Matt

Essa coisa de magia é mesmo muito interessante. E não falo em tom sarcástico não, é interessante mesmo. Logo após eu e Helo encontrarmos Marcy e ouvirmos um barulho naquela "caixa" onde estávamos, nossa amiga nos puxa por uma porta que brotou sei lá de onde (porque antes eu tateei cada centímetro das paredes que estava ao meu alcance e não encontrei porta alguma) e nós saímos no acampamento! Exatamente!

– Explico depois – falou Marcy. – No momento, o que precisamos mesmo é deter Peter.

Não sei quem tinha ajudado a gente daquela forma, e nem me interessava em saber no momento. Marcy estava certa, precisamos encontrar Peter e detê-lo. Claro que foi um alívio ter saído daquele túnel e voltado ao acampamento, embora a gente não tenha achado o objeto de Ares e o prazo com certeza já tenha acabado. Mas o traidor do Peter era prioridade em relação a isso.

Mas a alegria de voltar logo passou, quando eu percebi a situação deplorável em que se encontrava o CHB. Era guerra pra todo lado; a Casa Grande ardia em chamas; os morangos dos campos estavam pisados e amassados; a arena de combates estava cheia deles, só que reais; os pégasos fugiam voando.

Lágrimas vieram aos meus olhos. Não podia acreditar que o acampamento estava vivendo uma segunda guerra. Olhei para trás e vi o pinheiro de Thalia. Pelo menos ele estava intacto, graças ao velocino. E esse maldito dragão que o protege nem ajuda na luta, só sabe dormir. Droga.

Marcy sugeriu que nos espalhássemos. Ela foi na direção dos chalés, enquanto Helo seguiu para o lado do riacho. Não gostei muito dessa ideia, ficar sozinho naquele caos. Veja só, aqui estou eu no meio de uma guerra entre semideuses e não sei sequer lutar! Todos estão lutando, e não sei quem está do nosso lado e quem se aliou a Peter. Vejo uns matando outros e fico mal. Campistas com espadas, arcos e flechas, lanças... E eu nem tenho uma droga de arma.

– Porra, e agora? – murmurei em meio ao choro.

Desesperado, olhei em volta para não ser eventualmente atacado de surpresa, e ao mirar novamente o pinheiro, vislumbrei um corpo estendido na colina, com a cabeça decapitada ao lado. Prestei atenção para ver se era algum dos meus amigos, torcendo que não fosse. Mas então reparei nos cabelos pretos inconfundíveis, e a tristeza me dominou. Levei as mãos à boca e meu choro aumentou.

– Não... não... Marc... por que logo você? – falei quase sem voz. – Por que, cara?

Então me toquei de que não posso ficar aqui parado, chorando. Tenho que avançar e ajudar a vencer esses traidores, com armas ou sem. Ainda tenho meu poder sobre as plantas, embora não tivesse certeza se isso iria funcionar muito. Corri em direção à arena, rezando para que Helo não visse o corpo de Marc na colina. Isso poderia desconcentrá-la.

Ao passar pelo arsenal, tive a ideia estúpida de entrar lá e pegar umas armas, se ainda tivesse sobrado alguma. Considerando que eu não sei manusear ou usar nenhuma delas. Entrei e por sorte estava vazio, exceto por dois corpos mortos no chão, que não procurei saber de quem seriam. Vasculhei o local com o olhar, e consegui encontrar duas espadas. Saí e fui para os chalés.

Encontrei Marcy e o imbecil do Peter lutando perto de duas garotas mortas, que reconheci serem Cass e Maia. Deixei-os para trás e continuei correndo. Muitos chalés tinham danos, e o pavilhão do refeitório, à frente, estava com várias colunas tombadas. Muitos outros campistas lutavam, se feriam, mutilavam e matavam uns aos outros. De um lado, notei filhos de Atena, Ares, Apolo, Íris, Hades e outros que não soube de quem eram. Do outro, meus irmãos de Deméter – os únicos que eu tinha certeza de que não haviam nos traído – junto com alguns de Poseidon, Afrodite, Nêmesis e Hécate. Entre esses últimos, estava Chris. Suspirei aliviado ao ver que ele estava vivo.

