Jaspes e Jades

Capítulo 1 — Feliz Aniversário!


Mais um ano em sua vida. Menos um ano para viver. Fazia tempos que não se sentia assim, meio apreensivo, meio hesitante. Aniversários são bem irrelevantes às nações, mas mesmo assim, comemoravam-nos. Ele adorava o clima de festa, conversar com as pessoas, lembrar-se de suas aventuras, suas batalhas.

Mas hoje, ele decidiu ficar em casa. Um dia antes, saíra com o irmão para pôr a conversa em dia, almoçou na casa de Roderich com Vash e Lilli, trocou telefonemas com alguns velhos amigos dos anos de União Soviética. Naquele dia 18, às seis da manhã, Gilbert acordara e bocejou. Ah, é meu aniversário, pensou enquanto esfregava o sono de seus olhos.

Saiu da cama e escovou os dentes. Murmurou um “bom dia”, esperando pela resposta de seus cachorros, que geralmente vinham cumprimentá-lo. Naquele dia, não houve resposta. Coçou o queixo e percebeu que os pelos já cresciam de volta. Quando foi a última vez que fez a barba? Deu de ombros para si mesmo. Talvez devesse deixar como estava. A pergunta que o incomodava era onde estavam seus cachorros.

Desceu as escadas. Na metade da descida, podia sentir o cheiro de café e torradas.

“Tinha que ser, ” murmurou mentalmente, bocejando novamente. Com os olhos entreabertos e ainda pesados de sono, seus pés o guiaram para a cozinha, onde a familiar figura sentava-se em uma cadeira ao lado da cafeteira. Estava com a cabeça apoiada sobre os braços, que descansavam sobre a bancada de mármore, de costas para a entrada da cozinha e observando o líquido escuro pingar pouco a pouco dentro da jarra. Os três cães sentavam-se ao seu lado, analisando-a e talvez esperando por um chamego atrás das orelhas.

A ex-nação aproximou-se silenciosa, descalça sobre o piso de azulejo. A luz da manhã mal iluminava o céu e tentava penetrar as janelas da casa, cujo interior ganhava uma aura laranja, contrastando com as sombras da madrugada passada. A nação invasora estava vestindo uma blusa com capuz bem genérica e seu velho par de jeans. Gilbert sorriu. Pousou uma mão sobre o ombro da figura sentada à sua frente, esperando que ela virasse.

Seus olhos se encontraram. Sorriram um ao outro. Ele abaixou-se um pouco para que os lábios se chocassem. E ficaram um tempo ali, aproveitando-se no silêncio daquele 18 de janeiro. O gosto da pasta de dente de menta dele ainda estava forte em sua língua. Ela inspirava e o cheiro que infiltrava suas narinas era o de enxaguante bucal e de quem acabou de acordar, um cheiro de pele, um cheiro de preguiça.

Ele sentiu o cheiro do cabelo dela, um xampu gostoso que ele adorava. E ela sabia disso, e por isso usava. Sentia também o delicioso aroma do café, que logo estaria pronto; do pão que ganhava um bronzeado na torradeira.

Era uma relação gostosa que dispensava palavras. Ela sabia que Gilbert queria um tempo para si, mas que ela ainda era mais que bem-vinda para vê-lo naquele dia. Erzsébet sabia pela voz dele no telefone no dia passado que ele queria apenas uma pessoa em sua casa naquele dia. Sabia que ele não queria festa, não queria extravagâncias. Apenas tranquilidade. Bem incomum para o Gilbert que todos conheciam.

A mão dela escalava o peito dele, passando pelo pescoço e descansando contra a mandíbula dele. Demorou-se ali, acariciando a barba por fazer. A mão dele fazia movimentos circulares sobre o ombro dela, dizendo a ela que estava feliz em ter dado aquela cópia da chave da casa dele “para eventuais emergências”.

Por mais que o tempo passasse, por mais que ele sentisse que a vida estivesse tornando-se um conceito passageiro, ele sabia que podia encontrar um porto seguro nela. Como se a húngara fosse capaz de parar as horas por alguns segundos.

E aqueles momentos eram os melhores presentes que poderia ganhar em seu aniversário.

— Tá ficando velho, hein.

— Pois é.