressivos, românticos e sentimentais. Sorriu ao imaginá-lo como um cavaleiro perdido em busca de sua prometida.

Ao sair da frente deu lugar a jovem atrás e a surpresa se tornou ainda maior. Era como chocolate, sua pele era como chocolate, o melhor dos doces. Seu cabelo estava preso em uma trança frontal que no final formava um pequeno amontoado de cachos. Mas em seus olhos, eles eram tristes e mais vazios, mas que se escondiam atrás de um pequeno sorriso, tímido e um pouco solitário em sua visão, que ia em direção ao menino que a acompanhava.

— Anne, por favor, a acompanhe para que se familiarize com a guarda do leite. Gilbert, faça o mesmo com o jovem - a voz da professora fez com que todos saíssem de um transe.

Levantou rapidamente e caminhou ainda estupefata com a mais nova colega de aula. Recebeu um sorriso como o primeiro que tinha visto.

— Olá, me chamo Anne Shirley-Cuthbert, mas me chame apenas de Anne, Anne com um e - sorriu animada e recebeu um aceno de cabeça em resposta, mas sem nenhuma fala.

Ao lado contrário viu Gilbert falar como o dono dos cabelos mais negros que já tinha visto. Quando percebeu viu o olhar curioso da nova colega sobre si a desconsertando. Entraram rapidamente e logo atrás estava os garotos. A mais nova colega teve que sentar o mais próximo possível da professora, não tinha mais lugares atrás. Enquanto o irmão sentou no lugar que lembrou que antes Cole se sentava.

— Por favor, se apresentem - a voz veio de senhorita Stacy e todos podem ver o menino levantar.

— Me chamo Connor O'Flanagan, ela é minha irmã - afirmou quando viu a garota se levantar, sua voz tinha um sotaque carregado, Anne sentiu vontade de bater em sua cabeça por se sentir idiota, eram irlandeses, inglês não era sua língua nativa.

— Me chamo Dalia O'Flanagan - a voz era baixa, calma, um pouco rouca e igualmente carregada, a garota voltou a se sentar sem olhar pra atrás.

A ruiva voltou seu olhar para Connor e percebeu que o olhar dele era em direção a Jane, ela falava baixo com Josie Pye, mas que todos sabiam o que era, já que estavam tão animadas ao mencionar a nova aluna que nem perceberam quando as palavras de cor tinha saído um pouco mais alto do que o ideal.

O olhar amoroso do O'Flanagan recebeu raiva, Billy levantou, talvez para defender sua irmã. Porém o erro já tinha sido cometido, e ninguém agora falava mais nada.

— Sim, de cor, é quem eu sou, possui algum problema com essa situação? - a voz de baixa foi para agressiva e acusatória.

— Quem pensa que é para falar assim com minha irmã? Nem ao menos deveria estar aqui, pessoas como você não deveriam viver aqui! - a voz de Billy era cortante.

— Pessoas como ela? O que quer dizer com isso? - agora a fala tinha saído de Connor. Anne se desesperou, viu o garoto ir para cima do Andrews e era tudo que menos queria, um conflito nesse dia tão glorioso. Deveria ser gentil, calmo e romântico, seus desejos tinham sido arruinados.

— Parem agora! - professora Stacy foi firme - Billy sente em seu lugar ou irá para casa! Connor e Dalia, realmente peço desculpas - passou de firme a compassiva em pouquíssimo tempo, mas um olhar de pena caia agora em direção a nova aluna.

Os momentos seguintes deixaram de serem tensos com algo bobo que Moody falou, para Anne era tão desrespeitoso com a garota que tinha sido atacada, seu rosto se fechou a partir daquele momento. Moody sempre foi assim, idiota e insensível. Como ainda existia pessoas que falavam com ele era sua questão atual.

— Anne? Está tudo bem? - a voz baixa vinha de Diana.

— Não, Moody é tão insensível, falando coisas idiotas como se não tivesse sido nada.

— Sim, ele é, mas não se importe com isso.

— Não irei.

Seu olhar se voltou para aula e tudo que a professora passava, mas ainda assim, sua mente vários momentos se voltava a pensar em tudo aqui.

Observava Dalia que parecia calma perante tantas coisas, forte, inabalável e segura. Anne nunca viu uma garota rebater com tanta rapidez e força, queria conversar com ela mais uma vez.

Durante o intervalo todos saíram, Anne foi junto de Ruby, Tillie e Diana fazer suas refeições. Esperou ansiosamente a nova moradora de Avonlea ir pegar sua bebida, porém para sua infelicidade quem apareceu foi seu irmão que acenou a cabeça para todas e percebeu que todas, inclusive ela, corou por conta do aceno do jovem. Ele pegou a bebida e foi em direção a garota que se encontrava na porta com dois pequenos embrulhos em mãos.

Se sentaram logo depois em um pequeno espaço e comiam conversando, não conseguia ouvir e daria tudo para saber do que falavam, qual era o motivo das risadas de Connor e porque Dalia concordava tanto com a cabeça.