Fui até eles para tentar ajudar.

– MORRA, SEU IDIOTA – gritou Charlie ao matar um filho de Nêmesis.

– Sentiu minha falta? – perguntei sem fôlego, dirigindo-me a Chris.

– Matt!! – exclamou ele, e me deu um abraço rápido, voltando logo sua concentração para a luta. – Fico feliz que conseguiram sair daquele túnel.

– É, eu também – falei. – Quem está contra nós? – Então me abaixei de um golpe de espada que passou raspando por cima da minha cabeça. – Esse com certeza.

Empunhei desajeitado minha espada e desferi um golpe contra o garoto, cortando seu braço. Ele se enfureceu e apontou a sua na minha direção, mas quando ia quase me acertar, ela se tornou mole e dobrou de encontro ao meu corpo, não causando danos a mim. Olhei e vi que fora Chris quem tinha feito uma magia. Num ato meio sem pensar, aproveitando que o cara estava confuso, atravessei minha espada em sua cabeça. Ele caiu morto no chão e eu fiquei espantado comigo mesmo.

– Eu... acabei de... matar um ser humano?!

– Tipo isso – disse Chris. – E provavelmente não será o último.

Ficamos em posição de ataque, mas não havia mais ninguém a não ser uma filha de Afrodite e Charlie, que estava caído. Graças aos deuses ele estava apenas desmaiado.

A garota se dirigiu a Chris e alisou-o no rosto.

– Vamos, querido, junte-se a nós – disse ela com uma voz meiga e hipnotizante. – Por favor, Chriszinho, faça o que é certo.

– Ah, pois eu farei – dito isso, Chris enfiou sua espada bem no coração da vadia. – Desculpa, mas isso não vai funcionar comigo. Minha fruta é outra.

Então ela desabou, espalhando sangue pela grama. Fomos ajudar Charlie, que começara a acordar.

– Podem ir – eu disse aos dois. – Vou ajudar do outro lado. Nos vemos depois.

Mesmo com receio, Chris e Charlie seguiram na direção da floresta, enquanto eu fui para a área do lago.

Andei por aquela região e não avistei ninguém lutando ali, só tinha corpos espalhados. Então achei melhor voltar pra ajudar Marcy com Peter e usar as plantas – que, modéstia à parte, não era um poder fraco – para acertar alguns traidores. Comecei a correr ao longo da margem do lago, mas parei quando ouvi um barulho próximo.

Alguém estava chorando. Imaginei que todos os semideuses no chão estivessem mortos, mas aparentemente não. Procurei pela origem do choro e encontrei um deles se mexendo ligeiramente.

– Ei! – exclamei. – Você tá vivo.

Não, Matt, imagina, ele tá morto. Por isso é que chora e se mexe. Às vezes minha própria obviedade me dá raiva.

– Ai... – gemeu o garoto. – Não... consigo levantar...

– Calma, eu vou te ajudar – fui em direção a ele, mas parei. – Espera, você está contra ou a favor dos traidores?

– Ai... contra, é claro – disse ele com dificuldade. Não pareceu estar mentindo, até porque não havia razão para o fazer, pois eu duvido que ele saiba que sou contra; além de que eu o mataria se fosse aliado de Peter.

– Ainda bem – falei. – Vou te ajudar, não se preocupe. Aqui – me abaixei e indiquei meu ombro. Ele passou o braço esquerdo ao redor do meu pescoço e eu, o direito ao redor da sua cintura, então o ergui do chão.

Ele se contorcia de dor, e estava cheio de machucados. Alguns ainda sangravam.

– Temos que achar a Helô – eu disse. – Ela é filha de Apolo, vai te curar.

– Não... – murmurou ele, depois apontou pro lago. – Sou... filho de Poseidon.

– Aaah, certo, certo. Então venha, vou te levar pra água.

Ele caminhava com dificuldade, mas estava apoiado em mim e chegamos ao lago, dentro do qual o menino se deixou cair e ficou deitado por um tempo.

Após levantar, suas feridas tinham sumido e ele já conseguia andar direito.

