Interativa - Enquanto As Estrelas Brilharem

A Calmidade Antes Da Tempestade - Parte V


P.O.V Hanna

O plano de Quíron era simples: mandar um grupo de 6 Campistas para o Everest, para resgatar os capturados e se possível, matar a Empusa. Nard obviamente estava muito confuso, mas eu completamente ignorei a explicação de Quíron, me lembrando do que havia acontecido mais cedo.

Depois de ter todo o trabalho e a preocupação de me arrumar para o encontro, a criatura me deixa esperando com cara de besta na mesa. Enquanto eu fiquei sentada na mesa, cheguei até a ver o par mais improvável do século, Hayato e Sophie juntos, e nenhum sinal de Lara.

Enquanto eu relembrava repetidas vezes o que acontecia, Quíron me chamou. Demorei uns três segundos para reagir, tirando a memória da minha cabeça. “Desculpe, eu estava distraída”, eu disse, tentando disfarçar a raiva que eu estava sentindo. Quíron fez um gesto com a cabeça que não soube dizer se era compreensão ou impaciência e depois disse: “Agora que eu terminei de explicar pro seu irmão os acontecimentos, eu estava oferecendo para vocês serem parte do grupo que eu vou mandar”. Eu estava abrindo a boca para responder quando Nard se levantou e me interrompeu antes mesmo de eu poder falar. “Quíron, eu adoraria ir. Você me conhece, eu adoro aventura e luta, e essas coisas. Mas-”, ele enfatizou o “mas”, “Eu estive tendo muitos problemas com as vozes ultimamente. Antes até dava pra aguentar, mas agora eu tô tomando o dobro de comprimidos e mesmo assim não tá funcionando direito. Eu seria um peso morto pro grupo, e pra mim mesmo. Eu prefiro ficar aqui, onde além de não machucar ninguém, eu posso manter o lugar sob controle.”

Fiquei muito surpresa com a resposta dele, já que ele normalmente era bem imaturo na hora de tomar decisões. Quíron apenas deu um suspiro, num misto de compreensão e decepção e olhou para mim. “E você?” ele perguntou, um pouco friamente. Pensei por alguns segundos, sentindo o olhar levemente inquisitivo dele me observando, mas logo depois tomei minha decisão.

“Da última vez que a gente se separou, você viu o que aconteceu. Eu não ficaria longe do Nard por nada no mundo. A gente sempre cuidou um do outro e pretendo continuar assim, e nenhuma missão, não importa o quão importante, me separaria dele. Eu vou ficar”.

Ele ficou em silêncio, analisando a situação e nos encarou por um longo tempo. “Saiam”, ele disse, secamente. Eu e Nard nos olhamos, confusos, mas obedecemos o comando. Esse comportamento era anormal dele, mas a situação também era. Nard falou que iria para o Campo de Treino e me chamou para ir junto. Na falta de algo mais para fazer, concordei em ir.

No caminho, passei na minha Cabana, para pegar minhas armas. Passando pelas camas arrumadas, cheguei na minha, que ficava exatamente no centro da parede esquerda. A cama estava exatamente como eu a havia deixado: pilha de livros na esquerda, bonecos de massinha no meio e meu cajado na direita.

Meu cajado era feito de uma mistura de madeira de acácia e bronze celestial, o que causava uma mistura de laranja e vermelho muito bonitos. Além de reforçar o cabo, o bronze também fazia curvas e zigue-zagues, dando uma textura muito interessante.

Passei a mão em todos os 1 metro e 65 do cajado, sentindo as oscilações na madeira e no bronze.

O segurei na mão, sentindo o peso totalmente equilibrado em minhas mãos, e o abaixei depois, fazendo ele parecer uma lança. Uma vez, enquanto eu treinava perto do rio, Nard brincou falando que eu parecia Moisés com o cajado na mão, e que eu ia abrir o rio “para libertar as pedras”. Coloquei o cajado nas minhas costas, em um suporte feito por Maggie e fui em direção à porta.

Saí da Cabana, vendo Nard olhando para o pulso, como se olhasse para um relógio, e fazendo uma cara de “impaciência falsa”, e pela forma em que ele mexia os olhos enquanto fazia isso, acabei rindo.

Era impressionante; ele parecia ser uma “emanação” de felicidade, fazendo com que as pessoas riam das coisas mais estúpidas. Andamos com o braço um no ombro do outro em direção ao Campo de Treino. Passamos por alguns Campistas conversando, mas no momento em que chegamos perto, eles se viraram e baixaram o tom de voz. Era um comportamento suspeito, mas decidi ignorar e continuamos andando.

Ao chegar ao Campo, notei que o lugar estava mais vazio que o normal. Havia um ou outro Campista treinando ou conversando, mas no geral o Campo estava bizarramente vazio, como se estivesse sem vida. Nard já estava com as duas espadas desembainhadas, em posição defensiva, e em reação, retirei o cajado das minhas costas.

Ele fez um floreio com a espada defensiva, rodando ela com a mão ao mesmo tempo que girava o corpo, e em resposta rodopiei o cajado com as duas mãos e ao redor do meu corpo, parecendo o um mestre ninja dos filmes que víamos no limitado tempo de TV do orfanato.

Ele correu em minha direção, brandindo a espada direita em direção à minha cabeça, e defendi facilmente com a ponta do meu cajado. Em minha opinião, o melhor ataque é uma boa defesa, então meu cajado não tem nenhum tipo de lâmina ou perfurante. Enquanto Nard tentava completar o ataque com a outra espada, previ o movimento e bloqueei a segunda espada, logo depois pisando para o lado e dando uma cajadada na perna dele, como uma provocação.

