Muito tempo passou e Kurokawa apenas pôde esperar e afundar-se em sua impotência, afinal de contas, Sasesu não iria voltar tão cedo. A noite caiu e quando ele estava prestes a desistir, uma silhueta se formou no horizonte. Ele caminhou em sua direção com passos pesados e um pouco fora de si:

—Onde você esteve o dia todo? -Perguntou Kurokawa irritado.

—Não é do seu interesse... -Respondeu Sasesu apenas seguindo em frente.

—Você sabia que está fazendo a Lizzy sofrer?

—Ela é a minha ou a sua namorada? -Perguntou Sasesu impiedosamente.

—Seu maldito, você não entende nada do que ela sente e ousa falar assim... -Provocou Kurokawa adotando uma postura incomum.

Sasesu olhou nos olhos de Kurokawa com um olhar possesso:

—Eu não sei de nada? Você acha que é alguém para dizer isso? Você nunca se importou com ninguém!

Kurokawa levou Sasesu por seu colarinho numa atitude totalmente descontrolada:

—Eu sempre me importei com vocês!!

Um soco foi desferido. O imponente Kurokawa foi derrubado com um potente soco e o ar encheu-se de silêncio:

—Não me venha com essas merdas!! -Gritou Sasesu.

Kurokawa apenas escutou silenciosamente enquanto limpava o sangue que escorria de sua boca:

—Ele morreu e tudo o que você fez foi se afastar!!!

Sasesu partiu na direção de Kurokawa e começou a desferir socos pesados e violentos:

—Você não tem a obrigação de se importar conosco, só não me venha dizer que o faz!! Você é aquele que não entende nada!

Kurokawa tentou impedir Sasesu de continuar desferindo seus golpes, mas algo impedia-o, mentalmente e fisicamente:

—Não ouse se intrometer nisso! -Gritou Sasesu se levantando e indo embora.

Ele apenas pode ficar deitado no chão enquanto a dor preenchia seu corpo:

—Aquele maldito...isso doeu bem mais do que eu esperava...

Ele cuspiu sangue junto de alguns de seus dentes e levantou-se:

—Não me lembrava que ele fosse tão forte assim...

Ele pensou enquanto percorria o longo caminho para a sua casa:

—Porque eu continuo me importando com eles? Até mesmo o Sasu disse que não deveria me intrometer. Eu deveria fazer isso por ser uma boa pessoa?

Um sorriso se abriu em rosto e uma leve gargalhada foi expelida:

—Ser uma boa pessoa.. parece que eu ainda tenho senso de humor...Mas por outro lado, não tem nada que me motive a não ajuda-los...

Sua linha de pensamentos foi subitamente interrompida quando ele avistou duas figuras se afastando de sua casa:

—Sasesu? -Perguntou Lizzy com um olhar desesperado. -Porque você está fazendo isso? Porque você está indo embora?

Sasesu parou de seguir em frente com suas malas e olhou para Lizzy:

—Eu tenho os meus motivos para deixar a casa do Kurokawa. -Respondeu Sasesu com um olhar triste. -Mas eu não vou te forçar a vir comigo, apenas vou te dizer algo, ele não é quem que você possa confiar...

Kurokawa apenas observou a situação ao longe. Lizzy queria interferir, queria mostrar o que sentia mas tinha medo. Sasesu partiu enquanto a luz do sol lentamente se afastava, e lá ficou Lizzy, banhada pela escuridão da noite, mais impotente do que nunca.

Naquele momento, ele lembrou-se de um sentimento nostálgico:

—Eu sempre quis te proteger... -Sussurou ele inconscientemente.

Aquelas palavras nunca seriam escutadas por ninguém, afinal de contas, ele era alguém muito orgulhoso. Alguém perdido na fronteira da moralidade, preparado para matar sem hesitar e para salvar sem medir esforços, alguém tão contraditório quanto a vida. Ele suprimiu seus sentimentos, abraçou o seu rosto inexpressivo e tomou seu rumo.

Após andar por alguns minutos, ele chegou num lugar que frequentava há muito tempo. O dono da loja sorriu ao vê-lo se aproximar:

—Já fazia um bom tempo que eu não te via, criança...

—Só por você ter mais de 50 anos, não significa que todas as outras pessoas são crianças, velho... -Respondeu Kurokawa.

O homem de cabelos brancos se afastou do balcão enquanto esbanjava um sorriso em seu rosto:

—O mesmo de sempre? -Perguntou ele abrindo um armazém no fundo daquele lugar.

—Sim.

—Você vai acabar com cárie, garoto.

—Você não deveria estar me agradecendo? Não me pareça que você tenha muitos clientes além de mim...

—Você está certo, este lugar esteve bem parado ultimamente... -Comentou o velho trazendo vários pacotes de caramelos. -Aqui está...

Kurokawa entregou o dinheiro e rapidamente abriu um pacote:

—Tão bom... -Sussurou ele enquanto degustava um caramelo.

—Seus olhos me parecem perturbados criança...tenha cuidado no que irá fazer... -Advertiu o velho.

—Não me venha com lições de moral...você não tem moral para isso... -Respondeu Kurokawa indo embora.

—Esses jovens de hoje em dia...cada vez mais insolentes...

Kurokawa entrou em sua casa silenciosamente com a intenção de não encontrar Lizzy, afinal de contas, ele não conseguiria justificar o que aconteceu entre ele e Sasesu. Com uma determinação ridícula, ele praticamente forçou o seu corpo a dormir. E na manhã seguinte, ele acordou com apenas um objetivo em mente:

—Hoje...eu vou resolver tudo...

Sasesu estava certo, Kurokawa não entendia como Lizzy e ele se sentiam. Ele não conhecia a dor de perder alguém que amava e por isso ele não sabia como agir. Mas Kurokawa sabia de algo, ele conhecia a personalidade impulsiva de Sasesu, ele sabia que Sasesu iria se culpar por tudo o que havia acontecido...

Eles eram iguais nesses aspectos, quando fracos emocionalmente...eles buscavam força física...

Ele tomou sua decisão, esperou por Sasesu e perseguiu-o, na esperança de encontrar a resposta para os seus problemas. Mas tudo isso já havia sido previsto, nesse momento, ele era apenas mais um inseto na teia de uma aranha:

—Levante-se Ceifador...sua presa, finalmente, se aproxima... -Sorriu aquela velha.

Ele estalou seu pescoço e levantou-se:

—Eu esperei décadas por isso...venha ao meu encontro...meu pequeno irmão...