Insônia

Capítulo único


2 horas. 2 horas foi o que Steve conseguira dormir aquela noite sem precisar tomar remédios. Em comparação com os dias anteriores, era uma vitória, visto que o máximo que conseguia dormir sem remédios podia apenas ser chamado de breves desmaios.

Steve não gostava de tomar remédios para dormir, no passado ele precisava tomar vários remédios todos os dias devido às doenças de seu corpo frágil, então, quando adquiriu o corpo de super soldado pensou que nunca mais fosse precisar. Entretanto, a cada vez que fechava os olhos, inconscientemente o medo de acordar apenas décadas depois o impedia de relaxar e alcançar o descanso merecido, e apenas quando o cansaço era demasiado era que ele tomava um “descanso”.

Nesse exato momento ele se encontrava na cozinha da torre Stark esquentando um pouco de leite na tentativa vã de trazer a sonolência a tona.

— Não consegue dormir, Capitão? — Diz uma voz na entrada da cozinha.

— Não. E pelo visto, nem você, Tony.

— Por que não toma aquelas pílulas para dormir que o Nick mandou fazer especialmente para você?

Se Steve tentasse tomar pílulas normais para dormir o efeito seria imperceptível, pois o soro do super soldado fazia com que remédios normais não tivessem efeito em si. Pensando nisso Nick mandou fazerem testes para encontrar uma maneira de ajudá-lo a dormir, e o resultado são montes de caixinhas de remédio na gaveta da sua mesa de cabeceira.

— Odeio a ideia de tomar remédios. E considerando que você também está acordado, creio que você também. — Respondeu enquanto retirava a caneca de leite do microondas.

— Só porque estou acordado hoje, não significa que fique todas as noites. — Disse defensivo.

— Tony, absolutamente todo mundo sabe que você passa a noite em claro trabalhando na sua oficina, ninguém fala nada apenas para não receber um fora de você. — Se virou na direção de Tony apenas para levantar uma sobrancelha.

— Todo mundo?

— Todo mundo.

Eles permaneceram em silêncio enquanto Steve dava um gole em seu leite e Tony se aproximava para preparar um café.

Enquanto encarava o café sendo feito, foi surpreendido ao ter o rosto suavemente puxado na direção de Steve e sentir os dedos dele suavemente passarem pelas olheiras enormes que ele sabia que existiam abaixo de seus olhos.

— Você realmente deveria desistir de tomar esse café e tomar um remédio para dormir, Tony. Dormir é extremamente necessário e qualquer um vê de longe que você está há dias sem uma boa noite de sono.

— Embora não aparente, tenho certeza que você também não dorme bem há dias. Deveria seguir os próprios conselhos. — Disse enquanto retirava ambas as mãos de Steve das laterais de seu rosto.

O silêncio voltou a reinar na cozinha por alguns minutos e cada um se permitiu apreciar um pouco de sua bebida quente.

— Mesmo tomando remédios para dormir pesadelos preenchem minha noite e sempre acordo mal. — Disse Tony, rompendo o silêncio.

— O que?

— Você ouviu.

Steve conseguia entender um pouco o ponto de Tony. Ele o viu tomar rapidamente todo o café da caneca, caminhar até a pia e colocar o copo vazio dentro dela. Ele provavelmente voltaria para a oficina e ficaria lá trabalhando até desmaiar de cansaço.

— Você gostaria de assistir a um filme comigo? — Perguntou Steve. A idéia de dormir não lhe era agradável, mas passar a noite acordado e sozinho tampouco o era.

— Tipo amanhã no cinema? Como um encontro?

— O que? Não. — Steve estranhou. Mas Tony sempre fazia esse tipo de piadinha incompreensível. — Aqui, agora, para passar a noite.

Tony pareceu pensar um pouco antes de acenar positivamente e se dirigir para a sala.

— Que tipo de filme tem em mente? — Perguntou ao se acomodar no sofá.

— Toy Story. — Disse sério.

— Tá falando sério? — Disse descrente.

— Sim. Acho incrível como a tecnologia permite fazer filmes sem precisar de pessoas para interpretar personagens. E dizem que é muito bom.

— É para crianças.