Ele tentou fazer outro ataque, mas acabou tropeçando em uma pedra e caiu, o que fez nós dois cairmos na gargalhada. Estendi minha mão para ajudar ele a levantar, e ele tentou me puxar para baixo quando o fiz, mas evitei o movimento rápido o suficiente para não cair de cara no chão, dando uma cambalhota ao lado dele, e me levantando logo após.

“Boa tentativa”, eu disse, vendo o sorriso besta na cara dele. Eu ia voltar a lutar com ele, mas vi Lara na distância e falei para Nard que eu voltaria depois. Eu estava com muita raiva dela, e só queria ficar o mais longe possível.

Eu não sabia se ela já havia me visto e estava me seguindo, mas não quis dar benefício à dúvida. Enquanto eu passava pelo refeitório, olhando para trás a cada 5 segundos, vi Mevans sentando em uma parede com a cabeça nos joelhos, em completo silêncio. Depois do que havia acontecido, não me surpreende ele estar assim.

Por mais que eu quisesse chegar perto e o confortar, eu ainda estava paranóica com Lara e eu era péssima em ajudar pessoas nesse sentido. Enquanto eu rusheava, vi Nick se aproximar de Michael, e torci que ele pudesse ajudar o estado mental dele.

O continuei andando, e depois de uns 5 minutos, decidi parar de dar voltas e entrei na ferraria. Ao entrar, vi que o local, assim como o Campo de Treino, estava vazio. Quase vazio; em um banco no fundo do lugar, vi Maggie e Aurora.

Ambas estavam dormindo, e misteriosamente, Maggie ainda conseguia segurar uma chave de fenda na prótese. Aurora estava bem ao lado dela, com a camisa rosa quase marrom de ferrugem, com a cabeça apoiada no ombro da outra. Tive vontade de sorrir ao ver as duas daquela forma, felizes, calmas, como se o mundo fosse perfeito.

Me virei para a porta, tentando ficar em silêncio para não acordá-las, mas acabei derrubando uma caixa de ferramentas no chão. As duas acordaram com o barulho, e a chave de fenda que Maggie segurava caiu no chão. “Desculpa, eu já tava saindo. Eu só estava fugindo de-”, hesitei um pouco antes de terminar a frase “alguém”.

Maggie franziu o cenho, e Aurora estava com tanto sono que nem devia ter entendido a frase. “Já que você se deu ao trabalho de me acordar, deixa eu pelo menos te mostrar o que a gente tava fazendo”, Maggie disse. Não querendo enraivece-la, concordei em ver o projeto.

Ela me guiou para uma das mesas, onde havia umas 5 caixas de metal, e algumas engrenagens eram visíveis ao chegar perto. Na lateral das caixas, dava para ver uma pequena lente, parecendo uma câmera fotográfica. Ela apontou para a lente e disse: “Isso aqui reconhece os Campistas que foram marcados como ‘não sendo um ciclope’”. Ela pegou um controle atrás da máquina que ela mostrava e apertou um botão, que pareceu fazer a caixa ligar, já que as engrenagens se mexiam.

Ela apontou a câmera em minha direção e apertou outro botão. Antes mesmo que eu pudesse piscar, a caixa abriu uma das laterais, e um dispositivo parecendo um lançador de arpões saiu, e da ponta dele saíram três cordas, que em segundos se enrolaram em minhas pernas e braços.

Caí no chão de susto, e Maggie abriu um sorriso. “Bem impressionante, né?”, ela disse, e fiquei sem resposta, ainda com o susto. Ela se aproximou com uma tesoura e começou a cortar as cordas. Enquanto ela cortava as cordas, finalmente consegui perguntar “Vocẽ fez isso tudo ontem?”, ainda um pouco surpresa. Ela abriu outro sorriso e apontou com a cabeça para Aurora, que agora já estava totalmente acordado, e disse: “Confesso que com ajuda, o trabalho fica mais fácil”.

Elas trocaram olhares, e logo depois Maggie carregou as caixas para fora da ferraria. “Pra evitar acidentes, vou sair reconhecendo todo mundo pra máquina”, ela disse, saindo.

“Na verdade, ela fez quase tudo”, Aurora disse. “Eu meio que só olhei e dei idéia”, ela completou. “Bom, eu te acho muito sortuda. Vocẽ mal chegou no Acampamento e já achou alguém que você gostava e que gostava de você de volta. Eu, particularmente, demorei 8 anos pra ter a minha primeira namorada. E digamos que os relacionamentos que eu tive aqui não deram exatamente muito certo”, eu respondi, tentando consolar ela.

“Acho que você tem razão…”, ela disse, enrolando o dedo em uma das mechas cacheadas do cabelo dela. “E é por causa desses seus ‘relacionamentos falhos’ que você tá aqui, não é?”, ela perguntou, me pegando desprevenida. “Eu posso ser muito boa em identificar emoções, e você tem todos os sinais de coração partido”, ela continuou. Fiquei muito surpresa com a habilidade empática dela, e respondi “sim” hesitantemente.

Ouvi batidas na porta e logo depois ouvi alguém perguntar se havia alguém dentro, Reconheci a voz de Lara e congelei no lugar. Aurora colocou a mão em meu ombro e disse “Sai pela janela dos fundos, eu distraio ela”, o que me deixou muito feliz. Saí correndo e nem olhei para trás.

—Fim do Ato I-