Aquela imagem desprezível preencheu sua visão. Mais uma vez, ele estava de volta naquele quarto. Seu corpo já não tinha vontade para revidar. Uma explosão balançou sua casa mas ele sequer moveu-se:

—Se deus existe...ele é um pervertido cruel...

Lizzy estava sendo capturada neste momento e um fim muito pior que a morte esperava-a. Ele importava-se? Nem um pouco. Seu corpo vagueou sem destino procurando algo que pudesse pôr um fim em sua maldição. E quando ele se deu conta estava com uma faca a centímetros de seu estomago:

—Isso me parece uma ótima ideia...

Suas mãos se moveram instintivamente. Suas pernas fraquejaram enquanto sangue pintava o chão. Seus olhos perderam a luz e um frio aconchegante abraçou o seu corpo:

—Ah... -Suspirou ele satisfeito.

Sua última esperança se esvaiu quando seus olhos abriram-se naquele quarto. Viver tornou-se uma maldição. Mas aquele lobo apareceu vestido em roupas de carneiro para oferecer salvação:

—Ei...você não está cansado?

Ele usou suas últimas forças para observar seus arredores e como esperado, ele estava sozinho. Aquela voz que ecoava em sua mente não era nada além daquilo que se escondia em seu corpo:

—Você não quer descansar? -Continuou ele.

Ele riu:

—Eu sei que você quer...

Uma sombra ergueu-se acima de Kurokawa:

—Vamos...me dê o seu corpo...

Naquele ponto, Kurokawa buscava apenas um fim para a sua dor eterna...por quaisquer meios:

—Eu aceito...

Seus olhos fecharam-se e sua consciência fugiu para muito longe. Ele viu-se num lugar branco e vazio. Ele preencheu esse lugar com seus pensamentos. Lá, ele criou seus amigos. Criou amizades. Criou felicidade. Criou mentiras.

E o tempo voou. Seu sonho eterno teve fim com o retorno de seu pesadelo. Por algum motivo, seus olhos abriram de novo naquele quarto. Confuso, ele tentou mover seu corpo. Como um galho velho, seus músculos rangeram ao moverem-se. Ele entrou em seu banheiro e olhou-se no espelho. Seu rosto já não era algo familiar:

—Quanto tempo passou? -Questionou ele.

Algo estilhaçou-se dentro dele. Uma memória. Atravessou sua mente. Em meio a gritos de dor, ele lembrou-se. Ele viu seu corpo deitado em meio a uma pilha de corpos. O cheiro a podridão era insuportável mas ele mesmo assim conseguia rir incontrolavelmente. As feridas em seu corpo rapidamente curavam-se enquanto ele acariciava os cadáveres a sua volta como se fossem seus brinquedos.

Mas apenas ver aqueles corpos retorcidos não o satisfazia. Sua garganta coçava, ele pressionou suas mãos contra ela mas aquilo não era algo que pudesse ser satisfeito assim. Aquela sede era incontrolável. Seu corpo correu como um animal sedento em direção a primeira coisa que viu. Ele estraçalhou aquele pobre jovem que passava por perto.

A sensação de sede diminuíra mas ainda não era o suficiente:

—MAIS!

Aquela lembrança teve fim e sua mente regressou ao seu corpo. Ele encostou-se na pia perto ao espelho e tremeu:

—O que foi aquilo?

Mas elas não cessaram. Outra memória perfurou sua mente impiedosamente. Dessa vez, ele estava numa cidade. Suas roupas estavam rasgadas e seu corpo fedia a sangue. Ele corria como um animal a procura de um alvo. Um homem e uma mulher cruzaram a rua abraçados. Ele não sabia o significado de compaixão mas crueldade era algo que estava cravado em sua alma.

Ele intencionalmente atacou a mulher da forma mais violenta que pôde. O homem apenas gritou com lágrimas em seus olhos quando viu sua mulher ser desfeita por aquilo:

—Eu vou te matar!

Ele riu e rapidamente ergueu-o por seu pescoço:

—Matar?

Sua mãos começaram a pressionar de tal forma o pescoço daquele homem que segundos foram necessários para os seus olhos perderem a vida:

—Você pode tentar!