— Que eu saiba a classificação livre é para todas as idades.

Tony se permitiu rir levemente ao ouvir aquela resposta e decidiu não retruca-la.

— Tony. — Steve perguntou depois de encarar o controle por alguns segundos.

— Sim?

— Como mesmo é que se coloca na Netflix?

O Stark se permitiu rir um pouco mais e, com Steve sentado ao seu lado prestando atenção, explicou passo a passo como colocar um filme na netflix.

Após o filme finalmente começar, ambos se acomodaram melhor no sofá. E mesmo depois de todo o ensinamento de “como colocar um filme” acabar, nenhum deles se afastou um do outro.

Rogers prestou tanto quanto pode a sua atenção no filme, mas ela foi desviada após sentir o peso da cabeça de Anthony Stark em seu ombro e, ao olhar para o rosto do dito cujo, percebeu que ele havia caído no sono. Pensou em levá-lo até o quarto dele, ou acordá-lo, mas, sabendo a dificuldade dele em dormir, decidiu apenas ficar quieto no lugar e deixá-lo descansar o tanto quanto possível.



Quando seus olhos abriram no dia seguinte, estranhou a claridade do local, pois sempre mantinha tudo fechado ao ir dormir. Após os olhos se acostumarem, percebeu que estava na sala, no mesmo canto que sentou de madrugada para assistir o filme. Podia ouvir a voz de Clint e Natasha da cozinha e, além de não se lembrar de ter assistido ao fim de toy story, podia sentir o peso que alguém encostado em si, provando que Stark continuava no mesmo local.

— Tony. — Balançou suavemente o ombro do outro. — Acorda.

— hnm. — Gemeu Tony, acordando lentamente. E aparentemente demorou alguns segundos para perceber onde se encontrava, pois deu um pequeno pulo no sofá e olhou para os lados para se localizar na casa.

— Bom dia. — Disse Steve.

— Bom… dia. — Disse parecendo um pouco estranho e alongando os músculos do corpo.

— Você tá bem?

— Sinceramente? — Olhou para Rogers. — Faz muito tempo desde que dormir tão bem assim.

— Teve pesadelos?

— Não. E você?

— Não lembro nem quando caí no sono.

Tony respirou fundo, se sentindo como novo, e escutou as vozes de Clint e Natasha ao longe.

— Ah, droga. Aqueles dois devem ter tirado uma foto da gente.

— Por que acha isso?

— É o que eu faria. — Sorriu e se dirigiu ao quarto para a higiene diária.

Os dois passaram o dia de bom humor. Quem imaginaria que conseguiriam cair no sono enquanto assistiam a um filme e que tal sono seria tão bom?



No começo da noite, Steve, junto com Natasha e Clint, foi chamado para uma emergência em uma cidade vizinha para uma emergência envolvendo reféns e Tony ficou na torre tendo a companhia de Bruce e Jarvis.

Stark ficou trabalhando em melhorias em sua armadura até estar tarde e cansado demais para continuar trabalhando. Ele pegou uma manta e um travesseiro e ao chegar na sala se acomodou, colocou um filme, que mentalmente ele nomeava de estúpido, e esperou o sono chegar.

O que ele não esperava era assistir ao filme inteiro aos mínimos detalhes e não pregar o olho nem ao menos uma vez. Ele sabia que isso poderia acabar acontecendo, mas não custava tentar se enganar e acreditar que o que o fez cair no sono anteriormente havia sido o sofá e o filme ao invés da companhia. Então, aceitando que não pregaria o olho, Anthony foi preparar um café na cozinha antes de voltar para a oficina.

Na manhã seguinte o trio voltou da sua missão, e, após comer um café da manhã reforçado, cada um deles foi para seu respectivo quarto.

Caso perguntado, Tony diria que esperava todos os três tivessem um bom sono, mas mentalmente ele esperava que o capitão chegasse a mesma conclusão de que, talvez, o que os permitiu pegar no sono na outra noite, tenha sido a presença um do outro. Ao mesmo tempo em que não teria coragem de pedir para Steve ir dormir com ele apenas para testar a própria teoria.