– Aaah! Me sinto bem melhor – ele falou. – Muito obrigado mesmo, é... Matt, não é?

– Aham – confirmei. – E você é...?

– Mike – ele respondeu. – Prazer.

– Igualmente – sorrimos um para o outro e apertamos as mãos.

Olhei ao longe, na direção dos chalés.

– É melhor voltarmos pra ajudar, essa guerra ainda não acabou.

– Vamos – concordou ele, e começamos a correr. – Cara, eu não consigo acreditar que alguns dos meus irmãos se aliaram a esses traidores.

– E eu não consigo acreditar que qualquer campista fez isso – falei, com voz de tristeza.

Chegamos aos chalés e Peter ainda lutava com Marcy. Além das espadas, eles usavam o poder de manipular sombras. Ambos estavam machucados, mas nenhum parecia mais fraco ou cansado que o outro. Outros semideuses lutavam ao redor deles. Uma aliada de Peter tentou atingir Marcy, mas ele gritou:

– NÃO! EU cuido dela!

Observei se ninguém estava tentando me acertar, então tentei me concentrar e chamar as plantas ao meu comando. Mas ali só havia grama, nada grande o suficiente para ser útil contra uma pessoa. Então olhei para a floresta próxima e vi cipós. Ordenei que eles se mexessem e viessem até aqui.

Nessa hora Luc apareceu do outro lado, por trás de Marceline. Ele estava prestes a acertá-la (Droga, Peter convenceu todos os seus irmãos?, pensei), quando fiz o cipó ir até ele e chicoteá-lo. Ele cambaleou para trás, mas logo se recuperou e avançou novamente para sua irmã. Fiz o cipó acertá-lo de novo. Não sei se Peter viu o cipó, ou mesmo se viu Luc, pois sua atenção estava toda voltada para Marcy.

Luc já focava novamente em atingir minha amiga; então, juntando toda a raiva e ódio que eu estava sentindo, fiz com que o cipó se enrolasse no pescoço do traidor e começasse a enforcá-lo com força. Ele parou e largou a espada. Tentava tirar o cipó sem sucesso, e sua expressão era de puro terror: olhos arregalados e boca aberta.

– Isso, Matt! – Mike disse, me encorajando. – Ele merece.

Não sei se meu ato foi consciente ou inconsciente, mas eu estava gostando da expressão de dor de Luc. Fiz o cipó erguê-lo no ar; ele ficou mexendo as pernas e os braços desesperado.

De repente o cipó foi cortado. Luc caiu no chão e começou a tossir ao ter o ar de volta em seus pulmões. Olhei para trás e vi um cara quase me acertando, quando uma pedra atingiu sua cabeça e ele caiu. Ao longe, Chris fez um sinal de positivo pra mim, e eu repeti o gesto.

– Essa foi por pouco – falei.

– É... – disse Mike.

Então John e Gee chegaram por trás de Peter e atingiram sua cabeça, fazendo-o desmaiar. Os dois abraçaram Marcy, e John a beijou.

– UHUUL! – comemorei, então fui até eles. – Até que enfim, hein!

Os dois coraram. Eles formam um casal tão fofo, aawn.

Não demorou muito e alguém inesperadamente puxou meu cabelo por trás e colocou a espada na minha garganta.

– Tentem me ferir agora – disse Peter com uma voz sombria. Marcy, Gee e John apontaram as espadas para ele. – Isso, tentem! Tentem, e ele morre.

Engoli em seco, totalmente nervoso.

– Eu deveria ter te matado antes, seu nojento – disse o traidor. – Tive a oportunidade e deixei-a escapar. Mas aqui estamos nós agora, e com apenas um movimento posso fazer isso.

– Matem ele – eu disse. – Vocês são três, vão conseguir. Não se preocupem comigo.

– Nunca – disse Marcy.

Peter riu. Então é isso: minha hora chegou, e eu vou ser morto justamente por esse desgraçado. Vocês não tinham uma morte melhor pra mim não, Moiras?

Fechei os olhos e esperei meu pescoço ser cortado por alguém que um dia chamei de amigo.