Seu riso psicótico intensificou-se e ele aplicou ainda mais força no pescoço daquele defunto. Um som horrível foi emitido quando suas mãos destruíram aquilo. Outro súbito fim. Kurokawa estava mais uma vez naquele banheiro. Seu corpo tremia e sua voz fraquejava. Quando percebeu que outra lembrança se aproximava, ele agiu por instinto.

Ele chocou sua cabeça contra o espelho e impediu sua mente de ser invadida mais uma vez. O sangue que escorria por suas roupas do ferimento de sua cabeça sequer fez diferença. Ele olhou-se naquele espelho quebrado:

—Parece que você se divertiu enquanto eu estava fora...

Alguma coisa moveu-se dentro dele:

—Muito! Eu matei todos, eu esquartejei todos, eu despedacei todos, eu queimei todos, eu estraçalhei todos...tantas...tantas vezes...

Kurokawa sentia nojo quando olhava para as suas próprias mãos e conseguia imagina-las manchadas de sangue inocente:

—Mas sabe...eu já decorei todos os gritos, todas as ameaças, todas as reações, todos os choros...isso perdeu a graça...

—Quantas vezes....quantas vezes você morreu? -Perguntou Kurokawa.

—Eu não contei, mas eu repeti esse dia por anos...até mesmo décadas... -Sorriu aquilo.

—Não tente buscar uma solução comigo...eu estou tão perdido como você... -Disse Kurokawa.

—Eu sabia que não devia ter confiado em você...

Kurokawa sorriu:

—Não me venha falar de confiança...

E no momento seguinte, aquela voz desapareceu. Kurokawa pegou algumas roupas e decidiu vagar pela cidade. Ele quebrou seu celular para evitar as chamadas de Sasesu, a saúde de Lizzy era a última de suas preocupações. Enquanto andava por aquelas ruas, algo tocou em seu ombro:

—Eai, pivete! -Disse aquela voz conhecida.

Ele virou-se e reconheceu aquele rosto:

—Lum. (NA: Os vendedores de informações que apareceram no capítulo 12 e em alguns outros.)

—Ei, você parece meio para baixo, pivete. -Continuou Lum. -O que aconteceu?

Kurokawa desviou seu olhar:

—Nada demais.

—Que pena que você não vai contar, de qualquer forma, passe na nossa loja quando precisar. -Sorriu ele.

—Eu passarei se tiver tempo. -Respondeu Kurokawa.

Lum antes de ir embora percebeu algo:

—Ei, pivete, onde você arrumou esse pendente?

—Eu ganhei...

—Tome cuidado com isso...ele parece ter uns vestígios de magia muito poderosa...

—Tudo bem.

Kurokawa continuou andando sem rumo quando alguma coisa o perturbou:

—Não pode ser...

Seu corpo mudou de direção rapidamente e ele correu com um objetivo. Após alguns minutos, ele finalmente chegou naquele lugar:

—Velha!!!! -Gritou ele.

Aquela idosa saiu de sua casa com um olhar preocupado:

—O que você está fazendo aqui? -Perguntou ela.

—Eu vim falar com você sobre o pendente que você me deu. Você me disse que ele podiam ressuscitar alguém mas que agora ele era inútil. -Falou Kurokawa. -Você poderia conferir se ele tem nenhuma magia ativa?

A velha estendeu sua mão naquela direção e surpreendeu-se:

—Parece que existe uma magia muito poderosa agindo sobre ele...

Kurokawa sorriu aliviado:

—Essa coisa é a causa de tudo...

Ele voltou seu olhar para ele e perguntou:

—Eu tenho duas perguntas. Primeiro, como eu faço para passar essa magia para outra pessoa?

—Você precisa entregar o pendente para essa pessoa e dizer "eu te dou isso como um amuleto de sorte". -Respondeu ela confusa.

—Certo. E quando ele ressuscitava as pessoas, existia alguma regra para onde a pessoa iria ressuscitar?

—Sim, esses tipos de magias ressuscitam a pessoa no lugar onde ela fica mais confortável.

Kurokawa começou a correr em direção a sua casa:

—Muito obrigado, tia!

Ela tentou impedi-lo:

—Ei, o que você planeja fazer?

Mas ele simplesmente afastou-se rápido demais. Ela suspirou:

—Pelo menos parece que você está no caminho certo...