Pelo resto da próxima semana, nenhum dos dois chegou a abordar o tema "dormir juntos". Tony foi em busca de soluções alternativas. Algo que transmitisse o conforto de um abraço, que o acalmasse e acolhesse, como aquelas almofadas com pernas ou braços para encostar a cabeça. Já Rogers foi atrás de consultar os seus amigos.



— Steve, acho que a melhor opção talvez seja tomar os comprimidos. Não é por você ter um super corpo que você pode se permitir tantas noites de insônia. — Disse Natasha após pegá-lo vagueando pela cozinha por mais uma noite.

— Eu realmente queria uma opção no qual não precisasse me drogar.

— Mas você já tem uma, não tem? — Encarou Steve com uma sobrancelha erguida. — Vá falar com Tony.

Sem sustentar o olhar que a viúva negra lhe entregava, ele concordou baixinho e se levantou dirigindo-se ao quarto de Tony.

Desde que eles caíram no sono juntos há uma semana, Tony passou há ir ao próprio quarto todas as noite, o que causou certo receio em Steve, que quase não pregava o olho.

Respirando fundo e criando coragem, Steve deu três batidas na porta e esperou uma resposta que não veio. Na dúvida da falta de resposta ser por ele estar dormindo ou algo ter acontecido, bateu novamente, e novamente a resposta não veio. Por fim, abriu a porta para dar uma verificada, e lá dentro encontrou Tony dormindo junto a uma almofada com um formato de um braço e tronco humano, o rosto do Stark repousava no braço da almofada e os braços rodeavam o “tronco”. Entretanto o que captou mais a atenção do Rogers foi o fato da almofada parecer estar usando o seu uniforme de herói.

O Capitão América podia ter virado as costas e saído do quarto, considerando que Tony estava conseguindo dormir bem. O Capitão podia acordar Tony e perguntar se poderiam dormir juntos e agir de acordo com a resposta. Rogers podia, também, retirar delicadamente a almofada dos braços do homem de ferro e ocupá-los, deixando para lidar com a reação de Anthony na manhã seguinte. Entretanto, de forma inusual, Steve, ao sentir algo que julgou ser raiva e revolta, puxou a almofada de forma abrupta, acordando Tony.

— Você podia ter chamado a mim, ao invés de se agarrar a algo falso. — Disse alto, segurando a almofada à vista.

Tony, ainda perdido e confuso pela sonolência, ficou um tempo encarando a almofada que lhe era estendida sem absorver o que estava acontecendo. Ao finalmente compreender a situação, retirou bruscamente a almofada das mãos de Steve.

— O que você está fazendo aqui? — Disse raivoso, mas, se prestasse atenção, era possível perceber um leve rubor tomando-lhe a face.

Sem esperar uma pergunta como resposta, Steve ficou sem jeito de responder, mas ao final, e ao ver que o que ele sentia era recíproco, decidiu ser sincero.

— Vim pedir para dormir com você.

— Não consegue dormir sem mim, é? — Provocou, embora constrangido.

— Não venha com essa. Você não é ninguém para dizer isso. — Disse Steve, igualmente constrangido.

Ambos, com os sentimentos completamente expostos, ficaram em quietos e em silêncio, evitando os olhos um do outro. Por fim, ainda sem se encararem, Tony levantou o lençol, em um convite mudo, esse que foi prontamente aceito por Steve, que não se demorou a se deitar na cama e rodear Tony com seus braços.

— Precisamos mesmo estar colados assim?

— Oh, desculpe. — Disse Steve, rapidamente o soltando do abraço.

— Não, não. Não precisa se preocupar.

E, encostando o rosto no peito musculoso, se permitiu ser rodeado pela inconsciência, sendo seguido por Steve.

Eles ficaram nesse ritual por semanas, tentando ao máximo, e de forma falha, evitar que os outros vingadores descobrissem. Eventualmente, se esconder não pareceu mais necessário. Embora o primeiro tenha sido estranho e difícil de aceitar, beijos começaram a se tornar comuns, normais e bem vindos. Mais para frente, ainda, eles iriam desencadear um romance, com direito a encontros, beijos em público e noites de sexo seguidas por noites de sono abraçados. Mas isso, entretanto, já é outra história.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.