— Não fique encarando, An - a fala vinha de Tillie.

— Mas eles realmente são diferentes - Ruby se pronunciou - E ele é lindo, me lembra os cavaleiros das nossas histórias, gostaria de tê-lo como meu príncipe - a fala emotiva trazia mais vermelho ao rosto dela, sempre sentimental e com fantasias, Anne amava isso nela.

— Sim, tão romântico, fora que Dalia parece um heroína incompreendida que parte em uma jornada de descoberta - se pronunciou em concordância - Gostaria de ter sua força.

— Sim, ela nem ficou triste, se alguém falasse daquele jeito sobre mim teria chorado e fugido - Gillis falou e todas concordaram com aceno.

O tom da conversa mudou para o aniversário que logo iria chegar, seus dezesseis anos tinham chegado, estava animada com tudo e todas compartilhavam de sua alegria. Crescer e se tornarem finalmente mulheres adultas, quais histórias viriam por vir era o que se passava na mente.

Com o término do intervalo voltaram a aula que seguiu de maneira calma. Mas Anne percebeu olhares por volta da sala, Ruby deixara de olhar Gilbert e seu olhar ia pra Connor. Diana observava a Gillis olhar o novo aluno. Billy olhava Josie de maneira estranha. Charlie a olhava e Moody prestava atenção, nunca o tinha visto assim, talvez o cérebro pequeno finalmente tenha crescido.

Ao irem embora todos pararam em frente a porta. Conversavam sobre o que faria o resto do dia. Jane falava sobre seus novos vestidos incessantemente e fazia os olhos da Barry revirarem, apenas conseguia esconder o riso por conta da realmente entediada da amiga. Quando a O'Flanagan saiu acompanhada do irmão, correu para chama-la.

— Dalia! Dalia! - gritava e puxava sua amiga junto de si.

— Olá, Anne! - a voz era calma e seu nome com uma pronúncia diferente, tão lindo e sensível.

— Eu e Diana poderíamos acompanha-lá enquanto vai pra casa? - o pedido incluiu a morena que a olhou surpresa.

Não obteve resposta automática. Observou a garota olhar o moreno, ele acenou em sua direção, mas viu seu braço envolver o dele como em defesa. Se sentiu estranha, sabia que ela iria negar.

— Sinto muito, prefiro ir pra casa apenas com Connor - e viu ela apertar o braço mais forte do garoto - Talvez em uma próxima - sorriu como todos os outros sorrisos, tímido e um pouco solitário.

— Até, senhorita Cuthbert e senhorita Barry - o garoto falou e se foram.

— Acho que ela é tímida - Diana falou enquanto olhava os dois ficarem cada vez mais distante.

Concordou, não sabia mais o que falar. Não queria que a garota a odiasse, o modo que agiu era o que imaginava, que não queria ter sua presença com ela. Seus olhos caíram e seguiram em direção pra casa.

Marilla a recebeu animada, a abraçando e pegando seus pertences. Tudo que teve em resposta foi um suspiro da ruiva.

— Ela me odeia - disse ao se sentar na cadeira da mesa de jantar.

— Quem te odeia, Anne? - a voz dela ficou preocupada, se culpou por deixá-la assim

— Dalia O'Flanagan me odeia.

— Quem é ela?

— A nova aluna, Marilla, esqueceu dos novos moradores? - perguntou já se exaltando e levantando - Ela nem ao menos deixou eu e Diana acompanha-lá, ela nem ao menos negou, o seu irmão falou por ela já que ela não quis nem ao menos fala e conosco - passava a andar de um lado para o outro enquanto falava.

— É o primeiro dia dela após se mudar, deveria estar cansada, ter afazeres em casa ou qualquer outra coisa - se virou para a mais velha das Cuthbert - Ela recusar pode ser qualquer coisa, não a odeia necessariamente, An.

— Sério? Tem certeza?

— Sim, e amanhã tente criar laços com ela, converse, ele pode ser muito tímida, principalmente já que não conhece ninguém.

— Sim, sim - agora a mente dele vagava para uma maneira de criar um laço com ela.

— Mas ela é tão boa a ponto de querer sua amizade assim? - e Marilla recebeu um suspiro apaixonado de Anne em resposta.

— Ela é como Bash, sua pele parece chocolate - disse sorrindo.

— Sério? Vi os O'Flanagan pela manhã, não imaginei que fosse assim.

— Também não, seu irmão Connor é claro como leite - e então obteve sua resposta - Será que ela é adotada como eu?

Agora tudo que mais queria era realmente criar laços com ela, alguém com uma historia parecida, adotada. Tinha que ser, era como sua semelhante. Queria saber mais dela.

— Pode ser, mas não pense muito nisso, precisa se lavar para me ajudar na cozinha.

— Sim, sim, irei - subiu correndo para seu quarto.

Esse dia estava sendo glorioso e esperava apaixonadamente que não parasse ali.